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sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

LUA NA RUA NUA (Crônica)

Por: Rangel Alves da Costa
Rangel Alves da Costa

LUA NA RUA NUA
Talvez achem demasiadamente poético o título acima consignado: Lua na rua nua. Contudo, saindo na porta da frente ou do fundo e voltando o olhar para a imensidão noturna, poesia maior não poderá surgir no instante. E se o texto fosse “Rua de lua nua” ou ainda “Nua lua da rua” teria o mesmo objetivo: cantar a beleza do luar dessa noite.
O sol foi imenso durante todo o dia, o calor insuportável até que poderia ser indicativo de alguma chuva ao anoitecer. Mas ela não veio, felizmente não veio para a festa da noite. Sem nuvens passeando lá por cima, com o firmamento de lado a lado tomado por brilhos faiscantes, o lugar estaria garantido para que ela passeasse imponente, toda linda, toda nua, imensa lua.
A lua está tão bonita, tão cheia e volumosa, que de repente fiquei com inveja dos lobos que se põem nos cumes das montanhas para celebrar o momento com seus uivos delirantes. De solidão não, nem de tristeza ou angústia, mas de alegria e encantamento por estar na presença de uma lua que representa exatamente a força da luz diante da vida.
Verdade é que a noite chega sempre instigante, catando em cada vão dos sentimentos qualquer motivo para o entristecimento, as recordações, as lembranças que fazem doer demais. Se chega acompanhada do silêncio, do sussurro da ventania passando pela janela entreaberta, então é preciso muito cuidado ao olhar para cima e encontrar o luar trazendo ainda muito mais motivações dolorosas.
É preciso, pois, muito cuidado com a noite, pois além dos seus mistérios, magias e encantamentos, ela costuma transformar o ser humano num desatinado, num inconsciente, em algo prestes a fazer besteiras. Ismália quis alcançar a lua na terra e pulou de sua janela; o louco dizia que a espada de São Jorge estava futucando seu juízo; a mocinha solitária cismou de subir até a lua numa escada de lágrimas. E eu, o que seria capaz de fazer se não fosse poeta?
Enquanto poeta não vejo a lua como astro iluminando a noite, mas sim como a dose certa de veneno para aplacar solidão, como a alquimia que transforma o impossível em outras impossibilidades, como a janela aberta para enxergar o amor que não tenho, como a música que canto no meu silencioso pranto. Se sou poeta a lua não é lua, nem a noite será noite enquanto puder transformar todo aquele luzir num pingo de lágrima, de chuva, de orvalho...
Mas não quero agora pensar em tristezas, pois a lua da rua está tão bonita que não teria motivos para dizer o contrário. Vejo nela uma poesia, e por isso mesmo encontro o amor de um dia, um tanto querer que um dia terei. E pelo brilho que vejo, pela festa dançante na noite, me ponho em valsa no meio do tempo, no meio da rua, como um ritual de iluminação para a noite que nunca mais será tão negrume.
Queria essa lua somente pra mim, guardá-la no meu espelho para encontrá-la a qualquer hora do dia. Abri os abraços para saber se cabe no coração; abri a porta e a janela para saber se cabe na minha casa, abri bem os meus olhos para saber se cabe dentro de mim. Mas não, pois somente no espelho é que a lua refletirá todas as vezes que eu queira tê-la como poesia.
Há meia hora ela me fez fechar os olhos para enxergá-la melhor, me fez cruzar as mãos em oração para entender melhor sua força, me fez ajoelhado e de braços abertos para entender melhor a beleza da vida e agradecer a Deus pelo presente noturno. Depois que levantei de olhos voltados para o alto, de corpo e alma iluminados pela força da existência maior, então me pus a escrever banhado de lua.
Mais tarde, assim que o sono chegar, apagarei todas as luzes e deixarei a janela do quarto aberta para a lua entrar. Se mais tarde ela sumir do Japão ou das ilhas do pacífico, é porque vai passar a noite noutro lugar. Dentro do meu sono será um sonho tão iluminado que me verei um poeta seresteiro, um trovador apaixonado, um cantador debaixo da janela da moça mais linda que houver.
E quando acordar caminharei pelas estrelas, num chão iluminado e cheio de certeza que a beleza da vida existe. Basta ir até lá fora, no meio da rua, e olhar a lua.

Rangel Alves da Costa 
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com

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