Por Geraldo Maia do Nascimento
A Lei nº 742,
de 26 de agosto de 1875, autorizava o Presidente da Província do Rio Grande do
Norte a contratar com John Ulrich Graf, ou com quem maiores vantagens
oferecessem, a construção de uma estrada de ferro, a partir do porto ou Cidade
de Mossoró, aos limites da Província, em direção ao município de Apodi e Pau
dos Ferro. Entendia Graf que o progresso de Mossoró dependia da velocidade com
que conseguisse importar e exportar os seus produtos. A tropa de burros, que
até então transportava as mercadorias, já não era suficiente para atender a um
mercado crescente como o de Mossoró, que naquela época era tida como empório
comercial. Fazia-se mister a construção de uma ferrovia, que entre outros
benefícios, baratearia os fretes e diminuiria o tempo de transporte.
No
“Prospecto da Empresa” Estrada de Ferro de Mossoró, de autoria de John Ulrich
Graf, que teve a sua primeira edição publicada pela Tipografia e Livraria de
Lombaertes & Cia, do Rio de Janeiro, provavelmente em 1876, ler-se o
seguinte: “Esta empresa reúne quase todas as vantagens que uma via férrea pode
apresentar; sua utilidade e seu valor serão superiores a todas as outras
estradas do Norte do Brasil. Para conhecer essa superioridade incontestável,
bastará ver a carta do Brasil e examinar o seu traçado, e saber que, com uma
linha quase reta de cerca de 230 quilômetros unir-se-á, com um dos
melhores portos do Norte, o centro mais importante, contendo uma população das
mais compactas, com um solo na maior parte dos mais férteis, podendo produzir
pela variedade do mesmo e da temperatura entre as serras e as planícies, não
somente os produtos do Brasil inteiro, como também cereais e muitos outros
gêneros da Europa. Este centro, já importante por sua produção agrícola, há de
ser também a sede da indústria geral, logo que começar a exploração das minas
de ferro, carvão, cobre, ouro e outras cuja existência me foi assegurada.
Também existe, na beira da estrada, barro e greda própria para louça fina,
etc., pedra calcária em abundância que auxiliarão muito a empresa. A exploração
das minas começará indubitavelmente com a construção da estrada e então a
imigração dirigirá sua grande atenção sobre o dito centro, rico em vegetação e
minerais, vendo que nele pode criar um belo futuro. O coração do dito centro
não poderá ser alcançado por via férrea, partindo de qualquer outro ponto da
costa do mar, senão com uma extensão superior àquela de Mossoró, de 100 a 500
quilômetros, visto que todas as outras estradas exigirão grandes voltas, por
causa das serras e rios importantes e numerosos que existem em qualquer outra
direção. Por exemplo: para chegar ao ponto importante de Cajazeiras, uma
estrada partindo do Ceará necessitava uma extensão de 530 quilômetros ao menos.
A estrada terá o trânsito dos produtos vindos das margens do Rio São Francisco,
oferecendo a mais curta, rápida e mais econômicas comunicações entre a costa e
o alto de São Francisco, será sem contestação a todo respeito a mais importante
estrada do Norte do Império. ” Previa também a criação de uma escola
agrícola: “ Para tirar os agricultores da sua velha rotina de trabalho
sem cálculo, isto é, a toa, incapazes assim de lutar com os países produtores
que constantemente procuram fazer progressos para serem capazes de produzir com
o mesmo lucro mais barato do que seus competidores favorecidos pela natureza,
eu me obriguei a fundar uma escola agrícola, a qual em vez de ser onerosa para
a empresa, lhe trará abaixo de uma direção hábil e ativa, muitos lucros diretos
e os seus benefícios indiretos serão ainda mais importantes. A escola formará
verdadeiros agricultores, os ensinará a reconhecer e escolher os melhores ramos
de agricultura, os mais apropriados as suas residências, a trabalhar com
cálculo e economia e os fará capazes de produzir, no mesmo tempo e com as
mesmas despesas e braços, ao menos o dobro do que tem produzido para obter
assim um resultado favorável do seu trabalho e ocupar uma posição mais
independente e social, o que os tornará aptos e ardestes para proteger as boas
empresas do país, que o progresso geral exigirá.“ O Projeto foi sancionado em
27 de agosto de 1875 pelo Presidente da Província Dr. José Bernardo
Galvão Alcoforado Júnior, e no dia imediato foi assinado o contrato com
John Ulrich Graf, testemunhando os senhores Arthur Annes Jácome Pires, Doutor
Manoel Dantas e o engenheiro da Província Feliciano Francisco Martins. O
Decreto Imperial foi assinado em 4 de março de 1876. Com o contrato nas mãos,
partiu em busca de capital para a realização do seu sonho. Mas logo percebeu a
impossibilidade de levantar parte do capital na própria região, como sonhara.
Seguiu então para o Sul, procurando organizar a companhia primeiramente com os
parcos recursos nacionais, só depois apelando para o capital estrangeiro. De
nada lhe valeu. A falta de garantias entravava o seu empreendimento. E por sete
anos seguidos se empenhou em torno do seu ideal, embalado pela esperança de um
futuro promissor. Mas a sorte lhe foi adversa. Humilhado, envergonhado pelo
fracasso de sua aventura e amargando grandes prejuízos comerciais, agravados
pelas disposições do Decreto Imperial nº 8.598, de 17 de junho de 1882 o qual
declarava a caducidade da concessão, sentiu o seu mundo desabar. Perdeu Mossoró
a estrada de ferro que alavancaria o seu progresso e o empreendedor Ulrich Graf
que arrecadando os parcos recursos que lhe sobraram de sua aventura, rumou para
a Amazonas, levando consigo a mágoa e a desilusão e deixando atrás o rastilho
de um ideal que levaria anos para se concretizar. Ali a morte cedo o arrebatou,
sumindo na floresta, com as flores cobrindo a sua sepultura.
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