*Rangel Alves da Costa
“Poço Redondo nunca foi pobre, de pobreza extrema e panela sempre vazia, de carência de tudo, também nunca teve gente mendigando pelas ruas nem pelas calçadas de cuia na mão”, assim se dizia acerca da realidade social e dos meios de sobrevivência de Poço Redondo. E com razão. Assim se dizia por que verdade: Poço Redondo nunca teve gente pedindo esmolas.
Tal contexto acima, contudo, refere-se apenas aos naturais de Poço Redondo, aos nascidos na localidade. Mesmo jamais tendo sido um município rico, de bonanças e com todas as facilidades da vida, também jamais foi um chão sertanejo dividido entre empobrecidos e miseráveis.
Quem já viu alguém nascido em Poço Redondo pedindo esmola de porta em porta, na porta da igreja ou pelas calçadas mendigando tostão? Nunca houve uma situação assim. Aqueles pedidos que até hoje são feitos em determinados períodos do ano, a exemplo da Semana Santa e do Natal, são exemplos de uma cultura ainda viva onde se imagina que os mais favorecidos possam fazer valer seus sensos humanitários e ofertar um peixe, um coco, um quilo disso ou daquilo ou presentear com uma lembrancinha de final de ano. Mas não no sentindo da esmola.
Noutros idos se dizia, por exemplo, que Boboca era pobre, que Remígio exemplificava a pobreza, que tantos outros não tinham sequer como se sustentar. Isso também é verdade, mas não no sentido da mendicância. Pessoas pobres sempre existiram e continuarão existindo. Cozinhas, despensas e armários estiveram e ainda estão vazios por todo lugar. Nenhum destes, contudo, já passou pela humilhação de bater à porta do conterrâneo ou erguer a cuia pedindo vintém, ainda que muito agradecessem toda e qualquer ajuda que fosse chegando.
Como do conhecimento da maioria, Poço Redondo, enquanto município sertanejo, sempre foi econômica e socialmente desfavorecido. O desemprego sempre foi um grave problema, a distribuição e geração de renda são mínimas, os meios de sobrevivência sempre foram precários. Nunca houve qualquer filho de Poço Redondo com extrema riqueza. Os ditos ricos de hoje não são naturais do lugar. Os “ricos” de ontem possuíam apenas terras - na maioria das vezes improdutivas - e rebanhos, mas nada de somas pessoais que os caracterizassem como ricos de verdade.
Até hoje a riqueza de Poço Redondo se traduz no passado. Mas como dito, apenas riquezas de terras e de rebanhos. Somente isso. Atualmente, mesmo os mais favorecidos ainda continuam no patamar das facilidades da sobrevivência. Não há um grande empresário, não há um grande investidor, não há um fazendeiro cujas terras alcancem além dos limites municipais. Aliás, foram as terras que no passado permitiram que Poço Redondo jamais chegasse a uma situação de pobreza ou de miséria.
Com relação a terra e ao seu uso, o quadro produtivo de Poço Redondo era bem diferente de agora. Ora, grande parte das famílias possuía seu terreninho, seu cercadinho, sua pequena propriedade. Afora os latifúndios que se entremeavam desde Canindé às divisas estaduais, quase todo o chão poço-redondense estava nas mãos de gente da terra. Nele se plantava o feijão, o milho, a melancia, a abóbora, havia criação do pequeno rebanho, havia trabalho e renda. Tanto os pais como os filhos cuidavam do que possuíam. Mas hoje, quantos ainda continuam ao menos com seu pedacinho de chão?
Atualmente não há pequenas propriedades como outrora, por consequência também não há renda nem emprego. Aqueles rapazinhos de ontem pegavam no cabo da enxada, mas hoje já não fazem mais. Até mesmo os serviços de servente de pedreiro são evitados por aqueles que vêm indignidade neste tipo de trabalho, ainda que tanto necessitem para a sobrevivência. Ainda assim, não há que se dizer que a pobreza se alastra por Poço Redondo. A pobreza existente é a da falta de melhores meios de sobrevivência, mas não do posicionamento num quadro de miséria.
Desde os tempos mais antigos o natural de Poço Redondo sempre soube “se virar” para ter o seu ganha-pão. Lavadeiras, fateiras, varredeiras, domésticas, sempre foram avistadas fazendo seus trabalhos com dignidade. Com o advento dos programas sociais de geração de renda, como o Bolsa Família, a situação melhorou muito para muitas famílias. Portanto, não há que se dizer que haja pobreza extrema em Poço Redondo. Com um porém, contudo.
Os pedintes, mendicantes e outros que rotineiramente são avistados erguendo as mãos, geralmente não são naturais de Poço Redondo. Verdade é que a chegada de muitas famílias de outros municípios e regiões transformou profundamente o quadro social. A pobreza, aí sim, tornou-se num grave problema e se alastra cada vez mais. Atualmente há panelas vazias, pratos sem nada e crianças chorando. Mas essa rotina de miséria e dor nunca foi própria daqueles nascidos em Poço Redondo.
Escritor
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