Por Raul Meneleu
Muitas pessoas
ainda hoje pensam que Lampião era um bandido pobre, talvez por não conhecerem
sua verve de comerciante e empreendedor, quando rapazinho e negociava nas
feiras das cidades próximas de onde morava.
Era sim, filho
de uma família da classe dos humildes proprietários rurais, situada entre os
ricos donos de terras, fazendeiros poderosos e de uma massa de lavradores sem
terra.
Naquela época,
no inicio dos anos 1900, ser um pequeno proprietário de terras tinha pouco
significado, pois a pobreza atingia tanto os despossuídos como os donos de
pequenas nesgas de terra. Nivelavam-se culturalmente, e seu padrão de vida
pouco diferia, todos sofriam o domínio do coronel.
Às vezes,
possuir uma faixa de terra era perigoso, pois quando cobiçado pelo grande
latifundiário que a cercava, a pessoa corria risco de perder sua vida e isso
aconteceu com a família de Lampião.
Família de Lampião
Ele nasceu no
dia 4 de junho de 1898 e enfrentou as mesmas dificuldades de quase todos os
seus contemporâneos que tinha a mesma condição. O que terminou por jogá-lo no
cangaço.
Era homem
corajoso, argucioso e treinado desde cedo para enfrentar as agruras da
caatinga, pois jovem já tomava de conta da pequena criação de seu pai e depois
participando da condução de mercadorias, em um pequeno empreendimento, de seu
pai, ao adquirir mulas para transporte, cujo nome do empreendimento era chamado
almocrevia.
Destacava-se
Virgulino Ferreira em tudo que se metia, pois era um jovem empreendedor.
Essas
peculiaridades pessoais ajudam a entendê-lo melhor quando enveredou no
banditismo. Era um bandido que progrediu. Tornou-se grande proprietário e um
homem de negócios organizado, levando-se em conta seu tipo de vida. Conta-se
que no ano de 1928 associou-se ao coronel Petronilo de Alcântara Reis e comprou
duas fazendas na Várzea da Ema, na Bahia. Poucos meses antes tinha vendido
outra fazenda em Vila Bela. Quase no fim da vida adquiriu mais duas em Porto da
Folha, perto de Angico, onde foi morto.
Seus parentes
mais próximo, irmão e irmãs chegaram a comprar terras e residências nas cidades
e é difícil saber se foram presenteados por Lampião ou usados corno testas-de-ferro.
Lampião era um
homem rico e possuía muito dinheiro e ouro. Dizem que ao morrer, carregava cem
contos de reis, valor de três fazendas no Nordeste. Nos seus bornais
encontravam-se cinco quilos de ouro e também dizem que estavam destinados a
prover o futuro de sua filha com Maria Bonita. Além dessa fortuna, tinha muitas
jóias como cordões e anéis de ouro.
Isso era parte
de sua fortuna, que carregava costumeiramente. O grosso de seu capital, em ouro
e dinheiro, enterrava em vários esconderijos, dentro de botijas. Um desses
esconderijos ficava no Raso da Catarina, numa série de locais marcados por ele
com o nome das notas musicais cifradas cuidadosamente em mapas que se
combinavam e que muito serviram em sua fuga para a Bahia.
Ele
entesourava riquezas através de roubos e assaltos. Mas Lampião revelou talento
empresarial. Foi, por exemplo, fornecedor de outras quadrilhas. Revendia armas
compradas de traficantes comuns, com cem por cento de lucro. Isso criou
inclusive uma dependência econômica de alguns chefes de bando inclusive gerando
queixas por sua exploração.
O mais exótico
empreendimento comercial de Lampião foi a sua entrada no ramo de transportes.
Acabou fundando uma companhia de caminhões e automóveis, que lhe deu bons
lucros. Fornecia o capital para a compra dos veículos e os sócios cuidavam da
administração. Retiravam o necessário para a continuidade da empresa e dividiam
o lucro com ele. Muita gente ficou feliz com sua morte pois não tinha nada
registrado no papel e apenas seus sócios andavam direitinho, com medo de
perderem a vida.
Lampião também
empreendeu os famosos salvo-condutos, transformando esse expediente
como altamente rendoso, a ponto dele encomendar ao mascate-cineasta Benjamin
Abrão a confecção de centenas de cartões de visitas, usados para esse fim.
Investiu
também numa frota de canoas que faziam a travessia do rio São Francisco, usando
o mesmo processo de aliciar sócios. Pessoalmente, esses fatos diferenciam
Lampião de seu grupo social de origem. Foi um cangaceiro-empresário
bem-sucedido.
Mas nada o
distingue tanto desse meio, que hipoteticamente tinha nele o representante de
sua revolta, como o fato sabido e consagrado de que ele jamais matou alguém
realmente importante. Havia um compromisso rigorosamente observado entre cangaceiros
e coronéis para que isso não quebrasse o pacto estabelecido entre eles. O
deputado Floro Bartolomeu, falando na Câmara Federal, amenizou o cangaço
destacando justamente o fato de que não matava gente de "posição":
"...no
sertão é raro um homem de posição ser assassinado, mesmo de emboscada, nas
estradas desertas; sempre estes fatos ocorrem entre os cabras, cangaceiros ou
não, gente que não faz falta." Em pronunciamento na Câmara dos Deputados.
O cumprimento
fiel desse pacto, aliado a um terrorismo implacável como meio de controle
social, fez de Lampião um bandido de sucesso.
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