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sexta-feira, 24 de agosto de 2018

QUANDO

*Rangel Alves da Costa

Quando passou um pedinte e depois mais outro, mais outro e mais outro, sempre cada vez mais famintos e magros, então eu temi pelo destino dos homens.
Quando minha avó deixou de me fazer cafuné e meu avô deixou de contar histórias do outro mundo, e tudo entristeceu pela casa, então eu aprendi que a velhice florescia demais.
Quando a criancice se despediu, a meninice foi embora e a adolescência sumiu, então eu resolvi parar de crescer e voltar a ser o que ainda estava presente dentro de mim.
Quando a nuvem não veio, a chuva não veio, o pingo d’água não veio, e tudo murchou e tudo secou, então cavei mais o barro do chão até surgir um veio de esperança.
Quando eu esperei a primavera e chegou o outono, e no lugar das flores apenas a secura da solidão e a tristeza do silêncio, então molhei mais meu jardim e fiquei esperando.
Quando pedi que ela segurasse minha mão para seguir pela estrada e ela negou minha proteção, então sozinho segui até ouvir o seu grito aflito desejando a mim.
Quando cansei pela estrada e não encontrei nenhum sombreado e nenhuma guarita para descansar, então caminhei mais ainda em busca do meu destino.
Quando procurei a igreja e a encontrei de portas fechadas e procurei um altar e nada encontrei que fosse santificado, então abri as portas do templo do meu coração e orei.
Quando minha vela de oração começou a se apagar antes do tempo e a minha oração era esquecida antes do fim, então me ajoelhei e abaixei a cabeça para reencontrar a minha fé.


Quando fui jogado às feras, fui lançado aos lobos, fui arremessado às peçonhentas serpentes, então esperei sobreviver e espantar as feras, os lobos e as serpentes, de toda estrada.
Quando eu amei e por esse amor me vi na ilusão de uma felicidade inexistente, pois amante e desamado, então preferi sofrer na solidão até que o sorriso chegasse ao meu coração.
Quando abri a panela e nada encontrei de comida, revirei a despensa e nada encontrei para matar a fome, então abri a porta para catar os grãos da sobrevivência.
Quando bati à porta e ela não se abriu e chamei à janela e ela continuou bem fechada, então sentei do lado de fora e esperei as coisas acontecerem.
Quando me tomaram as vestes e lanharam minha pele, depois me jogaram ao relento e ao frio, então simplesmente esperei o sol chegar.
Quando me forçaram a ir até a beira do abismo e lá me empurraram beiral abaixo, então eu abri minhas asas para voar.
Quando levantaram a arma e apontaram o cano sangrento em minha direção, então eu, mesmo de peito aberto, levantei meu escudo de proteção.
Quando soltaram palavras de aleivosia e sobre a minha pessoa lançaram as desonras do mundo, então eu silencie por saber de onde chegariam as respostas.
Quando me dizem que tudo é assim mesmo, que tudo deve assim acontecer, então simplesmente peço que leiam o Eclesiastes: nada é assim mesmo!

Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

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