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segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

A ‘MODA’ CRIADA NO CANGAÇO


Naquele tempo, já em 1929, ocorreu a permissão para que as mulheres passassem a fazer parte dos grupos de cangaceiros.

Até a entrada de Maria Gomes de Oliveira, a Maria de Déa, mais tarde chamada e imortalizada pela imprensa carioca de “Maria Bonita”, não há registros de que mulheres tenham feito parte de bandos de cangaceiros.


Famosos cangaceiros como Jesuíno Brilhante, Antônio Silvino, Sinhô Pereira e vários outros não permitiram a presença efetiva feminina em seus bandos. Logicamente que tanto os chefes quanto seus comandados tinham suas namoradas, sua mulheres, além das aberrações dos estupros.

Há citações de que no séc. XIX uma mulher, Anésia Cauaçu, tenha, ela própria, liderado um bando ‘cabras’, porém por alguns considerado de cangaceiros por outros não, no Estado baiano. Mas é um assunto que não vamos nos aprofundar desta feita.


Virgolino Ferreira, quando da transferência do seu ‘reinado sangrento’ para o Estado da Bahia, em fins de 1928, após aceitar inúmeras adesões dos filhos daquele chão e das do Estado vizinho de Sergipe, divide o bando em pequenos grupos. Essa divisão foi uma manobra tática usada por Lampião para facilitar o movimento de ataque e fuga empregado em um tempo mínimo. Menos gente, maior condições de se locomoverem dentro da “Mata Branca”. Além disso, havia a possibilidade de atacarem mais de uma localidade ao mesmo tempo e distante uma da outra. No entanto, para os ‘cabras’ não ficarem muito ‘à vontade’, vez por outra Lampião convocava todos para uma grande missão então voltava a demonstrar seu domínio total de líder. 

Citam autores que com a introdução da mulher, permissão dada pelo cangaceiro mor daquele momento no cangaço, Virgolino Ferreira, o Lampião, esse, o cangaço, passou a ser mais ameno, ou seja, diminuíram os estupros, porém, não acabaram definitivamente, e a higiene também fora integrada.


A mulher quando passa a fazer parte dos bandos de cangaceiros sua exclusiva execução era simplesmente de namorar seu companheiro. A mulher não cozinhava, não armava toldas nem participava de combates. Alguns autores citam essa ou aquela cangaceira apta no manejo das armas longas em combate. Particularmente não concordamos com essas citações devido o tipo de armas longas usadas pelos cangaceiros, fuzis 1908, 1922 e outras. A companheira do cangaceiro Corisco, Cristino Gomes, a cangaceiro Dadá, dona Sérgia, até comandar, comandou o grupo de Corisco, porém, não notamos registros fotográficos em que ela esteja portando arma longa, um mosquetão por exemplo. No entanto, há registros onde ela trava grande combate sangrento contra o soldado volante João Torquato usando uma arma curta, que, nessa luta, já havia matado os cangaceiros “Guerreiro” e “Chumbinho”, além de ter conseguido ferir Corisco nos braços colocando-o, para sempre, fora de combate.


Vários chefes de subgrupos tiveram, a exemplo de Virgolino Ferreira, sua companheira. A maneira, forma, dessa adesão, na maioria das vezes é citada pelos historiadores que ocorreu de uma forma brutal, obrigatória. Já em outros casos, as próprias moças pegaram suas ‘trouxas’ e deixaram a casa paterna em busca de uma cega ilusão.

Outro particular apresentado pelas pilastras da historiografia cangaceira surgido após a entrada da mulher no cangaço, foi à ornamentação das vestes e objetos usados pelos cangaceiros. A cangaceira Dadá, companheira do cangaceiro Corisco, tinha o dom de ser uma espécie de estilista. Pensava e colocava suas ideias nos tecidos, couro e arreios dos cangaceiros.


“Quando entrou para o cangaço, Dadá foi encarregada - à mercê dos seus talentos de bordadeira e costureira, e também graças a sua criatividade - de confeccionar as roupas de Lampião e Corisco”. Foi ela quem mudou radicalmente os motivos dos bordados e a feitura das roupas dos cangaceiros. Em 1932 lançou a moda dos motivos de couro branco costurados em chapéus, flores em tecidos coloridos bordadas nos bornais, peitorais e cinturões.” (JASMIN, Elise Grunspan).


“(...) Foi a estilista do Cangaço inovando os bornais com florais coloridos e colocando estrelas, signo de Salomão, moedas, fitas, nos chapéus dos cangaceiros. Buscava inspiração no Raso da Catarina, Bahia por ser um lugar tranquilo (...).” (mulheresdocangaco.com.br).

O trabalho de Dadá, realizado na estética do cangaço, serviu de inspiração para a estilista Helena Pontes, quando da criação da coleção “SUSSUARANA”.


“(...) A estilista Helena Pontes, 36 anos, é pernambucana, mas escolheu o Rio para lançar a marca que leva o seu nome, que teve a primeira coleção no fim de 2013. Desde sempre com o foco na alfaiataria, ela conseguiu adaptar paletós, macacões, vestidos e calças para o clima despojado daqui, usando recortes geométricos e uma pegada minimalista. Agora, na sexta coleção, a “Sussuarana”, inspirada na história e na estética de Dadá, mulher do cangaço que foi a estilista do grupo de Lampião e chegou até a comandar o bando, Helena volta a resgatar suas origens nordestinas.


Coleção “Sussuarana”, de Helena Pontes - Divulgação/Mar + Vin

— Até pelo momento político, eu queria falar sobre mulheres fortes. E também estava com saudade da minha terra. Comecei, então, a pesquisar as figuras nordestinas e encontrei a Dadá. Para ela, imaginei uma alfaiataria utilitária, com elementos que retratam características das roupas usadas pelas cangaceiras, como as linhas aparentes de pesponto, as amarrações e os recortes que remetem as cartucheiras (...).”

A Dadá, para aqueles que não sabem, levou sua arte para além-cangaço. Usou do seu dom e transmitiu para sua prole o seu saber. A prova maior disso são as confecções trabalhadas pela amiga Indanaia Santos, neta da própria.


Quanto à estética criada e lançada para o mundo dentro do cangaço lampiônico, o pesquisador/historiador Rostand Medeiros diz: “Tamanho apuro visual, pleno de detalhes nas coisas mais cotidianas (cães com coleiras trabalhadas em prata!), servia como proteção ao mau-olhado, instrumento de hierarquia interna, tinha funcionalidade militar e era um poderoso instrumento de propaganda junto às populações pobres, que se admiravam diante de todo aquele luxo, cor e brilho. Era também uma forma de arte que o cangaceiro carregava no seu corpo (...) Era como se os mais esquivos habitantes do cinzento se levantassem contra o despotismo da ausência de cor na caatinga e proclamassem a folia de tons e de contrastes.”(Tokdehistória.com).

Já o pesquisador/historiador/sociólogo Frederico Pernambucano de Melo, assim refere sobre: “Havia uma estética rica que conferia uma ‘blindagem mística’ ao cangaceiro, satisfeito com a sua beleza e ainda seguro em meio a uma suposta inviolabilidade.” A ponto de contaminar as roupas dos policiais, que copiaram suas vestimentas, e mudar o foco da guerra. “O contágio inelutável dá a força dessa estética e evidencia a existência de outra luta, travada em paralelo, no plano da representação simbólica.”(blog Ct.).


Virgolino, assim como Virgínio, seu cunhado, Luiz Pedro e outros cangaceiros dominavam a arte de trabalhar com e em couro... Virgolino, tendo sido almocreve, e como todo tocador de tropas naquela época, tinham a obrigação de dominarem essa técnica. O pai de Virgolino, José Ferreira, também dominava devido uma de suas profissões, era almocreve. Quando os almocreves almocreveavam pelos sertões nordestinos, a sua frente estava sua maior riqueza: seus animais com suas cangalhas. Os animais portavam arreios e cangalhas, nessas era onde eram colocadas as mercadorias a serem transportadas em seus lombos. Nas cangalhas havia rabichos de couro, uma espécie de tira larga de couro que, posicionada na parte traseira do animal, impedia que a carga, cangalha, escorregasse e caísse pela frente do animal. Para ter-se uma segurança impedindo da carga não pender para os lados e cair, assim como não cair por trás dos animais, eram colocados outra cinta, mais estreita, na altura do tórax do animal, chamada de cia. Além desses, haviam os animais que eram de sela, ou seja, aqueles que serviam de montaria. Nesses eram colocados à sela, os arreios, as coronas e os coxins, objetos formados com couro, ferro, argolas e tecidos. Devido a toda peça usada ser ou ter couro, fazia-se necessário o almocreve dominar a arte de trabalhar artesanalmente com ele. Com isso, ele ‘remendava’ uma cia, um rabicho, peça colocada abaixo da calda, rabo, do burro, cavalo ou jumento, ou um dos arreios das montarias. Sem esse domínio, quebrando algum em suas caminhadas, a coisa ficava feia. Não havia condições de continuar transportando as encomendas. Além disso, tudo, eles, os almocreves, tinham que terem em mãos ferramentas para tosarem as crinas e caldas, pois como nossos cabelos, os pelos do dorso do pescoço e a calda dos animais crescem constantemente, mais ainda, terem em seus alforjes, para cuidarem dos cascos dos animais, alicates, goivas, turquesas, pinos ou pregos, e limas, pois como nossas unhas, os cascos dos animais também crescem, além dos acidentes com pedras, grampos e/ou tocos que machucam e carecem de cuidados especiais. Os cascos dos animais são como as unhas da gente, crescem constantemente.

Pois bem, Virgolino, como almocreve e como cangaceiro cuidava, antes dos seus animais, depois de seus objetos pessoais como bainhas, chapéus, perneiras, alpercatas, bornais e bandoleiras das armas... A estética, nascida das entranhas de um Fenômeno Social rude, sofrido, sangrento e recheado de mortes, fez, faz e fará adeptos. Surgidas nas quebradas dos sertões nordestino para o mundo.

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