Seguidores

segunda-feira, 28 de abril de 2014

OS RASTROS DO CANGAÇO NO TINGUI

Por João de Sousa Lima
Aldiro, João de Sousa Lima, Paulo e Lira na fazenda Craunã, Tinguí

“A VIOLÊNCIA TANTO CANGACEIRA QUANTO POLICIAL DEIXOU MARCAS PROFUNDAS”.

O cangaço deixou marcas profundas nos povoados Tingui, Cachoeirinha, Riacho Seco e Alto dos Coelhos, em Água Branca, Alagoas. Desde a entrada no cangaço de Manuel Maurício dos Santos, 

...Barra Nova e Luiz Pedro

o cangaceiro “Barra Nova”, que teve sua família espancada pela volante policial comandada por Zé Joaquim, até as mortes de inocentes realizadas por cangaceiros, tendo por pretexto apenas o interesse de algum vizinho de roçado que fazia intrigas por coisas banais, como no caso de uma cerca arrombada por animais, um mourão avançado em alguns centímetros de terra, a água de um poço ou barreiro particular ou pela inveja de ver os animais do vizinho se reproduzindo e com o curral abarrotado, tudo era pretexto para desavenças, porém uma das principais causas envolvia namoros, traições e a honra de uma virgem seduzida.


Tudo isso era motivo de fuxico e o fuxico foi uma peste que assolou o Sertão na época do cangaço; Muitas mortes aconteceram motivadas pelo fuxico, conversas muitas vezes infundadas, inventadas por desafetos apenas para prejudicar seus inimigos.

Capela da família Xavier.

Lampião teve vários coiteiros e intermediários na região do Tingui, Cachoeirinha, Riacho Seco e no Alto dos Coelhos, como João Rodrigues de Oliveira “Joãozinho Pedrão”, tropeiro dono da fazenda Zuleiros; os irmãos Belo Salú e Miguel Salú (que depois entrou pro cangaço) Cazuza, Zé Lucas, Louzinho Coelho, Sebastião Vieira Sandes “Santo” (que foi cangaceiro e volante, estava no ataque a Grota do Angico, quando Lampião morreu), Ozório, Antonio Zezé, Ernesto e Nicolau, que era casado com Lídia Gomes.

Ouvindo Gonçalo: sobrevivente da chacina do Craunã

Mesmo tendo grandes coiteiros nessa região alagoana os cangaceiros atacaram no Tingui, a casa do senhor Lulú e não encontrando o patriarca da família carregaram Manuel  “Neco” Lulú e o levaram até a casa de Antonio Xavier de Carvalho. Na casa de “Xavier” Lampião amarrou Neco Lulú, pendurou no esteio da casa e exigiu dinheiro.

Casa onde Lampião amarrou Neco Lulú - Tinguí

O velho Lulú chegando em casa soube que os cangaceiros haviam carregado  seu filho Neco Lulú e pegou um facão e foi resgatar o filho. Na casa do velho Xavier, Lulú falou com Lampião e o cangaceiro disse que só libertaria Neco por dinheiro e Lulú mandou um portador ir até Água Branca buscar emprestado o valor solicitado e quando o portador retornou que o dinheiro foi pago Neo Lulú foi liberado.

João de Sousa Lima, SGT. Lira, Gonçalo e Nely

Lateral a casa de Xavier, seu filho Abílio Xavier tinha um armazém e os cangaceiros seguiram pra lá onde encontraram um comerciante de Mata Grande que estava em um caminhão negociando peles e algodão; Os cangaceiros pegaram o caminhão e inventaram de dirigi-lo e saíram da rota apertada e entraram com veículo no mato, batendo em árvores, tocos e pedras danificando o automóvel que foi logo abandonado.

Casa onde Lampião matou Oliveira e os filhos Duquinha e Manuel

Na fazenda Craunã residia o casal Joaquim Antonio de “Oliveira” e Joana Sandes de Oliveira e os filhos José (Duquinha), Manuel, Alcidor, Gonçalo, Natalício, Joaquim, Adecir e Maria.

Capela e casa da fazenda Craunã

Joana estava grávida de José.

No passado Joaquim havia namorado com Lídia Gomes e depois acabou casando com Joana, porém Lídia nunca esqueceu essa desfeita e mesmo casada com Nicolau restou essa rixa.

Maria e João. Ela é sobrevivente da fazenda Craunã

Lampião pediu um dinheiro a Oliveira, o coiteiro que foi levar o recado de Lampião foi Antonio Zezé. Chegando a fazenda Craunã Antonio entregou o bilhete com a solicitação de Lampião e Oliveira disse que estava sem dinheiro e pediu pra ele ir buscar depois. Oliveira vendeu uma vaca, juntou um dinheiro totalizando a quantia solicitada por Lampião, comprou uns cigarros e entregou a Antonio Zezé, fazendo o seguinte comentário:

- É duro trabalhar pra dar a quem não trabalha!

Enterrados Oliveira, Duquinha e Manuel

Antonio Zezé entregou o dinheiro e os cigarros a Lampião que estava acoitado nas proximidades. Os cangaceiros estavam bebendo e jogando baralho. Lampião começou enaltecendo Oliveira, falando das qualidades dele e dizendo que era um bom rapaz.

Capela da família Xavier.

Antonio Zezé ouviu calado o comentário de Lampião e depois comentou com Nicolau que Oliveira tinha dito que era duro trabalhar e dar a quem não trabalha.

Pia da fazenda Craunã

Nicolau já tinha ciúmes por sua esposa ter namorado com Oliveira e também havia tido uma discussão por causa da água de um açude que pertencia a Oliveira. Nicolau aproveitou a ocasião e desabafou:

fazenda Craunã: Marcada pela morte sombria

-  É capitão o senhor diz que oliveira é isso  e aquilo mais ele falou que era duro trabalhar e dar pra quem não trabalhava.

Josué Santana, João de Sousa Lima, Paulo e Aldiro

Os cangaceiros todos entregues a cachaça, Lampião enfurecido com o comentário pegou as notas e as espetou nos espinhos de um mandacaru e ordenou que  ninguém pegasse o dinheiro. 


Dia 02 de novembro de 1932, um dia de finados, na fazenda Craunã, a família no alpendre, Oliveira estava com a pequenininha Maria em seu colo e cantando músicas fúnebres; Lampião chegou com mais dois cangaceiros; A aflição tomou conta da família; O casal com os filhos pequenos ficaram frente ao terror.


Oliveira pediu pra Lampião matá-lo mais que deixasse seus filhos em paz; nesse momento foi chegando os filhos José “Duquinha” (com 17 anos) e Manuel (com 15 anos); Lampião pegou a “Mauser” e atirou em Oliveira, depois matou Duquinha e Manuel. Os filhos pequenos viram a triste cena.  Lampião fez Joana beber cachaça forçadamente. De repente chegou Belo Salú que havia ouvido os tiros. Belo era irmão do cangaceiro Miguel Salú e pediu pra que Lampião não fizesse mais nada com a família, Lampião disse que o filho mais velho, chamado Alcidor “Cidô”, teria que morrer pra que não viesse depois vingar a morte da família. Belo Salú insistiu pra que o cangaceiro não fizesse mais nada, pois Cidô era o mais velho e era quem iria cuidar da família. Lampião atendeu Salú, reuniu os comparsas e ordenou pra que o pequeno Gonçalo Joaquim de Oliveira fosse buscar uns animais na roça para que eles fossem embora; Gonçalo pegou os animais e trouxe para o algoz de sua família; Lampião e os cangaceiros montaram e foram embora. Naquela manhã de finados restou a dor, o sangue jorrado na terra sagrada, o dia de finados perpetuado na música fúnebre, na visão horripilante que a morte deixou pelas armas de homens perversos e impiedosos.


Cruzes dos mortos do Craunã

Hoje, domingo, dia 27 de abril de 2014, eu, Neli Conceição, Josué Santana e Antonio Lira, tendo a ajuda de Aldiro e Paulo Soares de Oliveira, visitamos  a casa da fazenda Craunã e vimos a capela onde Oliveira, Duquinha e Manuel foram enterrados; três cruzes lembram as três vítimas. Ouvimos os lamentos dos irmãos Gonçalo e Maria, hoje aos 88 e 85 anos de idade, figuras caladas, conversa pouca, dores eternas.


Capela onde foram enterrados os mortos da chacina do Craunã

A casa da fazenda encontra-se fechada, suas terras servem para a família plantar e colher, há algo de triste neste chão, mesmo com o  verde apontando e a chuva caindo, uma dor paira no ar, vento gelado açoita as paredes do casarão e da capela, chuva fina molha, enxágua, faz a semente adormecida florescer, florir, mais a tristeza impera, como mágoa que macula a terra em veios permanentes que absorveram sangues de inocentes almas, ensopadas frestas de areias que não cicatrizam as dores de uma família marcada por grande tragédia e nem o tempo é capaz de sarar as feridas do coração que sentiu a dor.......

João de Sousa Lima é escritor, historiador e pesquisador do cangaço.

Paulo Afonso, 27 de abril de 2014.

http://www.joaodesousalima.com/
http://blogdomendesemendes.blogspot.com

3 comentários:

  1. o lá sou Zé Raimundo quero lhe parabenizar pelas as sus postagem historias que marcaram a vida sofrida de muita gente em toda região de Alagoas Bahia e Sergipe

    ResponderExcluir
  2. Grande Zé Raimundo, muito obrigado pelas sua palavras, isso só faz a gente apegar-se mais aos estudos sobre cultura. O que leva uma pessoa que constantemente estuda cangaço continuar pesquisando são as palavras de ânimos que diariamente nós recebemos, quer seja no próprio blog ou através de e-mails.
    Você deveria ter colocado o seu e-mail para que lhe desse o agradecimento diretamente para seu e-mail.

    O meu é: Josemendesp58@hotmail.com - josemendesp58@gmail.com

    Felicidade para você e para todos os seus familiares.

    José Mendes Pereira
    Mossoró - Rio Grande do Norte.

    ResponderExcluir
  3. o lá José Mendes sou admirador das suas historias porque relata com sinceridade todo acontecido de uma época que nem todo mundo tinha a quem recorre e se obrigava a larga tudo que tinha e corre para outros lugares; moro em um povoado que parte destas famílias seus avos foi morto pelo os cangaceiros de Anjo Roque. gosto muito de pesquisar tenho um blog que conta a historia do Tingui e tem 03 pagina das barbaridades feitas pelo os cangaceiros. suo Zé Raimundo moro no povoado Tingui Cidade de Sitio do Quinta BA. Historiadotinguiblogespot.com. obrigado e muito bom ler as suas historias. um abraco tudo de bom para você e sua família

    ResponderExcluir