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terça-feira, 23 de março de 2021

O PADRE CÍCERO E O BANDITISMO DO NORDESTE - A República (PR) - 24/01/1930

Por Anderson Magalhães

De tempos em tempos, sempre que o país se agita numa questão política de interesse geral, o banditismo no Norte recrudesce. É o que está acontecendo ainda agora. Neste momento, Lampião, nos sertões de Sergipe e da Bahia, alarma as populações pacatas com os seus bandos sinistros.

O presidente João Pessoa, da Paraíba, entrevistado aqui sobre o assunto, declarou que os culpados principais pelo banditismo do Nordeste eram os governadores dos Estados encravados naquela região. Ele, João Pessoa, tinha querido pôr cobro a atividade dos bandoleiros, mas não havia encontrado quem o ajudasse nessa obra de patriotismo. Uma ação conjunta de vários chefes dos Estados, vem cujos territórios os criminosos de quando em quando se instalavam, era o único meio de acabar os salteadores; infelizmente, porém, nenhum dos governadores do Nordeste, além dele, interessava-se sinceramente pelo extermínio dos Lampiões et caterva.

O Sr. Juvenal Lamartine*, do Rio Grande do Norte, imediatamente formulou o seu protesto e o jornalista Matos Ibiapina, numa interessante palestra com o Correio da Manhã, procurou defender o Sr. Matos Peixoto, do Ceará, cuja administração não tem sido perturbada, como fora a do seu antecessor, pelos assaltos dos bandidos à propriedade alheia.

A parte mais curiosa, porém, da entrevista do Sr. Matos Ibiapina* é aquela em que ele se mostra disposto a repor a verdade sobre o padre Cícero. Esse sacerdote é visto pelo sul do país como um protetor de criminosos. Falando a esse respeito, disse aquele jornalista cearense: – “Devo esclarecer esse ponto. O patriarca de Juazeiro é o cidadão de maior prestígio pessoal deste país. Em todos os sertões do Nordeste, e até mesmo nos da Bahia, Goiás e Mato Grosso, a sua palavra é acatada como a de um oráculo, sendo de notar que onde ele tem mesmo força sobre os mesmos é no Ceará.

O modo porque conquistou as simpatias da população sertaneja é demasiado complexo para ser estudado em uma ligeira entrevista, mas o fundamento da enorme ascendência que aquele sacerdote exerce sobre a alma simples do sertanejo é a sua proverbial bondade.

O padre Cícero recebe, em Juazeiro, o bandido mais terrível, pelos mesmos motivos porque acolhe o político perseguido ou a decaída que recorre a seus conselhos.

Vou citar-lhe um fato, que esclarece a mentalidade do fanático e fanatizador de Juazeiro. Estávamos o padre Cícero, o ex-presidente desembargador Moreira e eu, em Juazeiro, e, provocada por mim, a palestra se orientou sobre a maneira de combater o banditismo.

O padre, que é um grande causer, tomou a palavra e começou a discorrer sobre o problema.

De entrada, manifestou a sua divergência dos pontos de vista dos governos.

Disse que os mais célebres bandidos eram vítimas das injustiças ambientes.

Geralmente, o seu primeiro crime era um ato de reação contra violências das polícias ou dos elementos políticos protegidos pelos governos.

Vendo inúteis os seus esforços para obter reparação dentro da lei, eles, porque eram fortes resolviam fazer justiça por suas mãos.

Praticado o primeiro crime, tudo o mais era consequência do movimento inicial.

Perseguidos, eles reagiam, a princípio individualmente e depois reunidos em grupo.

Os roubos, os assassínios, que se sucediam a esse passo, eram impostos pelas necessidades de defesa.

Eles são vítimas do meio.

E acrescentava:

“Quando eles me procuram nas suas aperturas, eu os mando para Goiás, recomendando-os a amigos que ali possuo. Ao abrigo das perseguições policiais, os bandoleiros compreendem que a vida honesta é menos trabalhosa e dedicam-se à profissão de criadores, logrando, frequentemente, fazer fortuna”.

Nessas palavras do padre Cícero está a psicologia do banditismo nordestino.

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