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terça-feira, 30 de maio de 2023

HISTÓRIA LAMPIÔNICA... O ASSASSINATO DO LEITEIRO

 Por José Cícero da Silva


Manhã de sábado.

Corria calmo o pequeno riacho do Jatobá. O pouco gado que havia no cercado já tinha sido solto para comer nos matos.

Sol preguiçoso.

O vento fresco trazia consigo o cheiro gostoso dos frutos dos joazeiros e da floração abundante da jitirana e do mufumbo. A tudo isso também se misturava o cheiro dos estrumes chovidos em lamaceiros vindo do pequeno curral quase escondido entre o barranco do riacho e a casa de taipa do vaqueiro.

No caminho, entre os verdes arvoredos três indivíduos. Um velho, outro de meia idade e um menino tímido(Zé Alves) que todos os dias cumpria seu eterno ofício de leiteiro.

O dia parecia ser igual como todos os outros, tranquilo. Muitos pássaros desfilavam seus cantos quase em uníssono pelas bibocas e as moitas verdejantes daquele mundo inteiro.

Além do barulho dos bichos, apenas o som dos ventos assoviando sobre as copas frondosas das oiticicas, dos paus d'arcos, das timbaúbas, dos cedros. unhas de gatos e joazeiros.

De súbito, vozes de gentes. Cascos de animais quase tinindo nas pedras, subindo os lajedos que davam para as bandas do marizeiro.

O menino leiteiro, acabara de amarrar no caçuá do seu burrico o balde de leite que sempre entregava como sem falta no vilarejo. E assim seguiu, curioso e destemido seu caminho.

Desceu o barranco do riacho que corria do jenipapeiro para engordar mais embaixo, depois da linha do trem, o rio Salgado.

Quando enfim subiu a grota sombreadas pelas altas moitas brabas de Jurema e de angico deu de cara com o bando de jagunços e cangaceiros.

Puxou com força as rédeas do seu burro. De chofre, como dois seres congelados no meio do caminho. Menino e jerico ficaram estagnados.

- Pra donde você tá indo menino sabido? - perguntou o cangaceiro.

- Tô indo pra vila das Ororas, seu moço, deixar a encomenda: sou leiteiro.

- Tamo com sorte cambada!

Disse o cangaceiro. Quando em seguida, dois dos seus comandados, se atracaram com o balde.

Abriram ligeiro. Ambos começaram a beber com sofreguidão como bichos com fome e sede.

- Vai querer ou não seu Massilon? - Disse um deles.

Em silêncio, o jovem leiteiro, sequer descera do seu burro. Coração batendo forte. Olhos arregalados...Suor frio na testa e no lombo.

Até que de repente, um pouco mais atrás surgiu quase do nado mais quatro cangaceiros. Estes se pareceram muito mais afáveis e cordiais.

- Aquele lá é o capitão, nosso chefe. - Explicou Zé Baiano para o menino. Depois completou: - Você por acaso já ouviu falar em Lampião, menino? - Indagou ao leiteiro, outros dos jagunços que chegaram primeiro.

- Já vi falar sim senhor, mas não conheço ele não. Respondei.

- O que está acontecendo aqui. - Quis saber o rei do cangaço.

- ora, tamo matando nossa sede com leite bom, capitão. - respondeu Mormaço.

- E vocês beberam tanto leite assim, estão com o diabo? Redarguiu o chefe deles.

- Não capitão - disse o cangaceiro. - O bando derramou no riacho o resto, pro menino não precisar mais ir pro vilarejo.

- Não foi certo este proceder. - Enfatizou de modo ríspido Lampião. - Por fim emendou: - Não quero nenhum mal por estas bandas. Pra mim basta a covardia e a traição daquela peste de Izaías. Aquele sim há de merecer um bom trocoo. Mas só ele, acentou o rei do cangaço. Cardoso e Saraiva não se acovardaram, não

Depois completou: - Mas o que se é de fazer agora tá sem jeito. Deixa as frutas amadurecer pra eles ver! Em seguida olhou de soslaio para o menino e disse: - Não fique triste seu menino, os que beberam seu leito tem dinheiro suficiente pra te pagar em dobro. Mas, você não vai poder ir hoje pra cidade não; porque lá tá cheio de macacos. E você sem querer pode dá com a língua nos dentes. Aurora hoje vai ficar sem beber seu leite igualzim a esses bezerros magros. Falou ele. E logo depois perguntou:

- Cadê seu pai menino? Preciso de alguém pra mim guiar por estes caminhos brabos que não conheço. Preciso chegar logo à Conceição na Paraíba, com as bençãos do meu padim.

- Meu pai e meu tio tão bem ali em casa. Eles conhecem tudo por aqui. Eles podem ajudar o senhor... Respondeu baixinho o leiteiro ainda em cima da cangaio do seu burrico.

Então desça já desse animal e vamos lá. Quero ver que cara tem o seu pai. E assim seguiram....o leiteiro agora puxava o animal pelos cabrestos.

Chegando na casa apenas o tio do leiteiro e sua esposa se encontravam lá. Sob o pé de juazeiro, Lampião logo se entendeu com o vaqueiro. O bando ficou na cancela.

Os dois( vaqueiro e Leiteiro) seguiram com o bando como guias. Antes do serrote do Brandão o grupo se dividiu em dois. O vaqueiro seguiu com Lampião que ansiava atravessar a linha do trem, enquanto o jovem leiteiro( Zé Alves) seguiu com o subgrupo do cangaceiro Massilon, nos rumos do sítio Catingueira a mais ou menos légua e meia dali.

No outro dia antes do sol nascer o vaqueiro chegou em casa, inclusive, com algum dinheiro ofertado por Virgulino como sendo a paga do Leite e do serviço prestado como guia.

Enquanto o jovem leiteiro não retornara. Vez que fora morto por Massilon logo que avistaram as terras da catngueira na direção da Ingazeiras.

Dias depois seus familiares encontraram seu corpo denunciado pelos urubus no fundo de uma grande grota um pouco antes do açude velho. Só o reconheceram por conta do cinturão de couro malhado que o leiteiro usava.

História e estória quem ouvi contar.

<><> (José Cícero)

Aurora - CE.

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