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segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

O TEMPO DAS BOTIJAS

By Rostand Medeiros
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O povo nordestino tem certas peculiaridades que o distinguem dos de outras regiões brasileiras. São tradições e costumes que o pintam de maneira singular.
Quando criança, comecei a ouvir lá no meu interior, histórias de descobridores de botijas, era o tempo das botijas que creio eu ainda não findou-se.
Contavam os mais velhos que nos séculos XVIII, XIX e ainda quase metade do século XX. O povo do interior costumava guardar suas moedas de ouro, prata e cobre escondidos em latas de metal onde podiam ser conservadas ou em baús revestidos de chapa de metal e enterrados. O lugar era marcado por pedras, acidentes geográficos ou embaixo de grandes e velhas árvores.
As latas eram colocadas nas paredes grossas das casas e os baús, longe, como já dito fora delas.
O costume se fazia pela falta de bancos, pelo medo do roubo e por não ter com que gastar o muito lucrado. Sertanejos faziam quase tudo, e se às vezes tinham o que comprar, guardavam uma minguada economia que sobrava sempre e assim se mantinham.
Em Ipueiras, foram encontradas várias botijas no correr de sua história, a mais recente na década de 1970. O descobridor derrubando as paredes de uma antiga casa encontrou socado numa grossa parede de canto uma lata, cheia de moedas de prata e ouro, não se sabe o valor, o certo é que silenciosamente em pouco tempo mudou-se com a família para uma capital do sudeste e só depois por parentes se soube do fato.
Contornando o morro do Cristo, em Ipueiras , se via no caminho serpenteado, covas quadradas na medida de um grande ou médio baú, quase a beira da estrada carroçal.
Não havia dúvida, e isso era fato corrente daquela região, muitas botijas foram certamente achadas.
Dizem os mais velhos que às vezes o felizardo sonhava com o lugar, ou por pura sorte cavando encontrava. Para completar o quadro,era corrente a história de que ao cavar o astuto e ambicioso tinha visões macabras, como fogo queimando o corpo, cobras se enroscando nas penas e espíritos penados a mandar que parasse a escavação. O certo era que das histórias que ouvi muitos fugiram e se desequilibraram mentalmente, outros mais corajosos iam até o fim, e bastava abrir o baú de madeira carcomida, tudo sumia com um gemido medonho.
O que levava estas botijas a serem esquecidas era ou a morte repentina do dono, e só ele sabia onde estava, ou pela idade o esquecimento que lhe fazia procurar e não mais achar o lugar correto.
Outro fato era o sonho do lugar da botija, dizia-se que o espírito não teria paz enquanto não revelasse o segredo, o dinheiro que em vida não usufruiu, que o ouro e a prata o prendiam no lugar.
Verdadeiro ou falso, muitos descobriram esses tesouros, e formou-se lenda no sertão, dinheiro não gasto traz a perdição do falecido.
O tempo das botijas passou. Mas quem pode afirmar quantas ainda estão a esperar o seu descobridor. Com modernos aparelhos a detectar metais, um corajoso aventureiro não há de voltar de mãos vazias, ficando rico da noite para o dia e finalmente libertando o espírito de quem a enterrou.
Bergson Frota – Cronista - bergsonfrotta@ig.com.br
app/opovo/jornaldoleitor/2011/08/20/noticiajornaldoleitorjornal,2280957/o-tempo-das-botijas.shtml
Extraído do blog "Tok de História" do historiógrafo Rostand Medeiros

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