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quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

SERTÃO SANGRENTO - LUTA E RESISTÊNCIA - L AMPIÃO: RETIRADA E REFÚGIO

Por: Jovenildo Pinheiro de Souza

Todos os estudiosos da vida de Lampião são unânimes a afirmar que o ataque a Mossoró, no dia 13 de junho de 1927, foi uma operação guerreira, no mínimo, desastrada. Uma série de equívocos culminou numa derrota para Lampião. Os principais equívocos cometidos por Lampião, segundo os estudiosos, podem ser resumidos nos seguintes:

a) comando compartilhado,
b) desconhecimento do terreno,
c) distanciamento de suas fontes de suprimento.

No que se refere ao compartilhamento do comando das operações, estranha-se o fato de que Lampião, tão cioso do seu valor como estrategista e tático, tenha-se deixado influenciar por um aventureiro medíocre e falastrão, como Massilon Leite.

O fator desconhecimento do terreno contribuiu, decisivamente, para o fracasso da operação, sendo também de se estranhar este descuido de Lampião, pois ele jamais tinha incorrido neste erro inadmissível em um chefe militar. Por fim, o distanciamento das fontes de suprimento deixou-o numa situação difícil quando teve que percorrer longas distâncias contando com o acaso e saques para reabastecer seu grupo.

Diante de tais erros, não se pode  estranhar que o ataque a Mossoró tenha
terminado em derrota e fuga. As táticas equivocadas, baseadas numa apreciação irreal do objetivo a ser alcançado, terminaram por conduzir à derrota. Beneficiandose destes erros, cometidos por Lampião, o Prefeito da cidade, Rodolfo Fernandes, comandou a resistência satisfatoriamente.

Luiz da Câmara Cascudo, ao elogiar a  atitude do Prefeito, não esconde seu entusiasmo, afirmando o seguinte: “Surgira o HOMEM, providencial-necessário de Carlyle, polarizador incomparável  da Energia... organizando a defesa, arregimentando dedicações, improvisando e reunindo armamentos e munições, enfrentando a incredulidade que negava o perigo aproximado, sacudindo os tíbios, encorajando os fracos, comunicando, contagiando, irradiando a confiança, a Fé, a convicção da invencibilidade aberta, transformada em fortaleza inexpugnável”

Retirando-se de Mossoró, começou  para Lampião um dos seus períodos delicados, no qual os erros deveriam ser descartados, sob pena de ser exterminado.

É o período da busca de um refúgio, de um santuário. Para a efetivação deste plano ainda deveria transcorrer um longo período de mais de quatrocentos dias, entremeados de deserções, mortes e combates quase diários contra as forças policiais de vários estados nordestinos.

Para administrar um situação tão difícil e adversa, com os adversários  tentando dar-lhe um xeque-mate no campo de batalha, Lampião passou a corrigir drasticamente os seus erros. Descartou qualquer parceria no comando e assumiu total responsabilidade pelas ações do grupo, rumou para terras conhecidas, para retomar a iniciativa no campo de luta e procurou ativar a sua rede de informantes e coiteiros. Mesmo assim, as dificuldades chegaram várias vezes a um ponto limite.

Os   primeiros   passos   de   Lampião,   depois   da   retirada   de   Mossoró,   foi   tentar escapar rapidamente da armadilha em que ele mesmo tinha se metido. Marchou então  para   o  Ceará,  margeou   o   Jaguaribe e rumou para Pernambuco, combatendo quase todos os dias. Três meses depois do frustado ataque a Mossoró, Lampião, “com apenas nove companheiros, percorria, praticamente, sem se deter, o sertão de Pernambuco e as áreas vizinhas dos Estados do Ceará e de Alagoas, acossado pelas forças volantes. Os cangaceiros passavam por um período aflitivo, às vezes passando de dois a três dias sem beber água, exceto aquela conseguida sugando-se caules descascados de xiquexique”

As atribulações de Lampião, nessa marcha   em   busca   de   refúgio   mal   tinham começado. Por mais onze meses o quadro não se alteraria, numa rotina mortal: combates, mortes, deserções, fome, sede e mais combates. Por esse tempo, o grupo de Lampião já estava bastante reduzido, com menos de dez cangaceiros que percorriam incessantemente todos os quadrantes dos sertões nordestinos, traçando num   mapa   um   roteiro   assombroso   e,   aparentemente, sem lógica. Numa dessa caminhadas, Lampião voltou ao Ceará e aí, no dia 27 de março de 1928, travou-se o
combate na fazenda Piçarra, sendo mortalmente ferido um dos homens de
confiança de Lampião, Sabino Gomes de Góis.
Por fim, depois de uma ”luta titânica" , que teve a duração de um ano, dois
meses e  quinze dias, Lampião atravessou o Rio São Francisco, pisando, finalmente, em território baiano, o quadro não recordava em nada Lampião em seus dias de glória. Escreve ele: “Eram apenas 5, esfarrapados, esfomeados, estropeados, mais mortos do que vivos”

Também Optato Gueiros é da mesma opinião. Ele escreve que quando Lampião chegou à Bahia, o seu abatimento físico e moral “eram tais que, os soldados das volantes falavam mais de capturá-lo à mão do que abatê-lo, fosse quais fossem as conseqüências”.

Depois de ter sido submetido a terríveis pressões  por parte das volantes e de ter sido levado quase ao colapso físico e moral, seria de esperar que Lampião deixasse o cenário   por   um   longo   período,   tentando  fingir-se de morto. Mas, não. Uma vez mais, Lampião surpreendeu a todos, renasceu de suas próprias cinzas, em território baiano, tendo por fundamento “o seu valor pessoal, a sua extraordinária inteligência, as suas invejáveis qualidades de estrategista nato”.

Dois militares, que tiveram destacadas atuação no combate a Lampião e a seu grupo,  não   escondem   o   seu  espanto   ao   relatarem  a   rapidez   como Lampião  passou da extrema decadência para um extremo prestígio entre a população do sertão baiano. Ele passou a ser chamado pelos sertanejos de o HOMEM, não no sentido de carlyleano do termo, mas sim no sentido de alta responsabilidade, como se fosse um santo ou um conselheiro. Abaixo, transcrevemos o testemunho de dois militares, Optato Gueiros e João Gomes de Lira, sobre a perfeita integração de Lampião com a população sertaneja, numa região  aparentemente - só aparentemente - desconhecida.

Optato Gueiros:

“Conquistou Virgulino quase todos os habitantes das caatingas, tratando-os com extrema bondade e esbanjando prodigamente o dinheiro de que se apossara... Tornou-se Lampião para aquela gente, no que fora o Padre Cícero, no Juazeiro, para os seus crentes. O seu nome sinistro não foi mais pronunciado, agora era conhecido por - “o Homem”

João Gomes de Lira:

“Diante do grande conceito que os baianos deram ao chefe Lampião, tornou-se ele naquele Estado um homem fanatizado. Logo alguns sertanejos o classificaram de um homem santo, o chamavam de Santo; outros passaram a chamá-lo de ‘o Homem‘. Quando um sertanejo programava uma festa ou um adjunto qualquer na sua casa, os convidados procuravam logo se já havia ele convidado  ‘o Homem‘, caso não tivesse convidado, fosse convidá-lo para vir garantir aquelas reuniões. Dizia ser ele o Governo do Sertão. Que tudo no Sertão tinha que passar por suas mãos”.

Tinha Lampião, por essa época, 31 anos de idade.

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