Por Maria do
Carmo Andrade
Francisco
Heráclio do Rêgo, filho de João Heráclio Rêgo (Pai Laquinho) e Josefa Duarte do
Rêgo (Mãe Zefinha) nasceu no dia 3 de outubro de 1885, no município de Bom
Jardim, Pernambuco.
Teve onze
irmãos: Basílio, Antonio, Jerônimo, José, Maria (conhecida por Mã), Josefa
(conhecida por Josefina), Isaura, Josefa (chamada de Finha para distinguir da
outra Josefa), Amália, Dorotéia e outra Maria.
Francisco
nasceu na propriedade do velho Joca da Salina, seu avô. Posteriormente seus
pais se estabeleceram na Fazenda Vertentes, no mesmo município de Bom Jardim,
onde permaneceram até o final da vida, ficando este local conhecido como
“Vertentes do Heráclio”.
Os pais de
Francisco, com sacrifício colocaram todos os filhos, para estudar no Recife,
com exceção de Basílio que já havia casado. As filhas estudaram internas no
Colégio das Damas da Irmandade Cristã, aprenderam a tocar piano e concluíram o
curso pedagógico; Antonio e José concluíram o curso secundário no Recife e se
formaram em Medicina no Rio de Janeiro; Jerônimo concluiu o equivalente ao
curso científico e abandonou os estudos e Chico mal fez o curso primário e
voltou para junto dos pais.
Acostumado com
a vida do campo, não se adaptou à vida da cidade grande. Pegou a maxambomba
(trem) e voltou para a Fazenda Vertentes, onde se tornou o braço direito do
pai.
Para poupar
seu pai, Chico ia sempre a Limoeiro fazer as compras a cavalo. Numa dessas
viagens, na volta, parou em Bom Jardim e deparou-se com um homem que estava
vendendo, por baixo preço, doze garrotes magros. Como não tinha dinheiro,
providenciou um empréstimo com Silvio Mota, velho conhecido de seu pai,
residente em Bom Jardim.
Quando chegou
na Fazenda Vertentes trazendo os animais magros, o pai quis saber de quem era
aquela boiada e ele contou os detalhes do seu empreendimento. Três meses
depois, os animais já bem nutridos foram vendidos por mais de três vezes do
valor comprado. Chico pagou o empréstimo a Silvio Mota e daí em diante não
faltou mais dinheiro em seu bolso.
Francisco
Heráclio do Rêgo casou três vezes. A primeira, com D. Maria Miguel, no
religioso (na época não havia união com efeito civil) que logo morreu e não lhe
deixou filhos. A segunda, com D. Virgínia, com quem casou na igreja e
posteriormente no civil, dando-lhe quatro filhos: Heráclio Moraes do Rêgo,
Francisco de Moraes Heráclio, Luiz (que morreu ainda jovem) e José de Moraes
Heráclio. O terceiro casamento, só no religioso, foi com D. Consuelo, que lhe
deu um filho – Francisco Heráclio do Rêgo Filho.
Fora estes, Francisco Heráclio do Rêgo ainda teve mais sete filhos fora do
casamento: Josefa (Lulito), Walter, José Francisco (Zé Pequeno), Severina,
Gerson Alexandre, Reginaldo (Pequeno) e Reginaldo (Meninão). A todos estes foi
reconhecida a paternidade, para efeito de habilitação no inventário.
Estava com 18
anos quando durante suas viagens para Limoeiro conheceu a jovem Maria Miguel
por quem se apaixonou e casou, porém a mulher adoeceu de febre amarela e morreu
ainda na lua-de-mel. Chico ficou muito deprimido e voltou para Vertentes do
Heráclio. O pai, para animá-lo, presenteou-o com uma vaca leiteira que, com os
cuidados de Chico, logo aumentou a produção de leite e, conseqüentemente, a de
queijo e de manteiga.
Quando chegou
o inverno de 1907, Chico Heráclio decidiu voltar para Limoeiro. Levou consigo
Manoel Mariano (seu fiel ajudante), duas vacas e algum dinheiro no bolso.
Chegando no Cumbe, arrendou um roçado do Dr. Severino Pinheiro, que era um
político de prestígio, rico fazendeiro e poderoso comerciante de Limoeiro.
O ano foi bom
para Francisco. Choveu quando necessário e fez sol na época certa,
possibilitando a colheita de milho, feijão, fava e algodão em abundância.
Durante as entressafras, ele saía a cavalo pelos engenhos da redondeza,
comprando e vendendo gado, cavalos, burros e, principalmente, ferro-velho,
tachos, caldeiras, tubulações, maquinário imprestável.
Francisco
tinha um primo, Pompílio, que participava de alguns de seus negócios,
emprestando dinheiro e apresentando-o aos senhores de engenho de Nazaré,
Aliança, Carpina e Vale do Sirigi, garantindo por ele e arranjando-lhe bons
negócios, muito contribuindo para sua ascensão social.
Por outro
lado, o homem forte de Limoeiro, Dr. Pinheiro, dava total cobertura a Francisco
na região mais agreste, junto a fazendeiros e comerciantes. Já se comentava
àquela altura, nas altas rodas da Capital, da existência de Chico Heráclio.
Chico sempre
vinha ao Recife vender o ferro-velho aos atacadistas. A sucata era transportada
de trem e o carrego era efetuado nas estações de Carpina e Limoeiro. Eram os
tempos da Great Western. Na capital, sempre almoçava com Pompílio e outros
comerciantes de prestígio, no Restaurante Leite.
Durante sua
viuvez, quando estava na Fazenda Vertentes em companhia dos pais, Chico
Heráclio se absteve de aventuras amorosas, em respeito à memória de Maria
Miguel. Porém, quando voltou a Limoeiro começou a ter relacionamentos e
conquistas amorosas. Nas suas andanças pelos engenhos de Nazaré da Mata, Chico
Heráclio conheceu Virgínia, moça fina e recatada, filha dos proprietários do
Engenho Pagi e sobrinha de Herculano Bandeira, então Governador de Pernambuco.
Francisco
Heráclio do Rêgo casou pela segunda vez, em 1911, com D. Virgínia Moraes. Na
cerimônia esteve presente a alta sociedade pernambucana, inclusive o
Governador, padrinho da noiva. O casal fixou residência em Limoeiro, num
pequeno sítio que Chico Heráclio tinha adquirido no Cumbe.
D. Virgínia,
chamada de D. Santa, era mãe extraordinária e uma esposa dedicada, o que muito
contribuiu para a escalada do marido ao poder.
Por essa
época, seu irmão Jerônimo adquiriu uma propriedade ao lado de Francisco, em
Campo Grande. Os irmãos já possuíam fama de valentes, o que aumentou ainda mais
com essa proximidade.
Francisco
Heráclio começou a fazer política apoiado por Dr. Severino Pinheiro, que havia
sido eleito senador por Pernambuco. Jerônimo Heráclio também tornou-se político
em Surubim e Vertentosa.
Na década de
1920, o mundo passava por uma grave crise financeira. Para Chico, entretanto,
não houve crise. Adquiriu por 90 contos de réis a patente de Coronel da Guarda
Nacional. Jerônimo Heráclio comprou a de Capitão, mas era chamado também de
Coronel.
Em 1922, foi
eleito Prefeito de Limoeiro, apoiado por Dr. Severino Pinheiro e por Estácio
Coimbra, que seria eleito Governador de Pernambuco em 1926, ficando à frente da
administração do estado até 1930.
Em 1924, Chico
Heráclio comprou a Fazenda Varjadas, que lhe valeu o título de “Leão das
Varjadas”. Comprou também os Engenhos São Roque e Santa Cruz.
Em 1930, o
presidente da nação era Washington Luiz, que lançou como candidato à sua
sucessão Júlio Prestes. Houve o pleito, Júlio Prestes ganhou, mas a oposição
alegou fraude nas eleições. A confusão começou e a agitação tomou conta do
País. A situação piorou quando, em julho, o candidato a Vice-Presidência, João
Pessoa, foi assassinado.
Em outubro
eclodiu o movimento armado que depôs o Presidente Washinton Luiz. O chefe do
movimento vitorioso foi Getúlio Vargas, que havia perdido nas urnas, mas ganhou
pelas armas o poder, passando a chefiar a nação até 1934, sem que houvesse uma
Constituição.
Foram nomeados
interventores para os estados. Para Pernambuco foi nomeado Carlos de Lima
Cavalcanti, que começou a perseguir os partidários do presidente deposto. Dr.
Pinheiro, em Limoeiro, começou a sentir os efeitos dos atos do Interventor.
Chico Heráclio, na qualidade de braço direito dele, também foi pressionado.
Com a doença
do líder político de Limoeiro, Chico Heráclio assumiu o comando e enfrentou
Carlos de Lima. Foi um período difícil.
Quando entrou
em vigor a Segunda Constituição da República, promulgada nesse mesmo ano de
1934, a situação melhorou para o lado do Coronel Chico Heráclio.
Em novembro de
1937, Vargas revogou a Constituição e declarou a Carta do Estado Novo. Em
Pernambuco Carlos de Lima Cavalcanti foi substituído por Agamenon Magalhães.
Chico Heráclio
continuava sem poder, embora durante todo aquele período tivesse somado cada
vez mais prestígio junto aos limoeirenses e habitantes de municípios vizinhos.
Osvaldo Lima, compadre de Chico Heráclio e amigo pessoal de Agamenon, era quem interferia
pelo Coronel, dando boas referências do compadre e amenizando algumas
situações.
Para o período
pós-Estado Novo, começaram a ser definidos os chefes políticos dos municípios
pernambucanos. Com a saída de Getúlio Vargas, em outubro de 1945, Dr. José
Linhares ocupou a presidência; Agamenon Magalhães saiu da Interventoria em
Pernambuco e para seu lugar foi escolhido Etelvino Lins, depois substituído
pelo Dr. José Neves Filho; José Linhares presidiu as eleições para eleger os
Deputados Estaduais e Federais, os Senadores e o Presidente da República, que
aconteceram em dezembro de 1945.
Chico Heráclio
aproveitou o prestígio que desfrutava naquele momento e lançou seu filho mais
velho Heráclio, como candidato a Deputado Estadual e, a pedido do seu amigo Professor
Antônio Vilaça, apoiou Costa Porto para Deputado Federal, fazendo dobradinha
com o filho. Ambos foram eleitos.
Com a
redemocratização houve dissidência política na família Heráclio. Chico Heráclio
filiou-se ao Partido Social Democrático (PSD) e Jerônimo Heráclio a União
Democrática Nacional (UDN). Em Limoeiro, os Arruda, que faziam oposição a Chico
Heráclio, se filiaram a UDN e passaram a ser companheiros do partido de
Jerônimo Heráclio.
Os coronéis
tinham muito poder, os currais eleitorais eram fechados. A oposição ao PSD
ganhava na capital, mas a diferença era tirada quando as urnas do interior eram
apuradas.
Foi na década
de 1940 que Francisco Heráclio do Rêgo consolidou seu prestígio e prosperidade.
Cercou-se de pessoas inteligentes e de prestígio, passou a se relacionar com
mais assiduidade com os homens que detinham o poder em Pernambuco.
Por outro
lado, o patrimônio de Chico aumentou muito, comprou as Fazendas Carié (1941),
Serrinha e Grande (1942), Areias, Baixa Verde, Escuro eSanbra, onde residia e
perto de Cumarú comprou a fazenda Viração. Seu rebanho era formado por mais de
10.000 cabeças de gado. Na política, elegeu deputado o filho mais velho, e um
outro filho, prefeito, em 1947.
Era o caminho
para o apogeu de sua vida, em prestígio, dinheiro e poder, que se estendeu do
início da década de 1950,até 1960.
D. Virgínia
Heráclio morreu em 8 de março de 1949. Ao seu enterro compareceram as mais
altas autoridades do Estado. Em 1950, morreu Jerônimo Heráclio. Foram duas
perdas lamentáveis para o Coronel.
Durante sua
viuvez, Chico Heráclio atingiu o ápice do seu prestígio. O ponto culminante foi
o brinde com Agamenon Magalhães em 8 de abril de 1951, quando da inauguração da
água encanada em Limoeiro.
Chico
continuou em evidência por mais dez anos, quando então sua vida começou a
declinar.
Depois de dois
anos da morte de D. Virgínia, Chico Heráclio casou-se, em cerimônia religiosa
simples, com D. Consuelo Salva, uma viúva de 27 anos de idade, mãe de dois
filhos do casamento com Severino Salva.
O casamento
não deu certo e D. Consuelo saiu de casa levando o filho Francisco, com então
quatro anos de idade, o que foi motivo de muitos desentendimentos dela com o
Coronel.
Chico Heráclio
tinha muitos votos e muito prestígio, conseqüentemente podia prejudicar e
ajudar muita gente com sua influência. Além de tudo, era muito rico, podendo
acionar os mecanismos legais e arbitrários para atingir seus objetivos.
Possuía grande
presença de espírito, raciocínio rápido e uma resposta na “ponta da língua”
para cada situação. Era um homem determinado e de coragem. Nunca deixou de
cumprir o prometido.
Francisco
Heráclio do ego, coronel Chico Heráclio, o Leão das Varjadas, morreu no dia 17
de dezembro de 1974, com 89 anos de idade.
Diabético,
semiparalítico, com problemas no coração, não tremeu nem chorou, nem na hora
final.
Fonte:
Fundação Joaquim Nabuco
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