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terça-feira, 14 de outubro de 2014

Pavilhão Vitória - 05 de Outubro de 2014

Por Geraldo Maia do Nascimento

O padre Luís Ferreira da Cunha Mota foi o prefeito que mais tempo passou na administração do Município de Mossoró. Foram nove anos e três meses. A 16 de janeiro de 1936 foi nomeado pelo Dr. Rafael Fernandes para exercer o cargo de Prefeito do Município de Mossoró, permanecendo nessas funções até o começo de novembro do mesmo ano, quando foi convocado, na qualidade de 2º suplente, para ocupar a cadeira de Deputado na Assembleia Legislativa Estadual. Voltou a Mossoró e reassumiu a Prefeitura no dia 23 de dezembro do mesmo ano. Vitorioso nas eleições realizadas a 16 de março de 1937 (1.486 votos), tomou posse como Prefeito constitucional, a 7 de setembro do mesmo ano. Em virtude do golpe de 10 de novembro e implantação do “Estado Novo”, foi confirmado no cargo de Prefeito de Mossoró, por ato do Interventor Federal Dr. Rafael Fernandes, de 16 de dezembro de 1937, prestando compromisso legal de posse, perante o Dr. Juiz de Direito da Comarca, a 30 do mesmo mês e ano. A 5 de abril de 1945 renunciou definitivamente ao cargo e afastou-se da política.
               
Como gestor, procurou implantar melhoramentos tais que proporcionaram a cidade uma aparência moderna e alegre, com implantação de jardins nas praças Vigário Antônio Joaquim, da Independência, Rafael Fernandes e Ulrick Graf; remodelou os jardins das praças da Redenção e Rodolfo Fernandes. 


Nessa última, no centro do jardim, por volta dos anos 40, ergueu um majestoso pavilhão de cimento armado, de aspectos modernista, que chamou de Pavilhão Vitória, numa homenagem à vitória das nações aliadas sobre a Alemanha de Hitler. O Pavilhão tinha sobre o teto um simbólico V, de concreto, com mais ou menos um metro de altura. Tinha formato circular, sendo composto por duas salas fechadas e uma área aberta. Destinava-se a servir como bar, sorveteria e café. O seu primeiro arrendatário foi o senhor Severino Rodrigues, de Pernambuco, que na instalação tratou de implantar algumas modernidades como a geladeira. O Pavilhão Vitória oferecia serviços de bebidas geladas, café, doces e lanches, possuindo ainda seções de confeitaria e charutaria. Os outros arrendatários foram Antônio Jerônimo de Queiroz (mais conhecido por Seutônio), Jeremias Gurgel e Francisco Leonardo Nogueira (Chico Leonardo), dentre outros.
               
Foi por vários anos um agradável ponto de encontro de amigos para os bate-papos sobre qualquer assunto. Era o point da cidade. Todos os que se dirigiam ao cinema Pax para ver um filme ou retornavam de uma sessão cinematográfica ali reservavam algum tempo para um gostoso papo, sempre regado a um gostoso cafezinho.
               
Ao seu redor, pela manhã e a tarde, ficavam os engraxates, alguns bem tradicionais na cidade, com clientela fixa, numa época que era comum o uso de paletó e gravata, principalmente o branco, que amenizava o calor sem perder o estilo. Os sapatos, portanto, tinham que estar sempre polidos.
               
Na década de 60, em nome do progresso e da modernidade, demoliram o Pavilhão Vitória. O grande fotógrafo Manuelito Pereira legou para o futuro a imagem que ilustra este texto. Foi só o que restou de um recanto da cidade que marcou época e que ainda é lembrado por muitos que o frequentaram. 

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Há muito o que estudar sobre o fenômeno cangaço


Há muito o que estudar sobre o fenômeno cangaço. Citando um exemplo, por demais conhecido dos amigos, é a relação de Corisco e Dadá. Dadá, quando menina, tinha entre 12 e 13 anos de idade, foi arrancada do seio familiar, sequestrada por Corisco e, segundo os relatos, estuprada em cima de um lagedo, pedra muito grande. Pois bem, na sequência de suas existências, criou-se um elo muito forte entre eles. Corisco não fazia determinadas coisas que desagradassem a Dadá, como vemos no caso do massacre na Fazenda Patos, onde ela o enfrenta e consegue salvar duas crianças da morte certa, e as declarações de um cangaceiro dizendo que ele só fazia o que sua mulher queria ou mandava. Dadá defendeu ou salvou Corisco de morrer pelo fuzil do valente Torquato. Aconteceu aquilo que chamamos, ou os especialistas chamam, 'Síndrome de Estocolmo'?

O escritor José Bezerra Lima Irmão falou o seguinte ao pesquisador e escritor Sálvio Siqueira:


Sálvio Siqueira, você é de onde? Pernambuco? O seu "Siqueira" tem a ver com os Siqueira de Trinfo, Calumbi ou Afogados da Ingazeira?

Olha, amigo Sálvio, as considerações que você faz são decorrentes das coisas que os autores, repetindo-se uns aos outros, costumam dizer a respeito de Corisco e Dadá.

Estive em Salgado do Melão, Pariconha, Verdão, Serra da Jurema, Delmiro Gouveia... Posso assegurar que Dadá não foi "arrancada do seio de sua família. Dadá não foi "sequestrada" por Corisco. Dadá não foi estuprada em cima de um lajedo.

A história do sequestro e do estupro é resultante do que Dadá contou aos seus entrevistadores, já morando em Salvador, depois da derrocada do cangaço. Ela contava o que lhe interessava.

Os cangaceiros Corisco e Dadá

Dadá e Corisco tinham vários laços familiares. Certamente nas entrevistas ela omitiu seu parentesco com Corisco para esconder sua participação, mesmo que indireta, na morte do namorado, Cazuza, assassinado por Corisco. Seus parentes em Salgado do Melão afirmam que Dadá não era mais “moça” quando se juntou a Corisco.

Corisco e Dadá têm vários vínculos familiares. Dois tios de Dadá (Livino Ribeiro e Né Cunha) casaram com duas irmãs, tias de Corisco (Lina Quileto e Maria Quileto), irmãs de Firmina Quileto (mãe de Corisco). Corisco não se chamava Cristino Gomes da Silva Cleto, como dizem por aí. Não era "Cleto": era Quileto (apelido). Quileto era o apelido de um antepassado da família, chamado Anacleto.

O pai de Corisco não "morreu cedo", como dizem por aí. E o nome dele não era Manoel Gomes da Silva. Este era o marido de Firmina, mas não é pai de Corisco. Manoel Separou-se de Firmina e casou com Rosa Ribeiro, tia de Dadá. Já separada de Manoel, Firmina teve um relacionamento com um homem casado chamado José Francisco da Silva (Zé Peba), residente no Verdão, perto de Pariconha.

Dadá acompanhou Corisco por livre e espontânea vontade. Ela vivia recebendo presentes de Corisco. O próprio pai de Dadá ajudou-a a montar na garupa do cavalo de Corisco.

Nas entrevistas, Dadá contava seu sofrimento ao ser "sequestrada". Que sofrimento? Estava com o primo. Os cabras que acompanhavam Corisco eram todos primos.

Sofrimento mesmo quem passou foi o pai de Dadá, quando a polícia soube que sua filha estava amigada com um cangaceiro de Lampião. Mal uma volante saía de sua fazenda, chegava outra. O tenente Manoel Campos de Menezes, de Chorrochó, prendeu o pai dela e levou-o para a cadeia de Uauá. Como se não bastasse toda aquela humilhação, o velho ainda foi surrado: apanhou tanto que ficou inchado. A mãe de Dadá foi para Belém de São Francisco com os filhos pequenos a fim de pedir ajuda a um cidadão chamado Antônio Félix, que socorria os retirantes em épocas de secas. Chegou a pedir esmolas. Os filhos também.

O notável professor Estácio de Lima dedicou um subcapítulo de seu primoroso livro a Dadá, a Princesa do Cangaço. Porém, como o respeitável mestre se baseou no depoimento de Dadá, pouca coisa se aproveita, porque Dadá foi entrevistada numa fase em que ela não abria sua alma para ninguém, pois vivia assustada diante de todo tipo de perigo. Além disso, havia aspectos relativos a sua família que Dadá não conhecia, porque saíra de casa ainda menina. Dos irmãos, ela conhecia apenas os apelidos. Errou até o nome de sua mãe. Está errada também a data de seu nascimento (de acordo com seus documentos pessoais, Dadá nasceu em 1915, e não em 1914).

Dadá disse a Estácio que o seu namorado, Cazuza, era “filho de seu Jonas, homem trabalhador...”. Porém Cazuza não era filho de “seu Jonas”, mas sim de “dona Joana” – Joana Maria da Conceição –, esposa de Silvino José de Carvalho (conhecido como Silvino Maia), um grande proprietário de terras. Silvino e dona Joana tiveram os seguintes filhos: Cazuza (José), Benjamim, Cornélio, Feliciano (Ciano), Candinho e Gregório (todos tendo o sobrenome Silvino do Nascimento). Um filho de Feliciano viria a ser também cangaceiro – Pedro de Ciano, o famoso Calais.

Dadá mentiu a Estácio ao contar que seu namorado foi assassinado “Certa noite, numa festa, bastante bebida, animação, juventude, aconchegos...”, dizendo que dois rapazes se desentenderam, e Cazuza sucumbiu.Dadá não só omitiu a participação de Corisco no crime, mas ainda negou o fato. Estácio de Lima perguntou: “Mas Dadá, Curisco matou, ou não matou, seu namorado Cazuza?” E Dadá respondeu: “Já disse e repito: não teve nada com o crime! Deixe, porém, que eu continue...” – e prosseguiu contando só o que lhe interessava. Dadá tapeou seus entrevistadores, contando as coisas como bem lhe convinha. A história de seu “rapto” por Corisco é pura fantasia. Logo ao ser presa, não tendo ainda arquitetado a versão que passaria a repetir mais tarde, Dadá contou ao repórter Evandro Américo, dos _Diários Associados_, que ela conheceu Cristino, seu “primo carnal”, quando ele estava negociando naquela zona (Baixa do Ribeiro) e certa vez apareceu em visita a seu pai.

Disse que nasceu no mesmo dia em seu coração uma admiração apaixonada pelo parente, que segundo ela nem sonhava talvez se tornar cangaceiro. “Outras visitas transformaram em amor aquele sentimento a princípio vago e indeciso. Ao primo não passou despercebida aquela atenção demasiada e aqueles agrados fora de propósito que lhe dispensava Dadá. E ele passou a corresponder ao amor da prima”.

Pelo que Dadá contou àquele repórter, fica claro que não houve rapto algum – ela simplesmente fugiu com o primo: “Corisco levou um tempo enorme sem aparecer e quando surgiu à frente de Dadá com a vestimenta característica dos cangaceiros, chapelão enorme e todo enfeitado, cartucheira arrodeando o corpo, e os cabelos compridos feito de mulher – ela tomou logo a decisão de acompanhá-lo. E sem ninguém em casa dar fé saiu numa madrugada para a aventura, para o amor”. 

Isso é, literalmente, o que consta na reportagem do Estado da Bahia, de 3 de junho de 1940. Essa entrevista foi dada por Dadá quando ela ainda estava em Djalma Dutra (atual Miguel Calmon), logo após a amputação da perna, em decorrência do tiro recebido ao ser presa.


Passei onze anos pesquisando a história do cangaço. Quem tiver interesse em saber o resultado dessas pesquisas, especialmente no tocante a Corisco e Dadá, basta checar o que consta no capítulo intitulado "Corisco, o Último Cangaceiro", das páginas 658 a 681, de "Lampião - a Raposa das Caatingas". Não estou fazendo propaganda do meu livro. É que notei que o amigo tem interesse por esses assuntos.

Veja, por favor, anexa, a capa do referido livro. Tem 736 páginas. Centenas de mapas. Centenas de fotos.

Fonte: facebokk
Página: José Bezerra Lima Irmão O cangaço

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LAMPIÃO - O Guerreiro que corria atrás do vento

Material do acervo do pesquisador Raul Meneleu Mascarenhas

Alguns historiadores em suas dissertações a respeito de Virgulino Ferreira, O Lampião, procuram mostrar que ele não era um guerrilheiro enquanto pensamento político e têm razão, pois se tornou cangaceiro pelas circunstâncias de rixas familiares e não por política partidária e alguns chegam a afirmar a maldade dele já estava no sangue desde jovem.

O que quero demostrar aqui, é que ele poderia até não ser um militante político que partiu para a luta armada, mas que era um guerrilheiro estrategista de primeira, ninguém pode duvidar.

Chegou até mesmo a ser reconhecido por um oficial combatente seu, onde desde a primeira batalha entre os dois, narrada por Frederico Bezerra Maciel em sua sextologia ‘Lampião, Seu Tempo e Reinado’ no segundo livro ‘A Guerra de Guerrilhas’ onde o Tenente José Lucena e Lampião ficaram temendo-se mutuamente. 

De sua parte José Lucena temendo  e receando a sagacidade de Lampião e da parte do temível cangaceiro, respeitando a força do Tenente pelo poderio bélico  e também sagacidade, pois nunca andava fora das estradas reais, usando dessa tática para não aventurar-se ‘no mato’, território do cangaço.

O relato abaixo se encontra no referido livro e dará a você leitor, uma visão das estratégias do Rei do Cangaço em batalha real com seu grande inimigo, José Lucena. Vamos visitar a história, lendo o relato:

ISCAS DE FOGO PARA LUCENA

Acompanhado de seus irmãos Antônio e Livino, deixou Lampião, mais uma vez, a sepultura de sua estremecida mãe, no cemitério de Santa Cruz do Deserto. Com lágrimas nos olhos e ódio no coração. Uniu-se, com seus dois irmãos, aos Porcinos, aos Marcos, a Antônio Fragoso e a seu tio Antônio Matilde, formando, com mais outros dois cabras do coronel José Abílio, um grupo de treze homens. Subiu o vale do Moxotó, cortando seus areais frouxos e escaldantes de semi-deserto, e a 1de junho de 1921, atacou Santa Clara (Tupanatinga), no município de Buíque. Em seguida, desceu o mesmo vale, passando pelo povoado de Caboclo e pela vila de Pau Ferro (Itaíba), e atravessou a fronteira alagoana do município de Mata. Grande acrescentado de mais quatro homens, agora num total de dezessete, cada qual armado de rifle e punhal e municiado com 450 cartuchos nutrindo as cartucheiras e amojando os bornais. A 5 de junho deu combate aos tenentes Optato Gueiros e Eutíquio na fazenda Pilão do Gato, sem prejuízos de parte a parte, a não ser de objetos. 

Depois atacou a residência de Firmino Brandão e levou o terror às populações sertanejas de Capiá, Maravilha e outras localidades e fazendas que, de sobrosso, corriam para Santana de Ipanema. Tudo isto Lampião fazia por estratagema, com o fito de atrair o tenente José Lucena para um ajuste de contas: — "Quero quebrar e sujicar o sedém deste peste de Zé Lucena".

Entrementes, em Jatobá de Tacaratu (Petrolândia), reunidos quatro oficiais de Pernambuco, capitães Teófanes Torres e José Caetano e tenentes Carneiro e Campos, e um oficial alagoano, tenente José Lucena, para consertarem, em ação combinada, combate eficaz a Lampião, com o acordo simultâneo das fronteiras interestaduais. De volta a Santana de Ipanema, saiu Lucena com uma volante de sessenta praças para ôlho Dágua do Chicão (Ouro Branco), ausente dez léguas a noroeste. Tendo disto notícia, frechou Lampião, com mais de vinte homens, numa disparada para ali. E a 9 de junho o atacou furiosamente qui ném onça faminta. Foi apenas um golpe de mão. 

O todo-poderoso Lucena, acostumado a correr atrás de cangaceiros, que dele se sumiam apavorados, ficou estarrecido com o atrevimento do ataque e a afoiteza da ofensiva inusitada. Por desforra, matou, em caminho, o pacato José Porcino, que não havia participado da luta. E, temeroso face às perspectivas de rumos desconhecidos e novos, que parecia a luta contra o banditismo tomar, requisitou destacamentos e volantes por perto, perfazendo sua força um total de cento e vinte praças bem equipadas. Por seu turno, Lampião arrebanhou mais gente, perfazendo um grupo de mais de quarenta cabras e com muita privinição de armas e munições.

A PRIMEIRA GRANDE BATALHA 

a) no rumo de Poço Branco

Passou Lampião pelo Espírito Santo (Inajá), deixando para Lucena pista visível e fácil. Vadeou o leito seco do rio Moxotó a uma légua de distância, e fez arranchação de pernoite na casa de seu amigo José Mandu, no Poço Branco, posição estratégica que escolheu para dar combate. Casa grande essa do Mandu, de varanda na frente, olhando para o sul. Na frente, o terreiro ligando-se com o caminho largo, variante da estrada real, que passa ao nascente, unindo Espírito Santo à Mata Grande, localidades separadas entre si por cinco léguas. Atrás, o rio Moxotó, largo, margeado de frondosas caraibeiras e graciosas palmeiras catolé, com suas flabelas farfalhantes encobrindo pejados cachos de pequeninos cocos amarelos. Um dos belos espetáculos daquela ribeira. 

b) base da emboscada

O despertar cedo, naquela madrugada fusca e fria de 20 de junho. Depois do café gordo, reforçado com muita carne-seca para dar sustança, distribuiu Lampião o seu pessoal por trás de pés de-pau, de pedras, de barrocas e cercas, as emboscadas para O combate. 

A casa com o curral, ponto mais difícil, porque perigoso, decerto seria o primeiro alvo visado pelo inimigo. Essa posição reservou ele para si. A direita da casa, oculto pela serroteira, seu irmão Antônio, com o bote pronto para dar retaguarda, operação esta de que me tornaria, depois, exímio mestre. A esquerda da casa, por trás das cercas de pedra, seu irmão Livino, vanguardeiro, peitudo, indômito. E, mais adiante deste, também camuflado no mato e atrás de pedras, Antônio Matilde.

A cada um coube dez a doze homens. 

Larnpiãó fez privinição quiném experimentado cabo de guerra: 

- "Os macacos não vêem todos juntos, não. Antônio Matilde, sustente no fogo os que chegarem no coice. A gente só faz fogo quando os primeiros chegarem na frente da casa. Espero o sinal meu. Não gastar munição à toa. Se a gente tem de fugir é por detrás, pelo rio. Mas esperem eu dar o sinal".

c) cabreirices de Lucena 

Em desde o Espírito Santo, vinha Lucena no rasto claro, certo e seguro, deixado por Lampião, na estrada de Tacaratu, paralela à margem direita do rio Moxotó. Mas, quando os rastos entraram no mato, em direção do rio, desconfiou de cilada ao mesmo tempo, assuntou que Lampião, tudo indicava, havia tomado o rumo da fazenda Poço Branco. Apiançando dar um golpe de surpresa pela retaguarda — a hora do dia cedo era favorável para pegar na desprivinição os cangaceiros —, mais que depressa voltou, vadeou o rio, tomando a estrada real que vai para Mata Grande e penetrando na boca do desvio que chega a Poço Branco. Mais uma vez desconfiando, fez alto. Por segurança, saiu caminhando por dentro do mato, beiradeiando a variante.

 d) a batalha

Todos os cálculos de Lampião deram certo. Lucena não o atacaria pelo outro lado, a retaguarda. Teria sua tropa dizimada no atravessar do leito seco e arenoso do rio. Acertou também: a tropa veio dividida. Na frente, Lucena com bem oitenta homens. Atrás, pouco distante, o tenente Enéias Barros com uns quarenta. Logo que a cabeça do pelotão de Lucena chegou defronte da casa, fez alto, a modo de observar, através do mato, aquele misterioso silêncio e de ganhar posição. Antes que isto acontecesse, Lampião deu o sinal convencionado com um tiro de pistola, rompendo o tiroteio da casa e do curral contra a tropa. Esta, num sufragante, deitou corpo e tratou, arrastando-se, de logo se mofumbar e entrincheirar para responder ao fogo. O pelotão de Enéias acelerou o avanço, mas foi detido pelo fogo de Antônio Matilde. A peitada não foi de graça, não. Parecia um ridimunho dos infernos! Na tiroteiação, balaços açoitavam as pedras num baticum enervante, ou assobiavam doidamente no meio do panavueiro chamando a morte, ou barbavam o mato, torando as folhas, estalando os galhos... Os cangaceiros, animosos, lançavam, no parraxaxá, desafios, insultos e xingos... gargalhavam sarcasticamente de mangação... rinchavam e zurravam feito animais...

Infuleimado o sangue com a quentura das armas cuspindo fogo e escoceiando nas detonações, as gargantas torturadas de sede com a abafação da atmosfera produzida pela pólvora queimada, os olhos zaros e ardendo e a vista alazã, sem trégua para tomar alento, depressa ficaram os combatentes bebos de raiva virando feras. Lampião levava vantagem dentro de melhores emboscadas, cuidadosamente escolhidas. 

Sob as ordens de Lampião, rápido deslocou-se seu irmão Antônio, com seus homens, bem agachados, para atacar, de retaguarda, o flanco esquerdo da tropa de Lucena. Ao impacto inesperado e violento, a parte atacada se desatou do grosso da tropa e recuou com cerca de trinta soldados.

Para salvaguardar a perigosa situação, destacou Lucena imediatamente uns quarenta soldados em contraofensiva. Nesse quando, chamando seu irmão Livino, tentou Lampião o envolvimento do flanco direito da parte da tropa de Lucena que ficara na linha de fogo. Oficial instruído em curso de caserna,  compreendeu Lucena o jogo tático de seu adversário: aniquilar ou afugentar sua tropa para, ao depois, cair sobre a do tenente Enéias. Realmente, muito tempo adiante, narrando a amigos aquela batalha, confirmou Lampião a sua intenção no momento. Isso, porém, não teria passado de mera tentativa se na ocasião tivesse ele, pelo menos, outro tanto do efetivo de Lucena e um poder bélico muito superior. Mesmo assim, saliente-se, nesse movimento de cerco dentro da batalha, talvez tivesse de sacrificar muita gente. Ademais, enquanto a polícia usava carabina-fuzil de longo alcance, semiautomático, e bala de aço de grande poder perfurante; Lampião utilizava rifle papo-amarelo* ou cruzeta, arma de repetição, que esquenta muito após quarenta tiros, de muito menor alcance, e bala calibre 44, de chumbo, chata, de poder antes rompedor que penetrante. Refez e uniu Lucena sua tropa fragmentada e, num trancão impetuoso de fogo cerrado, empurrou Lampião e seus irmãos para as linhas primitivas. Durante a contra ofensiva, houve um corpo-a-corpo, desesperado e sangrento: engalvinharam-se o valente cangaceiro Cavanhaque e um "macaco", rapidamente passando os dois apronto. 

* O rifle Winchester, desde 1866, ano de sua invenção 'por Oliver Ficher Winchester, que fundou no Connecticut a "Winchester Repeatring Arms Company", fez parte da história de todos os povos: Estados Unidos, México, Peru, Brasil, Chile, Argentina, Espanha, França, Rússia, Turquia, China... tanto na guerra, como na paz. Recorde-se sua adotação pela Polícia Montada do Noroeste dos Estados Unidos e pelo presidente Roosevelt nos safáris das selvas africanas... Mesmo depois de ter adotado o mosquetão ern 1926, • jamais deixou Lampião de utilizar .o "papo-amarelo", talvez porque arma mais fácil de conseguir. Tem o rifle esse nome por causa da pequena placa de metal amarelo — o papo — na parte infe-rior, a cujo impulso a cápsula salta para cima. Diga-se de passagem que se tornou muito conhecida, naquele tempo, a casa co-mercial "A Sertaneja", de Pesqueira, pertencente a Orestes de Almeida Maciel, a qual possuía permanente estoque de rifles e munição apropriada. Consultando-se o velho Arquivo Comercial da "A Sertaneja", chega-se a saber, através de faturas emitidas por Herm Stoltz e pelo Armazém do Caboclo. quais as armas então vendidas na referida firma: revólveres "Colt" (preto) e "Smith and Wess" (niquelado), americanos, calibre 32; revólver "Azul", espanhol, calibres 32 e 38; pistola "Comblain" (Fogopagô), belga 320 e 380; pistolas de pente:, "Mauser" (')Vf..ausa") 6,35 e 7,35, "Remington" 380, e "FN", belga, 6,37 e 7,35; rifle "Winchester"-7,44-..,(PaPo-amarelo); espingardas de caça ou de passarinhar (de 'cartucho), e^ (de I.a7s+rino, famoso milanês fabricante de espingardas no século XVI), de can° fino e comprido, de encher pela boca, em três cores, verde, amarelo e encarna4o. Para espingardas desse último tipo, vendiam-se também. acessórios: canos, fechos, varetas, ouvidos... além de espoletas BB. Note-se que a primeira pistola que apareceu no sertão foi levada por um Carvalho (cf. cap. 4, nota 7). Antes existiam apenas o bacamarte¡ e pistola de encher boca.

O sol se incrisava. 


Lampião verificando a munição ficando escassa, deu sinal de retirada — cinco tiros secos de pistola para o ar. Correndo agachados e atirando, os cangaceiros cruzaram o lençol de areia enxuta do rio e fizeram pousada num arredado perto, embiocados.

Lucena não saiu na inculca deles. Voltou, com a 'tropa em muxibas, trambecando, para Santana de Ipanema. Além dos dois mortos na luta corpo-a-corpo, não foi possível obter-se informação exata do resultado da batalha. A tarde se arriara, por coincidência, sombria e triste, envolta em tons arroxeados. E com ela, a catinga começava a adormecer, toda desarranjada e destroçada pelo espasmo da luta, parecente, de mesmo, um espojeiro de monstros anti-diluvianos...

e) oficial do Exército? 

A seu amigo, Padre José Bulhões, vigário de Santana de Ipanema, comentou Lucena a batalha do Poço Branco: — "Figurei, em dado momento da luta, que Lampião queria mesmo acabar comigo, Depois, diante de seus estratagemas, me veio uma dúvida: Não é possível! Seria mesmo Lampião o comandante? Ou esses cabras estão sendo comandados por  algum oficial estrategista de alta patente, egresso do exército?!...”

Classificou também ele, a retaguarda de Antonio Ferreira de “manobra magistral”.

Nova Ordem do Cangaço

Vemos nessa bela demonstração do grande estrategista que foi Lampião: A partir do ano de 1929, passou a acontecer uma das mudanças mais radicais no modo do famoso cangaceiro portar-se perante seus inimigos, vindo a tornar-se muito mais perigoso ainda. Mulheres passaram a integrar seu bando e ele passou a dividi-lo em grupos e subgrupos.

Que estratégia incrível para os padrões ‘cangaceirísticos’ daquela sua época. Ninguém ainda tinha feito isso. Eram uma espécie de clãs familiares e autônomos sob a direção de homens de sua inteira confiança. Era a Nova Ordem do Cangaço que se apresentava. Chamava menos atenção e seus inimigos não tinham a menor ideia onde ele se encontrava, pois o bando dividido, a população os via em muitos lugares e as autoridades ficavam sem saber onde centrar fogo, com números maiores de contingente.

Essa estratégia, ou por querer ou por necessidade e imposição do destino, fez que Lampião, perseguido sem descanso pelas Forças Volantes de Pernambuco, teve de fugir e refugiar-se na Bahia com cinco companheiros que lhe restavam e maltrapilhos e famintos ali chegaram para a recomposição mais espetacular de sua vida. Era o ‘Fênix’ que retornava mais forte e das cinzas ressurgia sua têmpera de ‘cabra macho’ que não temia ninguém .

Lampião veio a entender por conta da situação em que seus inimigos contavam com armas melhores e poderosas, que deveria mudar de estratégia. Em sua mente de guerreiro privilegiado e líder, compreendeu que já não tinha condições de dirigir um número considerável de cangaceiros. Além disso o  sertão ficava aos poucos modernizado, com estradas, vias férreas e pipocava o progresso. Sua vida e de seus cabras agora dependiam mais da ‘inteligence’ que de seus músculos, coragem e pontaria pois deixava aos poucos de ser um território virgem e impenetrável. O Governo estava agora em toda a parte com suas construções de progresso e sua ‘gana’ de exterminar o banditismo naquela região.

Élise Grunspan Jasmin em seu livro ‘Lampião, Senhor do Sertão’, veio a tecer um comentário de pé de página onde o chama de ‘O Guerreiro Sedentário’ justamente por substituir seus ataques violentos, embora vez em quando o fizesse, por essa nova ordem familiar tornando-se menos nômades.

Em suas notas, Élise Grunspan Jasmin aponta para António Silvino que tentara “resistir a construção da estrada de ferro pela companhia Great Western no sertão da Paraíba. Em 1906, ele perseguia os engenheiros ingleses encarregados de executar os trabalhos, ameaçava os operários, cortava os fios telegráficos, deteriorava as vias já instaladas e extorquia os passageiros do trem. Constatando a ineficácia de sua empresa, enviou uma carta aos diretores da Great Western por meio de Francisco de Sá, um de seus empregados, dizendo que permitiria a construção da estrada de ferro mediante uma indenização de 30 contos de réis. Ver, a esse respeito.

Sempre que tinha oportunidade. Lampião ameaçava ou assassinava os operários que trabalhavam nos canteiros. Em 1929. fez interromper a construção de uma estrada que devia ir de Juazeiro a Santana da Glória, CE, e que devia passar por seu refúgio predileto, o Raso da Catarina. Em outubro desse mesmo ano, constatando que sua ameaça não tinha sido levada em consideração, matou um dos operários. Em 1930, perto de Patamuté. BA. atacou um grupo de operários e matou um deles. Em 1932. no sitio Carro Quebrado, entre Chorrochó e Barro Vermelho, na Bahia. Lampião executou nove operários.

No Estado de Sergipe. em fevereiro de 1934, atacou operários e paralisou a construção da estrada. As autoridades governamentais nunca levaram em conta as ameaças de Lampião, e a partir de 1930 intensificaram os projetos de abertura do sertão ao "progresso". No dia 9 de junho de 1935, por ocasião de uma reunião organizada em Águas Vermelhas, na fronteira de Pernambuco. Carlos de Lima Cavalcanti, governador desse Estado, e Osman Loureiro, governador de Alagoas propuseram um plano de construção de estradas e vias férreas nas zonas do sertão afetadas pelo cangaço.

Elas deviam cortar sistematicamente em diversos eixos as regiões mais freqüentadas por Lampião e facilitar o transporte das Forças Volantes por caminhão, enquanto os cangaceiros se deslocavam quase sempre a pé. Os canais e as vias fluviais também deveriam ser controlados, pois permitiam o envio de armas aos cangaceiros. Lampião sabia que as conquistas tecnológicas com as quais as Forças Volantes tinham sido municiadas e a penetração das vias de comunicação através do sertão poderiam anunciar seu fim próximo e pôr em perigo sua autoridade na região (Informações extraídas das obras de Frederico Pernambucano de Mello, op. rir., 1985, e Quengo: !Amplio?, 1993).

Cristino Gomes da Silva Cleto, conhecido como Corisco nasceu em 1907 em Marinha de Água Branca, no Estado de Alagoas. e foi morto no dia 25 de maio de 1940, no Estado da Bahia, pelo tenente José Rufino. Da mesma forma que Jararaca. ele também chefe de subgrupo, Corisco tinha-se alistado no Exército em 1924, em Aracaju. Desertou, foi perseguido e encontrou refúgio no cangaço. Seu conhecimento das técnicas de guerra lhe valeu o interesse de Lampião, bem como sua confiança. Depois de inúmeras tergiversações. 

Corisco alia-se a Lampião em 1926. em Vila Bela (Pernambuco), e lhe permanecerá fiel para sempre. Em 1927 começou a dirigir um grupo de cangaceiros e sempre reivindicou certa autonomia com relação a Lampião, embora sempre o considerasse seu superior hierárquico. Segundo Frederico Pernambucano de Mello, como Lampião, Corisco se fazia chamar de "Capitão" e assinava assim os pedidos de resgate que dirigia a suas vítimas: "capitão Corisco, chefe de grupo dos Grandes Cangaceiros" (grad Frederico Pernambucano de Mello, op. rir., 1985, pp. 88-89). Corisco, o "diabo louro", distinguia-se por sua brutalidade e crueldade.

Depois do anúncio da morte de Lampião, que ele vingará mediante um ato punitivo de rara violência. Corisco tentou retomar o lugar deixado vago pela morte de seu chefe e procurou reestruturar os grupos restantes de cangaceiros. Essa tentativa redundou em fracasso, devido, principalmente à sua falta de diplomacia para com os coronéis e coiteiros. 

Sua morte anuncia a extinção definitiva do cangaço.

Em um artigo do Diário de Pernambuco de 11/6/1935 intitulado "Assentado Medidas para a Extinção do Banditismo", dedicado aos acordos firmados entre as forças policiais de Pernambuco e Alagoas, o major Lucena diz ao jornalista que Lampião dirigindo apenas um grupo de 30 a 35 cangaceiros, dividiu-o em pequenas unidades de 5 ou 6 homens. 

Outro artigo do Mujo de Pernambuco, datado de 24/11/1937, intitulado "O Problema do Banditismo na Zona Sertaneja" e ilustrado com uma fotografia do tenente Luís Mariano, feita possivelmente no sertão, também evoca a divisão do grupo de Lampião, divisão a que ele parece acomodar-se para levar uma vida tranqüila, dando-se o luxo de se esconder ou de se exibir em público como e quando lhe bem aprouvesse: "Lampeão nestes últimos tempos tem-se embrenhado nas caatingas do Estado de Sergipe e se demora principalmente nos municípios de Poço da Folha. [...] e São Paulo, sendo neste que o bandido chefe, faz com uma certa segurança o seu quartel general.

De vez em quando Lampeão, á frente de uma parte do seu grupo invade a Bahia, entrando ahi pelos municipios de Geremoabo. [...] Nessas excursões pratica grandes roubos e depreciações e, retorna aos logares que lhe servem de coito, onde descansa meus occulro e guardado por ectiteiros de sua absoluta confiança. [...] Depois de descansar a vontade em Alagoas. o bandido com seu grupo, procura ser visto nas caatingas de Aguas Bellas, esconde depois os rastros para promover a confusão, e desorientar os pequenos troços de volantes desorganizados. que o perseguem. Violentamente regressa ás caatingas de Alagoas. occultando-se de preferencia na zona do Serrote do Carié, Riacho do Canapy. Poeira [...] dos Municipios de Marta Grande e Pão de Assucar.[...] Enquanto Lampeão e sua Maria De Déa de José Felippe e meia duzia de bandidos descansam, os bandidos de nomes Corisco. Luís Pedro. Portuguez. Angel Roque. Moreno. Moita Brava, Chumbinho, Pedro Rocha e outros chefes de grupos matam, roubam, promovem incendios. praticando, enfim, toda sorte de miseria". 

Em artigo do Diário de Pernambuco. 11/5/1935. intitulado "Luís Pedro. do bando de lampeão. visitou Pernambuco. O prefeito de Macia Grande esteve sequestrado 15 dias — Virgulino está em Sant'Anna do Ipanema", faz-se referéncia ao rapto do prefeito de Mata Grande por Luís Pedro. o homem de confiança de Lampião, em troca de uma importância elevada.

Benjamin Abrahão

Um dos historiadores mais ousados de Lampião e seus cangaceiros foi Benjamin Abrahão Botto, que após a morte de Padre Cícero, solicitou e obteve do "Rei do Cangaço" a permissão para acompanhar o bando na caatinga e realizar as imagens que o imortalizaram. O próprio Lampião assegurou o testemunho, em um bilhete, de que todas as suas imagens eram produto do trabalho de Abrahão. Abaixo as palavras do cangaceiro escritas em um de seus famosos bilhetes:

Illmo Sr. Bejamim Abrahão

Saudações
Venho lhi afirmar que foi a primeira peçoa que conceguiu filmar eu com todos os meus peçoal cangaceiros, filmando assim todos us muvimento da noça vida nas catingas dus sertões nordestinos.
Outra peçoa não conciguiu nem conciguirá nem mesmo eu consintirei mais.
Sem mais do amigo
Capm Virgulino Ferreira da Silva
Vulgo Capm Lampião

Benjamin em seus trabalhos, diz ter encontrado vários grupos de cangaceiros, dentre eles o de Corisco, Zé Sereno e Gato, o que confirma a estruturação do grupo de Lampião em pequenas unidades relativamente autônomas. Ele fotografou os chefes dos grupos e os grupos separadamente. Apesar de esses diferentes "subgrupos" estarem com toda a evidência sob a autoridade de Lampião, não se conhecem fotografias apresentando o conjunto dos cangaceiros.

Devido então a esses testemunhos, vemos em Lampião um grande estrategista, que aprendeu na lida todos esses ‘truques’ que o tornaram um inimigo a ser respeitado pelas volantes e seus comandantes.

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A Famosa Passagem das Pedras e a Caravana Cariri Cangaço

Por Heldemar Garcia
Louro Teles, Heldemar Garcia, Jorge Remigio, Narciso Dias e Jair Tavares

O Sítio Passagem das Pedras, no município de Serra Talhada, antiga Vila Bela, foi o berço de Virgulino Ferreira da Silva. Aqui às margens do riacho São Domingos, na Serra Vermelha, nasceria nos idos de 1898 o mais destacado cangaceiro de todos os tempos: Lampião. O cenário é a mais pura manifestação da braba caatinga sertaneja. De longe se avista a majestosa Serra Vermelha, tão famosa e tão falada na vasta literatura do cangaço.

A Caravana Cariri Cangaço, formada por seu curador, Manoel Severo e pelos pesquisadores Narciso Dias, Lourival Teles, Jorge Remígio, Jair Tavares e por mim; Heldemar Garcia, estivemos no finalzinho deste último mês de setembro, visitando o cenário dos primeiros passos de Virgulino Ferreira naquele "sertão alegre" do início do século XX.

Sítio Passagem das Pedras, berço de Virgulino Ferreira da Silva
Louro Teles e Heldemar Garcia
Narciso Dias

A fazenda Passagem das Pedras pertence ao confrade Carlos Eduardo Gomes, empresário carioca e membro da família Cariri Cangaço; aqui foi construída uma réplica da casa da avó de Virgulino, dona Jacoza. Atualmente como já há algum tempo, tem sua administração confiada e sob a responsabilidade da Fundação Cultural Cabras de Lampião dos amigos; pesquisador e escritor Anildomá Souza e sua esposa Cléo.

"Ali é um lugar polêmico e importante. Uns dizem que o parto foi de um lado da cerca, outros dizem que foi do outro lado. Mas foi naquele chão que veio ao mundo o Capitão Virgulino..." relata Carlos Eduardo Gomes. O fato é que de um lado ou do outro da cerca, nasceu Virgulino Lampião, bem vizinho as terras da família de Zé Saturnino e o resto todos já sabem...

Réplica da casa de dona Jacoza, na Passagem das Pedras
Serra Vermelha
Carlos Eduardo Gomes, proprietário do Sítio Passagem das Pedras

Sobre a réplica e o local da casa de dona Jacosa no sítio Passagem das Pedras, nos valemos de um relato de Carlos Eduardo respondendo ao saudoso Alcino Costa aqui mesmo neste blog ainda em 2010, vejamos: "Meu prezado mestre e amigo Alcino, muito bom saber que o grande sertanejo de Poço Redondo está atento as mudanças ocorridas lá na terra onde nasceu Lampião. De fato houve pequenas mudanças no local, porém confio que o lugar onde foi construida a casa que representa a antiga morada de Da. Jacosa, é exatamente o mesmo. Na época da construção pessoas que conheceram a casa antiga foram consultadas para que a nova casa mantivesse as características da residência onde Virgulino passou boa parte da infância. Infelizmente não foi encontrado nenhum registro fotográfico da velha casa que permitisse assegurar que a nova construção é réplica fiel do antigo imóvel. Fora isso, a casa sede da antiga fazenda, não resistiu a uma chuva muito forte e infelizmente ruiu, antes que pudessemos tentar recuperá-la. Essa casa não existia na primeira década do século passado, quando a terra pertencia a família de Lampião. É sempre um prazer dialogar e aprender com mestre Alcino, homem de elegância e muito respeito ao debater e ensinar. Sem deixar-se contagiar pelo orgulho excessivo que as vezes leva ao exagero desagregador", concluía Carlos Eduardo Gomes.

Estando em Serra Talhada saímos pela rodovia que nos liga ao município de Floresta, cerca de 20 km de estrada vamos encontrar a "estrada José Saturnino", agora é entrar a esquerda e rodar mais uns 4 a 5 km até chegar a Passagem das Pedras, não sem antes pararmos no local exato onde se deu o primeiro confronto armado entre Virgulino e seus irmãos contra Zé Saturnino, seu primeiro inimigo. Nesse fogo saiu ferido o irmão de Virgulino, Antônio Ferreira.

Estrada Zé Saturnino
Aqui se deu o primeiro combate em armas entre Virgulino e Zé Saturnino
 Manoel Severo e Louro Teles 
 Caravana Cariri Cangaço rumo a Passagem das Pedras
Jorge Remígio

Sou jornalista com especialização em marketing, ou seja, não tenho nenhuma afinidade mais profunda com o tema cangaço, mas pisar o solo que foi berço do mais destacado cangaceiro da história do planeta, Lampião, é algo simplesmente sensacional e devo isso a grande família Cariri Cangaço, que aos poucos vai me permitindo adentrar neste mundo totalmente fascinante, e tem sido assim em todas as nossas viagens de trabalho; enquanto "eles" pesquisam, eu me encanto com tudo que diz respeito ao universo do cangaço.

 Louro Teles, Heldemar Garcia e Narciso Dias nas trilhas de Virgulino 
Narciso Dias e uma relíquia de Louro Teles: Punhal pertencente a Meia-Noite
Manoel Severo e Louro Teles

Durante essa jornada ainda tivemos a oportunidade, a partir do confrade, Louro Teles, de ver um punhal artesanal que pertenceu ao cangaceiro Meia-Noite. "Esses punhais eram incríveis e aterrorizantes , tinham tamanhos e adereços diferenciados, de acordo com a posição do cangaceiro dentro do grupo" ressalta o pesquisador de Calumbi, Louro Teles. "Já fazia tempo que queria conhecer a Passagem das Pedras e hoje realizei esse desejo" relata Jorge Remígio. Missão cumprida em mais uma visita de trabalho da Caravana Cariri Cangaço, até logo mais !

Heldemar Garcia

Assessor de Marketing Institucional
Cariri Cangaço

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LAMPIÃO, SUA ÚLTIMA VIAGEM E ESTRATÉGIA

Por Clerisvaldo B. Chagas, 14 de outubro de 2014 - Crônica Nº 1.280

Tirando a banda podre do monstro Lampião, encontram-se méritos inquestionáveis nas estratégias guerrilheiras a que se dedicou. Vivia, entretanto, o bandido no perde-ganha. Suas técnicas de esconde-esconde quase sempre eram descobertas por exímios rastejadores filhos do mesmo mato e das agruras sertanejas. São várias modalidades de ataques, retiradas e demais estratagemas urdidos e amplamente divulgados.


A última estratégia de Virgolino foi também a sua última viagem, definida com a impressionante pena do padre Frederico Bezerra Maciel. Era o dia 20 de julho de 1938, quando o bandoleiro resolveu dirigir-se à fazenda Angicos, na beira do São Francisco, lado sergipano. Ali havia uma grota que serviria de esconderijo,  além de estar situada em terras de coiteiros da sua confiança. Lampião estava no lado alagoano, afastado do rio na fazenda e serra São Francisco. Caso saísse para a fazenda Angicos com fácil chegada pela frente, poderia ser visto por espiões e delatores. Procurou, então, atingir o mesmo ponto, em longo rodeio, com entrada pelos fundos.


Assim, descendo a serra São Francisco diretamente para o rio, foi cruzando as fazendas: Conceição, Bom Jardim, Bela Vista, Bardão até chegar diante do Rio da Unidade Nacional no lugar chamado Bonito, muito abaixo do povoado Entremontes, já à tardinha, onde foi bem recebido.

Ao anoitecer, entre frio intenso e chuva, Virgolino atravessa para Sergipe, direto, e aporta no lugar Capoeira Nova. Dali vai subindo, margeando e se afastando do Velho Chico passando pelas fazendas: Macaba, Bebedouro, São João, Jacaré, Cajueiro, Lajeiro, Paraíso e Logradouro. Em Logradouro é acolhido, devidamente alimentado e agasalhado pelo coiteiro da fazenda, volta à direita em direção ao rio e entra na fazenda Angicos, pelos fundos, indo a procura da grota onde chega ao amanhecer e faz seu acampamento. Quem navegasse pelo rio São Francisco, não o avistaria, pois, estava por trás de dois morros, dentro de um riacho seco, cuja curvatura impedia a visão dos curiosos. Dia 21 de julho de 1938.

Essa foi a última viagem e estratégia de Lampião.


CROQUI DO ESCRITOR FREDERICO MACIEL, ADAPTADO.
Como ninguém está em lugar seguro quando a morte o procura, Lampião desencarnou sete dias depois.

* Na próxima sexta, leia aqui sobre a estratégia das volantes.

CLERISVALDO B. CHAGAS – AUTOBIOGRAFIA
ROMANCISTA – CRONISTA – HISTORIADOR - POETA

Clerisvaldo Braga das Chagas nasceu no dia 2 de dezembro de 1946, à Rua Benedito Melo ( Rua Nova) s/n, em Santana do Ipanema, Alagoas. Logo cedo se mudou para a Rua do Sebo (depois Cleto Campelo) e atual Antonio Tavares, nº 238, onde passou toda a sua vida de solteiro. Filho do comerciante Manoel Celestino das Chagas e da professora Helena Braga das Chagas, foi o segundo de uma plêiade de mais nove irmãos (eram cinco homens e cinco mulheres). Clerisvaldo fez o Fundamental menor (antigo Primário), no Grupo Escolar Padre Francisco Correia e, o Fundamental maior (antigo Ginasial), no Ginásio Santana, encerrando essa fase em 1966.Prosseguindo seus estudos, Chagas mudou-se para Maceió onde estudou o Curso Médio, então, Científico, no Colégio Guido de Fontgalland, terminando os dois últimos anos no Colégio Moreira e Silva, ambos no Farol Concluído o Curso Médio, Clerisvaldo retornou a Santana do Ipanema e foi tentar a vida na capital paulista. Retornou novamente a sua terra onde foi pesquisador do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Casou em 30 de março de 1974 com a professora Irene Ferreira da Costa, tendo nascido dessa união, duas filhas: Clerine e Clerise. Chagas iniciou o curso de Geografia na Faculdade de Formação de Professores de Arapiraca e concluiu sua Licenciatura Plena na AESA - Faculdade de Formação de Professores de Arcoverde, em Pernambuco (1991). Fez Especialização em Geo-História pelo CESMAC – Centro de Estudos Superiores de Maceió (2003). Nesse período de estudos, além do IBGE, lecionou Ciências e Geografia no Ginásio Santana, Colégio Santo Tomaz de Aquino e Colégio Instituto Sagrada Família. Aprovado em 1º lugar em concurso público, deixou o IBGE e passou a lecionar no, então, Colégio Estadual Deraldo Campos (atual Escola Estadual Prof. Mileno Ferreira da Silva). Clerisvaldo ainda voltou a ser aprovado também em mais dois concursos públicos em 1º e 2º lugares. Lecionou em várias escolas tendo a Geografia como base. Também ensinou História, Sociologia, Filosofia, Biologia, Arte e Ciências. Contribuiu com o seu saber em vários outros estabelecimentos de ensino, além dos mencionados acima como as escolas: Ormindo Barros, Lions, Aloísio Ernande Brandão, Helena Braga das Chagas, São Cristóvão e Ismael Fernandes de Oliveira. Na cidade de Ouro Branco lecionou na Escola Rui Palmeira — onde foi vice-diretor e membro fundador — e ainda na cidade de Olho d’Água das Flores, no Colégio Mestre e Rei.

  Sua vida social tem sido intensa e fecunda. Foi membro fundador do 4º  teatro de Santana (Teatro de Amadores Augusto Almeida); membro fundador de escolas em Santana, Carneiros, Dois Riachos e Ouro Branco. Foi cronista da Rádio Correio do Sertão (Crônica do Meio-Dia); Venerável por duas vezes da Loja Maçônica Amor à Verdade; 1º presidente regional do SINTEAL (antiga APAL), núcleo da região de Santana; membro fundador da ACALA - Academia Arapiraquense de Letras e Artes; criador do programa na Rádio Cidade: Santana, Terra da Gente; redator do diário Jornal do Sertão (encarte do Jornal de Alagoas); 1º diretor eleito da Escola Estadual Prof. Mileno Ferreira da Silva; membro fundador da Academia Interiorana de Letras de Alagoas – ACILAL. 

Em sua trajetória, Clerisvaldo Braga das Chagas, adotou o nome artístico Clerisvaldo B. Chagas, em homenagem ao escritor de Palmeira dos Índios, Alagoas, Luís B. Torres, o primeiro escritor a reconhecer o seu trabalho. Pela ordem, são obras do autor que se caracteriza como romancista: Ribeira do Panema (romance - 1977); Geografia de Santana do Ipanema (didático – 1978); Carnaval do Lobisomem (conto – 1979); Defunto Perfumado (romance – 1982); O Coice do Bode (humor maçônico – 1983); Floro Novais, Herói ou Bandido? (documentário romanceado – 1985); A Igrejinha das Tocaias (episódio histórico em versos – 1992); Sertão Brabo CD (10 poemas engraçados).

  Até setembro de 2009, o autor tentava publicar as seguintes obras inéditas: Ipanema, um Rio Macho (paradidático); Deuses de Mandacaru (romance); Fazenda Lajeado (romance); O Boi, a Bota e a Batina, História Completa de Santana do Ipanema(história); Colibris do Camoxinga - poesia selvagem (poesia).

  Atualmente (2009), o escritor romancista Clerisvaldo B. Chagas também escreve crônicas diariamente para o seu Blog no portal sertanejo Santana Oxente, onde estão detalhes biográficos e apresentações do seu trabalho.

(Clerisvaldo B. Chagas – Autobiografia)

http://clerisvaldobchagas.blogspot.com.br/2008/08/bibliografia.html
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