Por: Rangel Alves da Costa*
PASSIVOS E CONFORMADOS
O País da ordem e do progresso não passa de uma imensa junção de pessoas passivas e conformadas. E isto para ser razoável, pois poderia muito bem ser dito que a sociedade brasileira é negligente, omissa, esquecida, acrítica, apática, inerte, paciente, resignada, manipulada, inativa, indiferente, manuseada ao bel-prazer das nojentas e absurdas conveniências.
O esquecimento e a aceitação talvez sejam as características que mais mortificam um povo que sem o senso do espanto, da indignação ou revolta, fica à janela ou à porta vendo tudo acontecer como se não tivesse culpa pelo pior estar acontecendo. Tanto faz ver o manto da Virgem como um monstro. Tanto faz.
O mundo pode desabar em Brasília ou nas esferas de poder estadual ou municipal, vindo à tona um lamaçal recoberto de roubalheira, corrupção, maracatuia, propina e tudo o que de mais nefasto possa existir, que ainda assim amanhã será tudo relegado ao esquecimento. Por mais que a imprensa noticie, os jornais publiquem, a polícia investigue e até prenda alguns, mas amanhã é como se não houve acontecido absolutamente nada.
Só mesmo num País de irresponsáveis políticos, de ignorantes e de falsa cidadania, se observa tantos exemplos de imoralidade que simplesmente são colocados no ralo das coisas. E o pior é que produzem efeito contrário, pois quem deveria ser desmascarado politicamente, condenado por improbidade e corrupção e queimado na fogueira dos reincidentes, de repente sai do centro da maracatuia como vítima, dando a volta por cima e ainda mais forte.
Não faz muito tempo que aconteceu um triste exemplo envolvendo um senador. Foi noticiado à exaustão, provado por todos os meios que o parlamentar estava envolvido num verdadeiro mar de lama, que comandava uma rede de apadrinhamento, que era mais perigoso do que gavião tomando conta de milho, e ainda assim o homem foi alçado, mais uma vez, à presidência da casa. E o mais doloroso é que hoje posa de bom moço, ninguém fala mais nisso, e de inatacável bigode continua sendo grande cacique em Brasília e lá junto aos seus Marimbondos de Fogo.
É inacreditável como tudo tem o dom da fantasia, da brincadeira, da miragem. Político comprovadamente corrupto é cassado e reeleito; surgem escândalos e mais escândalos, nomes são apontados, reconhecidos os culpados, e depois tudo acaba em pizza; os órgãos de contas dizem que tal administrador fez malversação do dinheiro público, roubou, é corrupto, o maior ímprobo que possa existir, mas nada acontece depois. Ficha limpa, que ficha limpa, se quem limpa a cara do safado é o próprio povo, mais safado ainda.
É o País das maravilhas nebulosas, do inacreditável, dos contos de fadas macabros, das estórias das mil e uma noites com seus ladrões engravatados. Mas não poderia ser diferente. Com razão os que dizem que o Brasil é imprestável por natureza, pois não se pode ter como sério um País que até outro dia estava abraçando a loucura do governo iraniano, que não reconhece a violação dos direitos humanos na ilha cubana, que trata medrosamente com canhestros e suspeitosos presidentes latino-americanos. Pode ser sério um País que acolhe e defende as ignorâncias bolivarianas de Hugo Chávez?
Os habitantes desse País não são menos culpados do que sua envergonhada nação. Um povo sem tradição de luta, sem sangue na veia, sem jamais ter a coragem de fazer ecoar um grito dizendo que basta, que vai tomar vergonha na cara e dar, através do voto ao menos responsável, a devida resposta à velha corja das mesmas raposas políticas. Mas não. Sofrendo de amnésia histórica, muitos só reclamam quando lhes falta alguma coisa, porém sem lutar para que nunca lhe falte o essencial. E tudo se dá através da política, do voto, ainda que os eleitos também se esqueçam das finalidades de um mandato eletivo.
Enquanto isso, por todo lugar se vê a população sendo vitimada por sua própria passividade, sua ignorância e covardia. Quanto se pensa que vai abrir a boca para falar alguma coisa proveitosa, então se ouve sobre o BBB, sobre Luíza (a que estava no Canadá), sobre o jogo de ontem e o futebol de amanhã. E a vida gente, e a vida?
Os morros estão desabando com as chuvas, pessoas estão sendo soterradas, edifícios desabam por falta de cuidados e vistorias, famílias nordestinas morrem de sede ao lado do rio, a merenda escolar de alunos famintos é sempre desviada, aulas estão sendo dadas debaixo de umbuzeiros por falta de ambiente adequado, nada presta no País e o povo finge as mil maravilhas.
Mas é povo, e o mesmo povo que constrói indevidamente, que entope de lixo os bueiros e canais, que não joga sequer um papel numa lixeira. E ainda por cima vota nos mesmos ladrões. Dizer mais o que?
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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