por Ana
Clara Brant jornalismo@uai.com.br
por Estado
de Minas politica.pe@dabr.com.br
Virgulino
Ferreira da Silva, o Lampião, morreu aos 40 anos, numa emboscada na Grota de Angico,
em Sergipe, em julho de 1938. Apesar de, na época, o fato ter estampado as
capas das principais revistas e jornais brasileiros e ter virado notícia até
fora do país, algumas lacunas permaneceram. A principal delas: quem apertou o
gatilho que deu fim à vida de uma das figuras mais temidas e admiradas da
história brasileira?.
A versão
oficial aponta como assassino o oficial Antonio Honorato da Silva,
guarda-costas do aspirante Francisco Ferreira. Mas a história não é bem essa.
Após quatro décadas de pesquisa, o historiador Frederico Pernambucano de Mello,
biógrafo de Lampião e considerado o maior especialista em cangaço no Brasil,
revela que a identidade do carrasco do cangaceiro é outra em 'Apagando o
Lampião – Vida e morte do Rei do Cangaço'. O livro acaba de sair pela Global
Editora.
Antonio Honorato da Silva suposto matador de Lampião
Lampião foi
morto com apenas um tiro, às 5h de 28 de julho de 1938. Desde os primórdios de
suas pesquisas sobre o cangaço, e, principalmente, após ler uma entrevista
concedida por Antonio Honorato da Silva, o suposto assassino, ao jornalista
Melchiades Rocha, Frederico Pernambucano de Mello tinha uma pulga atrás da
orelha. “Nesse relato de Honorato, encontrei algumas inconsistências. Ele
afirmava que Lampião tinha um pavor enorme no rosto quando atirou, que deu o
primeiro tiro e acompanhou a queda. Coisas que não faziam muito sentido”, diz.
Coronel Audálio Tenório de Albuquerque - Acervo João de Sousa Lima
Foi a partir
de 1970 que o mistério começou a se esclarecer. O historiador recebeu uma
informação do coronel Audálio Tenório de Albuquerque dizendo que ouviu seu
parente e amigo próximo, o coronel José Lucena de Albuquerque Maranhão (o
responsável intelectual pela morte do Rei do Cangaço, já que comandava o
batalhão encarregado da caça a Lampião em Angicos), que o verdadeiro assassino
era um dos guarda-costas do aspirante Francisco Ferreira de Mello, mas não
Honorato, como a imprensa havia divulgado.
Coronel José Lucena de Albuquerque Maranhão
“Eu achava que
ele tinha uns oito, dez guarda-costas, por isso desanimei. Mas, em 1978, ao ter
contato com uma das irmãs do aspirante, ela me disse que ele tinha apenas dois.
Um era velho, o Honorato, e o outro era mais novo e ficou conhecido como
Santo”, diz o historiador.
Frederico
conseguiu encontrar o cabo que se chamava Sebastião Vieira Sandes. Durante
muito tempo, tentou, em vão, arrancar alguma informação. Só no fim de 2003,
quando se descobriu portador de uma doença terminal, Sandes procurou o
biógrafo. Decidiu que havia segredos que ele não queria levar para o túmulo.
“Fiquei até emocionado. Fazia mais de 20 anos que estava atrás dele. Minha
mulher achou, na ocasião, que era uma emboscada. Ele me deu um relato precioso,
que gravei durante quatro dias. Morreu um mês depois”, lembra o historiador.
Historiador Frederico Pernambucano de Melo
Segundo
Sebastião Sandes, Lampião morreu com um tiro só de fuzil, disparado a oito
metros e que não estava em combate. A bala bateu na lâmina do punhal do
cangaceiro e atingiu sua região umbilical esquerda. “Lampião foi surpreendido,
pois esperava ser atacado por terra e não pelo rio, como aconteceu. Sandes me
disse que o silêncio era de uma catedral, porque era começo da manhã. Havia
chovido e até os animais estavam recolhidos. A maneira como atirou, de cima
para baixo, ao contrário do que afirmava Honorato, foi comprovada pela perícia
feita recentemente pelo perito criminal federal Eduardo Makoto Sato, do
Instituto Nacional de Criminalística. O punhal de Lampião, que foi atingido,
nunca havia sido analisado”, afirma.
O mais curioso
é que, no passado, Sandes chegou a ser amigo e querido por Lampião e Maria
Bonita. Eles o chamavam de Galeguinho, por ser bem claro. “Sandes foi coiteiro
(pessoas que ajudavam os cangaceiros, dando-lhes abrigo, comida e informações)
de Lampião na região de Alagoas e companheiro de costura dele. Lampião era um
exímio costureiro de couro, de pano, bordava. Quando Sandes me deu o
depoimento, ele estava, inclusive, com o olhar baixo, até um pouco emotivo,
porque eles foram próximos”, diz.
Ele não quis
assumir a autoria do crime para evitar represálias. Quando matou Lampião,
Sandes estava com apenas 22 anos. “Internamente, sabiam que foi ele, que chegou
a ser promovido. Porém, ele foi aconselhado a não se revelar, porque Lampião
era muito poderoso. Tanto que Honorato apareceu morto, em 1968, logo após
estampar uma edição da revista Fatos & Fotos gabando-se de seu feito. Era a
chamada vingança de Lampião.”
MINAS
Além da
revelação sobre o assassino de Lampião, o livro de Pernambucano traz também um
fato pouco conhecido sobre o Rei do Cangaço. Lampião tomaria o rumo de Minas
Gerais, caso não tivesse sido surpreendido em Sergipe. “Nós vamos roubar no
estado de Minas Gerais. O negócio lá vai ser pesado. Quem quiser ir, vai. Quem
não quiser, fica. Estou fechando minhas contas por aqui e cuidando de ajuntar
cem homens.” Foram essas as palavras de Lampião a Manoel Félix, um dos seus
coiteiros.
Maria Bonita e Lampião - Arte colorida pelo professor e pesquisador do cangaço Rubens Antonio
“Minas foi um
sonho perdido de Lampião e Maria Bonita. Não tenho dúvidas. Antes dele, outros
cangaceiros, que já não tinham mais espaço no Nordeste, pois levavam bala em
todo canto, tinham encontrado no território mineiro a solução”, explica o
historiador.
Um deles foi
Sinhô Pereira, o mais reconhecido professor de cangaço do jovem Virgulino. Após
rodar por vários lugares, como Goiás, ele acabou aportando no município de
Santo Antônio de Patos, hoje Patos de Minas, no Noroeste do estado. Por aqui, o
forasteiro adotou vários nomes e acabou tendo como protetor um dos chefes
políticos mais poderosos da região, Farnese Dias Maciel, irmão do governador
Olegário Maciel.
“Aproveitando
a vastidão do Oeste mineiro e as dificuldades de comunicação na região, que não
só prejudicavam o desenvolvimento econômico, como facilitavam se manter
escondido, Sinhô manda uma carta para Lampião, chamando-o para vir a Minas. Não
dá para precisar quando foi, mas, provavelmente, pelos idos de 1928”, afirma o
historiador, que teve como uma de suas principais fontes a escritora Risoleta
Maciel Brandão, filha de Farnese e já falecida.
O interesse de
Farnese em receber Lampião e seu bando tinha relação com a briga política que
os Maciel travavam com outro clã importante da região, os Borges. Segundo
Frederico Pernambucano, a carta animou Lampião, apesar de ele não ter
respondido. Como boa parte do sertão nordestino estava se fechando para ele, a
solução temporária foi se embrenhar pela Bahia e Sergipe. “Ele conseguiu ficar
ali mais uns 10 anos. Mas, como o cerco foi apertando, ele vislumbrava Minas
Gerais. Tanto que começou a juntar um montante absurdo de dinheiro, a cobrar e
a resgatar o que estavam lhe devendo. Tinha um arsenal de munição gigantesca e
estava atrás até de uma metralhadora de mão, que provavelmente levaria para Minas.
Ele estava indo para a guerra”, afirma.
O pesquisador
diz que Virgulino Ferreira chegou a comentar com vários cangaceiros e coiteiros
sobre seu desejo de seguir para Minas Gerais. Tanto é que, após a sua
morte, alguns vieram para cá, como Moreno e a mulher, Durvalina, a Durvinha.
“Moreno morreu em Contagem, em 2010, com 101 anos. Assim como Sinhô, ele é a
prova de que o sonho mineiro de Lampião não passou de miragem. Não tenho a
pretensão de esgotar o assunto. Longe disso. Quem sabe essa história do cangaço
com Minas não renda e seja aprimorada e aprofundada por historiadores locais?”,
diz.
Frederico
Pernambucano de Mello acha que os avanços de seu livro são um incentivo para
jovens pesquisadores. “Uma pesquisa bem conduzida e concluída proporciona todos
os tipos de sentimento. Emoção, apreensão, recompensa. Mais do que empenho e
entrega, tem que ter fé.”
Apagando o
Lampião – Vida e morte do Rei do Cangaço
Frederico
Pernambucano de Mello
Global
Editora
336
págs.
sugerido: R$
55
Adquira com o professor Pereira através deste e-mail: franpelima@bol.com.br
http://www.diariodepernambuco.com.br/app/noticia/viver/2019/01/16/internas_viver,773944/amp.html?__twitter_impression=true&fbclid=IwAR1QYC8Mg_BEhBmPLhsTBqO1OokCyhrEeUCnUlmCCRVnkB4IBuIKJ1XEKpA
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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