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domingo, 20 de novembro de 2011

O JOIO E O TRIGO: ANTES QUE DESTRUAM - (Crônica)

Por: Rangel Alves da Costa
Rangel Alves da Costa
O JOIO E O TRIGO: ANTES QUE DESTRUAM
 AS TRADIÇÕES DE UM POVO
 
Verdade é que não há como impedir que os tempos mudem, que o progresso chegue, que o novo venha apressadamente querendo descaracterizar o já existente para tomar seu espaço. E isso é um problema sério a se resolver, principalmente quando o já existente, perpetuado na raiz de um povo, se chama cultura popular, legado cultural, memória, tradições.
Por todos os lugares há os defensores dos modismos, os adeptos das novas ondas e os que abraçam todas porcarias que surjam mesmo sem saber o que sejam. Nas cidades interioranas, principalmente no sertão, essa cegueira pelo desconhecido é tão grande que chega a causar asco e preocupação. E isto porque a juventude está abraçando o imprestavelmente novo em detrimento daquilo que caracteriza a história do seu povo.
Bati demais na porta e não disse o porquê da visita. Vou chegar lá. É até aceitável que a moçada sertaneja não goste nem valorize o forró, não saiba o que é um aboio, um samba de coco, um reisado, o azul e o encarnado das pastorinhas, um repente ou um toque dolente de pífano. Até aí tudo bem, pois ninguém pode forçar que conheçam ou sintam prazer por aquilo que quem deveria preservar nem se importa que tais manifestações possam acabar ou não.
Contudo, o erro da moçada não é fruto de qualquer culpa que possa recair no próprio povo, mas tão-somente porque as administrações municipais simplesmente não possuem nenhum interesse na valorização e preservação das manifestações culturais próprias das comunidades. E como se diz no meu lugar, se não quero passarinho cantando no meu ombro então vem alguém e liga a vitrola. Tenho que ouvir o que não gosto.
Fato é que os gostos, as opções, os desejos e anseios devem ser respeitados. Se o jovem gosta de balada, da música de duplo ou nenhum sentido, das baianadas e baianices, das porralouquices que só fazem barulho e afrontam a dignidade corporal e sexual daqueles que se alimentam dos seus requebros, não há que simplesmente impedi-los de se esbaldar com o que não presta.
Isso é um problema deles e dos seus pais. Estes são também responsáveis por estes absurdos. Contudo, a culpa maior, diga-se mais uma vez, é daquele que não oferece boas e dignas opções a essa gente e não procura incutir nas suas mentes e corações que ali, ao seu redor, vindo do pé da serra ou da beira do rio, há um legado musical que precisa ao menos conhecer. E como fazer isso sem ter que proibir a festança jovial e sua música maluca? É mais fácil do que se imagina. E digo por quê.
Ora, se o jovem não sabe o que é um autêntico pé de serra jamais vai gostar de forró; se não conhece a autenticidade melodiosa da legítima música nordestina nunca vai saber distinguir o autêntico forrozeiro daquele músico de sanfona que acompanha um grupo musical; se não conhece uma banda de pífano nunca vai se interessar por seus sonidos, trinados acompanhados pelo toque cadente da caixa e da zabumba; se não conhece a música do sertão logicamente que vai aceitar e gostar de qualquer música, principalmente daquela imposta pela mídia, ainda que passageira.
Mas um passageiro que não dá mais espaço ao que é verdadeiramente do povo, pois, a um só tempo, tomando as praças, os bailes e avenidas e deitando ao relento do esquecimento aquilo que tem a feição nordestina, tem o gosto do sertão, traduz o romanceiro apaixonado do seu povo. Daí ser uma afronta que o interiorano tenha que engolir de goela adentro tantos absurdos audíveis.
Bastaria - e agora digo por que – que deixasse a moçada com sua festa, mas também fizesse a festa do povo. O que não pode é que essa nojeira musical cante glória em cima da convalescente sanfona. Bastaria que ao invés de pagar milhões a essas bandas duvidosas, deixassem um conto de réis para chamar o sanfoneiro, convidar a banda de pífano, organizar a cavalhada, dizer que vai ter reisado, pastoril, samba de coco. Bastaria que lembrasse que o povo, sendo a própria terra onde vive, merece ter suas raízes preservadas.
Agora o ponto nevrálgico: Por que todo município sertanejo possui Secretaria de Cultura, com prédio próprio, secretário e verba? Para organizar baianadas, bandalhadas que se diz de forró ou preservar a memória cultural? Que os administradores e os secretários entendam que com menos da metade do que se gasta com uma banda se contrata um forrozeiro bom e mais uns cinco sanfoneiro pé de serra. Ou forró, o autêntico forró, não é cultura nordestina?

Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com

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