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segunda-feira, 13 de julho de 2020

LIVRO "LAMPIÃO A RAPOSA DAS CAATINGAS"


Depois de onze anos de pesquisas e mais de trinta viagens por sete Estados do Nordeste, entrego afinal aos meus amigos e estudiosos do fenômeno do cangaço o resultado desta árdua porém prazerosa tarefa: Lampião – a Raposa das Caatingas.

Lamento que meu dileto amigo Alcino Costa não se encontre mais entre nós para ver e avaliar este livro, ele que foi meu maior incentivador, meu companheiro de inesquecíveis e aventurosas andanças pelas caatingas de Poço Redondo e Canindé.

O autor José Bezerra Lima Irmão

Este livro – 740 páginas – tem como fio condutor a vida do cangaceiro Lampião, o maior guerrilheiro das Américas.

Analisa as causas históricas, políticas, sociais e econômicas do cangaceirismo no Nordeste brasileiro, numa época em que cangaceiro era a profissão da moda.

Os fatos são narrados na sequência natural do tempo, muitas vezes dia a dia, semana a semana, mês a mês.

Destaca os principais precursores de Lampião.
Conta a infância e juventude de um típico garoto do sertão chamado Virgulino, filho de almocreve, que as circunstâncias do tempo e do meio empurraram para o cangaço.

Lampião iniciou sua vida de cangaceiro por motivos de vingança, mas com o tempo se tornou um cangaceiro profissional – raposa matreira que durante quase vinte anos, por méritos próprios ou por incompetência dos governos, percorreu as veredas poeirentas das caatingas do Nordeste, ludibriando caçadores de sete Estados.
O autor aceita e agradece suas críticas, correções, comentários e sugestões:

(71)9240-6736 - 9938-7760 - 8603-6799 

Pedidos via internet:

franpelima@bol.com.br

Mastrângelo (Mazinho), baseado em Aracaju:
Tel.:  (79)9878-5445 - (79)8814-8345

Clique no link abaixo para você acompanhar tantas outras informações sobre o livro.
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1° EPISÓDIO - A CASA ONDE LAMPIÃO NASCEU



Nas Pegadas de Lampião: Uma jornada pra lá de emocionante conhecendo algumas das Histórias do famoso Virgolino Ferreira da Silva, Vulgo Lampião. Toda segunda e quarta a partir das 9 da manhã nas nossas redes sociais: @museudocangaço; Facebook: Fundacaocabrasdelampiao; E também pelo nosso Canal no YouTube: https://www.youtube.com/channel/UCtxt... Venha viver essa aventura, aguardamos você.

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" O IMPORTANTE PAPEL DAS MULHERES NO FOGO DE GUARIBAS".


Luis Bento

CASA DA CULTURA
APOIO, Prefeitura Municipal de Jati-Ce
( JATI Em Boas Mãos )
ADM. Maria de Jesus Diniz Nogueira
(Neta).
DIRETOR DE CULTURA
Luís Bento de Sousa
Luís Carolino.


No Fogo de Guaribas só havia duas Mulheres dentro da casa grande de Chico Chicote. Dona Geracina, esposa, e dona Josefa, sua filha. Nenhuma serviçal da casa estava na hora; aquelas duas tiveram importante papel no decorrer no tiroteio que dorou 32 horas.

Chico Chicote atirava com vários rifles a seu dispor; dona Geracina e sua filha foram encarregadas de os municiarem. Chico Chicote só atirava! E de tanto atirar, os rifles ficaram com os canos incandescentes. As duas mulheres foram também encarregadas da refrigeração dos rifles em latas de água, ali posta para isso, possibilitando Chico Chicote atirar continuamente, como se fossem muitos os defensores. Elas foram poupadas da morte, e presenciaram a bárbara morte do chefe da família.

Não houve tempo de alimentarem. Somente a luta tenaz e a residência heróica estavam na agenda daquele pequeno grupo de quatro homens e duas mulheres, sustentando um fogo desigual contra as polícias de três Estados. Nunca se viu coisa igual antes! Guaribas foi mesmo uma epopéia como igual nunca se viu, nem se verá! Guaribas jamais será repetida, porque Chico Chicote morreu!

Fontes: Napoleão Tavares Neves
Cariri, Cangaço, Coiteiros e adjacências - Pág - 62.



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MEMORIAL ALCINO ALVES COSTA. A Linda História do Sertão!..Poço Redondo--SE,


OBS: Excelente museu e, contém muitas peças. Vale a pena visitá-lo. ( dendo, por Volta Seca).


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UMA OBRA À PROCURA DE UM EDITOR


Antônio Corrêa Sobrinho

"A resenha abaixo, publicada no Diário de Pernambuco em 1974, sobre o clássico Lampião, seu Tempo e Seu Reinado, do padre Frederico Bezerra Maciel, faz parte integrante da seleção de 550 textos jornalísticos, que reuni no e-book Lampião, Maria Bonita e o Cangaço sob o olhar dos literatos nos jornais e revistas, disponível gratuitamente no site www.antoniocorreasobrinho.com

UMA OBRA À PROCURA DE UM EDITOR
(Lampião, seu Tempo e Seu Reinado)
José Rafael de Menezes

Foi-me confiada a leitura e revisão de um trabalho de proporções gigantescas: Lampião, seu Tempo e Seu Reinado. Os dados do empreendimento são impressionantes: 1.000 laudas datilografadas; 62 capítulos; 526 notas; 120 fotos; 83 mapas... Será que Lampião é tema para tanto material? Será que Lampião ainda é assunto? E o mais questionável: o autor é um sacerdote. Padre mesmo de carreira paroquial, com sua reverência e sua ortodoxia, seu zelo apostólico e sua perseverança vocacional.

Nos muitos anos de seu ministério no Sertão, o padre Frederico Bezerra Maciel foi escutando notícias sobre as atividades dos marginais do cangaço; foi se impressionando com a superioridade de um deles – Lampião. Observou a variedade dos julgamentos. Viu-se aos poucos provocado para se definir. Procurou esclarecimentos junto a vítimas e a protegidos. Por curiosidade visitou cartórios, leu relatórios oficiais, correspondências particulares, bilhetes passaportes, folhetos populares. Incursionou pela bibliografia pretensiosa. E se sentiu obrigado a resumir e a rever... Daí a ideia do livro, já na metade pelo que recolhera curiosamente. Decidiu-se então aprofundar a pesquisa e consultou 30 mil exemplares de jornais. Traçou um roteiro histórico-social, pluricultural, de uma obra muito além de biográfica, ecológica. De análise e interpretação de toda uma área sertaneja, pouco estudada – a dos afluentes do São Francisco, Pajeú e Moxotó; das cidades e dos costumes. Dos líderes. Dos incidentes entre 1910 e 1940. Tudo se destinando a explicar o fenômeno Lampião, mas transbordando do personagem e valendo na seriedade do expositor, como estudo geoecológico, social, histórico. Para ser mais útil e original, no seu imenso esforço, o padre Frederico traçou mapas, reconstitui áreas culturais, desenhando casas, figuras humanas, animais, objetos – com pendores excepcionais. De uma multiplicidade minuciosa. Sem dúvida com despesas, em material, com riscos para se aproximar. E muitas horas, e muitos anos. Trinta anos de pesquisa. Esses detalhes, esse esforço, essa paixão logo se me impuseram. A um professor, a um intelectual, a um escritor, tanto trabalho e tanta perícia, tanto empenho e tanta organização, modelavam-se: para registrar, para divulgar, para exortar...

Após a leitura dos primeiros volumes posso afirmar que a obra vale. Que toda essa peripécia se compensa. O escritor existe e provoca. Haverá de esperar, de um homem erudito, de um historiador, de um sacerdote à antiga, a verbosidade, o rigor clássico, a abundância retórica. Pelo já lido há surpreendentemente uma linguagem audaciosa. Uma abertura quase insólita, pelo conviver e pelo misturar – como pelo inovar – termos e períodos, frases e conceitos, estrutura do ensaio gigantesco. Nada pacífico. Nada bem comportado. Um desafio ao leitor. Como sucedeu ao Os Sertões, de Euclides da Cunha, e à Pedra do Reino, de Ariano Suassuna. Sem ter tido o propósito de seguir esses mestres, vindo acidentalmente erguendo sua obra, o padre Frederico é pródigo como expositor. É um escritor, com muitas complicações, mas um escritor... E sua documentação resiste, conduz a segurança da responsabilidade do autor e se comprova, pelas fontes exaustivamente referidas. Estamos então diante de um livro. De um possível grande livro, só dependendo de um editor.

Na missão que me foi confiada, de rever e sugerir uma reestruturação da obra, sinto-me vencido. É impossível alterar um trabalho que foi se erguendo em etapas, circunstâncias e que conduz a marca do seu autor, nada acadêmico. Limito-me a ler com proveito e deleito, de sertanejo. Possuo motivos de discordâncias em alguns pontos, mas na maioria das teses ou das versões, tenho me modificado. Acredito que o livro poderia ser bem menor, desde que há excessivo zelo por anotações, discrições, comprovações. Mas como já afirmei, é difícil alterar o conjunto. É quase impossível podar. Um editor sem ambição de lucros. Um editor público – de finalidade cultural, como a Universidade, como o Instituto Nacional do Livro, como o Instituto Joaquim Nabuco, o Instituto Histórico.

O trabalho do padre Frederico: Lampião, Seu Tempo e Seu Reinado é grandioso e desafiante. Polêmico, exaustivo. Mas de uma grandeza que abala o leitor dos originais e exige um grande editor.
Diário de Pernambuco (PE) – 04.02.1974


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LUTO NA ARTE DE CEARÁ-MIRIM O ADEUS A IVO MAIA (VÍTIMA DO COVID-19)

Por Edvaldo Morias


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VIAGEM A MACEIÓ

Clerisvaldo B, Chagas, 13 de julho de 2020
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 2.343

(HOMENAGEM AO ESCRITOR FLORO DE ARAÚJO MELO)
Caro leitor, calcule quando foi o acontecimento da narrativa abaixo, do conterrâneo Floro (In memoriam) na íntegra.
A viagem foi extremamente cansativa. Fomos de caminhão até Palmeira dos Índios, ponto terminal da estrada de ferro. Não havia asfalto, a poeira era sufocante, levamos quase um dia inteiro ao sabor de buracos e depressões medonhas do terreno. Ao atingir o destino, ninguém tinha forças para embarcar. Tivemos que pernoitar no hotel, ou melhor, numa estalagem sem conforto e sem muita higiene.

Máquina do trem de Palmeira dos Índios no Museu Xucurus. (Foto: Livro:
"Repensando a Geografia de Alagoas/B. Chagas)

O trem partia de madrugada. Saímos do “hotel” sonolentos e com muito cuidado, devido aos buracos das ruas e à má iluminação da cidade. Eu, entretanto, exultava: garoto do sertão, tudo para mim era novidade e descoberta. Imagine o leitor que jamais ouvira um apito de trem! Com grande estardalhaço, a máquina partiu, levamos horas intermináveis sentados naqueles duros bancos de madeira, ouvindo os ruídos ritmados das rodas em contacto com os trilhos desgastados pelo tempo de uso. Para quebrar a monotonia, eu olhava pela janela e divisava a paisagem que ia ficando para trás, as serras, as casas das cidades por onde o trem passava, as paradas ao longo da estrada e, nessas, uma imagem triste que me ficou para sempre na memória: crianças sujas e maltrapilhas que pediam moedas ou vendiam banana, manga, jaca, etc.,  tudo num vozerio que mais parecia uma dolorosa e sofrida ladainha. Ah, meu Nordeste querido, quando tais cenas deixarão de acontecer em seu seio?!   Minha avó, já conhecedora da melancólica procissão, nem sequer abria a janela, sempre a segurar-me pelo braço. Felizmente, a demora era pequena, o trem apitava estridente altivo e se punha em marcha.
(...Finalmente Maceió...)

MELO, Floro de Araújo. Vim Para Ficar. Borsoi, Rio de janeiro, 1981. Págs 29-30.
Nota: a “minha avó” a que o autor se refere, foi a primeira professora de Santana do Ipanema, Maria Joaquina.


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ZABELÊ, CORRENTEZA E DINDA: MEUS PARENTES CANGACEIROS

*Rangel Alves da Costa

Nos dias de hoje, a cada esquina de rua de Poço Redondo, no sertão sergipano, o caminhante acaba encontrando um parente de cangaceiro ou de coiteiro. Certa feita disseram que em Poço Redondo quem não era cangaceiro era coiteiro. E não há nenhum absurdo em tal afirmação. Era quase assim mesmo. Na pequena povoação e na vastidão de seus arredores, grande parte da população ou estava junto com Lampião ou a seu serviço.
Mais de trinta e quatro mocinhas e rapazes fizeram parte do bando do Capitão Virgulino. Mas um número indescritível de poço-redondenses fez parte do rol daqueles que, mesmo não seguindo os passos do cangaço, intermediavam o bem-estar, a segurança e a proteção dos cangaceiros. Estes eram os coiteiros.
Como diz o outro, coiteiro em Poço Redondo teve de “ruma”, e cangaceiro teve de “montão”. Acaso alguém se debruce sobre as raízes familiares destes sertões do Velho Chico, das terras de China do Poço e de Zé de Julião, dificilmente não encontrará um parente que foi cangaceiro. Minha família paterna, a família Marques, por exemplo, contou com dois cangaceiros: Zabelê e Correnteza. Já minha família materna, do tronco dos Alves, teve a cangaceira Dinda como sua representante.
Manoel Marques da Silva, o Zabelê, era irmão de minha avó Emeliana. Alcino Alves Costa, meu pai, filho desta, era, portanto, sobrinho do cangaceiro. E eu, então, um sobrinho-neto. Este Zabelê foi, certamente, o último dos três Zabelê que existiram do bando de Lampião. E assim porque o Zabelê dos Marques de Poço Redondo estava em Angico naquele fatídico dia 28 de julho de 1938, quando Lampião, Maria Bonita e mais nove cangaceiros foram mortos pelas forças volantes. E não haveria como ter surgido outro Zabelê pós-Angico.
Manoel Marques, o Zabelê de Poço Redondo, foi um dos sobreviventes à chacina. Contudo, até hoje a família jamais soube de seu paradeiro após a fuga. Era o segundo homem dos onze filhos de Antônio Marques da Silva e Maria Madalena de Santa (Mãe Véia), sendo oito mulheres, dentre as quais minha avó Emeliana. Cangaceiro com nome de passarinho, quando fogo de Angico começou a zunir por todo lugar, então bateu asas e voou. E voo tão apressadamente alto que até hoje é desconhecido seu paradeiro. Já nos céus, na terra, ninguém sabe.
Outro parente meu, pelo lado de meu pai Alcino, foi o cangaceiro Correnteza, de nome Joaquim Marques da Silva. Correnteza era primo “carnal” de Zabelê e, como quase todos os poço-redondenses que foram para o cangaço, acabou servindo ao subgrupo de Zé Sereno (companheiro de Sila, também de Poço Redondo). A admissão de tantos filhos de Poço Redondo neste subgrupo parece ter apenas uma explicação: Sila. Esta era uma espécie de Maria Bonita no subgrupo do companheiro. Igual à companheira de Lampião, certamente também possuía muito poder de mando junto a Zé Sereno. Daí chamar seus conterrâneos para o seu lado.
Correnteza, ao contrário do que se imagina, não nasceu em Porto da Folha, mas nas terras da família Marques já na povoação de Poço Redondo, na Lagoa de Dentro ou arredores. Seu pai era irmão de meu bisavô Antônio Marques. Diferente de seu primo Zabelê, Correnteza não suportou as agruras do cangaço e fugiu do bando enquanto estava acoitado na fazenda Boa Lembrança, em Poço Redondo. Da fuga desesperada, só retornou ao sertão sergipano após a morte do Capitão. Sabia o seu destino acaso fosse encontrado pela cangaceirama.
Já a cangaceira Dinda, que certamente possuía outro prenome e Alves Feitosa como sobrenome, pois filha de Presentino Alves e Eutímia Feitosa, sendo seu pai irmão de meu avô Teotônio Alves China (o China do Poço Redondo), foi uma das sete mulheres de Poço Redondo que enveredaram no mundo carrasquento dos cangaceiros: a própria Dinda, Sila, Adília, Enedina, Áurea, Rosinha e Adelaide.
No cangaço, Dinda foi companheira de Delicado (João Brás de Souza, ou João Mulatinho, irmão da cangaceira Adília), também de Poço Redondo. Os dois jovens sertanejos eram noivos quando João Mulatinho resolveu seguir Lampião. Sua noiva Dinda não suportou a saudade e pediu-lhe para fazer companhia naquela vida de ilusões, desilusões, dores e sofrimentos. Estava no Angico durante o fogo matador. Os noivos, contudo, restaram salvos da terrível chacina.
Assim, relatos sobre uma parentagem que fez parte da saga cangaceira. Depois de seus feitos e de suas partidas, restou aos que ficaram a guarda de suas memórias. Memórias cangaceiras, é verdade. Mas, acima de tudo, História. Há gente que não gosta de ser reconhecido com tal parentesco. Mas um vínculo que não pode ser afastado por um desejo próprio. Que se honre ou não a afinidade familiar, o que não se pode ocultar é a verdade desde muito enraizada.

Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

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CAPITÃO VIRGULINO — COMO O “REI DO CANGAÇO” FOI PROMOVIDO A CAPITÃO DO EXÉRCITO


Por Rostand Medeiros - Transcrito do site Tok de História
A história da famosa promoção a capitão do cangaceiro Virgulino Ferreira da Silva, o “Lampião”, ocorrida em Juazeiro, no ano de 1926, é de conhecimento de todos e um tema já bastante divulgado. Sobre o homem que realizou este procedimento, o pernambucano Pedro de Albuquerque Uchôa, muito já foi igualmente comentado.
Quem primeiro trouxe a história da patente e a figura de Uchôa ao conhecimento geral foi o cearense Leonardo Mota (1891-1947), no seu livro “No tempo de Lampião”. Lançado em 1930, a entrevista transcrita de Uchôa colocou este funcionário público no centro das atenções.
Três anos após o lançamento do livro de Mota e sete anos depois deste acontecimento “burocrático-cangaceirístico”, Uchôa teceu mais alguns interessantes comentários relativos a este pitoresco episódio da trajetória do Rei do Cangaço.
Matéria com Uchôa
Através da reprodução das páginas de um vespertino carioca, apresentadas na primeira página do jornal sergipano “Diário da Tarde”, de sexta-feira, 29 de setembro de 1933, vamos encontrar o funcionário público Uchôa, aparentemente vivendo na antiga Capital Federal. Pela descrição no jornal, tudo indica que ele não era mais um membro dos quadros do então Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio. Era apresentado pelo jornal como funcionário da “Secretaria do Tribunal”, sem especificar se era um tribunal ligado a justiça Estadual ou Federal.
O jornalista que realizou a entrevista informa que se espantou ao descobrir que estava diante do homem que forçadamente provocou uma interessante querela burocrática e o mesmo, em nenhum momento da entrevista, negou o seu ”feito”.
“- Fui eu mesmo, quando estava no Juazeiro, Ceará”. Afirmou Uchôa.
Mas como tudo ocorreu
Para reavivar a memória de todos, recorro ao excelente livro “Padre Cícero-Poder, Fé e Guerra no Sertão”, de autoria do jornalista e escritor cearense Lira Neto, que no capítulo 11, páginas 463 a 482, traça detalhadamente os episódios que culminaram na criação da patente de capitão para Lampião.
No ano de 1925, o então presidente da República Arthur Bernardes idealizou um plano para derrotar os componentes de uma coluna de oficiais rebelados do Exército Brasileiro, que percorriam os sertões na esperança de insuflar a massa com o seu exemplo de luta, derrubar o presidente e alterar a ordem vigente na nação. Comandados por Luís Carlos Prestes, Isidoro dias Lopes, Siqueira Campos, eram conhecidos na época como Revoltosos.
Eles estavam no início de 1926 adentrando o Ceará, vindos do Piauí. O presidente da República convoca Floro Bartolomeu da Costa para organizar a resistência aos rebelados no Ceará. Floro era um médico baiano, que vivia em Juazeiro, era deputado federal, muito ligado ao Padre Cícero Romão Batista e que em 1914 havia organizado um movimento sedicioso que culminou com a derrubada do então governador cearense, Franco Rabelo. Parecia o homem certo para a função.
Floro procura o Padre Cícero, carismático prefeito e religioso de Juazeiro, e, com uma dinheirama vinda do Rio de janeiro, organizam os chamados Batalhões Patrióticos. Eram mais de mil homens com uniformes de brim azul-celeste e munidos de modernos fuzis privativos das forças armadas. Foram passados em revista pelo Padre Cícero em 9 de janeiro de 1926 e saíram ao encalço dos revoltosos.
Mas a caçada não deu certo. Afeitos as táticas de guerrilhas e ao constante movimento da tropa pelo sertão, os revoltosos conseguiram driblar os membros dos Batalhões Patrióticos e seguiram atravessando o Ceará.
Desesperado, o Floro pede mais dinheiro ao governo e amplia a já amalucada ideia de Arthur Bernardes. Ele envia um portador com uma carta do padre destinada a ninguém menos que Virgulino Ferreira da Silva, o famigerado Lampião. Ele estava sendo convocado para uma “Guerra Santa”.
No início desconfiado, Lampião acabou aceitando o convite do seu “Padim Ciço”, o homem a quem ele devotava confiança cega e que aparentemente, protegia os seus familiares há algum tempo de vinganças.
Virgulino partiu para o Juazeiro.
Lira Neto foi muito feliz ao colocar uma frase que exemplifica esta parte desta história; “Deus e o Diabo iriam se encontrar na Terra do Sol”.
Mudanças no Meio do caminho
Enquanto Lampião seguia para a “Meca do sertão”, os Revoltosos driblavam os Batalhões Patrióticos e seguiam seu caminho de lutas sem nem chegar perto de Fortaleza, ou de Juazeiro, grande temor do Padre Cícero. Neste meio tempo Floro Bartolomeu adoeceu fortemente de sintomas ligados a sífilis e deixou a “frente de combate”.
Logo a coluna de Revoltosos, que entraria para a história do Brasil como Coluna Prestes, passou pelo Rio Grande do Norte (Cidades de São Miguel e Luís Gomes) e seguiu para a Paraíba. Floro Bartolomeu por sua vez rumou para Fortaleza e depois foi de navio para o Rio de janeiro, onde morreria em pouco tempo.
Tudo parecia indicar que a tempestade havia passado, mas uma nuvem negra, em formato de um chapéu de couro com a testeira quebrada, se aproximava de Juazeiro.
O perigo dos Revoltosos poderia ter até passado, mas Lampião vinha cobrar a sua conta para poder “cumprir seu dever cívico”.
A princípio o chefe da guarnição policial de Juazeiro pensou em oferecer resistência, mas Padre Cícero não podia aceitar esta situação. Afinal o homem era um convidado e deveria ser bem recebido. Durantes três dias de um final de semana memorável para a cidade de Juazeiro, Lampião e seus homens aproveitaram ao máximo da principal urbe do interior do Ceará.
Na noite de 4 de março de 1926, ocorreu o famoso encontro de duas das mais míticas figuras já produzidas no Nordeste do Brasil.
É nessa hora que entra em cena Pedro de Albuquerque Uchôa.
Encontro Memorável
Voltando a reportagem reproduzida sete anos após os fatos, Uchôa comenta que ainda na época em que vivia em Juazeiro, era “muito amigo” do líder político e religioso da cidade. Afirmou que mantinha uma boa relação com o religioso, a ponto de todo dia o Padre Cícero ir tirar um cochilo na sua casa ao meio dia. Nestas horas a casa de Uchôa ficava cheia de romeiros que vinham pedir a benção ao velho padre.
Sobre os acontecimentos de 4 de março de 1926, Uchôa não narra o que aconteceu antes da chegada de Lampião, mas informa que nesta noite foi acordado por dois “jagunços”, em um sobradinho onde morava com seu contraparente, o cantador João Mendes de Oliveira.
Os homens intimaram o funcionário público, afirmando autoritariamente que “-Meu padrinho está chamando o Senhor com urgência”. Uchôa não perdeu tempo e foi logo a casa do Padre Cícero.
Segundo sua narrativa, estes dois homens portavam fuzis a tiracolo, estavam encourados e cheios de “medalhas”. As medalhas no caso, certamente seriam imagens de santos penduradas no peito. Ao escritor Leonardo Mota, Uchôa afirmou que estes homens eram Sabino Gomes e o irmão de Lampião, Antônio Ferreira.
Ao chegar a residência do líder de Juazeiro, o Padre Cícero lhe apresentou Lampião e disse, conforme está reproduzido no velho jornal sergipano de 1933.
“- Aqui está o capitão Virgulino Ferreira. Ele não é mais bandido. Veio com cinquenta e dois homens para combater os revoltosos e vai ser promovido a capitão. Olhe, o senhor vai fazer a patente de capitão do Sr. Virgulino Ferreira e a de tenente do seu irmão”.
Evidentemente que Uchôa ficou pasmo, “perplexo” em suas palavras.
Fiquei imaginando a cara do pobre coitado do funcionário do Ministério da Agricultura, acordado no meio da noite com esta bomba na mão. Ele ainda tentou argumentar que não podia, mas um dos irmãos de Lampião ponderou na hora.
“- Não, se meu padrinho está mandando o senhor pode”.
O Padre Cícero lhe colocou na condição de “mais alta autoridade federal de Juazeiro” e aí não teve jeito. Com o carismático prefeito ditando os documentos, foram “lavradas” as designações de patente.
Padre Cícero em sua mesa de trabalho
Segundo Uchôa comentou ao repórter, parte dos termos do documento referente a patente de Lampião foram; “Pelo Governo Federal era concedido a Virgulino Ferreira a patente de capitão do Exército, por serviços prestados a República”.
Depois o Padre Cícero foi categórico e ordenou a Uchôa um curto “assine”. Ele colocou a sua firma no controverso documento.
Interessante é que em nenhum momento na reportagem, Uchôa pronuncia que concedeu uma patente a um dos mais cruéis e sanguinolentos bandidos de Lampião, o famigerado Sabino.
Após os “trâmites burocráticos”, Uchôa afirma que presenciou o temível Lampião, todo equipado, se ajoelhar reverentemente e beijar emocionado a batina do Padre Cícero. Lampião informou ao Padre que se comprometia a “proceder bem”…..
Uchoa informou ainda que após o encontro destas duas figuras, Lampião e seus homens receberam suas armas, munições e partiram no meio da noite.
Se assim foi, este foi o último ato da visita de Lampião e seu bando a Juazeiro.
Um Simples “ajudante de inspetor agrícola”?
A Leonardo Mota, o funcionário público Uchôa afirmou que ao retornar para a sua casa, por volta das onze da noite, tentou argumentar com Sabino e Antônio Ferreira que aquele documento não valia nada e que ele “não passava de um simples funcionário subalterno do Ministério da Agricultura”. Ao que o irmão do cangaceiro-mor do Brasil respondeu secamente que “-Se o padre dissera que era ele que devia assinar a patente, era porque era ele mesmo”. Uchôa se calou.
Ao ler em Mota, que Uchôa se considerava “um simples funcionário subalterno do Ministério da Agricultura”, percebi que na reportagem de 1933, Uchôa informou que na época era um “simples ajudante de inspetor agrícola”.
Ele então se encontrava em um dos postos mais baixo na hierarquia dos quadros funcionais do Ministério da Agricultura daquela época? Seria obrigatório que um “ajudante de inspetor agrícola”, fosse uma pessoa com formação superior?
A resposta é não necessariamente.
Mesmo com o termo “ajudante”, aparentemente esta extinta função do Ministério da Agricultura, conforme se lê em vários exemplares do Diário Oficial da União (D.O.U.) desta época, poderia, ou não, ser exercida por uma pessoa com o título de agrônomo. Encontrei várias transferências publicadas no D.O.U., do início da década de 1930, onde vemos inúmeros “ajudantes de inspetor agrícola” sendo remanejados. Alguns aparecem com o título de “agrônomo” adiante do cargo, em outros não.
O interessante é que na entrevista concedida no Rio, sete anos depois do episódio em Juazeiro e reproduzida na primeira página do jornal sergipano “Diário da Tarde”, em nenhum momento Uchôa comenta sua formação superior. Isso em uma época onde o Brasil era tão carente de educação, que quem era “Dotô” fazia questão de dizer a todos sobre a sua superioridade acadêmica e ainda mostrar o seu anel de formatura.
Das duas uma; ou Uchôa era um homem muito humilde, ou o repórter do tal vespertino carioca era muito fraco…
Consequências
Certamente o Padre Cícero, em muito pouco tempo, deve ter se arrependido de dar continuidade à ideia de Floro de trazer Lampião a Juazeiro.
Logo Lampião percebeu que de seus “colegas de farda”, estes não viriam até ele com salamaleques típicos de militares e nem com continências do estilo. Deles, Lampião só iria receber bala.
Sobre a sua luta contra os Revoltosos da famosa Coluna Prestes, existem indicações que Lampião e seu bando travaram um pequeno combate em Pernambuco, sem maiores consequências. Depois o cangaceiro decidiu continuar seu caminho de depredações, saques e violências, do qual era um especialista, deixando de lado a promessa feita ao Padre Cícero.
Mas quem não deixou passar em branco a situação foram os jornais da época, que se mostraram extremamente impiedosos nas críticas ao líder de Juazeiro.
As manchetes do jornal recifense “A Noite”, de 10 de agosto de 1926, aqui apresentadas, dão uma ideia do que o Padre Cícero sofreu. O texto então é pior ainda. Nele encontramos; “E ainda agora, para coroar toda esta obra de misérias que o Padre Cícero vem desenvolvendo ao longo de anos, Lampião passeia a sua impunidade nas ruas de Juazeiro, garantido e hospedado pelo padre satânico”.
Em minha opinião o Padre Cícero não percebeu a extensão do estrago que ocorreria quando decidiu dar prosseguimento ao plano desorientado de Floro Bartolomeu.
Alguém se esqueceu de lembra ao padre que seria muito difícil fazer com que certos componentes de volantes que combatiam os cangaceiros, teriam agora de parar a sua luta figadal contra o facínora e seus homens, e ainda mais, teriam de prestar continência ao capitão Virgulino. Isso tudo apenas por uma ordem emanada de Padre Cícero e sacramentada pela “mais alta autoridade federal de Juazeiro”, um “ajudante de inspetor agrícola”.
Para a imprensa do país e certos setores da elite que governavam a nação, a ação do Padre Cícero foi considerada, no mínimo, “desastrada” e só serviu para manchar a sua biografia.
Sobrou até para o pobre do Uchôa. Segundo a reportagem de 1933, ele teve de prestar contas do ocorrido a ninguém menos que o próprio Ministro da Agricultura.
Uchôa não informa se foi ao titular da pasta durante a gestão Arthur Bernardes, o baiano Miguel Calmon du Pin e Almeida, que ele teve de narrar os fatos. Ou se prestou contas ao sucessor deste, o paraense Geminiano Lira Castro. Ou se este encontro ocorreu com o paulista Paulo de Morais Barros, que assumiu o ministério depois da Revolução de 1930, na mesma época que ocorreu o lançamento do livro de Leonardo Mota, que tornou o “simples funcionário subalterno do Ministério da Agricultura”, em alguém que mereceu um encontro com o titular do ministério.
Com qual ministro se Uchôa encontrou, não importa. O que importa foi que neste encontro ele falou a autoridade o mesmo que havia dito a Leonardo Mota; “Naquele momento eu lavraria até a demissão do presidente da República”…
Não sei se esta verdadeira “epopeia burocrática” trouxe a Uchôa algo mais do que constar nos livros de história do cangaço.
Sem dúvida alguma, apenas uma pessoa saiu ganhando deste episódio e ele foi Lampião. Além de receber novos fuzis e munições, vaidoso como era, deve ter adorado a sua “patente”. Pois assim passou a assinar seus bilhetes e seus cartões que continham sua fotografia. A partir do dia que Uchôa assinou aquele papel, todos os nordestinos que ficaram diante de Lampião, desde um rico coronel na sua casa-grande, ao simples lavrador na sua tapera, passaram a tratá-lo como capitão.
Uma situação chama atenção.
Lampião sabia que não lutaria mais com a Coluna Prestes?
A Coluna Prestes cruzou o Rio Grande do Norte em 4 de fevereiro de 1926, depois foi para a Paraíba e Pernambuco. Lampião só chegou a Juazeiro em 4 de março. É possível que ele soubesse por onde andava a Coluna? Certamente. Os jornais Pernambucanos da época, que estão no Arquivo Público de Pernambuco, dão notícia praticamente dia a dia dos Revoltosos. Se os jornais em Recife sabiam, imaginem Lampião.
Esperto e bem informado, certamente Lampião deveria saber de tudo isto. Mas como diz Lira Neto, foi a Juazeiro cobrar o que lhe foi prometido.
Lampião era tão sem vergonha, pilantra, que não ficou satisfeito só com as armas e munições (que já era um grande presente), quis a patente, quis sair de Juazeiro como “oficial” e “oficializado” e aí ocorre o caso do Uchôa.
Me chama a atenção que, com o poder que o Padre Cícero tinha em Juazeiro, ele poderia ter mobilizado até as “corujas da torre da igreja” para lutar contra Lampião e este jamais teria pisado em Juazeiro e sei lá o que teria acontecido. Mas ele não o fez. Por que?
Creio que o Padre tinha receio de um retorno dos Revoltosos a sua região. Pode ter pensado que podia precisar dos serviços do “capitão”. Não podemos esquecer que nesta época os membros da Coluna já tinham entrado em Piancó, na Paraíba, e degolado o líder político local, o Padre Aristides, depois de um forte combate pouco conhecido.
Defesas em Favor do Padre Cícero
Chama atenção neste episódio a forma como ao longo dos anos os defensores de Padre Cícero buscaram, de todas as maneiras, alterar as características deste encontro com Lampião. Dos cantadores de feira, passando pelo sanfoneiro Luís Gonzaga e até na internet dos nossos dias, muita gente buscou dar uma nova versão aos fatos.
Durante anos existiram folhetos de cordel, livros, revistas que defendiam a existência histórica do encontro e surgiam os defensores da tese que nada foi daquela forma.
Capa do disco com o show de 1972, com Luiz Gonzaga ao vivo.
Em 1972 o admirador inconteste de Padre Cícero e de Lampião, o sanfoneiro Luiz Gonzaga, de Exu, em Pernambuco, ao realizar um antológico show no Teatro Teresa Raquel, no Rio de Janeiro, defendeu abertamente o Padre Cícero em relação ao seu encontro com Lampião. Nesta época, devido a Bossa Nova, Jovem Guarda e outros movimentos musicais, Luiz Gonzaga andava meio esquecido do grande público. Este show foi seu grande retorno, sendo um dos poucos registros de como era Gonzagão no palco.
Quando cantou a música “Olha a Pisada”, de sua autoria em parceria com o médico Zé Dantas, fez um “break” e narrou uma história sobre o episódio. Começava com Lampião e a “cangaceirada” entrando de fuzil na igreja “com a boca do cano para baixo” em sinal de respeito. Gonzaga afirmou que o Padre Cícero não queria que Lampião chegasse muito perto dele e, quando este pediu uma benção, o padre de Juazeiro não lhe benzeu e ainda aplicou com seu cajado uma grande surra em Lampião.
Evidentemente que nada disto aconteceu. Era uma criação fantasiosa do insuperável sanfoneiro, na defesa do Padre Cícero.
Atualmente, chama atenção a defesa do Padre Cícero que ocorre no site Wikepedia (http://pt.wikipedia.org/wiki/Floro_Bartolomeu).
Nesta grande enciclopédia da internet, no tópico destinado a narrar a vida do médico baiano Floro Bartolomeu da Costa, encontramos um texto repleto de meias verdades, que em nada ajuda a estudantes que por ventura utilizarem este serviço para uma pesquisa sobre este assunto.
O texto comenta que no ano de 1925, Floro havia recebido uma ordem do então presidente da República Artur Bernardes para defender o Ceará da Coluna Prestes. Foram então organizados os chamados Batalhões Patrióticos (verdade).
Consta que Floro, teria então usado o nome do Padre Cícero sem que o sacerdote soubesse dos fatos (situação essa muito difícil de ocorrer devido ao prestígio do Padre Cícero).
Este então convidou Lampião a fazer parte do Batalhão Patriótico. Lampião, grande devoto do padre, aceitou o convite e partiu para Juazeiro, mas não encontrou Floro, que havia viajado para o Rio de Janeiro por motivos de saúde (verdade).
Comenta-se que Padre Cícero ficou perplexo quando soube que Lampião estava em Juazeiro para servi-lo (O Padre Cícero sabia que eles vinham).
Ao encontrar Lampião e seu bando, Padre Cícero os aconselhou a abandonar o cangaço e lhes deu rosários de presente, com a condição de que só usassem depois de abandonar a vida bandida (o Padre Cícero pode até ter dado conselhos, rosários e escapulários, mas as armas e munições foram entregues).
Os cangaceiros deixaram então Juazeiro, mas antes Lampião recebeu a patente de capitão do Batalhão Patriótico das mãos de Pedro de Albuquerque Uchôa, funcionário público e integrante do batalhão (Uchôa não afirmou isso nem em Leonardo Mota e muito menos na reportagem de 1933).
O Padre Cícero Romão Batista era um homem do seu tempo, com virtudes e defeitos. Possui uma biografia feita de altos e baixos momentos, coisa normal que qualquer ser humano passa em sua vida. Para mim, o encontro com Lampião foi um momento de baixa na história do padre.
Mas em minha opinião, ele fez sim um grande milagre (e não tem nada haver com a história da Beata Mocinha).
O maior milagre do padre Cícero, mesmo tendo sido realizado em meio a religiosidade popular e mística, lances de violência e muita politicagem, foi a transformação de um simples povoado em uma das mais pulsantes e progressistas cidades do interior do Nordeste.
Fonte: TOK DE HISTÓRIA 
http://blogdomendesemendes.blogspot.com

POSTAGEM NÚMERO SEIS.- EU OUVI DE QUEM ESTAVA LÁ...

Por Charles Garrido

Deixemos a análise das imagens após à leitura, por gentileza.

Conforme havíamos prometido, hoje, quando completa setenta e cinco anos do último combate de Lampião, iniciaremos uma série de relatos referentes à esse episódio. E nada melhor do que começarmos, lendo o depoimento daquele que foi forçado à delatar o local onde o rei do cangaço, e seu bando, estavam escondidos na ocasião. Leiamos atentamente, pois estão inseridos vários diálogos, e assim teremos uma melhor compreensão.

Seu nome é Durval Rosa irmão de Pedro de Cândido o último coiteiro de Lampião. 

Aquele cinco de fevereiro de mil novecentos e noventa e nove, ficará marcado para sempre em nossa memória.

Ele não era muito à dar entrevistas, mas tínhamos um trunfo, Jairo Luiz (o guia), que aliás muito nos ajudou, era casado com uma sobrinha dele, o que supostamente facilitaria nosso tento. Partimos do município alagoano de Piranhas, indo até a cidade sergipana de Poço Redondo, onde ele havia sido prefeito em alguns mandatos, e mesmo com seus oitenta e três anos (à época) ainda era um homem influente em sua região.

Para nossa "infelicidade", era uma tarde chuvosa, e exatamente o dia de um festejo religioso na cidade, o que supunha ser algo imperdível para um sertanejo envolvido com a política. Foi quando um de nossos colegas pesquisadores, falou:

- Está tudo perdido, ele não irá nos receber

Mesmo assim, decidimos seguir em frente.

Paramos os carros na praça, enquanto Jairo Luiz, seguiu até à porta e adentrou à residência.

Alguns minutos depois ele voltou, fazendo mais suspense do que um juiz de direito ao ler a sentença de um réu a ser condenado.

- Ele irá receber vocês, mas sejam breves, pois hoje está havendo um festejo religioso. (Jairo)

O primeiro passo estava dado, ficamos tímidos, pois éramos oito, no total.

Entramos.

Ele e sua família receberam-nos da melhor maneira possível, entretanto, percebíamos que não lparava de olhar para a igreja, que era exatamente em frente à sua casa. Tudo estava contra nós, até mesmo os santos.

Começamos nossa conversa, até então não tratávamos sobre o tema cangaço, só que; surpreendentemente ele falou:

- Como eu já imagino o que vocês querem, podem começar (Durval)

As perguntas começaram à surgir, porém nada de gravações, pois deixamos as câmeras dentro do carro, receosos que isso poderia assustar o senhor em questão.
Depois de quinze, ou vinte minutos de conversa, eu pensei:

- Meu Deus! O homem vai falar tudo e ninguém vai gravar nada.

Ninguém tinha coragem de pedir permissão a ele, pois diziam que nos últimos tempos era avesso à entrevistas. Até que em um certo momento, tomei a iniciativa e o solicitei:

- Sr. Durval, será que poderíamos gravar o seu depoimento?

* Pois não, meu filho (disse ele)

Meus amigos, quando ele falou isso meu coração disparou, eu fiquei parecendo pinto no lixo, quiçá, uma criança pequena, quando volta a energia depois de um "black out".

Fomos correndo pegar os equipamentos para a gravação.

Relatemos agora alguns trechos da entrevista do Sr. Durval Rosa, sem nenhum tipo de interferência, ou modificações. E para uma melhor compreensão por parte de nossos confrades:

DR = Durval Rosa

EQP = Equipe (pois as perguntas, foram feitas por todos nós, pesquisadores presentes)

Sigamos senhores:

EQP - O senhor poderia esclarecer uma dúvida, qual o correto, Grota do Angico, ou Gruta de Anjicos?

DR - o nome correto é Grota do Angico, eu nasci e me criei ali, sei até o local de todas as pedras que tem lá.

EQP - O nome do seu irmão era Pedro de Cândido, ou Pedro de Cândida ?

DR - Pedro de Cândido, pois era uma referência ao nosso pai, que se chamava Cândido.

EQP - O Angico, já era um coito antigo? O senhor era coiteiro?

DR - Eu nunca fui coiteiro, pois ainda era um menino. Já o meu irmão sim, pois era mais velho. E o Angico, já era freqüentado pelo capitão, pois tinha muita água, e muita comida por perto, já que naquela época, a gente tinha muita criação.

EQP - O senhor teve muitos encontros com Lampião?

DR - Tive. Inclusive, dois dias antes dele morrer, conversamos, e perguntei o porque dele continuar naquela vida de cão, ele respondeu que tinha que continuar pra vingar a morte do pai.

EQP - Seu irmão era um homem de confiança de Lampião?

DR - Sim, o capitão confiava muito nele.

EQP - O senhor poderia nos relatar o que aconteceu naquela noite do dia 27, para a madrugada do dia 28 de julho de 1938?

DR - A volante do tenente João Bezerra saiu de Piranhas, a noite, vindo em direção às nossas terras. Ele mandou dois soldados irem até a casa do meu irmão, que na ocasião disse que não iria, pois sua esposa estava grávida e poderia entrar em trabalho de parto a qualquer momento.

Os soldados voltaram sem ele, e o oficial ficou bravo, mandando que eles voltassem de imediato, e o trouxessem a qualquer custo.

Não teve jeito...ele teve que vir

Quando meu irmão chegou até a volante, João Bezerra perguntou:

- Pedro, cadê o homem? (Tenente João Bezerra)

- Sei não seu tenente (Pedro)

- Sabe sim. Só tem uma coisa a fazer contigo, ou você fala, ou morre. (Tenente João Bezerra)

- Sei não senhor (Pedro)

- “Peraí...me dá um punhal pra eu sangrar essa peste aqui sem ter que atirar pra não espantar os bandidos. (Tenente João Bezerra)

- Calma, tenente, eu vou falar... o homem taí... ele e a cabroeira toda do bando. Estão lá na subida da serra. Mas quem pode dar mais informações ao senhor, é o meu irmão Durval, pois antes de ontem, ele foi lá e levou uma máquina de costura da minha mãe, pra eles fazerem um “bornal” pra um sobrinho de Lampião, que havia entrado no bando há pouco tempo. (Pedro)

- Pois vamos agora até o seu irmão. (Tenente João Bezerra)

DR - Aí, já era madrugada, e eu tava sem sono, mesmo porque naquela época ninguém dormia, ainda mais sabendo que Lampião, estava no meu quintal.
Quando dei por mim, ouvi Pedro bater na porta:

- Durval...Durval...Durval (Pedro)

Quando fui atender, pensei:

Vixe Nossa Senhora!

Tinha uns quarenta soldados na calçada. Aí meu irmão disse:

- Durval, o que você souber diga, pois eu já estou aqui todo furado, e se a gente não falar, eles me matam. (Pedro)

DR – O meu irmão vinha andando, e sendo espetado pelos soldados à pontas de punhais.
´
Aí eu desci a calçada, quando pisei no chão, o aspirante Chico Ferreira, totalmente embriagado me empurrou, eu caí, ele colocou a metralhadora na minha cabeça e disse:

- Coiteiro, cabra safado! (Chico Ferreira)

A minha sorte, é que o tenente estava sóbrio, tomou a frente e falou:

Compadre, tenha calma, eu preciso conversar com esse rapaz, ele irá trabalhar por nós.

- Durval, não minta, cadê Lampião? (Tenente João Bezerra)

- Sei não, tenente

- Sabe sim, e diga logo senão eu mato você, e seu irmão. (Tenente João Bezerra)

Aí eu não tinha mais como negar:

- Tenente, os cangaceiros estão aqui perto. Mas eu não posso garantir ao senhor que eles ainda estejam no local. Pois o capitão, pediu pra eu ir lá hoje por volta das cinco horas da manhã, pra devolver a máquina da minha mãe, e pagar umas cabras que eles mataram pra comer.

- Pois ainda dá tempo. Vamos lá agora, e quando chegar no local, se abaixe, pois irá morrer muita gente. (Tenente João Bezerra)

DR - Seguimos subindo a serra, ninguém dava um pio, sempre com cuidado, pra não espantar os cangaceiros. Quando a gente estava se aproximando, ouvimos um barulho, aí eu pensei:

Valha-me nossa senhora, já estão acordados.

O tenente ouviu também, e me perguntou:

- O que foi isso? (Tenente João Bezerra)

- Tenente, cangaceiro não dorme.

Quando a gente foi chegando perto, eu parei e falei:

- Pronto, tenente, aqui ta bom ... (ora mais, eu queria era correr)

- Negativo, vamos continuar. (Tenente João Bezerra)

Aí, eu pensei: o pau quebra já, e vão matar a mim, e meu irmão também. Mas não tinha o que fazer, a não ser, seguir as ordens da volante.

Eu já sabia que estávamos a poucos metros do local, foi quando João Bezerra parou a tropa e perguntou de novo:

- Durval, Lampião está aí mesmo? (Tenente João Bezerra)

- Está, tenente. Não só ele, mas também toda a tropa. E fique certo que o negócio aí vai ser
duro.

O tenente dividiu os soldados, e deu as últimas instruções. Já eram umas quatro e meia da manhã...chuvinha fina...quando eu pensei que não...eu ouvi foi o estrondo:

“taaaaaaaaaaaaaa” (o primeiro tiro de fuzil)

Nunca vi tanta bala na minha vida. E eram uns xingado contra os outros:

- Macaco, traga sua mãe, seu filho da puta (vozes dos cangaceiros)

Foi quando eu vi Lampião, sair da barraca, e levar um tiro à altura do pescoço, e já cair morto. Ele não deu um tiro sequer, e se duvidar, nem percebeu que morreu. Logo depois, eu notei que já haviam, uns sete, ou oito corpos ao chão. Nesse momento, vi o tenente, que estava do meu lado, colocar a mão na perna. Aí eu pensei: ele está baleado.

- O que foi tenente?

- Nada, apenas escorreguei aqui numa pedra. (Tenente)

Porém, eu vi o sangue jorrando, e percebi que realmente ele havia sido atingido. Mas, como era o comandante, não poderia fraquejar, e assim esmorecer os soldados. Foi quando levantou-se e falou:

- Avança tropa...quero Lampião pegado à mão...quero Lampião pegado à mão. Não se dá um tiro perdido...não se dá um tiro perdido. (Tenente)

Aí eu vi o mundo se acabar. Mas, também não demorou muito...foi coisa rápida... mais ou menos, de quinze a vinte minutos.

E já no finalzinho, eu ouvi o grito de Maria Bonita:

- Chega Luiz Pedro, acuda que mataram Lampião. (Maria Bonita)

Logo em seguida ela foi morta também. E só se ouviam os últimos tiros.

Começaram a cortar as cabeças, a golpes de facão.
Até o momento havia dez mortos, e já decapitados. As cabeças todas em fila, uma ao lado das outras. Jamais esquecei daquela cena horrível.

Mas, um dos soldados, percebeu que ainda havia um cangaceiro baleado, e agonizando. Eu já sabia que o apelido dele era Elétrico, mas como não perguntaram seu nome, nem a mim, e nem ao meu irmão, ficamos calados.

O tenente foi até onde estava o cangaceiro caído, e perguntou:

- Bandido, qual o seu nome? (Tenente)

- Pergunte à sua mãe, pois eu dormi com ela essa noite. (Elétrico)

- É rapaz, pena que você não presta mais, senão eu ia lhe levar, pois um homem valente assim, não se mata. (Tenente)

- Não mata o que covarde? Me deixe vivo! Me deixe vivo, que vou lhe buscar debaixo da sua cama, seu filho da puta. (Elétrico)

- Atirem nesse homem aí (Tenente)

O soldado atirou nele, e acabou de matar.

Quando o tenente deus as costas, os outros meteram a faca no cangaceiro já morto.

Aquilo me doeu, pois ele não era bicho, e sim, gente.

O tenente viu, e ficou enfurecido com aquela cena, porém, não tinha mais jeito.
Como os outros dez, já estavam decapitados, João Bezerra falou:

- Corta a cabeça dele também (Tenente)

Aí eu virei o rosto, e não quis ver.

Quando acabou tudo, eu pensei numa maneira de fugir, pois sabia que eles podiam querer me matar, e já não estava mais vendo meu irmão, achava até que ele já estivesse morto.

Foi quando um dos soldados, que era meu primo, me chamou e disse:

- Durval, está na hora de você correr. Veja se consegue escapar de algum bandido que fugiu, pois todos aqui têm raiva de ti, e de seu irmão. Daqui a pouco, vai haver briga de soldado contra soldado, pra saber quem fica com o ouro, e o dinheiro dos cangaceiros.

Quando eu percebi que ia começar a discussão pela disputa dos pertences... fui saindo...saindo...saindo...aí eu corri mesmo... como nunca na minha vida.
E escapei, graças a Deus!

Fim do depoimento.

Analisemos a “foto-montagem”

1 – Durval Rosa, e eu, em sua residência no dia dessa entrevista, em 05 de fevereiro de 1999.

2 – As ruínas da casa de onde partiu a volante em direção ao combate. Ao meu lado, o guia local, Francisco, sobrinho-neto de Durval, e Pedro, em maio de 2004.

Amigo, o privilégio que tive ao estar presente no dia dessa entrevista histórica, não se compara à satisfação em dividir com vocês, esse momento único e inesquecível.

Obrigado a todos, e continuemos, pois temos muito ainda pela frente.

EU OUVI DE QUEM ESTAVA LÁ

Charles Garrido
Pesquisador - Fortaleza - Ce


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