Por Sálvio
Siqueira
Maria Gomes de
Oliveira segunda filha do casal José Gomes de Oliveira, José Felipe e de dona
Maria Joaquina Conceição de Oliveira, Maria Déa, como toda moça no desvirginar
da adolescência, sonha em casar e ter seu ‘príncipe encantado’ ao seu lado por
toda a vida.
Nos sertões
nordestinos esses sonhos eram, na maioria das vezes, uma maneira de fugir,
escapar, do modo, maneira, ao qual eram tratadas as meninas pelos pais.
A criação não
era nada fácil para um casal de agricultores, vivendo exclusivamente do que a
roça lhes oferecia. O maior temor de um pai, ou uma mãe de família, naquela
época era ter sua filha vendendo seu corpo nos cabarés das cidades.
Principalmente a mãe, pois o machismo reinante faziam-na exclusivamente
culpada. Com esse receio, em vez de educar, mostrando o fato, como a coisa se
dava, e assim ela própria teria tempo para construir uma forte ‘muralha’ como
defesa, os pais faziam eram manter suas filhas como escravas, ensinando, quando
ensinavam, como ser obedientes em tudo ao marido. Logicamente, como em toda
regra tem exceção, nessa também teve a sua.
O Casório…
Como em toda
adolescência faz-se os grupinhos de moças e rapazes, com particulares e
‘segredos’ entre eles, naquele tempo, também tinha. Nos anos que se seguiram,
Maria foi ‘ganhando’ uma ruma de irmãos, e fazendo amizades com algumas primas
e primos. Logicamente todo mundo teve sua, ou seu, confidente, e Maria Gomes,
Maria de Déa, tinha sua prima Maria Rodrigues de Sá como tal. Nas festividades,
sambas e forrós que tinham na região, nas cidades de Santa Brígida, Santo
Antônio da Glória e Jeremoabo, todas no Estado baiano, as quais ficavam mais
perto de seu lugarejo, Malhada da Caiçara, pelos cálculos da época, como suas
primas e amigas, Maria de Déa arrumou namoricos com um ou outro rapaz.
Quis o destino que Maria se apaixona pela primeira vez por um de seus primos chamado José Miguel da Silva, por todos conhecido como Zé de Neném, da mesma localidade em que nascera, na Malhada da Caiçara, tendo uma espécie de ‘atelier’, ou um quarto de trabalho, um local para trabalhar, em Santa Brígida, onde exercia sua profissão de sapateiro.
Zé de Neném
"(…) Zé
de Neném era filho de Pedro Miguel da Silva conhecido por todos na região pela
alcunha de Pedro Brabo e Maria Conceição Oliveira, apelidada de Neném. O
parentesco do sapateiro com Maria de 'Déa' vinha por parte da sua avó, Generosa
Maria da Conceição, uma senhora que era conhecida pelo apelido de Juriti e que
era irmã de Zé Felipe, pai de Maria (…).” (“A trajetória guerreira de Maria
Bonita – A Rainha do Cangaço” –LIMA, João de Sousa. 2ª Edição. Paulo Afonso,
BA, 2011)
Foto da casa dos pais de Maria Bonita.
Como a família
de Maria Gomes, a família de Zé de Neném era bastante grande. Naquela época não
havia os meios contraceptivos atuais e, com toda certeza, fazer, fecundar,
filho era como se fosse um investimento para o futuro, erroneamente pensavam
assim os catingueiros. No futuro eles iriam ajudar os pais nas lidas diárias
das fazendas, essa, e simplesmente essa, era a razão. Dentre as irmãs do
sapateiro, destacamos Mariquinha Miguel da Silva, que, em determinada época,
deixa seu marido, Elizeu, que era proprietário da fazenda Ingazeira onde
moravam, e dana-se no mundo sombrio e incerto do cangaço com o bandoleiro
Ângelo Roque, chefe de um dos subgrupos do bando de Lampião, que tinha a
alcunha de ‘Labareda’.
Maria e José
casam-se.
Não demoraria muito para que se começassem as incompatibilidades.
Não demoraria muito para que se começassem as incompatibilidades.
A Separação…
Maria era por
demais ciumenta e seu esposo, Zé de Neném, um verdadeiro ‘pé de forró, não
saindo dos sambas.
Certa feita, estando Zé em um dos vários botecos, bebendo com alguns conhecidos, chega Maria e arma o maior escarcéu. Zé se defendia das acusações de Maria até quando pode, porém, a baiana encontra em um de seus bolsos uma lembrança de uma ‘amiga’, um pente com o nome da mesma. Nisso o pau quebrou pra valer. E a já conturbada vida a dois entre Zé e Maria, pelo fato de Maria não engravidar, desmorona-se de vez.
Maria Bonita – Fonte – http://umas-verdades.blogspot.com
“(…)
Maria encontrou um pente em um dos bolsos do marido, com o nome de uma moça
gravado no objeto (…). Este tipo de discussão e separação tornou-se uma
constante e marcou significativamente o relacionamento dos dois (…). O casal
não chegou a ter filhos. Alguns amigos confirmam a esterilidade do sapateiro Zé
de Neném, que não chegou a engravidar nenhuma das mulheres com quem viveu (…).”
(Ob. Ct.)
Pois bem,
nessa, como em tantas outras ‘separações’, Maria Gomes corria à procura dos
braços acalorados e protetores de seus familiares, apesar de seu pai, Zé
Felipe, não concordar com tais separações, ela assim procedeu por várias vezes.
E Chega
Lampião!!!
Em uma dessas separações, já se indo alguns dias, mais ou menos quinze dias de Maria estar na casa de Déa, sua mãe, ela, por um acaso conhece o “Rei dos Cangaceiros”. Achamos, particularmente, que num ímpeto, Maria deixa aflorar seu ego, e permitiu que se falasse o cupido. Tanto Maria, quanto Lampião sente alguma coisa dentro deles de cara. A atração foi dupla e contagiante. Lampião, que tanto fez arapuca, tanta emboscada aprontou, caiu de quatro pela armadilha que o destino lhe fez. A morena da Malhada da Caiçara acabou de domar uma fera nascida e criada na região pernambucana do Pajeú das Flores. Não podendo mais esconder sua paixão, Lampião inventa de inventar uma encomenda, vários bordados em lenços de seda, simplesmente para ter a desculpa, de vindo ver se tinha algum lenço pronto, vir mesmo era Maria. Sabedora dos planos de Virgolino, Maria, logicamente aceita a encomenda e trata de, também, curtir aqueles raros momentos.
“(…) Era uma
sexta-feira, Lampião pisou o batente da casa de Zé Felipe e Maria Déa. Odilon
Café apresentou ao cangaceiro uma das filhas daquele casal, que no momento se
encontrava ali, por estar separada do marido.
Novos sentimentos renasceram naqueles minutos seguintes. Depois de uma rápida conversa, lampião pergunta a Maria:
Novos sentimentos renasceram naqueles minutos seguintes. Depois de uma rápida conversa, lampião pergunta a Maria:
– Você sabe bordar?
– Sei!
– Vou deixa uns lenços pra você bordar e volto daqui a duas semanas pra buscar!
Este foi o primeiro diálogo realizado entre Lampião e aquela que seria a sua grande companheira e eterna paixão, até o fim da vida (…).” (Ob. Ct.)
A partir de determinado tempo, ou de um dos encontros entre eles, não teve mais
volta. O pai de Maria Gomes, Zé Felipe, não aprovava o namora entre ela e
Lampião. Já por outro lado, sua mãe, Maria Déa, parece que até ‘cortar jaca’,
cortou, para que eles se encontrassem.
Violência
Policial Contra A Família De Maria Bonita
Naquele tempo,
a casa que recebesse com maior constância visita de cangaceiro, com toda
certeza, logo, logo receberia a visita de alguma das volantes que caçavam os
grupos. Então, rastejando os vestígios dos cangaceiros, as volantes terminaram
fazendo, também, várias ‘visitas’ a casa da fazenda do pai de Maria Gomes, Zé
Felipe. Com o aperto que deram no velho patriarca, cacete nele e sua família,
até Zé de Neném foi pra debaixo da madeira, Zé Felipe resolve mandar sua filha
para casa de um parente na fazenda Malhada, nas Alagoas. Para que assim, as
volantes os deixassem em paz. Ao saber disso Lampião vai e dá um ultimato para
Zé Felipe, ou ele manda buscar sua filha em terras alagoanas ou ele destrói a
fazenda com tudo que nela existia. Sem ter, novamente, uma saída, Zé Felipe
manda alguém buscar Maria, sua filha.
Maria Bonita – Fonte – blogs.ne10.uol.com.br
Ao retornar, Maria Gomes percebe o
quanto sua família estava envolvida numa encrenca desgraçada por seu romance
com o ‘Rei do Cangaço’. Nesse momento, ela toma uma decisão importante que
mudaria a vida de muita gente, principalmente a do pernambucano fora-da-Lei,
para que a Força Pública deixasse seus familiares em paz. Quanto da localidade
de onde Maria Gomes resolvera seguir com Lampião, não fora na fazenda onde
nascera, a Malhada da Caiçara, e sim, numa outra localidade, onde cuidava de
sua avó materna, Ana Maria, que estava enferma, denominada Rio do Sal.
Ao contrário do que pensou, planejou Maria de Déa, a Força Pública não se afastou da casa de seus familiares, pelo contrário, as visitas tornaram-se mais constantes e violentas, tendo como alvo principal o velho Zé Felipe, seu pai.
Estando já a
não aguentar mais tanta pressão e cacete, Zé Felipe recebe a visita de um dos
soldados da volante, que era seu amigo Antônio Calunga, dizendo-lhe que o
comandante da volante recebera ordens superioras de acabar totalmente com a
fazenda Malhada da Caiçara, matando todos que naquela ribeira moravam.
Zé Felipe, pai de Maria Bonita.
Zé Felipe agradece ao amigo, junta sua família,
desce rumo às águas do “Velho Chico” aluga uma embarcação, coloca todos dentro
e passa para o solo alagoano. Vai montar residência no sítio chamado ‘Salgado’,
no município de Água Branca. Porém, sua estada nele é curta. Pega suas trouxas
novamente, levanta acampamento, junta seus familiares e parte rumo ao local
denominado ‘Salomé’, o qual, hoje é a cidade de São Sebastião.
Nessa agonia, tendo de deixar suas terras por serem perseguidos e maltratados, constantemente, pela volante, um de seus filhos, conhecido como Zé de Déa, resolve juntar-se ao cunhado, Lampião. Lá estando, conta por tudo que seu pai, sua mãe, seus irmãos e irmãs passam. Lampião ordena que se façam as vestes, bornais, cartucheiras, em fim, toda a tralha de um cangaceiro para seu ‘cunhado’, e separar-se, também, as armas para o mesmo usar. No entanto, Maria sua irmã, não permite que ele use armas. Mesmo estando por mais ou menos oito dias no acampamento, Zé de Déa e sempre aconselhado pela irmã para não fazer parte daquela vida em que ela metera-se. Termina o irmão por ceder aos conselhos da irmã.
Nessa agonia, tendo de deixar suas terras por serem perseguidos e maltratados, constantemente, pela volante, um de seus filhos, conhecido como Zé de Déa, resolve juntar-se ao cunhado, Lampião. Lá estando, conta por tudo que seu pai, sua mãe, seus irmãos e irmãs passam. Lampião ordena que se façam as vestes, bornais, cartucheiras, em fim, toda a tralha de um cangaceiro para seu ‘cunhado’, e separar-se, também, as armas para o mesmo usar. No entanto, Maria sua irmã, não permite que ele use armas. Mesmo estando por mais ou menos oito dias no acampamento, Zé de Déa e sempre aconselhado pela irmã para não fazer parte daquela vida em que ela metera-se. Termina o irmão por ceder aos conselhos da irmã.
O “Rei dos Cangaceiros”, através da sua malha de informantes, sabe da fuga do sogro e sua família, assim como tem o conhecimento da ordem e do nome do policial comandante incumbido da tarefa de matar toda a família de Maria, sua amada, que seria o tenente Liberato de Carvalho.
Recado de
Capitão para Capitão…
Maria Bonita cangaceira
Certo dia chega à casa onde moravam Zé Felipe e sua família, uma volante
policial. Começam a destruir as coisas, matam alguns animais que estavam
soltos, mas, próximos a casa. Sem ninguém da família na casa para saciar a ira
dos volantes, sobra para um morador das redondezas, que seria, segundo
indicaram, um coiteiro, o qual é colocado debaixo de cacete e depois
assassinado pela tropa.
“(…) Uma
volante visitou a casa de Zé Felipe e não encontrando ninguém, quebraram as
madeiras dos currais, destelharam e quebraram parte do telhado da residência,
matando alguns animais. Menos sorte teve o coiteiro Manuel Pereira, conhecido
como Manuel Tabó, que por não ter fugido acabou sendo espancado e morto pelos
soldados (…).” (Ob. Ct.)
Lampião,
sempre ardiloso, sabia que partir para enfrentar de cara a volante, indo a
desforra, pelo que fizera nas terras da Malhada da Caiçara, usa de outra
artimanha. Ordena a um de seus ‘cabras’’ que vá em determinado lugar, e peça a
determinada pessoa para vir vê-lo. Essa pessoa já havia, em outras
oportunidades, feito o mesmo que ele o enviaria para que fizesse.
Essa pessoa
era conhecida pelo apelido de Tonico, e era irmão de Zé de Neném, ex marido de
sua companheira Maria de Déa.
Atual Delegacia de Polícia Civil de Jeremoabo, o antigo aquartelamento dos
tempos do Cangaço – Fonte – Rostand Medeiros
Lampião escreveu uma missiva e
determina que o jovem a leve ao Capitão João Miguel, em Jeremoabo, BA. Assim, o
jovem após dar voltas e ter a certeza de não estar sendo seguido, parte rumo ao
destino determinado. Lá chegando, procura o oficial no QG.
“(…) Tonico
seguiu em direção ao quartel, sendo recebido por um sargento que fazia a
guarnição e lhe perguntou:
- O sinhô qué fala cum quem?
- Com o Capitão João Miguel!
- Eu posso resolver?
-Não, tem que ser com o Capitão!
O sargento foi até a sala do capitão, retornou alguns minutos depois e pediu para que Tonico o seguisse até a sala do oficial (…).” (Ob. Ct.)
Tonico era
frio, Lampião sabia escolher a pessoa certa para cada missão específica. E essa
era bem difícil de ser cumprida, pois tinha que o colaborador entrar em um
quartel militar. Chegando diante do capitão, esse dispensa o sargento e recebe
o papel que lhe é entregue pelo portador.
“(…) O Capitão
João Miguel, depois que leu o bilhete, falou: “Se você está numa missa dessa,
não é preciso pedir segredo, pois você deve ser da confiança de Lampião”.
Os dois
conversaram secretamente, trancados dentro da saleta. O Capitão João Miguel
mandou a resposta: diga ao Capitão que pode mandar o sogro dele voltar, pois a
partir de hoje não passará mais nenhum soldado na sua porta. Na
manhã seguinte, ao despertar, Tonico regressou da sua missão, trazendo consigo,
a promessa positiva de que nenhuma volante iria mais importunar aquele pedaço
de chão e sua gente V…).” (Ob. Ct.)
Vejam que Virgolino não só sabia manejar as alavancas das armas que usou, mas, também, com tinta, pena e papel, fazia suas defesas diante de uma guerra particular, imposta por ele mesmo, contra seus inimigos.
Uma das coisas
que mais ocorreu no cangaço foi à traição, tanto do lado dos cangaceiros e
coiteiros, como mesmo do lado daqueles que os davam combates. E essas atitudes,
tomadas por dinheiro ou ‘favores’, foram mais um motivo para que Lampião
prolongasse por quase vinte longos anos, seu reinado de sangue, lágrimas e
mortes nas entranhas do sertão nordestino.
Fonte “A
trajetória guerreira de Maria Bonita – A Rainha do Cangaço” – LIMA, João de
Sousa. 2ª Edição. Paulo Afonso, BA, 2011. Foto Ob. Ct. Benjamin
Abrahão
http://lampiaoaceso.blogspot.com/2018/05/casos-de-familia.html
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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