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segunda-feira, 30 de outubro de 2017

RENASCIMENTO DO SERTÃO

Por Luiz Otavio Cavalcanti

O que é capaz de juntar Portinari, José Lins do Rego, Glauber Rocha e Ariano Suassuna? E mais o cinzento da caatinga e o colorido da cidade?

Ao longo do tempo, consolidou-se o cangaço, como insubmissão social. E praticou-se imprevisível aliança politica entre cangaço e setores da elite rural. Na pratica, aliança do arcaico contra o moderno, do mundo sertanejo contra o universo litorâneo. Da crendice do império contra a República anti religiosa.


O cangaço foi fato social e político que passou pelas páginas policiais. E, um século depois, virou moda, vestuário, passarela, comércio, tema. Símbolo e inspiração. Os insurgentes deixaram de ser bandidos para serem modelos temáticos de designers e estilistas de moda.

O temor a Lampião, Corisco, Jitirana, Mourão, Sereno, virou marca de roupa. O que era pipoco de arma virou faturamento. O binário tac tac do winchester transformou-se em dígito de calculadora. O quaternário prá prá prá prá da Mauser corporificou-se em nota fiscal. Há inimaginável precedente: Lampião usava perfume Fleurs d’Amour, de Roger Gallet. Tomava uísque White Horse. E vestia lenço de pura seda.

Os bordados dos embornais formavam profusão de cores: amarelo sobre azul, azul claro sobre azul escuro, vermelho sobre roxo, cromatismo vivo sobre o cáqui. Cores sobre o cinzento da caatingare. Floral sobre o mandacaru. Carnaval oculto nas dobras de tecidos. O embornal de Maria Bonita era um arco íris bordado cuidadosamente a duas linha, pelo próprio Lampião, tinha monograma e botões em casas embutidas.

E o punhal? Onipresente na cintura, na luta e nas fotografias?

João Cabral de Melo Neto o descreve muito bem:

“Esse punhal do Pajeú, faca de ponta só ponta, nada possui de peixeira, ela é esguia e lacônica. Se a peixeira corta e conta, o punhal do Pajeú, reto, quase mais bala que faca, fala em objeto direto”.

O cangaço tornou-se referência, mesmo arcaico. Mas foi além do meramente popular. Porque incorporou, na fonética do poder, o tom do fazendeiro. E mais: enraizou-se no inconsciente coletivo do nordestino. Virou marca, símbolo atemporal. Mostrou orgulho. E exibiu a estética própria da insurgência.

O cangaço nunca foi utopia. Não tinha doutrina política. Nem ideologia. Não bancava projeto de poder. Exercia certo naturalismo social. Não se ocupava do futuro, não tinha plano nem programa de ação.

E, não mais que de repente, no ocaso do século 20, na esquina do devir tecnológico, mais que lógico, ressurgem o cangaço, renasce o sertão. Vem macio como a roupa que vestimos. É completamente soft como o silente reino virtual. Está nas páginas das revistas, é fashion. O cangaço agora é roupa, moda, software, designe, estilo. Sem deixar de ser o que sempre foi. Marca de uma região, símbolo de insubmissão, signo de cultura, cor que ressalta, sal que tempera.

Ora viva ! O cangaço não é mais perseguido, é exaltado. Não é mais Proscrito, é declarado. Sua beleza não é mais oculta, avulta, cresce. Não é mais lua noturna, É sol, quente, forte, escol. Saiu da caatinga. Foi parar nas passarelas.

Fonte: Revista Algomais

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