Por Hérlon Fernandes Gomes
Em 1970, uma
mulher se tornou a sensação do momento, entrando pela TV nos lares brasileiros,
no famoso programa Show Sem Limite, de J. Silvestre, respeitado apresentador da
TV Tupi. O programa era desses da pergunta milionária. A professora Aglae, de
Cabrobó-PE, foi sabatinada na atração, respondendo a tudo sobre um difícil e
interessante assunto: LAMPIÃO. Os programas se avolumavam, a audiência era
grande e a professorinha aproximava-se da resposta premiada.
-
Absolutamente certa a resposta, dona Aglae! – bradava o apresentador.
Ela foi uma apaixonada pela
história do cangaço, rendendo a publicação de impressionante livro a respeito,
intitulado Lampião, Cangaço e Nordeste. Dedicou uma vida a pesquisar, visitando
lugares, consultando sobreviventes do período. Nertan Macedo, que honrou
as orelhas do livro; e Rachel de Queiroz, que o prefaciou, assim escreveram
sobre autora e obra:
“Sem contar
jamais com verbas e recursos oficiais, Aglae não fez pesquisa livresca,
buscando nas fontes consagradas o que entre nós foi dito e escrito sobre os
cangaceiros. Ela própria, nascida e vivida no sertão, conviveu, durante duas
décadas, não apenas com a paisagem que emoldurou o Capitão do Cangaço, mas com
os cabras sobreviventes da terrível aventura, que lhe ditaram memórias e
reminiscências inesquecíveis sobre a vida comunitária do grupo bandoleiro,
fatos, hábitos, higiene, sexo, maneiras de encarar as coisas, os homens e os
animais. [o livro] é uma fonte de consulta obrigatória a quantos queiram
conhecer o cangaço nômade na intimidade.” (Nertan Macêdo)
“Hoje ninguém
poderá pretender discutir cangaço e cangaceiros - especialmente quando se
tratar daquele que foi chamado o Rei do Cangaço, Lampião -, sem se curvar ante
a professora Aglae Lima de Oliveira, autoridade máxima no assunto. (...) Aglae
domina o assunto, conhece-o profundamente, vive a história de Virgulino,
interpreta-a, recorda-a quase como uma testemunha - , o que de certa forma o
foi. Pois se a moça não viu, porque nem era nascida então, ou era pequena
demais para entender o que assistia, soube depois recolher no testemunho direto
dos contemporâneos, na visita aos cenários do drama (que ocupou lugar tão
dilatado no tempo e no espaço do Nordeste), no interrogatório paciente e
minucioso dos sobreviventes da grande tragédia sertaneja, a sua verdade mais
autêntica.” (Rachel de Queiroz)
Sobre Lampião, resumiu Aglae à
revista O Cruzeiro, de 11/08/1970: "Na minha concepção, foi um
fenômeno sociológico e psicológico. Um gênio militar perdido nas caatingas.
Grande capacidade de liderança. Amava e odiava, alimentava e assaltava, era
herói e covarde. Foi profundamente nacionalista. Sua vida foi a luta de um
homem contra o destino. Lampião era astuto e calculista e não se pode
dizer que era totalmente ruim. É que seu lado mau tem sido muito explorado. Ele
não cansava de repetir as quatro coisas que mais gostava: gado gordo, cavalo de
passada boa, mulher e arma de fogo."
A distante
Piçarra, no Cariri, localizada no município de Porteiras-CE, foi um dos pontos
para onde convergiu a escritora, em busca de conversar com Sr. Antônio, 75 anos
de idade, memória viva de sua complicada relação com Lampião: de coiteiro
a delator, premido pelas questões legalistas. De fato, a Piçarra foi palco de
importantíssimas diligências cangaceiras. Foi lá, por exemplo, onde aconteceu,
em 1928, uma das mais penosas baixas no bando do Rei do Cangaço, a morte de
Sabino Gomes, o lugar-tenente de Lampião.
Fui me encontrar com Wilton
Santana (Vilson), filho-neto de Sr. Antônio, que me contou a bonita história de
afeto entre ele e o seu velho invisível - o seu velho
indivisível avôhai; e como foram as visitas de Aglae em busca de todos os
detalhes sobre o cangaço. À época, Vilson era uma tenra e curiosa criança, que
cresceu apaixonado pelas histórias do perigoso sertão. Ele me contou os
detalhes desses encontros.
... Continua
Hérlon
Fernandes Gomes
By Hérlon Fernandes às janeiro 22, 2022
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Local: Porteiras, CE, 63270-000, Brasil
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