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quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

A LAGOA DA MALHADA FUNDA

 Por Bruno Yacub

Aspecto atual da Lagoa da Malhada Funda.
No seu centro está localizado o marco
dos limites entre os
municípios de Brejo Santo, Missão Velha e Porteiras.




Ao falarmos sobre as passagens de Lampião pelo Cariri cearense entre 1922 e 1928, quando este e seu bando iriam se refregar e reabastecer de armas e munições, cerca de duas a três vezes por ano, na Serra do Mato, em Missão Velha, região de domínio do Cel. Santana, é comum a citação da passagem destes bandoleiros em pontos estratégicos no percurso, onde poderiam descansar e dessedentar seus animais. Estes lugares onde se acumulava água da chuva, chamados de “barreiros” ou “aguadas” eram conhecidos no platô da Serra do Araripe, com a sua mata virgem, sem divisões de propriedades e suas cercas, onde o gado bravo criado solto mitigava sua sede, como era o caso do barreiro do lugar Baixa das Cacimbas, já no município de Jardim, como também a Lagoa da Malhada Funda, ponto de divisa territorial entre os municípios de Brejo Santo, Porteiras e Missão Velha.

A Lagoa da Malhada Funda ficou marcada como um dos cenários no episódio do Fogo das Guaribas, pois o local serviu de camarote para o Rei do Cangaço ouvir o tiroteio no seu início, entre as forças volantes de três estados contra o Cel. Chico Chicote, já que usando o pretexto de perseguição ao famoso bandido, o Estado usou a sua força para dar cabo ao temido Coronel. Em um país onde houvesse realmente o Estado de Direito, Guaribas teria sido indenizada pelos enormes prejuízos e os seus invasores exemplarmente punidos.

Assim citado por Otacílio Anselmo e Silva em A Tragédia das Guaribas, Itaytera; N° 16; de 1972; pág. 21:

“Exatamente naquele instante, Lampião se achava com seu bando na chapada do Araripe, acantonado no local denominado Malhada Funda, a pouca distância de Guaribas. Ao escutar o tiroteio, e certo de que se tratava do ataque policial a Chico Chicote, ele assim manifestou-se: “Se ele fosse meu amigo, eu ia lá”. E foi na mesma data — l.° de fevereiro de 1927 — que Lampião passou a cometer selvageria no Ceará, sequestrando, no lugar Baixa das Cacimbas, município de Jardim, os caririenses Pedro Vieira, fuzilado no dia seguinte — após o fracasso do ataque a Ipueiras, na fronteira de Pernambuco com o Ceará — e Vicente Venâncio, que conseguiu fugir do bando logo depois do sequestro”.

Sabe-se que Chico Chicote e Lampião eram notórios desafetos, como cita Napoleão Tavares Neves em Cariri Cangaço, Coiteiros e Adjacências – Crônicas Cangaceiras; Editora Thesaurus; 2009; pág. 49:
“(...) Não se entendiam desde que, descansando na Serra do Mato, Lampião deu liberdade aos seus cangaceiros para comerem churrasco na bebida da Fonte da Pendência e eles mataram um boi do coronel Pedro Martins (Pedro Martins de Oliveira Rocha, proprietário da fazenda Cacimbas, em Brejo dos Santos) e dele se alimentaram. O vaqueiro do coronel indagou sobre a autoria da matança do boi e os cangaceiros disseram que havia sido por ordem de Chico Chicote. Lampião silenciou, mas Chico Chicote não gostou nada daquela infundada informação e passou a ter Lampião como inimigo.”

Fonte da Pendência,
região da Gameleira de São Sebastião,
em Missão Velha - CE.

Ainda em A Tragédia das Guaribas, Itaytera; N° 16; de 1972; pág. 10, Otacílio Anselmo faz a seguinte explanação sobre a relação de Chico Chicote e Lampião:

“(...) A partir daí, o boato alastrou-se no município e nas suas imediações, e, como não podia deixar de acontecer, provocou forte indignação ao caluniado.

De resto, o caso foi comunicado pessoalmente a Chico Chicote por Pedro Martins, para o que o convidara a ir a Cacimbas acompanhado do seu irmão Manoel Inácio de Lucena (Manoel Chicote). 

Pouco depois, no intuito de evitar luta entre Lampião e Chico Chicote, Antônio Aristides Xavier, genro de Pedro Martins, conseguiu levar Lampião à fazenda Crioulo (município de Jardim) e convidou Chico para ir até lá, tentando, desse modo, fazer a paz entre ambos.

Lá chegando, e cientificado de tal intenção, Chico Chicote repeliu o intento, não entrando, sequer, na casa do fazendeiro, em cujo interior se achava o famoso bandoleiro. Além disso, em voz alta – como sempre costumava falar – fez severas criticas a conduta de Virgulino, acrescentando que continuaria a tê-lo como inimigo, como foi detalhado por Antônio Lucena Cabral, sobrinho legítimo de Chico Chicote, ao autor.

Sem nenhuma dúvida, a recusa de “Seu Chico” à sugestão de Antônio Xavier deixou Virgulino bastante preocupado, naturalmente pelo fato de não ter um só inimigo no Ceará, onde encontrava com seus mais prestigiosos coiteiros e onde se mantinha absolutamente inofensivo. Daí porque, decorridos alguns dias, Chico Chicote recebeu um convite do Cel. Antônio Joaquim de Santana para comparecer à sua casa, no sítio Serra do Mato.

Ao ser recebido pelo mandão de Missão Velha, “Seu Chico” perguntou-lhe para que fora chamado. Em resposta, disse-lhe o Coronel que o convidara a pedido do cabra Sabino, que desejava conhece-lo pessoalmente.

Como é sabido, esse bandoleiro (Sabino Barbosa de Melo, mais conhecido como Sabino Gomes ou Sabino das Abóboras), era lugar-tenente de Lampião. E está evidente que ele apenas serviria de intermediário para a conciliação almejada pelo Rei do Cangaço.

“Seu Chico”, porém, além de recusar-se à apresentação, não esperou nem pelo café-gordo que o Coronel mandara preparar, voltando incontinenti para Guaribas, segundo informes de Pedro Celião de Moura ao autor.”

Escombros do Casarão do
Cel. Antônio Joaquim de Santana
Serra do Mato, Missão Velha - CE.

Aspecto atual do local do Casarão do
Cel. Santana na Serra do Mato.
Pois bem, ao visitarmos recentemente a Malhada Funda, podemos observar a sua descaracterização, sendo o local ocupado por atividades humanas: adensamento populacional, construção de moradias ao longo da parede da lagoa, como o uso de sua área para fins agrícolas. Sabe-se que posterior à década de 1960, o proprietário, um famoso pecuarista da região, aterrou o local com a finalidade de práticas agropastoris.

E desde então a Lagoa da Malhada Funda “não pegou mais água”.

Memorial Descritivo o município de Brejo Santo,
 da Lei Estadual n° 16.198, de 29.12.16,
sobre os limites municipais do estado do Ceará.

Mapa atual do município de Brejo Santo.
Fonte: IPECE.


O Brejo é Isso!

Bruno Yacub Sampaio Cabral
A Munganga Promoção Cultural

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