Por Susi Ribeiro Campos
Boa noite, meu grande amigo José Mendes Pereira:
Como lhe prometi, vou dar continuidade ao que relatei anteriormente sobre minha convivência com minha sogra Sila ex-cangaceira de Lampião.
Já em Julho de 1993, quando comecei a namorar Wilson (filho do casal de cangaceiro), no dia seguinte ao dia 08 de Julho, Sila havia me feito um elogio e Wilson se dirigindo a ela, disse:
- Ela pode ser sua nora...
Disse e saiu rindo, alegre como sempre foi.
Sila me olhou assustada, estávamos na cozinha de sua casa:
- É verdade? Mas seus pais não vão deixar... Wilson é pobre... ele bebe.
Susi Ribeiro e o coronel do exército Conrado Lima
Ao que logo lhe respondi:
- Mas ele vai parar de beber (tinha comigo essa certeza) e meu pai vai deixar sim, sabe o quanto gosto do seu filho.
Susi Ribeiro Campos e sua mãe Lea Ambrogini de Lima
Sila se preocupava, pois, meus pais me haviam dado estudo e tinham uma posição sócioeconômica privilegiada. Meu pai era Coronel da Aeronáutica aposentado. Logo fomos conversando e arrumando a mesa para o almoço, enquanto eu procurava dissipar suas preocupações.
Susi e Wilson
Sila tinha se apegado muito ao Wilson e com razão, pois viúva, tinha perdido o filho mais velho Ivo Ribeiro de Souza, em um trágico acidente ainda muito jovem, lhe restava Wilson e Gila.
Gilaene (Gila) filha do ex-casal de cangaceiros Zé Sereno e Sila. - www.youtube.com - Gila também já faleceu há poucos anos.
Wilson era quem cuidava dela, estava sempre ao seu lado, a acompanhava ao médico, enfim Wilson era seu "tudo". Sila tinha muito medo de perder esse filho, que ele se casasse de novo e a abandonasse, como dizia.
Não foi fácil, procurei explicar a ela que eu não estava ali para afastar Wilson dela, mas para que pudéssemos todos ser mais unidos.
Aos poucos, quando fui morar nos fundos de sua casa, ela pode então compreender, que realmente minha intenção não era levar Wilson embora, e ficou mais tranquila.
Voltando a hora do almoço... esse demorava, rsrsrsrs nos fins de semanas, eu e ela preparávamos o almoço e ficávamos por horas jogando Buraco, até a hora de Wilson voltar, do bar “Toca do Sapo”, que pertencia aos meus padrinhos de Batismo, o casal baiano Eriberto Pereira de Jesus e Maria José Pereira.
A diversão de Wilson era a cerveja, mas voltava alegre para casa e ia dormir... rsrsrs e nós duas almoçávamos sozinhas.
Durante a semana, ele trabalhava o dia inteiro, como fotógrafo e cinegrafista do Instituto Oceanográfico da USP, voltava direto para casa, e ficávamos juntos na sala, assistindo as novelas, filmes...
Sila ainda costurava, fazia roupas para peças de teatro sobre o Cangaço, escrevia livros, dava entrevistas em programas de Televisão, fazia exposições e Lançamentos. Era muito ativa, vaidosa. Era eu que cuidava dos cabelos dela, fazia suas unhas, maquiagem, e a deixava prontinha para suas entrevistas.
Wilson e eu a levávamos, quando suas entrevistas eram em São Paulo, como no Programa do Amaury Júnior, Jô Soares e Sílvia Poppovic. Wilson programava o videocassete para gravar, a acompanhávamos e esperávamos por ela.
Muitas vezes, ela insistiu para que eu a acompanhasse em suas entrevistas, mas nunca quis aparecer às custas da vida, do sofrimento dela, era sua história, seu momento, respondia... preferia esperar por ela lá fora.
Na volta para casa, íamos correndo assistir, ele então fazia uma pequena edição e ficava completo, porque ela tinha brilho, força, luz e a História encantadora de sua vida
Sempre tivemos desavenças familiares quanto a limpeza da casa, forma de como passar a roupa do Wilson... quem cuidava melhor dele, rsrsrs, mas nada nunca nos desuniu, ela era realmente para mim não uma sogra, mas uma madrinha, aquela da infância. Íamos juntas à feira fazer compras, ela adorava peixe, e o que me fazia fazer cara de nojo... gostava da cabeça do peixe assado.
Muitas vezes ela foi conosco (Wilson e eu) à casa de meus pais, tinha seu quarto e sua televisão particular, para assistir sua novela preferida "Maria do Bairro".
xonatas.blogspot.com
Sila gostava muito de passear, viajava muito ao Nordeste, e ficava por lá durante meses, na casa de amigos.
Sobre o cangaço, comigo, não falava muito, pois eu a ouvia contar repetidas vezes suas histórias, durante as entrevistas que dava aos repórteres que a procuravam em sua casa. Eu já sabia de trás para frente, de frente para trás..., mas algumas coisas me foram confidenciadas sim. "Que Lampião era um chefe justo, calmo, sua fala era pausada, tranquila e era além de muito inteligente, como um pai para todos. Não gostava de maldades e refreava os cangaceiros que tinham índole violenta.
Lampião rezando
Que era um homem religioso, com uma fé enorme e muito respeito pelas famílias. Que havia sido "carregada" para o Cangaço por Zé Sereno, não tinha ido por livre e espontânea vontade.
Cangaceiro Zé Sereno
Chorava ao lembrar de seus irmãos que a acompanharam e morreram no Cangaço, do filho que teve "no mato" e por incrível que possa parecer, do gênio forte de Maria de Lampião, que a desagradava. Ela dizia que "Maria era meio louca" instável, xingava muito e ridicularizava quem não gostava."
Maria Bonita
Que pouco se viram, Sila não gostava de Maria, não sei o que houve e não vou entrar em detalhes, pois ela não me contou o porquê, mas pude sentir isso várias vezes, em todas as entrevistas que dava, durante as exposições e quando falava conosco, nos contando particularmente.
Segundo Sila ela foi a última pessoa a conversar com Maria Bonita antes do Massacre de Angico, mas como todos nós temos outras pessoas que mais nos agradam, Sila não era diferente, Maria não era sua melhor amiga, como dizia aos historiadores. Ela nunca quis revelar isto aos historiadores, somente contava a nós, e é claro, a Vera Ferreira neta da Maria Bonita sabe disto também.
Ex-cangaceira Dulce - a última cangaceira que está viva - De toda(as)(os) os cangaceiros ela é a única que está viva.
Das cangaceiras amigas, falava muito de Dulce, Nenê de Luiz Pedro, que havia falecido no dia seguinte de sua entrada no cangaço e de Dadá após o Cangaço.
Neném do Ouro e Luiz Pedro
Dadá e Corisco
Sila e Zé Sereno haviam feito muitas amizades com ex-policiais e volantes que também foram morar em São Paulo, e até uma vez, tive a oportunidade de acompanhá-la à casa da família de um ex-volante, foi uma tarde muito agradável, conversei muito com uma senhorinha já bem idosa, esposa do ex-volante falecido. Infelizmente não me recordo o nome deles.
Minha sogra tinha momentos de tristeza, lembrava muito de Ivo, o filho falecido, logo eu procurava mudar de assunto... "vamos jogar? Eu perguntava, ela adorava jogar.
De tempos em tempos, eu a acompanhava ao médico. Ela sofria de hipertensão sistêmica, e tinha crises terríveis de pressão alta, com dores de cabeça que a atormentavam muito, principalmente no tempo frio de São Paulo.
Um dia chegamos, Wilson e eu a ter que correr com ela, de madrugada, para o hospital, acordamos e ela sangrava muito pelo nariz. “- Foi a sorte dela”, disse o médico, pois se o sangue não houvesse saído, poderia ter causado um derrame cerebral.
Ainda existe muito a ser dito sobre nossa vida em comum, após o falecimento de meu pai, quando Sila ficava muito em nossa casa em Rio Claro, mas vou terminar por aqui hoje meu amigo , e continuar um outro dia.
Realmente tenho vontade de lhe escrever mais, mas após o falecimento do Wilson, venho sofrendo com astigmatismo e hipermetropia e detesto usar óculos, mas mesmo com eles, minha vista se cansa.
Se Deus quiser próximo ano acaba a carência do plano de saúde por doença pré-existente, e eu poderei fazer a cirurgia da vista.
Agradeço por mais uma oportunidade!
Um grande abraço a você
À Sila, sempre minha eterna gratidão e carinho!
Susi Ribeiro Campos, nora de Sila e Zé Sereno
Este material foi enviado para mim pela nora do casal de cangaceiros Zé Sereno e Sila Susi Ribeiro Campos.
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