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quinta-feira, 25 de setembro de 2014

DONA CYRA BEZERRA, A DAMA SERTANEJA QUE ENFRENTOU O CANGAÇO.

Por Carlos Jatobá - escritor e professor universitário.
Dona Cyra em uma das últimas fotos

Cyra Britto Bezerra (nascida Correa de Britto), nasceu no interior de Alagoas, no município de Piranhas, às margens do rio São Francisco, em 12 de março de 1915. Filha de Francisco Correa de Britto e de Emiliana Gomes de Britto prósperos fazendeiros e, também neta do chefe político da região dos dois lados do rio São Francisco: Piranhas (Alagoas) e Canindé do São Francisco (Sergipe), o Cel Antonio José Correa de Britto (conhecido como "Antonio Menino", "Sinhozinho do Gerimum" ou "Pai-Nosso") e de Prima Gomes de Britto ("Mãe-Nossa"). De família numerosa, dividia com seus 14 irmãos: Carlos, Célia, Ciro, Claudemiro, Clodovil, Cordélia, Guiomar, João, José, Maria José, Nair, Noélia, Raimundo e Yolanda, as brincadeiras entre a Fazenda Gerimum (no lado sergipano) e a casa grande em Piranhas.

Dona Cyra e o tenente João Bezerra

Casou-se com o então Ten Bezerra em 1935 de quem lhe era prometida, por "Pai-Nosso", desde tenra idade. Representa no alto dos seus quase noventa anos de existência, um exemplo de coragem, tenacidade e companheirismo da mulher nordestina e brasileira.

João Bezerra e dona Cyra

Aos 21 anos de idade (por volta de 1936), era considerada a grande incentivadora nas campanhas do marido, além de exercer forte liderança como professora, enfermeira e conselheira entre os seus liderados e respectivas famílias. Fazia de sua casa um verdadeiro quartel da volante. A esse respeito Cyra Bezerra, assim se expressou: "Quando chegava, a volante vinha diretamente para minha casa. Eram 20, 30 homens de uma vez. Alguns com família iam para suas residências. Outros eram medicados, comiam e dormiam na minha casa. Quando os quartos estavam lotados, se espalhavam pelas quatro salas. Eu cuidava de tudo, junto com uma empregada. Por lá, passaram muitos feridos, mas ninguém morreu em minha casa." (1996, p. 24)

 Paulo Britto, filho de Dona Cyra e João Bezerra, Administrador de empresas, Derpe, mora em Recife.

Ainda em 1936, no mês de setembro mais precisamente, o tenente Bezerra em perseguição aos diversos subgrupos de cangaceiros (que compunham o grande grupo comandado por Lampião) na Fazenda Picos onde se deu um combate em que, depois de baleada na perna direita, à altura das nádegas, foi capturada a cangaceira Inacinha (mulher do famoso Gato, chefe de um dos subgrupos). Inacinha estava grávida e, em conseqüência, o tenente Bezerra resolveu leva-la para a cidade de Delmiro Gouveia em busca de ajuda médica e posteriormente transportá-la para Piranhas e recolhê-la à cadeia local. Nesse ínterim, os cangaceiros, através dos subgrupos liderados pelo próprio Gato, por Virgínio e por Corisco, resolveram atacar Piranhas.

Dona Valdenice, filha de Dona Cyra e João Bezerra

Conforme Ferraz (1985, p. 40), a cidade de Piranhas era um importante centro comercial da região e, em decorrência, bastante visada pelos bandoleiros como fonte de logística e suprimentos. A princípio julgou-se que tanto poderia ser um ataque em busca de víveres, armamento e munição ou, de um possível resgate da meliante presa. Porém, no decorrer da ação e constatado pela história, verificou-se que o que queriam mesmo era sequestrar a esposa do tenente Bezerra (D. Cyra, que também estava grávida: no quinto mês de gestação) para trocá-la por Inacinha. 

Piranhas, cidade onde nasceu dona Cyra e a mesma que defendeu dos cangaceiros, liderados por Corisco e Gato.

A esse respeito Cyra Bezerra, recorda: "Eram duas da tarde quando eles chegaram a Piranhas. Eu pensei que fosse [o tenente] Bezerra de volta com a volante [proveniente de Delmiro Gouveia]. Então eu saí para a calçada, porém uma prima minha gritou: 'Cyra, entre são os cangaceiros'. Piranhas é uma cidade construída num vale cercado de serras. Quando eu olhei, vi que vinham descendo cangaceiros por todos os lados. Recuei e fui fechar a porta da casa, mas não consegui fechar a primeira janela e, um cangaceiro, escondido atrás de uma gameleira (uma árvore secular que havia em frente à casa) disse: 'Não feche que morre'. Eu me encostei na janela e olhei. Vi a um canto da parede um riflezinho. Peguei-o e atirei no cangaceiro. Fiquei trocando tiro. Ela tentava me alvejar pela janela e eu atirava nele. (...) Nós tínhamos armas em todos os cantos da casa, vivíamos prevenidos. Quando eu estava assim trocando tiros com esse homem, Corisco surgiu na esquina da avenida Tabira de Britto [próxima à Prefeitura Municipal], perseguindo meu tio João Correa de Britto, prefeito nessa época. Corisco estava quase pegando meu tio quando eu atirei nele, mas só consegui atingir os bornais. Ele rodopiou, entrincheirou-se na escada de uma casa e ficou atirando em mim. Eu deixei de atirar naquele que estava junto à gameleira e fiquei atirando para o outro. É quando surge na mesma esquina um grupo de cangaceiros trazendo uma rede com um corpo, uma rede toda ensanguentada. Era Gato, marido de Inacinha, que tinha morrido. Um tiro [dos muitos dados pelos defensores da cidade em duas horas de cerrado tiroteio] atingiu a cartucheira que ele trazia na cintura, atingiu o pente de onde explodiram cinco balas que esfacelaram seu intestino." (1985, p. 13) Os cangaceiros, diante do inesperado, bateram em retirada.

Reportagem de Dona Cyra, contando os fatos passados na época do cangaço a revista Fatos e Fotos.

Araujo, referindo-se ao fato, atesta que: "[Cyra] ... moça pacata teve que se transmudar numa Maria Quitéria, de Alagoas, para ajudar a rechaçar a horda desenfreada e violenta. (1985 p. 279)

Desde então Cyra Britto Bezerra seria cultuada e sempre lembrada, na região do São Francisco conforme Ranzan & (2001), como a "A dama sertaneja que enfrentou o cangaço".

D. Cyra faleceu na cidade do Recife, Estado de Pernambuco em 30 de março de 2003 aos 88 anos de idade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BEZERRA, Cyra. Viúva do comandante da tropa que deu cabo a Virgulino, fala ao JC [Depoimento] 

in Jornal do Commercio, seção Regional [O Lado esquecido de Lampião].
Recife : JC, 11/08/1996.

FERRAZ, Marilourdes. Op. cit.
BEZERRA, Cyra. Piranhas: A reação feminina diante do cangaço.

[Depoimento dado à Fundação Joaquim Nabuco e à equipe Bandepe] 
in Jornal BANDEPE (periódico interno do Banco de Estado de Pernambuco)
Recife : JB, fevereiro de 1985.

ARAUJO, Antonio A. C. de. Op. cit.
RANZAN &, Ane (Dirs.) 

A Dama sertaneja que enfrentou o cangaço
Depoimento em VHS] 
Recife : Senac-PE/PRBritto, julho de 2001.

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Fonte: facebook

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Um comentário:

  1. Anônimo13:55:00

    Tudo indica Mendes, que Dona Cyra era mulher de muita coragem.
    Antonio Oliveira

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