Por Volney
Liberato (*)
Graças à mediocridade-plural.blogspot.com.br (Laélio Ferreira). Currais Novos
na vida de Chico Pereira
“Desde o dia em que um desconhecido foi morto pela polícia na estrada de
Currais Novos, espalhou-se pelo sertão, vaga mas persistente, a suspeita de que
ali morrera outro que não Chico Pereira”.
(Padre Pereira – Vingança, não!).
(Padre Pereira – Vingança, não!).
Derna do tempo d'eu menino”, quando a escritora pernambucana Aglae Lima de Oliveira respondia sobre “Lampião” no Programa J. Silvestre, na extinta TV Tupi, que eu comecei a me interessar, a ler e a pesquisar sobre o cangaço – e isso já vão mais de 30 anos.
Tempos depois,
ao passar pela BR 226, quase a entrada da cidade, deparei-me com um cruzeiro
erguido para sinalizar o local onde morreu o cangaceiro paraibano Chico
Pereira. Depois disso, ao visitar o Museu do Acari (onde funcionou a antiga
Cadeia Pública), vi a foto do citado cruzeiro, com uma outra foto de Chico
Pereira, aí comecei a nutrir a curiosidade de ler o livro “Vingança, não! -
Depoimento sobre Chico Pereira e Cangaceiros do Nordeste”, 5ª ed. Rep's Gráfica
e Editora – João Pessoa / PB – 2004, de F. Pereira Nóbrega (Padre Pereira),
filho do cangaceiro Chico Pereira, que naquele quase amanhecer do dia 28 de
outubro de 1928, pereceu macabramente, exatamente no KM 177 da hoje rodovia BR
226, próximo a cidade de Currais Novos, pelas mãos de uma escolta policial, que
tinha no comando nada menos do que o famigerado então Tenente Joaquim de Moura.
A escolta era
ainda composta pelo sargentos Luís Auspício e Feliciano Tertulino, sendo o
“chofer” o sargento Genésio Cabral de Lima. O livro citado, na época, era
difícil, pois até hoje só foram feitas cinco edições do mesmo, e é esta última
que encontra-se em minhas mãos hoje, que me foi entregue pelas mãos de um
companheiro também pesquisador, a quem agradeço que, dia 08 de Janeiro,
colocou-lhe sobre a minha mesa, no Detran. Ali estava mais de 20 anos de
espera, por aquele que, um dia, seria o delator da verdadeira história da morte
do cangaceiro Chico Pereira, nos “aceros” de Currais Novos.
A história se
inicia quando Chico Pereira, paraibano de Sousa, já envolvido numa questão de
vingança familiar e já andando debaixo da “canga”, é acusado – injustamente,
segundo relatos da época – de ter, junto com um pequeno bando, assaltado uma
propriedade, na Rajada, de Joaquim Paulino de Medeiros, o legendário coronel
Quincó da Ramada. Chico foi preso na Paraíba e recambiado para a detenção de
Natal, onde responderia juri no Acari.
No dia 28 de
Outubro de 1928, a escolta que o recambiava algemado para o Acari, comandada
pelo Tenente Joaquim de Moura, estanca a poucos quilómetros da entrada de
Currais Novos, numa parte da estrada de terreno elevado, tirando-o da
carroceria e o golpeando a coices de fuzil. Já no chão, ferido de morte, o
Tenente Moura ordena ao sargento Genésio para precipitar o carro sobre o corpo
de Chico Pereira, numa altura de alguns metros, o que fez com que o corpo fosse
esmagado em algumas partes (cabeça e abdómen).
Os participantes
da escolta passaram então a ferirem-se mutuamente, para fazerem crer que
realmente tinham sido vítimas do desastre que vitimou fatalmente somente o
preso. Enquanto eram “atendidos” em Currais Novos, o corpo de Chico Pereira era
levado para a Cadeia, na então Rua do Rosário (hoje Vivaldo Pereira), onde
permaneceu exposto á visitação pública até a hora do seu sepultamento, que
ocorreu lá pelas 21 horas, no Cemitério Público de Santana, em cova hoje não
mais identificada.
A verdade é
que Chico Pereira jamais havia posto os pés em Currais Novos, e quando o fez
foi tão somente por alguns minutos, que separaram a sua vida da sua morte.
Pisou no solo curraisnovense o tempo necessário para permanecer de pé e receber
as coronhadas de fuzil que o vitimou e ser também vítima de um plano macabro, e
por que não dizer “político”.
O advogado de
Chico Pereira, em Natal, era ninguém menos do que João Café Filho, o criador de
dezenas de sindicatos na capital, e que por isso ganhou a pecha de “comunista”.
Era plano de Café Filho acompanhar a escolta, de seu carro, de Natal ao Acari,
para assim ter certeza da integridade física do seu constituído. Mas, uma
pessoa do seu relacionamento, alertou-o: “Se a polícia vai mesmo matar Chico
Pereira, pelo caminho, não vai deixar testemunhas sem farda. Na certa você
morrerá também”. Café então retornou para Natal.
No dia
seguinte, lá pelas 10 horas da manhã, recebe telegrama narrando-lhe o
“desastre” e a morte “acidental” do seu constituído. O Tenente Moura era
“pau-mandado”, como se dizia, do governo do estado, que tinha Juvanal Lamartine
no poder. O coronel Quincó era gente grande no dinheiro e na política regional,
influente nas eleições de voto de cabresto e possuidor de curral eleitoral
nutrido. Por isso, gente grada aos interesses da burguesia instalada no comando
do poder estadual.
Mas, se a morte
de Chico Pereira se deu, involuntariamente, em Currais Novos, a do Tenente
Joaquim de Moura, por ironia do destino, também. Anos mais tarde, já nos anos
40, o já então Coronel Joaquim de Moura vem a Currais Novos, sob pretexto de
participar de uma festa numa fazenda avizinhada á cidade. Mas o verdadeiro
motivo da estada do coronel Moura em Currais Novos, segundo me relatou o
saudoso Euzébio Hipólito de Azevedo, carnaubense, octogenário, que conheceu o
Coronel Joaquim de Moura de perto e privou de sua amizade, que o motivo da sua
vinda a Currais Novos era para se “acertar” com uma certa mulher – casada –
oriunda de uma família “importante” do município, que havia tido um caso com
ele na capital.
Como o coronel
apaixonou-se pela tal mulher, veio disposto a tudo, até ameaçando matar o
marido dela, caso ela não aceitasse juntar-se a ele. Pela tarde, o coronel
Moura sente-se mal e é acometido de um ataque cardíaco, vindo a falecer.
Contou-me ainda Euzébio que, seu corpo foi vestido com a farda da Polícia -
mandada buscar em Natal ás pressas - numa casa de esquina, que depois pertenceu
a Severino Maroca, na atual Rua Dix-Sept Rosado (hoje residência de Maria José
Mamede Galvão). O destino fatal uniu as duas personagens: Chico Pereira e
Joaquim de Moura. Vítima e algoz, ambos finando-se em Currais Novos, em épocas
diferentes, numa cidade em que ambos não tinham a menor relação.
O capítulo que
trata da morte de Chico Pereira, em Currais Novos, é intitulado “O Morto que
Ninguém Chora”, e é escrito de uma forma, digamos, poética, dada a verve do
autor, que não conhecia Currais Novos, mas a descreveu tão bem, como resultante
dos depoimentos, que mais parecia um curraisnovense contemporâneo dos fatos,
descrevendo a vida e os costumes da nossa comuna, naquele distante e fatídico
1928.
Quem passa
diariamente por aquele trecho da Maniçoba, talvez não perceba esta capelinha lá
existente, a esquerda da Rodovia BR 226, sentido Currais Novos-Natal. Foi o
exato local que o cangaceiro Chico Pereira foi assassinado quando vinha
responder júri no Acari. E o pior é que Chico Pereira morreu inocente, pois
nenhum crime seu foi constatado pela justiça norte-riograndense.
*Volney Liberato é filho de Currais Novos, Seridó - RN. Bacharel Bacharel em Administração pós-graduado pela UFRN; repórter pela Oficina de Jornalismo "Genival Rabelo"; pesquisador do cangaço, história regional e cultura popular.
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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