Por Rangel
Alves da Costa
Aqui, sentado
na beirada de uma das panelas abertas na pedra, de vez em quando olhando ao
redor para avistar pedreiras, funduras, trincheiras, locas e esconderijos,
então me vejo – até entristecido – matutando: Aqui foi templo e pedestal
cangaceiro. Aqui serviu tanto como coito para repouso e ocultamento bandoleiro
como para sentenças de mortes dos próprios cangaceiros. A cangaceira Lídia foi
morta ali, o cangaceiro Coqueiro foi morto acolá, a cangaceira Rosinha um pouco
mais adiante. E eu aqui em meio ao livro aberto no passado. Aqui rodeado de
memórias tristes, de sombras medonhas de antigamente, de horrores e de ecos
aflitos que o tempo jamais silencia. É como se o sangue ainda estivesse
amolecido por cima das pedras e ao redor. É como se lá dentro, lá dentro da
fundura da panela da pia, vultos se movessem procurando saída. Bem ali ao
fundo, logo depois do velho umbuzeiro, há uma cova. É a sepultura de Lídia. As
pedras juntadas por cima talvez tenham sido ali despejadas pelas mãos odiosas
do algoz Zé Baiano, seu traído companheiro. Lampião estava por aqui, mas deixou
que tudo acontecesse pela mão do ódio, da vingança e da violência. Mas não foi
só culpa de Lampião, e sim da hostilidade do tempo e da desesperança na luta,
do ódio entrincheirado nos corações e das incertezas em cada passo. Em meio a
tanta morte, a tanto sofrimento e a tanto sangue derramado, de nenhuma valia
seria uma vida a mais ou a menos. Mas é melhor deixar pra lá. Avisto Lampião
saindo detrás de um tufo de mato e vindo em minha direção. Eu teria muito a
falar com ele, pois muita pergunta a fazer, mas é melhor deixar isso pra lá.
Aqui no coito é assim, um reencontro com o cangaço e sua história, mas também
uma tristeza danada pelo que aqui aconteceu. E que parece tão presente como
naquele mês de julho do ano de 34.
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