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sábado, 10 de janeiro de 2015

“O GLOBO” – 07 DE OUTUBRO 1927

Material do acervo do pesquisador Antonio Corrêa Sobrinho

A PSICOLOGIA DO CANGACEIRO
O BANDITISMO NOS SERTÕES DO NORDESTE BRASILEIRO
UM ENSAIO POLÍTICO-SOCIAL
(Especial para o GLOBO)

CAPÍTULO VI

Desde junho deste ano vinha sendo notada a má vontade com que chefes políticos do interior do Ceará olhavam a incursão das forças aliadas no seu território, em virtude do convênio pernambucano; principalmente por parte das famílias cearenses Santa Ana, Chicote e Arruda, que procuravam por todos os meios dificultar a perseguição a Lampião e outros cangaceiros.

O “Diário da Manhã”, de Recife, em seu número de 15 de julho, transcreveu uma entrevista dada por um fazendeiro do Ceará, José Ribeiro da Costa, ao jornal “A Tarde”, da Bahia, na qual o referido fazendeiro declarou “que vinha do Ceará” e que Lampião ali estava seguro contra quaisquer perseguições. – “A polícia do meu Estado (disse ele) não incomoda Lampião. O Ceará oficial entende-se com ele e o protege. O governador Moreira da Rocha e o padre Cícero garantem-lhe plena liberdade de locomoção.”

Nesta mesma entrevista o citado fazendeiro fez também grave acusação ao governo de Pernambuco (não são sabemos com que fundamento, uma vez que declarou “ter vindo do Ceará”, onde tinha suas fazendas) afirmando – “que a polícia pernambucana fingia apenas guerrear Lampião, mas que, de verdade, o que fazia era aproveitar o lamentável estado de cousas, para tirar gordos proveitos.”

É bem de ver que o “Diário da Manhã”, folha oposicionista à situação política de Pernambuco, inseriu também esta acusação. Entretanto, adiantou os seguintes conceitos: - “Não queremos crer, assim, sem mais nem menos, que essa deprimente invectiva seja procedente. Não temos, todavia, elementos para contestá-la. E , por isso, “limitamo-nos a registrá-la, visando com isso arrancar aos atingidos pela vergonhosa incriminação palavras de defesa.”

Essa defesa não tardou. Foi-a “A Província”, de Recife, em nota que nos pareceu oficial; e foi tal modo esmagadora, que o jornal oposicionista não voltou ao assunto.

Dela extraímos os seguintes períodos:

“Se a polícia pernambucana “finge apenas” perseguir Lampião, porque fugiu ele dos sertões de Pernambuco para se internar nos do Ceará? Depois que o Dr. Souza Leão iniciou a campanha atual, é mister indagar: - “Onde as fazendas pernambucanas incendiadas? Os roubos? Os assassínios? Apontem-nos, se puderem. É verdade que o celerado volta às vezes aos nossos sertões, por dias, para se ausentar de novo; ele, ou alguns bandidos do seu bando, que se dividiu em diversos grupos, chefiados por outros perversos, por causa justamente da perseguição tenaz que lhes movem os nossos soldados; mas vivem escondidos nas caatingas, porque sabem que não há mais uma cidade ou vila que não esteja guarnecida de tropa.

“No entanto, se querem ver com olhos justos, sinceros, vão ao teatro dos acontecimentos. Todos os meios serão facilitados, por que de direito, aos jornalistas que se interessam, a fim de darem lealmente o seu testemunho sobre a ação de Pernambuco na campanha contra os bandoleiros.”

Mais alto, porém, do que essa linguagem franca e leal, falam – “os fatos”.

Além dos 96 bandidos, mortos ou capturados, de dezembro de 1926 (data do convênio) a maio do corrente ano, cujos nomes constam do nosso artigo, temos mais os seguintes, de junho até hoje:

MORTOS EM COMBATE

O temível bandido Jararaca, lugar-tenente de Lampião, ferido e morto dias depois, tendo feito declarações, tomadas por termo, de que muitos de seus companheiros já haviam desertado do bando, diante da perspectiva da polícia pernambucana; José Isidoro, vulgo “Jatobá”; José Lopes, vulgo “Pinga-Fogo”; Antônio de tal, vulgo “Sabiá”; José Marinheiro, Antônio Garapu, coiteiro Firmino José Sant’Anna, Hortêncio de tal, vulgo “Graúna”; Manoel do Vale, vulgo “Lavandeira” e Manoel Maria – 10.

CAPTURADOS

João Nunes Lima, Manoel Pereira, José Bento, Cândido Cícero, Agostinho de tal, vulgo “Patrício”; Benedito Domingos, Fortunato Domingos, vulgo “Guará”. Antônio Quelé, vulgo “Candeeiro”; Manoel Victor, José Vieira, José Guida, Firmino de Dona, vulgo “Condutor”; Venâncio Ferreira, vulgo “Açucena”; Manoel Claro, vulgo “Teotônio”; Cornélio de tal, vulgo “Pirulito”; Manoel Domingos, coiteiro David Dudu, coiteiro Manoel de Lucinda, coiteiro Dionísio Vaqueiro, Domingos dos Anjos, vulgo “Serra Uman”, terrível facínora do grupo de Lampião; Raimundo dos Anjos, pai de “Serra Uman”; Luiz Paulo Santos, João Sipahuba, Emídio Lopes, Antônio Juvenal, vulgo “Mergulhão”; coiteiro Cesário Domingos, Pedro Domingos, Camilo Domingos, Albino da Silva, Domingos Souza, vulgo “José Pastora”; Júlio de tal, coiteiro Antônio Bento dos Santos, vulgo “Cobra Verde”; José Terto, vulgo “Caneta”; José Rosa, vulgo “Candinho”; João Terto, Nicodemos Cordeiro, vulgo “Nico”; Luiz Bezerra, vulgo “Manoel Helena”; Manoel Luiz, vulgo “Manoel Helena”; Marcos Gaudêncio de Sá, João Quirino Neto, Gabriel Pereira Barbosa, Marinho Gonçalves dos Santos, Ângelo de tal, vulgo “Capão”, do grupo de Lampião e Antônio Gregório, vulgo “Baraúna”, um dos mais perigosos do grupo de Lampião, preso nos esconderijos da serra Arapuá, pelo bravo tenente Arlindo Rocha. – Ao todo 47 capturados.

Aí temos, portanto, com os 96 do nosso artigo, os bandidos mortos em combate e os capturados. Ao todo 153 cangaceiros, dos quais já estão livres os sertões do Nordeste.

É assim que a polícia pernambucana “finge apenas” persegui-los.

Poderíamos terminar aqui o artigo de hoje; mas como se poderia pôr em dúvida a veracidade da estatística que pacientemente organizamos pelas notícias publicadas em diversos jornais, aqui e nos Estados do Norte, vamos transcrever uma importantíssima entrevista que ao jornal “A Província”, de Recife, deu o coronel Francisco Romão, fazendeiro no município pernambucano de Salgueiros, depoimento tanto mais insuspeito, quando se trata de um “adversário político intransigente da situação atual de Pernambuco, correligionário e amigo dedicado do ex-senador Manoel Borba”.

Eis o que publicou “A Província”, em seu nº de 9 do corrente:

“Há dias esteve nesta capital o senhor coronel Francisco Romão, chefe político “borbista” em Salgueiros. Disso tendo conhecimento, um repórter desta folha resolveu ir ouvi-lo a cerca do banditismo em o Nordeste e, particularmente, em Pernambuco.

O coronel estava em companhia de outro sertanejo político.

Falou o nosso repórter:

- Então, coronel, como vamos de policiamento contra o nefasto cangaceirismo? As tropas têm desenvolvido com eficácia a perseguição ao banditismo?

- Esta é a verdade, senhor, respondeu o coronel. Correligionário do ex-senador Borba, ao qual sempre dei o meu apoio e darei em qualquer emergência, por um dever de lealdade para mim mesmo, não posso entretanto deixar de reconhecer que o Dr. Eurico de Souza Leão tem sido um abnegado, diante os interesses dos sertanejos, na campanha contra o banditismo. O amigo não pode avaliar os vexames que passamos com os “raids” contínuos de Lampião às nossas paragens. Era um horror. Mães que choravam, maridos que se maldiziam da sorte, finalmente um pandemônio.

Hoje, porém, o grupo de Lampião está reduzido a 12 ou 14 bandidos, internados nas caatingas, porque as forças policiais não lhes dão tréguas.

Hoje se pode viajar com plena segurança no sertão. A polícia pernambucana tem desempenhado com louvores o que lhe foi confiado: 

- o extermínio de cangaceirismo.

O major Theophanes Torres, a quem o Dr. Eurico confiou a chefia das forças volantes é um oficial esforçado, conhecedor absoluto de toda a zona sertaneja, e, com calma, sem reclame, vem realizando uma campanha perfeita, de pleno acordo com o chefe de polícia.

- Mas alguns jornais (replicamos) costumam, quando atacam o governo, desmerecer a energia da polícia nos combates a Lampião. Que nos diz o coronel?

- Nada mais lhe posso adiantar. – sou “Quero que o senhor frise bem em seu jornal o seguinte: - sou “borbista”, nunca abandonarei o ex-senador; por isto ninguém mais autorizado do que eu para falar nestas cousas. Por um princípio político “sou inimigo da situação atual”; e que lucraria eu louvar a polícia, endeusando a campanha feita pela mesma em nossos sertões se tudo isto não fosse verdade?

A campanha contra o cangaceirismo, feita pelo Dr. Eurico de Souza Leão e pelo major Theófanes é uma campanha que merece todo o aplauso dos sertanejos. E ouça: eu, chefe “borbista” intransigente, sou o primeiro a aplaudir.

O jornal terminou a sua publicação com o seguinte período, que fazemos nosso: - “Os que têm combatido a ação do Sr. Dr. Chefe de polícia, que contestem o coronel Romão. Contra fatos não valem argumentos falsos”.

Justiniano de Alencar (no seu penúltimo capítulo)

Fonte: facebook
Página: Antônio Corrêa Sobrinho

http://blogdomendesemendes.blogspot.com


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