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segunda-feira, 16 de outubro de 2017

LAMPIÃO E OUTRAS CELEBRIDADES DO CANGAÇO DESTACADOS EM ABORDAGENS CORDELÍSTICAS ENFATIZADAS PELO GRANDE E NOTÁVEL POETA POPULAR GONÇALO FERREIRA DA SILVA

Por José Romero Araújo Cardoso

O fenômeno do cangaço no Nordeste Brasileiro é tão antigo quanto a colonização da região, principalmente na área sertaneja submetida aos rigores dão malfadado quadro natural, onde periodicamente imperam estiagens que deixaram tristes lembranças e que marcaram o aparecimento de grupos bandoleiros, a exemplo dos Viriatos, dos Calangros, dos Brilhantes, etc.

Foram registradas ainda ações de cangaceiros precursores de Lampião e Antônio Silvino, tanto nos séculos XVIII como no XIX, exemplificadas através do anti-heroísmo do Cabeleira e Lucas da Feira, não esquecendo a atuação do célebre Rio Preto, cuja imitação de relinchos de jumento fazia tremer toda população ordeira da ribeira do Piranhas, na então Província da Parahyba.

Leandro Gomes de Barros, paraibano nascido em Pombal no dia 19 de novembro de 1865 e falecido no dia 4 de março de 1918, no Recife, capital pernambucana, considerado o Pai do Cordel Brasileiro, a quem, com muita justiça Carlos Drummond de Andrade agraciou com o título de “O Verdadeiro Príncipe dos Poetas Brasileiros”, honraria antes concedida ao poeta Olavo Bilac, imortalizou em versos de grande aceitação popular em seu tempo a saga cangaceira de Antônio Silvino, o Rifle de Ouro, em produções cordelísticas antológicas, a exemplo de Antônio Silvino: O Rei dos Cangaceiros e Confissões de Antônio Silvino.

Tendência semelhante em esforçar-se para fazer com que o público compreendesse e, não raro, enaltecesse personalidades bandoleiras de época, encontra-se ainda em Francisco das Chagas Batista, cuja obra, talvez a mais importante, com relação ao cultivado cangaceiro pernambucano, tem o título Antônio Silvino: Vida, crimes e julgamento.
Lampião, sucessor de Antônio Silvino e Sinhô Pereira nas lutas cangaceiras, foi alvo de duas biografias eruditas ainda em vida. A primeira, publicada no Estado da Paraíba, no ano de 1926, de autoria do jornalista Érico Gomes de Almeida, tem o título de Lampeão, sua história, enquanto a segunda, publicada no ano de 1933 em Sergipe, de autoria do médico Ranulpho Parta, traz o singelo título de Lampeão.

Gonçalo Ferreira da Silva, honrando a tradição de antigos e imortais catalisadores da essência que embasa a autêntica literatura nordestina, destaca celebridades do cangaço que deixaram histórias de valentia inaudita, iniciando, como era de se esperar, com destaque biográfico àquele que se tornou o grande “rei do cangaço”, responsável pela ênfase a uma epopéia sertaneja sem paralelos nos anais da violência que assinalou mais de duas décadas de domínio quase absoluto pelas veredas da terra do sol, pois derrotas fragorosas, como a infringida em Mossoró, quando da heróica resistência de 13 de junho de 1927, abalaram domínio antes incontestáveis.

Em seguida, o destaque fica a cargo da atuação do célebre Corisco, a quem Sérgio Dantas destacou como verdadeira sombra de Lampião, sendo responsável pela tentativa de suceder Virgulino Ferreira da Silva após a tragédia ocorrida na grota de Angico em 28 de julho de 1938. Corisco não tinha o mesmo poder de liderança desfrutada pelo compadre e amigo perecido na companhia de dez cangaceiros, razão pela qual seu domínio foi finalizado em maio de 1940, atingido, na companhia de Dada, pela volante do então Tenente Zé Rufino na região de Brotas de Macaúbas, Chapada Diamantina, Estado da Bahia.

O terceiro cordel que integra a obra enfatiza Jesuíno Brilhante, a quem o mestre Gonçalo Ferreira da Silva reconhece como “O Braço Avançado da Justiça”, pois o bandoleiro norte-riograndense chegou a fazer o papel do Estado, principalmente quando da grande seca de 1877-1879, garantindo abastecimento de víveres à população flagelada, de forma humana, sem fazer distinção.

Antônio Silvino, “a justiça acima da lei”, é a quarta celebridade do cangaço abordada, considerado, em sua época, verdadeiro terror das veredas do sertão, cujos desafios chegaram a atingir a toda poderosa Great Western Company.

O quinto momento cordelístico a ter ênfase destaca o casal cangaceiro Lampião e Maria Bonita, primeiro a integrar as hostes do cangaço a ponto de surpreender o comandante Sinhô Pereira, quando de entrevista para o jornalista Nertan Macedo que o localizou em Patos de Minas. Sebastião Pereira e Silva, neto do Barão do Pajeú, vingador da família Pereira em luta interfamiliar secular contra os Carvalhos, revelou que nunca admitiria a presença de mulheres no ambiente cangaceiro. Lampião e Maria Bonita viveram romance tórrido, marcado por contradições inauditas, tendo como ponto principal a humanização do movimento sertanejo, antes assinalado pela absoluta ausência do perdão.

A sexta abordagem em cordel fica a cargo da brilhante composição, em sublimes versos sertanejos, enfocando o cangaceiro paraibano Asa Branca, “a inteligência a serviço do cangaço”. Antônio Luiz Tavares fez parte do bando de Lampião e participou da tentativa de ataque à cidade de Mossoró, escapando milagrosamente graças à intervenção involuntária de valente sertaneja de nome Maria Maia, esposa de Alcides Dias Fernandes, que o levou para fazer séricos domésticos em sua residência, a contra-gosto dos policiais que lhes faziam guarda, pois estava preste a ser executado como os demais capturados após o frustrado ataque de 13 de junho de 1927. Asa Branca foi funcionário da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, falecendo em Mossoró e sendo enterrado próximo ao túmulo de Jararaca, bem como do local onde está sepultado Colchete, no Cemitério Público São Sebastião.

A sétima celebridade a ser destacada é o Menino-Bandido Volta Seca, cuja atuação no cangaço foi tão marcante a ponto de ter despertado o interesse de Jorge Amado em inseri-lo no romance intitulado Capitães de Areia, um dos mais importante trabalho literário do filho de cacauilcultores baianos que abraçou a doutrina comunista. Volta Seca foi um dos mais cruéis cangaceiros na tragédia verificada na cidade baiana de Queimadas, quando o destacamento local, à exceção do Sargento Evaristo, foi dizimado covardemente.

Em seguida, Gonçalo Ferreira da Silva versifica a trajetória sanguinária e hedionda de Zé Baiano, “o ferrador de gente”, cangaceiro perverso que cismou em moralizar o sertão através de métodos violentos que puniam com arrojo o que considerava desvios de conduta, sobretudo manifestados pelo gênero feminino. A fama de perversos granjeada pelo cangaceiro Zé Baiano enfatizou o empenho de Estácio Lima a fim de provar vínculos desse sertanejo com teorias lombrosianas.

A nona celebridade do cangaço a ser enfocado em versos cordelisticos é o pernambucano de Quixaba de nome Ângelo Roque, o qual ficou conhecido pela alcunha de Labareda. Em Guerreiros do Sol: O Banditismo Rural no Nordeste do Brasil, Frederico Pernambucano de Mello, pesquisador e historiador de raros dotes, enquadrou-o no Cangaço-Vingança, seguindo a proposta que formulou e que a denominou de Teoria do Escudo Ético. Protegido do Dr. Estácio, Labareda, depois de se entregar com arte do bando, tendo recebido anistia de Vargas, foi enquadrado como funcionário público do Instituto Médico Legal em Salvador, capital baiana.

O décimo cangaceiro a ter sua vida destacada em cordel é o cunhado de Lampião, conhecido nas hostes do cangaço pelo apelido de Moderno, mas que não teve grande repercussão, pois Virgínio, seu nome de batismo, ficou imortalizado indelevelmente no movimento sertanejo. Virgínio era uma espécie de “juiz do grupo de Lampião”, tendo em vista ser ponderado e coerente, não apresentando “pendores voluntários” para a “profissão de cangaceiro”.

A décima primeira personalidade cangaceira a ter registro na obra literária que enriquece magistralmente a produção em cordel se refere ao cangaceiro-militar José Leite de Santana, o qual devido ao comportamento extremamente violento recebeu do próprio “Rei do Cangaço” o apelido de Jararaca. José Leite de Santana se encontrava em posição de vanguarda quando do ataque a Mossoró, sendo alvejado duplamente no ensejo dos combates travados em vias públicas da capital do oeste potiguar. A forma covarde e desumana como foi executado, pois estava preso e, em tese, deveria ter sua segurança garantida pelo Estado e seus aparelhos, despertou a fé popular, a qual o transformou em “santo milagreiro” na Terra de Santa Luzia do Mossoró.
As décima segunda, décima terceira e décima quarta celebridades do cangaço enfatizam o universo feminino e suas influencias, pois tanto Maria Bonita, “a eleita do Rei”, Dadá, “esposa e aliada de Corisco”, como Cila, “liderança feminina do cangaço”, ocuparam posições proeminentes e de respeito no Estado-Maior que estruturou uma das mais formidáveis manifestação de insurgência no sofrido Nordeste Brasileiro.

Maria Bonita, “a rainha do cangaço”, separou-se do esposo para seguir Lampião, assinalando capítulo inicial da inserção das mulheres no cangaço, enquanto Cila, esposa de Zé Sereno e Dadá, esposa de Corisco, sobretudo a última, deram provas inequívocas de engajamento completo, não obstantes dúvidas iniciais, mas que foram sendo dirimidas em razão de vínculos profundos com a organização do movimento e férreo atrelamento aos preceitos que definem, entre outras coisas, a moral sertaneja e suas implicações.

Estão de parabéns o renomado cordelista Gonçalo Ferreira da Silva, a Editora Queima-Bucha e o Nordeste Brasileiro, pois a importância do presente trabalho literário dignifica toda resistência que vem sendo empreendida por valorosos defensores das bases da autenticidade que caracteriza as verdadeiras expressões da originalidade nordestina.

José Romero Araújo Cardoso – Geógrafo (UFPB). Escritor. Professor-adjunto IV do Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Especialista em Geografia e Gestão Territorial (UFPB) e em Organização de Arquivos (UFPB). Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente (UERN). Membro do Instituto Cultural do Oeste Potiguar (ICOP), da Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço (SBEC) e da Associação dos Escritores Mossoroenses (ASCRIM).

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