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quarta-feira, 5 de agosto de 2020

A PRISÃO DO CANGACEIRO "BEZOURO" DO BANDO DE LAMPIÃO.


BEZOURO ESTÁ NO XADREZ – Orphão de pae e mãe – Novato no grupo.

S. SALVADOR, 23 (Succursal).

- Está preso no xadrez da delegacia auxiliar, um Cabra de Lampeão, há dias agarrado pelas forças volantes.

... Nosso repórter lá esteve e falou ao bandido. É um moço robusto de 22 anos de idade, estatura mediana e de cor morena, possuindo vasta cabelleira.
Crivamol-o, então com uma série de perguntas:

- Pode nos contar a sua história?

- Pois não, meu senhor. Eu me chamo José Soares e nasci em Bebedouro (Bahia). Distrito de Cajueiro, neste estado, Sou orphão de pae. Minha mãe chama-se Baldoina Soares. Em novembro passado, um grupo de Cabras do capitão Virgolino passou por minha terra, chefiado por “Balão” e “Moreno” e me convidou a tomar o “mescla”.

- O que é mescla?

- É a farda que elles fornecem a todos os que entram no grupo. Apresentei algumas desculpas e recusei o convite.

Pensei logo em minha pobre mãe. Os bandidos, depois de roubarem muito no arraial, foram embora e eu fiquei. Mas depois...

- Elles voltaram...

- Foi, “doutor”. Cinco dias não eram decorridos, quando “Balão”, “Moreno” e “Creança” voltaram a minha residência e me disseram que a minha presença no grupo era indispensável. Mesmo porque, em caso contrário, eu poderia denuncial-os à policia. Ameaçaram-me de morte e tive de acompanhar os três bandidos, no dia 3 de novembro.

- O bandido apoia a fronte pela mão esquerda, fita depois o repórter e prossegue:

- “Balão”, quando chegamos no acampamento, próximo a Várzea da Ema, reuniu os seus companheiros e declarou que eu precisava ter um nome de guerra. “Creança” propoz que eu fosse appellidado por “Cabelludo”, porque tenho muito cabello na cabeça.

Moreno era de opinião que eu passasse a me chamar “Novato”, porque era o mais novo do grupo. Houve discussão e até punhaes desembainhados.

Afinal, “Balão” disse que era autoridade e mandava que todos me conhecessem por “Bezouro” allegando que eu tinha a fala muito Gross...

- Você tomou parte em algum combate?

- Tomei somente no que se verificou no dia 4 deste mez, quando o nosso grupo se dirigia para Curaçá. Fomos surprehendidos pela polícia.

Os soldados estavam na moita e a gente não viu. Quando menos esperávamos, os tiros partiram. “Balão” gritou: - “Home é home”.

- Que significa isso?

É o sinal para a turma abandonar os animaes e se entrincheirar. Fazemos isto e respondemos ao fogo. Mas, “doutor”, nunca vi tanta bala! Não nego não. Tive medo.

- Houve mortos e feridos?

- Não senhor. Nem signal de sangue. O nosso grupo fugiu e eu fiquei escondido num cipoal.

No dia seguinte, resolvi entregar-me á policia, em Geremoabo. Eu não queria ser bandido...

- E entregou-se?

- Não cheguei a fazer isso, porque o sargento commandante do destacamento de Geremoabo mandou me prender perto da Várzea da Ema.

- Que aconteceu depois disso?

- Elle me entregou a dois soldados, que me trouxeram para aqui.

Tenho gostado muito da capital. Que coisa bonita! Nunca vi assim!

Por onde anda Lampião?

- Ninguém sabe. Nunca se encontrou com o nosso grupo. “Balão” e “Moreno” sabem onde elle vive, mas não nos dizem.


OS COMPONENTES DO FAMIGERADO GRUPO.

Prosseguindo nas suas narrativas, o bandido prestou-nos ainda, as seguintes informações:

O grupo se compõe das seguintes pessoas: “Balão”, “Sereno”, “Creança”, “Bezouro, “Mergulhão”, “Bom de Vera”, “Marinheiro”, “Ponto-Fino”, “Cajazeira”, “Santa Cruz”, “Cuidado” e “Colchette”.

Durante as horas de descanso, os bandidos jogam baralho e quando chegam em qualquer logar gastam contos de réis. Pagam as despezas e na hora de saírem vão tomar “os “cobres” outra vez.

Fonte: Jornal "Diário da Noite".

Obs: O texto foi transcrito obedecendo a ortografia empregada na época.

Transcrição: Geraldo Antônio de Souza Júnior


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