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quinta-feira, 15 de março de 2018

PEGA DE BOI BRABO NO MATO, NA FAZENDA ARACATI


Benedito Vasconcelo Mendes

Eu era criança quando assisti pela primeira vez meu avô e o vaqueiro Sales derrubarem um enorme touro brabo, dentro de uma mata garranchenta e espinhenta na Fazenda Aracati. Eu estava  passando minhas férias escolares de meio de ano na referida fazenda, juntamente com meu pai, que também estava de férias de seu emprego no Banco do Brasil. Corria o mês de junho, ainda com chuvas, o gado gordo e a vegetação verde, viçosa e florida.                                                                                        
O Sales era o vaqueiro mais experiente da fazenda Aracati e meu avô era o melhor pegador de gado brabo da redondeza do município cearense de Sobral.                                                         

Depois do café da manhã, meu avô tirou sua camisa azul de mescla  de quatro bolsos, vestiu seu gibão-de-couro de veado-catingueiro, as perneiras, o guarda-peito, os guarda-pés, as luvas, as esporas e o chapéu de couro e depois foi arrear seu garboso cavalo Estrela. Com seu cavalo arreado, inclusive com peitoral de couro de boi curtido, para enfrentar a caatinga espinhenta, meu avô entrou em casa e se dirigiu até o oratório, ajoelhou-se, pediu proteção a São Raimundo Nonato, protetor dos vaqueiros, benzeu-se e saiu para o alpendre. Minha avó, que não tinha conseguido dormir à noite,  preocupada com o risco que seu esposo iria correr, rezava sem parar, invocando a proteção divina. Pouco tempo depois, chegou o vaqueiro Sales, também encourado, montado no seu cavalo. Em seguida, saíram os dois rumo à Mata do Serrote, que era uma reserva de caatinga virgem, que fazia parte das terras de meu avô. Eu e meu pai fomos a cavalo assistir, de longe, a perigosa aventura do meu avô. Os dois vaqueiros, ao se aproximarem da caatinga fechada, avistaram, na beirada da mata, o enorme touro zebu, de cor cinza, com cabeça, cupim e peito  quase pretos e chifres arqueados, com pontas afiadas. Meu avô e o Sales rapidamente se aproximaram do bovino que, ao perceber a presença deles, entrou em disparada carreira na mata  espinhenta  e  foi seguido, de perto, pelos dois corajosos e hábeis vaqueiros. Logo que meu avô conseguiu pegar no rabo do touro xucro, derrubou o gigantesco animal e, numa rapidez espantosa, o vaqueiro Sales saltou em cima da cabeça do barbatão caído, enfiando os dedos nas ventas dele e entortando a sua cabeça para cima, dominando-o totalmente. Rapidamente, meu avô saltou da sela do cavalo e  colocou a careta (máscara) sobre os olhos e laçou um longo relho de couro cru trançado nos chifres dele. O valente e enfezado touro, totalmente domado, foi levado até o curral e preso no grosso mourão de aroeira,  para aparar as pontas dos chifres, com um pequeno serrote de carpinteiro, e ser ferrado com o ferro do meu avô, na anca direita, e com o da ribeira, no lado esquerdo. Este touro por ser muito arisco, quando solto, nunca tinha se aproximado  do curral. Foi criado na caatinga e ainda não tinha sido ferrado.                                                                                 
Estas cenas de bravura do meu avô, que presenciei, me influenciaram de tal maneira que eu passei, a partir daí, a dizer que, quando crescesse, queria ser vaqueiro. O destemor, a destreza e a força demonstrados pelo meu avô fizeram com que ele passasse a ser também meu herói. Hoje, quando assisto pela televisão a pega de boi no mato, como um evento esportivo, recordo-me do heroísmo do  meu avô ao executar aquela perigosa tarefa de sua lida rotineira.

Enviado pelo professor, escritor, pesquisador do cangaço e gonzaguiano José Romero de Araújo Cardoso


http://blogdomendesemendes.blogspot.com 

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