Por Antônio Galdino
Escritor
descobre em Chorrochó-BA mais um filho de Lampião. Em suas pesquisas, o escritor
João de Souza Lima encontrou, "José Alves dos Santos ainda encontra-se
vivo e residindo em Chorrochó, nas mesmas terras onde seus pais o
criaram".
Folha
Sertaneja - Paulo Afonso - BA -27/11/2008
Segue texto de João de Souza Lima
Os caminhos
trilhados buscam os fatos inéditos, seguindo uma infindável legião de
admiradores e estudiosos ávidos a alcançarem os novos achados. Em busca deles
tenho me dedicado a longos dez anos de uma extensa pesquisa. Nessa
caminhada na busca de informações sobre a história de Lampião, neste longo
trajeto, um dos fatos mais marcantes foi a descoberta de um filho de Lampião e
Maria Bonita. Das quatro gestações da cangaceira, sabíamos apenas sobre
Expedita Ferreira da Silva, ainda viva e residindo em Aracaju. Quando comecei a
escrever o livro: “A Trajetória Guerreira de Maria Bonita, A Rainha do
Cangaço”, sempre que perguntava aos meus entrevistados detalhes sobre os gêmeos
Arlindo e Ananias, irmãos de Maria Bonita, ou obtinha o silêncio por resposta
ou escutava um curto e desafiador resmungar: “Ananias não é irmão de Maria
Bonita não!”. Tive que me desdobrar para conseguir alguém que me explicasse mais
abertamente essa afirmativa. Durante dias busquei os informes dos familiares e
amigos que conviveram com Maria Bonita nos conturbados dias do cangaço. Um dos
primos de Maria, um senhor chamado Manuel Maria dos Santos, apelidado por “Seu
Nequinho”, um ex-barqueiro acostumado atravessar, junto com o pai, os
cangaceiros que cruzavam o milenar Rio São Francisco, foi o primeiro a
confidenciar: “Ananias é filho de Lampião e Maria Bonita! Aqui todo mundo
sempre soube desse segredo. Agora, na época de Lampião, quem era doido de andar
com uma conversa dessa?!” Seu Nequinho ainda indicou mais algumas fontes que
poderiam atestar o que ele estava dizendo e fui buscar a comprovação. Dentre as
pessoas que fizeram seus relatos (e os tenho todos filmados para futuras
comprovações) pode-se encontrar Servina Oliveira de Sá (prima de Maria Bonita),
Eribaldo Ferreira Oliveira (sobrinho de Maria Bonita), os irmãos Osvaldo,
Olindina e Maria Martins de Sá (primos de Maria Bonita), Firmino Martins de Sá
(foi casado com a prima e melhor amiga de Maria Bonita: Maria Rodrigues de Sá).
Estes são alguns dos que confirmaram a história que se segue: Dona Maria
Joaquina Conceição Oliveira, “Dona Déa”, mãe da Rainha do Cangaço, estava
grávida e por coincidência Maria Bonita havia engravidado quase que na mesma
época. Por questão de aproximadamente dois dias, as duas mulheres viram nascer
seus rebentos. Mãe e filha gerando vidas e fazendo crescer sua
descendência. Pelas dificuldades impostas pela luta travada nas caatingas, onde
cangaceiro vivia permanentemente em fuga, lutando contra as perseguições da
polícia, filho era um entrave, levando perigo aos componentes do grupo e
sofrendo as conseqüências da vida atribulada. Os filhos nascidos no cangaço,
sempre iam cair nos braços de alguma autoridade política ou religiosa e às
vezes enviados aos simples catingueiros, quando dotados da extrema confiança do
cangaceiro. Duro castigo para as mães que tinham que ver seus filhos serem
criados por outras pessoas. Maria Bonita dera à luz. Lampião arquitetou deixar o
filho com a sogra, para que ela criasse as crianças como se fossem gêmeas e
assim aconteceu. O filho de Dona Déa ganhou o nome de Arlindo Gomes de Oliveira
e o filho de Lampião e Maria Bonita foi batizado como Ananias Gomes Oliveira.
Ananias ainda esta vivo, residindo em São Paulo. Arlindo faleceu recentemente. Era fácil observar as diferenças entre os irmãos: Arlindo era baixo e claro,
Ananias é alto e moreno, ganhando por sua cor escura, o apelido de “Pretão”. Dos
depoimentos que se tem registro daquela época, o mais contundente é o deixado
por José Mutti, major reformado do exército, que foi casado com Antonia
Oliveira (irmã de Maria Bonita) e que escreveu o livro: Reminiscências de um
ex-comandante de volante, que retrata com detalhes sobre a descoberta desse
segredo, vejam a parte do capitulo que trata do mistério: “... ao chegar nos
Picos do Tará, encontrei meus sogros arranchados numa frondosa quixabeira.
Mandei construir dois quartos pra eles. encontrei duas crianças de dois anos
cada. Tendo perguntado de quem eram filhos, dona Déa disse-me que eram mabaços
(gêmeos) e eram seus filhos. As crianças eram completamente diferentes. O
Arlindo sim, era parecido com a família, mais o Ananias era trigueiro (moreno
escuro), não podia ser do mesmo casal José Filipe e Déa. Deu-me o estalo de
“Vieira” será o Ananias, filho de Lampião e Maria?. Comecei a perseguir a
sogra: ”Dona Déa, diga-me quem é o pai de Ananias, o Ananias não é filho da
senhora e do José Filipe. Se a senhora disser de quem é filho o pretão (apelido
do Ananias) eu guardo segredo até a morte. “Tanto persegui minha sogra para
saber quem era o pai de Pretão, que um dia ela me disseO Pretão é filho do
homem” (a família de Maria Bonita tratava Lampião de “O HOMEM”), fiquei
satisfeito e não falei mais no assunto”.Ai está desvendado mais um dos
mistérios do cangaço e para registro histórico, vale salientar que Ananias
concordou fazer o exame de DNA, sendo coletado sangue de dona Mocinha (irmã de
lampião), de Arlindo (o irmão que se diz gêmeo) e do irmão Ozéas Gomes. O
desfecho está sendo aguardado porque vem sendo movido por meios judiciais uma
vez que Expedita e Vera Ferreira (filha e neta de Lampião e Maria Bonita) se
negaram a fazer os exames.Outro caso que foi bastante difundido foi o de João
Peitudo, outro suposto filho dos Reis do Cangaço, mais um que tentou em vão se
aproximar da família e não obteve resultados.Continuando no campo da pesquisa
histórica, vasculhando as fontes que trazem alguma ligação com o cangaço, acabo
de descobrir outro filho de Lampião, na cidade de Chorrochó, Bahia. Ele é da
família dos famosos “Engrácias”, as primeiras pessoas que mantiveram contato
com Lampião quando ele entrou no estado da Bahia, tendo vários membros dessa
família seguido os cangaceiros. Alguns se tornaram famosos, como: Cirilo de
Engrácia, Antônio de Engrácia, Zé Sereno, Zé Baiano, Arvoredo e Corisco.Da
família dos “Engrácias” um dos grandes coiteiros de Lampião nessa região foi
João Ramos de Souza, conhecido por todos como Joãozinho. Entre as filhas desse
coiteiro Lampião se engraçou da jovem Helena e com ela teve um caso, poucos
dias depois a menina-moça apareceu grávida e O Rei do Cangaço para resguardar a
honra da jovem e não desmoralizar a família que tanto lhe dava guarida, tomou
uma rápida e sábia decisão: Pagou uma alta quantia a um rapaz, Simão Alves dos
Santos, para que ele casasse com Helena e assumisse a paternidade do filho do
cangaceiro. Simão topou o acordo e assim foi feito, nascendo a criança no dia
13 de agosto de 1930, sendo batizada com o nome de José Alves dos Santos. O
parto foi realizado por dona Lídia, mãe do cangaceiro Zé Sereno. Durante muito
tempo as conversas sobre esse caso foram mantidas em segredo, temendo a
população que Lampião fosse sabedor que a conversa havia se espalhado.
Quando Lampião
morreu e o cangaço se extinguiu as brincadeiras começaram a surgir e os amigos
de José Alves sempre o perturbavam relacionando-o como filho de Lampião. Os
comentários tornaram-se freqüentes e as pessoas de mais idade sempre tocavam no
assunto. José Alves dos Santos ainda encontra-se vivo e residindo em Chorrochó,
nas mesmas terras onde seus pais o criaram. Estive recentemente com ele quando
realizei extensa entrevista e ele concordou em fazer um exame de DNA para
realmente comprovar o que os fatos indicam. Os testes estão em andamento e só o
tempo dirá se ele é realmente mais um filho gerado nas caatingas do Sertão
Nordestino, mais um rebento descendente de Lampião, mais um fruto evidenciado
de um farto capítulo da nossa história recente, a história do Cangaço, capítulo
ainda tão latente, tão presente nos carrascais do Sertão.
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