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quinta-feira, 31 de julho de 2014

Seu castigo era pior que a morte - Publicado em 08 de Julho de 1997


Lampião sangrava seus inimigos como se eles fossem bois e os castrava como bodes

O cangaceiro Lampião foi quem sistematizou, no sertão nordestino, o sequestro à resgate. O rei do cangaço também se colocava à disposição dos coronéis amigos e protetores, que lhe forneciam mantimentos, armamentos e munição, em troca da utilização do seu bando como "grupo de extermínio". "Esses coronéis e os próprios cangaceiros viviam financiando a abertura de negócios. Uma pessoa que quisesse abrir um comércio, recebia o empréstimo a juros. Agora, se não pagasse, eles iam atrás", revela detalhes das ações do maior dos cangaceiros, o historiador da Fundaj, Frederico Pernambucano de Mello.

Frederico Pernambucano de Mello

Por conta disso, tem sertanejo que ainda hoje o detesta e o compara aos bandidos atuais. A lista de crueldades e castigos aplicados pelo cangaceiro e seu bando é extensa. Seu punhal, com 45 centímetros de lâmina (80 centímetros), ficou tristemente famoso: a arma era utilizada para sangrar os inimigos e traidores, ou seja, era enfiado pelo pescoço de cima para baixo em direção ao abdômen da vítima, que morria com todos os órgãos vitais perfurados.

O sangramento, revela o historiador Frederico Pernambucano, era uma prática herdada da cultura medieval que ainda dominava o Sertão do Nordeste. A técnica era igual à técnica de sangramento do gado, aplicada pelo colonizador do Sertão. O corte da orelha é igual ao corte que marcava o bode. A castração do homem era igual àquela realizada no bode ou no carneiro. Retirava-se a bolsa escrotal com os testículos, mantendo-se o pênis. A assepsia era feita com a colocação de cinza, sal e pimenta. "Essa técnica foi aplicada pelo cangaceiro Virgínio, chefe de um dos bandos, no camponês Manoel Luiz Bezerra. Eu entrevistei Manoel e vi como foi feito o corte", relata Frederico Pernambucano.

TESTEMUNHAS


Na memória dos primos Davi Gomes Jurubeba, 95 anos, e João Gomes de Lira, de 82, o nome Lampião é associado imediatamente a muito sangue, um ódio imenso e vários combates. Juntos, testemunharam muitos desses crimes e integraram a mesma volante que combateu Virgolino Ferreira pelo sertão pernambucano. Apesar da idade avançada, os dois guardam detalhes daquela época. Jurubeba passou oito anos na polícia: foram 15 combates contra o cangaceiro, a maioria deles na pequena Nazaré (hoje, Carqueja, distrito de Floresta, a 434 quilômetros do Recife).

João Gomes de Lira

Jurubeba viu um irmão e seus primos morrerem. Fica revoltado quando se fala em homenagear o rei do cangaço. "Ele e seu bando cercaram o Riacho da Barra, tomaram conta do povoado ao redor, estupraram todas as moças. A mulher do médico, de quem queriam roubar, também foi estuprada, entrou em coma e morreu. Ele era bom?" questiona. 

"Querem pegar um bárbaro desses e fazer festa para ele. Além disso, ele castrou civis que recusaram ajuda, furou olhos e cortou línguas".

A relação entre cangaço e Justiça é o tema da pesquisa do juiz de Direito de Triunfo, Assis Timóteo Rodrigues, 50 anos, que lançará no próximo ano o livro Lampião e a criminologia de sua época. O trabalho é resultado de pesquisas que o juiz realiza por cidades de cinco estados nordestinos onde o cangaceiro esteve. Vasculhando os precários arquivos dos cartórios nordestinos, em busca de processos contra Virgolino Ferreira, ele chegou à conclusão que, se ele tivesse sido julgado por todos os crimes, seria a condenado a mais de mil anos de prisão.

Os assaltos, roubos, extorsões e homicídios eram seus crimes mais comuns. Mas ele nunca compareceu a nenhum julgamento. Ainda segundo Timóteo, os advogados que patrocinaram as defesas de Virgulino e seus cabras, deixaram de lado o aspecto criminológico, e sequer trataram o cangaço como fato social. "Os homens nomeados para a defesa de Lampião eram rábulas, sem conhecimento do Direito Penal e de outras ciências, como a Antropologia, Sociologia e Medicina Legal."


http://www.dpnet.com.br/anteriores/1997/07/08/especial5_0.html

Postado e ilustrado por Adryanna Karlla Paiva Pereira Freitas
http://blogdomendesemendes.blogspot.com

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