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quarta-feira, 23 de março de 2011

A Saga de Benjamim Abrahão Parte III

Por: Rostand Medeiros .
Benjamim Abrahão
 
            Quanto ao primeiro encontro de Abrahão com os cabras de Lampião, tendo sido com Juriti e Mergulhão, teve certa tensão, pois os dois guerreiros das caatingas chegaram totalmente equipados. Ao visualizarem o estranho apontaram seus fuzis e gritaram “-Não se mexa cabra. Vai morrer” e colocaram balas nas agulhas de suas armas. Foi um momento “angustioso” para o documentarista, mas logo o ambiente serenou. Abrahão afirmou ao jornalista que lhe entrevistava que “se impressionou”, pois os dois cangaceiros já sabiam quem ele era e qual era seu objetivo.
 
O cangaceiro Juriti
 
               É provável que nada disso tenha ocorrido. O Mais lógico foi que Abrahão deve ter sido guiado por uma pessoa de confiança dos coronéis da região, onde os cangaceiros já tinham conhecimento de sua chegada e que tudo estava previamente acertado.Tanto é que sobre estes primeiros momentos junto a estes cangaceiros, Abrahão chega ao ponto de transmitir uma opinião jocosa sobre um dos seus acompanhantes armados. Este era Juriti, que ele considerou “-Um sujeito de boa aparência, tem os cabelos bons, é metido à almofadinha e gosta de luxar”.

              Afirmou que teve de caminhar três quilômetros com os dois homens armados. Eles primeiramente entraram em entendimento com uma sentinela posicionado em local estratégico. Daí Mergulhão se embrenhou nos matos e desapareceu. Voltou algum tempo depois afirmando que Lampião queria vê-lo. Quando chegou ao local onde estava o bando, após passarem por uma área de caatinga bastante fechada, todos os cangaceiros estavam de pé, menos Lampião que se encontrava encostado em um tronco, lhe observando com olhos que o libanês classificou como “indagadores”. Era hora do almoço e todos comiam carne de bode com farofa.
 
 O capitão Virgulino veio até ele, lhe ofereceu comida e um copo com conhaque, demonstrando boas maneiras no tratamento ao estranho de fala enrolada.
 

             Lampião afirmou “-Não sei como você veio bater aqui com vida, bicho véio. Só mesmo obra de Mergulhão que é muito camarada”. Abrahão não informou ao jornalista o que achou da tirada do chefe cangaceiro. Logo se dispôs a montar o tripé com uma das suas máquinas para dar início à seção de captação de imagens. Nisto Lampião gritou “-Para, para”. Ele queria ver de perto o maquinário. Queria se certificar que daquele mecanismo estranho não poderia sair uma bala. Satisfeito nas suas dúvidas, o chefe liberou o libanês para trabalhar tranquilamente. Ele continuou captando imagens, mas em pouco tempo Lampião mandou parar a seção afirmando “-Basta. O resto fica para outra vez”. Abrahão retrucou com Lampião, afirmando que tinha lutado muito por este momento e que queria continuar. Ao que o chefe responde taxativamente

“-Quem anda comigo tem de ter paciência”.

             Insatisfeito com a resposta, o imigrante voltou à carga “-E onde poderia (Lampião) ser encontrado na próxima vez?”. “-Sou homem que não tem pouso certo. Hoje estou aqui, amanhã posso estar na Bahia, em Sergipe ou Pernambuco.” Seja pelo fato de Abrahão ter se sentido a vontade com o “Rei do Cangaço”, ou porque era uma figura completamente maluca, mais uma vez ele continuou retrucando com Lampião. Para sua sorte este nada falou. Depois, segundo sua narrativa, levaria quatro meses para ocorrer um segundo encontro com o bando. Por sorte este momento foi muito mais duradouro, calmo e positivo. Segundo Abrahão o local do esconderijo ficava “do outro lado do São Francisco”, a “36 léguas”. Ele só não disse de onde. Afirmou que era um domingo, sendo este “um grande dia, pois ninguém trabalhava e se reza de manhã e no começo da noite”.
 
             Para o imigrante os cangaceiros são muito religiosos e sobre o momento da oração ele fez interessantes observações. Um dos membros do grupo colocou um quadro do Sagrado Coração de Jesus em um tronco de árvore e Lampião, com um livro de orações, comanda a ladainha. Todos estão ajoelhados, contritos, alguns com rosários, ouvindo atentamente o chefe declamar em voz alta a prédica de um velho “adoremos”, que todos repetiam em coro.

             Para o observador Abrahão “as mulheres, neste dia, vestem-se melhor, enfeitam-se mesmo”. Para ele é como se elas fossem a uma missa em alguma paróquia. O imigrante apontava que aquelas mulheres, mesmo vivendo escondidas no meio do mato, em meio às correrias e violências, pareciam querer manter de alguma maneira os mesmos hábitos da vida “civil”. Durante o almoço todos os cangaceiros comem em grupos, uns em pé e outros sentados. Lampião, talvez por precaução, degusta a alimentação no meio de todos. Abrahão repetiu várias vezes ao repórter o quanto Lampião era desconfiado, sempre planejando mudanças de seus esconderijos.

              Continua...

Rostand Medeiros
Pesquisador e Escritor
 
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