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sexta-feira, 30 de março de 2018

SEXTA-FEIRA SANTA

Clerisvaldo B. Chagas, 30 de março de 2018
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica 1.869

ILUSTRAÇÃO: (PROJETO APOLO).
“Pilatos interrogou Jesus e afirmou para a multidão que não via fundamentos para uma pena de morte. Quando ele soube que Jesus era da Galileia, Pilatos delegou o caso para o tetrarca da região,Herodes Antipas, que, como Jesus, estava em Jerusalém para a celebração da Páscoa judaica. Herodes também interrogou Jesus, mas não conseguiu nenhuma resposta e enviou-o de volta a Pilatos, que disse para a multidão que nem ele e nem Herodes viam motivo para condenar Jesus. Ele então se decidiu por chicoteá-lo e soltá-lo, mas os sacerdotes incitaram a multidão a pedir que Barrabás, que havia sido preso por assassinato durante uma revolta, fosse solto no lugar dele. Quando Pilatos perguntou então o que deveria fazer com Jesus, a resposta foi: «Crucifica-o!» (Marcos 15:6-14). A esposa de Pôncio Pilatos havia sonhado com Jesus naquele mesmo dia e alertou Pilatos para que ele não se envolvesse «na questão deste justo»(Mateus 27:19) e, perplexo, o governador ordenou que ele fossechicoteado e humilhado. Os sumo-sacerdotes informaram então Pilatos de uma nova acusação e exigiram que ele fosse condenado à morte por "alegar ser o Filho de Deus". Esta possibilidade atemorizou Pilatos, que voltou a interrogar Jesus para descobrir de onde ele havia vindo (João 19:1-9).
Voltando à multidão novamente, Pilatos declarou que Jesus era inocente e lavou suas mãos para mostrar que não queria ter parte alguma em sua condenação, mas mesmo assim entregou Jesus para que fosse crucificado para evitar uma rebelião (Mateus 27:24-26).Jesus carregou sua cruz até o local de sua execução (com a ajuda deSimão Cireneu), um lugar chamado "da Caveira" (Gólgota em hebraico e Calvário em latim). Lá foi crucificado entre dois ladrões (João 19:17-22).
Jesus agonizou na cruz por aproximadamente seis horas. Durante as últimas três, do meio-dia às três da tarde, uma escuridãocobriu "toda a terra" (Mateus 27:45Marcos 15:13 e Lucas 23:44).
Quando Jesus morreu, houve um terremoto, túmulos se abriram e a cortina do Templo rasgou-se cima até embaixo. José de Arimateia, um membro do Sinédrio e seguidor de Jesus em segredo, foi até Pilatos e pediu o corpo de Jesus para que fosse sepultado (Lucas 23:50-52). Outro seguidor de Jesus em segredo e também membro do Sinédrio, Nicodemos, foi com José de Arimateia para ajudar a retirar o corpo da cruz (João 19:39-40). Porém, Pilatos pediu que o centuriãoque estava de guarda confirmasse que Jesus estava morto (Marcos 15:44) e um soldado furou o flanco de Jesus com uma lança, o que provocou um fluxo de sangue e água do ferimento (João 19:34).
José de Arimateia então levou o corpo de Jesus, envolveu-o numa mortalha de linho e o colocou em um túmulo novo que havia sido escavado num rochedo (Mateus 27:59-60) que ficava num jardim perto do local da crucificação. Nicodemos trouxe mirra e aloé e ungiu o corpo de Jesus, como era o costume dos judeus (João 19:39-40). Para selar o túmulo, uma grande rocha foi rolada em frente à entrada (Mateus 27:60) e todos voltaram para casa para iniciar o repouso obrigatório do sabá, que começou ao pôr-do-sol (Lucas 23:54-56)”. (Wikipédia, a enciclopédia livre).


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CANÇÃO AOS AFETOS

*Rangel Alves da Costa

Sinto saudade, mas muita saudade mesmo, dos pequenos afetos. Das coisas simples da vida, mas que causam satisfação desmedida. Só quem transmite ou recebe afeto sabe o significado do prazer na alma, do espírito confortado, da vida nutrida em perfume de flor.
O afeto é sentimento de doce pronúncia e de imensa significância para quem recebe e para quem transmite afeição. Gesto tantas vezes simples, despojado, porém de indescritível beleza quando verdadeiramente expressado.
Ter afeto é gostar, é querer bem, é sentir carinho por outra pessoa; o afeto se expressa no sentimento de ternura e amizade para com o outro. Daí a afeição ser o cuidado e a dedicação para que tal sentimento seja compreendido e acatado no coração, reconhecendo aquele gesto amável ou benevolente.
Contudo - e infelizmente -, nem todas as pessoas são capazes de transmitir afetos verdadeiros. Do mesmo modo, nem todos sabem compreender e corresponder as afeições recebidas. Nem externa nem internamente, o que é mais conflitante.
Expressar afeição não requer receita nem preparo. O sentimento afetuoso está em cada um, é instintivo do ser humano, já está enraizado no coração mais ou menos generoso que a pessoa tem. Quanto a isso, não depende de classe social, de sexo, de idade, de poder econômico ou de qualquer outra coisa.
A arte do afeto é a arte do humano, da humanização, da valorização do próximo. Só é afetuoso quem estima e aprecia o outro, quem o reconhece indistintamente; só consegue mostrar verdadeira afeição aquele que pelo outro é reconhecido como portador de cordialidade no coração.


Mas é muito fácil ser afetuoso. Está ao alcance de todos o amável cumprimento, a saudação cordial, a demonstração da saudade sentida pela ausência, o abraço afável e o aperto de mão, a palavra amiga e confortante dita quando do encontro. Tudo mundo é capaz de ser assim e agir assim.
Um sorriso sincero de satisfação é exemplo maior de afeto. Todo mundo admira ser reconhecido, relembrado, saudado, valorizado pelo outro amigo. Não há indivíduo consciente que não se encha de admiração quando o amigo lhe chega querendo saber se está precisando de alguma coisa, como está a família, se todos estão com saúde e paz.
Os gestos de afeto são inumeráveis. Entretanto, apenas um pode fazer surtir o efeito de todos. Num dado momento, num inesperado instante, aquele que se achava esquecido é relembrado e festejado pelo outro. E não há instante de magia maior que um conforto ou um reconhecimento num momento que parece ser de esquecimento. Ou de dor.
Já convivi e ainda convivo com muitos instantes assim. Porque geralmente estou distante de meu berço de nascimento, minha abençoada Nossa Senhora da Conceição do Poço Redondo, toda vez que coloco o pé na terra sagrada sou recebido e reconhecido com inestimável afeição. Só eu sei o quanto me enche de orgulho e graça sentir nos olhos e no semblante de cada conterrâneo o prazer pela minha presença.
Somente eu para saber o quanto me irradia ser saudado por um e outro, ser abraçado, ouvir palavras de carinho e amizade. E o orgulho é ainda maior quando estou diante das pessoas mais humildes, mais envelhecidas ou que são de meus tempos ou de outros tempos de convívio naquelas distâncias. Abraçar um velho amigo sertanejo é fazer reacender a chama da presença eterna.
Do mesmo modo, logo percebo a imensa satisfação quando me dirijo a cada um que, mesmo me reconhecendo, permanece afastado por estar acanhado ou vergonhoso de se aproximar. Os olhos brilham, o coração pulsa, o sentimento aflora. Reconheço isso porque conheço a sinceridade de meu povo, de meus bons amigos de Poço Redondo. Do mesmo modo pressinto o cumprimento falso de quem mente a si mesmo.
Convivo e sinto tais pequenos afetos. Nada de grandioso trocaria senão por um sorriso, por um abraço, por gesto simples e sincero de amizade. E que a humildade seja tudo. Ainda.

Escritor
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LIVRO



Neste segundo volume passeamos sobre a estada, a passagem, a vida das cangaceiras naqueles inóspitos tempos, suas dores e seus amores nas guerras do cangaço e também após esse tempo para aquelas sobreviventes.

A história de Carira, seus arruaceiros, seus bandoleiros, seus pistoleiros, os cangaceiros e policiais que por ali atuaram, também é minuciada e melhor estudada com a participação inequívoca de historiadores locais de renome que remontam esse tempo.

Laranjeiras, a histórica e linda Laranjeiras dos amores e horrores, não poderia ficar de fora, pois além de tudo, há a grande possibilidade de Lampião ali ter pisado, até mais de uma vez, para tratamento do seu olho junto ao médico Dr. Antônio Militão de Bragança. Nesse sentido a história, a ficção e as suposições se misturam para melhor compreensão do leitor.

Boas novidades também são apresentadas neste volume, uma com referência ao “desaparecido” Luiz Marinho, cunhado de Lampião, então casado com a sua irmã Virtuosa, outra referente ao casamento de um casal de cangaceiros ainda na constância desse fenômeno ocorrido em Porto da Folha, com a prova documental e, em especial o extraordinário fato novo relacionado a Maria Bonita em Propriá na sua segunda visita àquela cidade para tratamento médico. Fotos inéditas também estão apostas neste volume, que acredito será bem aceito pelos pesquisadores do cangaço.

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Não tenho certeza, mas acho que você irá adquiri-lo com o professor Pereira através deste e-mail: franpelima@bol.com.br

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LIVROS



Peça estes dois livros ao professor Pereira através deste e-mail: franpelima@bol.com.br

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LUIZ RUFINO FALA SOBRE SEU PAI O TENENTE ZÉ RUFINO



LUIZ RUFINO fala sobre seu pai, o Ten. ZÉ RUFINO; sobre a morte de Corisco e o ferimento em DADÁ, além de outros temas.

Depoimento de Luiz Rufino. Esse vídeo não é de minha autoria, tenho ele a mais de 10 anos e infelizmente não sei quem são os autores. Como é importante estou postando. Parabéns a quem o produziu.

OBS; a parte referente a Angico não postei, melhor assim.
Um vídeo compilado por Aderbal Nogueira.
OBS:

Ao assistir esse vídeo, parabenizo o Aderbal por tê-lo compartilhado. Informo, também, que percebi algumas "pequenas contradições" nas palavras de LUIZ RUFINO, mas que não invalidam o aspecto histórico...
( adendo, por Volta Seca).

Publicado em 28 de mar de 2018

Depoimento de Luiz Rufino. Esse vídeo não é de minha autoria, tenho ele a mais de 10 anos e infelizmente não sei quem são os autores. Como é importante estou postando. Parabéns a quem o produziu. OBS; a parte referente a Angico não postei, melhor assim.
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O PREÇO DE “LAMPIÃO”


Acervo do pesquisador Antonio Corrêa Sobrinho

Lampião, infelizmente, continua a ser um dos mais palpitantes assuntos do Nordeste.

É ele o campeão do crime na hinterlândia nordestina, cujas caatingas, serras e vales tem percorrido na faina desumana de semear todas as desgraças.

E apesar da ação conjunta dos Estados onde exercita suas sinistras atividades, dos revezes que tem sofrido nos encontros e reencontros com as forças regulares, Virgolino Ferreira ainda sobrevive mantendo o primado do cangaço.

A propósito desse facínora essa correspondência da Bahia:

“Em torno dos esforços desenvolvidos pelas autoridades policiais no sentido de livrar o sertão baiano do terrorismo de Lampião e seu grupo, os jornais, recordando as muitas tentativas levadas a efeito naquele sentido, publicam resumidamente as estatísticas de quantos soldados já foram distribuídos para a continuada perseguição.

No fim do ano passado, o efetivo das forças à procura de Lampião era de 1.170 homens, que acarretavam ao Estado uma média mensal de despesas no valor de 203:450$000 ou sejam 2.484:300$000, durante aquele ano e para as quais o governo da União concorreu com 900:000$000.

Enquanto isso o seu passivo de crimes já montava a cerca de 200 vítimas, ao passo que, do seu lado, eram abatidos pelos fuzis da Força Pública 18 dos seus cabras inclusive duas mulheres do bando que acompanhavam os amásios.

À Bem-te-vi, Gavião, Vereda, Quinaquina, Sabonete, Catinga, Baraum, Coenda, Baliza, Quixabeira, Pó Corante, Ferrugem, Lavareda, Açúcar, Ventania, Volante e duas mulheres amásias de Gavião e de Antonio de Engrácia, conseguiu a polícia eliminar em encontros diversos, aprisionando também Volta Seca, cuja detenção deu margem à discussões pela imprensa sobre a sua menoridade, e ainda Passarinho, Bananeira, João do Norte, Seca Preta, Esperança, Relâmpago, Caracol e Limoeiro, cujos processos foram instaurados nas comarcas onde os crimes foram praticados.”

“Diário de Pernambuco” - 19/09/1933

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OBITUÁRIO DA SAUDADE...


Por José Cícero Costa
Foto: De anos atrás de quando passei por sua residência(e por ele fui recebido) durante o meu trabalho de pesquisa de campo acerca da passagem do histórico revolucionário Frei Caneca pela região de Ingazeiras/Juiz.

Ingazeiras de luto...

Registramos com imenso pesar o Falecimento do Sr. ANTONIO DE DUQUE ocorrido na manhã de hoje. 

Uma figura humana das mais conhecidas e queridas pelo povo de Aurora, notadamente pelos moradores do bom distrito de Ingazeiras onde residia e nos anos 80 foi eleito pela 1ª vez sendo o segundo mais votado tendo muito bem representado por mais de um mandato sua região como vereador no legislativo municipal aurorense. Uma grande perda, portanto, para toda a comunidade ingazeirense e adjacências.

Nossos votos de condolências a todos os seus familiares, parentes e amigos. Saudades, para todo o sempre!

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AS CONVERSAS NO ALPENDRE DA FAZENDA ARACATI .


 Por Benedito Vasconcelos Mendes
Susana Goretti e Benedito Vasconcelos Mendes
       
Na Fazenda Aracati, o jantar era servido à tardinha, antes de escurecer, pois a casa não tinha energia elétrica. A iluminação era feita com lamparinas e lampiões a querosene. À boca da noite, depois do jantar e da oração diária da Ave-Maria (18 horas), o meu avô e todos da casa iam prosear no alpendre. Meu avô deitava-se em uma  rede branca, armada da coluna do alpendre para o torno de armar redes chumbado na parede. A rede era atada na coluna de aroeira do alpendre com sedenho ( corda trançada de cabelos de animais, como crina de cavalo e cabelos da vassoura de bovinos ). 

Minha avó deitava-se em uma rede vizinha, também armada de uma coluna para a parede. O vaqueiro Sales, Dona Lourdes, esposa dele, o vaqueiro Chicó, o Quinca Pescador e  mais alguns agregados da fazenda sentavam-se nos  bancos de aroeira do alpendre. As conversas, invariavelmente, versavam sobre fazendas, chuvas, gado, pescarias, caçadas, pegas de boi e sobre os preços da arroba de carne bovina, do quilo de  queijo de coalho e sobre o preço da garrafa de manteiga da terra, que eram noticiados pela recém-inaugurada Rádio Iracema de Sobral.  Estes eram os assuntos de maior interesse do meu avô e dos demais habitantes da fazenda. 

As novidades eram poucas, mas aqui e acolá surgia uma notícia que aguçava a curiosidade dos presentes, como a gravidez inesperada de alguma moça do distrito de Caracará (vila vizinha à Fazenda Aracati), uma queda de cavalo, um coice levado de uma vaca ou a chifrada dada por um touro,  em alguém da fazenda. 

Às vezes, a notícia principal era a morte ou doença de algum político ou de uma pessoa  importante residente em Sobral. Todas as noites, o Quinca Pescador contava uma de suas engraçadas estórias de vaquejada, pescaria ou de caçada, que agradava a todos, especialmente as crianças (netos do meu avô e filhos dos vaqueiros) pois, mesmo se sabendo que o relato não era verídico, era prazeroso de se ouvir. Os cachorros da fazenda, Japir e Tubarão, pareciam entender as estórias contadas por Quinca Pescador, pois eles o ouviam com redobrada atenção.  
                                                                           
Ao chegar no alpendre, meu  avô ia logo picar o fumo de corda, para abastecer o cachimbo de barro da minha avó. À luz de uma lamparina, ele picava o fumo de corda, com uma faquinha bem amolada, sobre um pedaço de tábua de craibeira. Minha avó só usava cachimbo à noite, antes de dormir. Ela dava cinco ou seis cachimbadas e ia para o seu quarto. 

O Sales, com um pedaço de fumo de corda na boca, cuspia de instante em instante, uma golda preta, na cuspideira (lata de doce de goiabada, cheia de areia), colocada ao lado do banco. O fumo de mascar estimula as glândulas salivares e provoca cusparada. O Chicó fumava cigarro de palha, que era preparado na hora. Ele picava o fumo de corda, colocava em um pedaço de palha fina de espiga de milho e enrolava e depois cortava as pontas, com sua faquinha bem afiada.  
                                  
Meu avô foi pegar seu corrimboque de guardar tabaco no caritó do quarto, tirou uma pitada de rapé de fumo, aspirou com uma das narinas e depois com a outra e em seguida deu três grandes espirros. Minha avó, às vezes, usava rapé de cumaru. Ela não gostava de rapé de fumo, embora fosse ela quem preparava o rapé usado por meu avô. Ela escolhia pedaços de fumo de corda, colocava em uma pequena tigela e levava ao forno para torrar. Depois ela pilava, peneirava em tecido de algodão e armazenava o torrado no corrimboque  de ponta de chifre de boi, com tampa de madeira.                                                                 

O Chicó gostava de contar suas bravuras nas pegas de boi brabo, que tinha participado na Fazenda Oiticica, quando lá morou, antes de sua vinda para a Fazenda Aracati. Meu avô apenas ouvia e dizia,  em tom de brincadeira, que o Chicó tinha desaprendido a pegar boi, já que ele nunca conseguiu sequer pegar um garrote solto na mata, depois que aqui chegou. 

As conversas prolongavam-se até às 8 horas da noite, quando o meu avô entrava em casa para dormir em sua rede e era seguido por todos. Todo mundo dormia em rede de tecido de algodão, pois na região, geralmente, não se usava cama. Eu ia para a rede  satisfeito, repetindo na memória a curiosa estória contada por Quinca Pescador.


Enviado pelo professor, escritor, pesquisador do cangaço e gonzaguiano José Romero de Araújo Cardoso

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AOS OITENTA E DOIS ANOS, AZEVEDO, TORNA-SE EXEMPLO PARA LITERÁRIOS CONTEMPORÂNEOS


Por Shirley M. Cavalcante (SMC)

Há 22 anos quando aposentou como auditor fiscal da Receita Federal, e com pendores literários, Azevedo, como é costumeiramente tratado nos meios literários, motivado por amigos, começou a escrever aos 65 anos. Utilizando a tecnologia da informação para seu tino autodidata, até então valeu-se de seu diário vivencial desde 1970. Tem cinco livros publicados.


Considerando-se um escritor ainda em formação, intitula-se uma pedra bruta a ser lapidada conforme crítica literária. Transitando da terceira para a quarta idade (82 anos) continua lendo, estudando e escrevendo para satisfazer seu ego, embora dificultem-lhe as dores físicas, a surdez severa, a memória esvaindo e outros empecilhos mais. Sem perder o senso crítico e a lucidez, reflete especialmente sobre a razão que leva os ingratos a agirem assim. Conclui sobre a diferença entre o velho e o idoso: ser velho é quando perdemos as esperanças e passamos a reclamar de tudo e de todos como se nada mais valesse a pena. Ser idoso é quando ainda descortinamos um novo porvir, transpondo barreiras na estrada da vida e abrindo picadas para as trilhas nas matas.

“Analisa também o aspecto vivencial da família, desmoralizada pela mídia e enxovalhada por quem mais deveria defendê-la: pais, mães e filhos.”

Boa leitura!

Escritor José Antônio de Azevedo, é um prazer contarmos com a sua participação na Revista Divulga Escritor. Conte-nos, o que o motivou a escrever o seu livro “O Homem no Mundo”?

Azevedo - Trata-se de uma obra séria com algumas pitadas de ironia, discorrendo sobre vários temas, como episódios do dia a dia do país, a administração pública e o descaso das autoridades com os idosos, apesar do Estatuto do Idoso. Analisa também o aspecto vivencial da família, desmoralizada pela mídia e enxovalhada por quem mais deveria defendê-la: pais, mães e filhos.

Quais os principais desafios para a escrita de “Transição”?

Azevedo - Demonstrar a existência das duas grandes e traumáticas transições: a do nosso nascer e a do morrer. O nascituro, que está tranquilo no ventre da mãe, suporta um grande choque ao vir à luz. Ao morrer sofre enorme impacto ao transitar para a quarta dimensão.

Quais os principais objetivos a serem alcançados por meio do enredo que compõe a obra?

Azevedo - Divulgar minha visão sobre as transições por que passou o mundo na atualidade, visto que em menos de um século tudo que existe nele transformou muito mais do que o que ocorreu até então desde o Big Bang.

Dando continuidade à sua carreira literária, surge “O coração infarta quando chega a ingratidão”. Quais temáticas estão sendo abordadas por meio do enredo que compõe a obra?

Azevedo - O tema da ingratidão como o PIOR DEFEITO do ser humano. Nele, reflito sobre a razão que leva os ingratos a se utilizarem dos velhos como escada, enquanto produtivos, para os descartarem quando perdem a capacidade de trabalho.

E por fim temos “Comendo fogo e cuspindo cinza”. Por que este título?

Azevedo - Fiel à temática que me é cara e crítico sobre a sociedade, nas questões que envolvem pessoas idosas, apresento uma personagem nova, Zé Baiano, e o cidadão idoso Maicro, para fundi-los como em uma simbiose, transformando-os daí numa terceira, Ícaro. Resulta em seguida no melhor que há nos outros dois: o vigor da juventude com a experiência da maturidade. O simbiótico Ícaro, assim transformado, torna-se imbatível nas batalhas diárias da vida, pois descobre dentro de si uma fogueira de energia que gera potência para fazer funcionar o motor da juventude acumulada. Conduzo, assim, o tema por uma série de palestras que abordam vários aspectos da existência, sempre em busca do equilíbrio, tão necessário a quem come fogo e cospe cinzas para produzir a energia de que precisa na evolução da vida.

Onde podemos comprar seus livros?

Azevedo - “Transição” está à venda na Biblioteca 24h.

“O Homem no Mundo”, “O coração infarta quando chega a ingratidão” e “Comendo fogo e cuspindo cinzas” podem ser adquiridos nas livrarias Cultura, Martins Fontes e Asabeça.

Qualquer um destes títulos pode ser pedido pelo e-mail jazevedo2008@gmail.com  diretamente com o autor a preço a ser combinado, ou doado para leitores pobres que não tenham condições de comprar.

Quais os seus principais objetivos como escritor? Soube que já temos livro novo no prelo.

Azevedo - Considerando minha humilde e simples pessoa, não tenho pretensões financeiras como escritor, mas se angariar alguns leitores já me sinto orgulhoso e realizado. O livro que está no prelo “Evolução Transcendental da Juventude” está com previsão para ser editado até final de abril deste ano (2018).

Pois bem, estamos chegando ao fim da entrevista. Muito bom conhecer melhor o escritor José Antônio de Azevedo. Agradecemos sua participação na Revista Divulga Escritor. Que mensagem você deixa para nossos leitores?

Azevedo - A todos os leitores o meu muito obrigado.

Enviado pelo professor, escritor, pesquisador do cangaço e gonzaguiano José Romero de Araújo Cardoso

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(GUARACIABA O ESCRAVO REPRODUTOR QUE FEZ 300 FILHOS)


Por Guilherme Machado

João Antônio Guaraciaba nasceu no dia 20 de setembro de 1850. Preto, alto, forte, viveu grande parte de sua vida em Magé, Estado do Rio de Janeiro, onde morreu velho, enrugado e de carapinha branca com seus bem vividos 126 anos. Gostava de andar, mas seus passos ficaram lentos denunciando o peso da idade, o reumatismo e as “oito picadas de cobras que levou na perna direita, de tanto viver nos matos”, apesar de “lúcido e ainda enxergando bem para longe e sem sofrer de surdez”. Filho de mãe angolana que o teve aos quinze anos, e o Barão de Guaraciaba “um mestiço fazendeiro comprador de escravos negros na África onde conheceu sua mãe Angelina, então negra forte e bonita”. Depois de engravidá-la, prometeu buscá-los em outra viagem, trazendo-os assim para o Brasil num veleiro negreiro. João tinha apenas quatro anos de idade. Registrado em Magé, onde “tirou certidão com testemunha e tudo”, como filho do barão e Angelina Maria Rita da Conceição (nome cristão), “por que naquele tempo não tinha disso não, a data do nascimento passava de boca em boca, de parente para parente”.

Quando foi para Mauá, então Guia de Pacobaíba freguesia de Magé, João tinha 17 anos, levado pela mão de Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá “para tirar (procriar) raça de crioulo escravo para o Imperador, que conheceu aquele preto forte na fazenda do Barão de Guaraciaba, onde passou uns tempos e pensou até que ele era escravo. Chegou a querer comprá-lo, mas o pai disse que não vendia, por que João era seu filho”. Ao chegar a Pacobaíba, na barca do Barão de Mauá aquele negro de “mãos de dedos longos, braços fortes, capaz de segurar com força as mulatas e crioulas da fazenda”, viu pela primeira vez “o trem vomitando fogo e fumaça” e apesar de não ter sido escravo, “trabalhou no porto onde os barcos veleiros atracavam”. Viu diversas vezes o Imperador desembarcar no cais de Pacobaíba e pegar o trem para Raiz da Serra onde embarcava na charrete até Petrópolis. “Era um homem sempre com o rosto limpo e bem tratado”. Ficou em Pacobaíba fazendo alguns serviços para o Barão até “despois que apanhei idade é que fui escolhido para tirar raça. Na minha fazenda só tinha eu de reprodutor”. Segundo suas próprias palavras, ele só foi levado para as fazendas de Petrópolis e Correias com 23 anos de idade quando assumiu sua nova “obrigação”.

Guaraciaba afirmou que deixou
 mais de 300 filhos: 100 para D. Pedro II e 200 para o Barão de Mauá, fora os que teve com as mulheres da fazenda de seu pai em Campos, ainda adolescente. “Ficou nessa vida de reprodutor deitando com duas, três, quatro mulheres por dia nas senzalas em que o Barão e o Imperador mandavam até os 38 anos, quando a Princesa Izabel aboliu a escravidão” A história registra que quando João nasceu em 1850, a Lei Eusébio de Queiroz confirmava a Lei de 1831extinguindo o tráfego de escravos, punindo com penas severas os infratores. Seguiu-se a Lei dos sexagenários de 1855. A Lei de 1869 libertando os servos que fossem para a guerra do Paraguai. A Lei do Ventre Livre de 1871, e finalmente a Lei da Abolição de 1888. João se lembrava que depois que surgiu a Lei do Ventre Livre, todos continuaram escravos, “agregados às fazendas sem outro ganho que não a casa e comida simples”. Foi escolhido para ser reprodutor por que “era preto de Angola”. Os senhores queriam pessoas bem fortes para esse serviço. “Se nhô quer saber: nas fazendas que eu ficava aquelas que não panhavam prenhez comigo eram vendidas para outros fazendeiros. Os donos tinham muito interesse em mulher que reproduzisse, pra ter mão-de-obra barata, pra trabalhar a cana, o café e a mandioca”.

Achava a “atividade” legal por que “era premitido”. Ele gozava de regalias que o resto da negrada não tinha. “Jamais entrou no chicote, nem foi açoitado no tronco ou acorrentado. Nunca levou bolo de palmatória ou teve pés e mãos amarradas no instrumento de tortura chamado “vira mundo”, onde muito escravo morreu. Às vezes morriam com gangrena, de tanto esfregarem os braços nas correntes para se soltarem cortando a carne que infeccionava”. Com ele foi diferente, embora trabalhasse com os escravos do Imperador, ajudando na lavoura quando podia, tanto que era aposentado pelo Funrural e recebia mensalmente por um banco de Magé Cr$ 300,00. “É muito pouco” dizia ele “não dá pra viver não. Se não fosse os amigos não sei o que seria”. João também lembrava das canções cantadas no eito pelos escravos. Trocando branco por baranco ou furta por fruta, cantava o “Lundu do Pai João” que falava de justiça: “Baranco dize: preto fruta / preto fruta com razão; / Sinhô baranco quando fruta / quando panha casião; ./ O preto fruta farinha / fruta saco de feijão; / Sinhô branco quando fruta / fruta prata e patacão; / Nego preto quando fruta / vai pará na correção. / Sinhô baranco quando fruta / logo sai sinhô barão”.Ele era o único na fazenda que não pagava no pesado. Boa alimentação e descanso, quando nas senzalas as escravas já o esperavam. “Era uma de cada vez na cama”. João sorri mostrando seus dois únicos dentes amarelos. “De vinte que entravam, quinze pegavam filho”. Quando seu pai o entregou ao Imperador, sabia que ele iria ser “cobridor de mucamas”.

Sua descendência se espalha pela Baixada e na Serra, incluindo parentes do Barão de Guaraciaba, “mas quase não vejo”. Antigamente subia a serra até Petrópolis de trem, mas desde que o Presidente Castelo Branco extinguiu a ferrovia Mauá-Petrópolis por ser antieconômico, raramente ia de ônibus.

“Companheiro do Aleixo, no mundo acho no mundo deixo” dizia ele repetindo um ditado popular de seu tempo. Mesmo numa época em que a Igreja vigiava o comportamento sexual das pessoas, muita negra teve filho de senhores e muita senhora amaldiçoou seu marido. Gostou de algumas escravas, mas como lembrar do “jeito” delas se o tempo passou. Muitas já morreram. O que sabe é que tem filhos espalhados “pela aí” de setenta, oitenta anos e que seus traços estão no olhar e no requebro de alguma mulata de hoje, nos ombros largos e nariz afilado de algum crioulo descendente afastado de alguns de seus trezentos filhos. Naquele tempo, não bebia nem fumava “pra não estragar o corpo”. Gostava de festas: São João, São Pedro, Santo Antônio, São Jorge, São Marcos, e São Sebastião. Gostava de ver capoeiras darem os botes. Cantava e pulava até de Madrugada. Gelados nem pensar, tiram a potência do homem. “Esses gelados pareceu depois da Abolição, não servem pra nada. Só pegou no Brasil por que faz muito calor e o pessoal gosta de refrescar, mas eu conselho a juventude evitar gelados, sorvetes”.

Negro João fica meditando quando é indagado sobre quilombos. Fala sobre o da Vila de Marcos da Costa e o da serra de Santa Catarina, perto de Petrópolis.

E os capitães do mato iam lá ?

- Iam o que sinhô, então eles eram bestas? Eles se escondiam em barrancos, faziam emboscadas para as tropas, espalhavam armadilhas onde elas caiam.

O preto velho que comandava o quilombo Marcos da Costa, mesmo doente de cama dava ordens: “vai catar o milho, vai cuidar dos porcos. Eles tinham de tudo, campos de gado, plantação de milho”. João conheceu muito crioulo que fugiu para esse quilombo “onde tinha um santo que veio da África e era o padroeiro do lugar, foi trazido pela fazendeira D. Inês, da Fazenda da Glória”. Cansados de verem tanta “malvadeza dos brancos” com seus irmãos de cor, a ponto de preferirem suicidar-se a continuarem escravos, a fuga era uma forma de se libertarem. Em Pacobaíba viu chegar muitos negros e muita negra mina natural de Angola. Uns destinados às fazendas, outros eram anunciados no “Jornal do Comércio” do Rio de Janeiro pelos agentes de escravos para serem vendidos em praça pública. Esse jornal publicava desde 1827 todo o movimento de navios com saída e chegada no porto. Compra, venda, aluguel e fuga de escravos, aconselhando que chamassem a polícia para capturá-lo e oferecendo recompensas a quem o levasse ao seu dono. João afirmava que escutou muita história de negros jogados no mar durante a travessia da África para o Brasil, “pelos comandantes que não queriam ser apanhados em flagrante fazendo tráfico de escravos. Abriam o porão e pronto, todos os escravos morriam afogados ou eram comidos pelos tubarões”.

Os velhos falavam que era assim, coisa de gente muito ruim “Diz o preto reprodutor que nunca leu jornal, nem no Império nem agora, pois é analfabeto”.

“Guaraciaba ainda se lembra que a fazenda de Pedro II era ali em Mauá, perto do lugar conhecido por Ipiranga dos Remédios. Naquele tempo era católico, mas gostava de macumba. Hoje é Batista, vai aos cultos sábados e domingos”.

Faz algum tempo, trabalhava no transporte de bananas com uma carroça e uma égua de sua propriedade, depois, passou a emprestar o animal ao compadre carroceiro para continuar o serviço, “por culpa de um reumatismo, principalmente no inverno, quando as dores aumentam”. Sobre os “feitores de escravos”, nem gostava de relembrar. Falava sobre a maldade e tortura contra os negros, crianças, mulheres e homens, amarrados no tronco e açoitados. Outros feridos a bala pelos senhores que experimentavam armas ou exercitavam a pontaria.

- O pior fazendeiro que conheci foi Antônio Nicolino, um homão de quase três metros de altura que comprava 100 escravos de três em três anos. Com três anos de trabalho a negrada estava arrebentada de tanta surra. Aí ele mandava comprar aguarrás, fazia uma fogueira e matava aqueles mais fracos.

- Eles pagavam os réis (impostos), e eram donos dos negros. Mas Deus é justo e Nicolino morreu pobrezinho e ninguém chorou (aí Guaraciaba fala sorrindo) por que todo mundo odiava ele.

Nesse tempo João era rapazinho e esses crimes foram testemunhados na Fazenda do Morro Seco, em Vassouras, propriedade de Nicolino.

- Tinha escravo que também era capataz e se juntava com os brancos para bater nos pretos, cercavam a negrada na mata e mandavam bala. Nhô não sabe, mais tinha fazendeiro que se desconfiasse que algum escravo roubou, matava, que era pru mode de não panhar costume.

O velho Guaraciaba está cansado de falar e pára para tomar o café, servido na casa dos compadres onde concedeu essa entrevista. Bebe de um só gole e estala a língua. Perguntado se nunca teve mulheres firmes com quem viveu, diz que sim, a Maria Olina, a Maria Madalena e a Olícia Maria do Carmo, esta com quem, teve uma filha agora com 33 anos, Laura, que mora em Nova Iguaçu, casada com um comerciante português.

“Os moradores de Mauá sabem de sua última mulher, Maria Olícia, que ele diz ser a mãe de Laura, morreu há três anos, com 50 anos. Aí o velho ficou mesmo só, dando suas caminhadas, mas ainda com vontade de caçar negas por aí”.

Acordava de manhãzinha com o cantar dos galos e dormia às oito da noite. Só sabia das horas orientando pelo sol. Não tinha relógio. Perguntado se gostaria de conhecer Angola, país onde nasceu, disse que “gostaria, mas só se fosse de navio”, pois “acho bonito o mar”. São quatro horas da tarde e o velho Guaraciaba quer ir embora pra casa, “hoje não foi almoçar com seus outros companheiros crentes, comeu arroz, feijão e peixe aqui mesmo na casa do compadre Jorge Carroceiro. Quer ir descansar”. Aceita uma carona. Está chovendo e a tarde vai antecipando a noite. Indica a estreita estrada de barro rasgada no mato, que João conhece bem, levando a um pequeno barraco de estuque com quintalzinho nos fundos, onde uma bananeira ao lado da porta tomba com o peso do cacho. Ao saltar do carro gemeu, ao botar a perna direita das oito picadas de cobras e pisar no chão com lama que agarra nos sapatos. Casebre acolhedor, mas que ele desejava melhor, pois nem porta firme tem, embora não se preocupe com ladrões, não há ali nada para roubar.

“Ficaram de me dar uma casa, mas acho que estão esperando eu morrer, diz brincando com um sorriso, pitando seu cachimbo de barro deixando um cheiro de fumo no ar. Na sua pureza ainda acredita em almas do outro mundo, rezando muito para elas não aparecerem em sua vida, principalmente quando vai a Piabetá a pé, sozinho pela estrada, chegando lá ao anoitecer”.

Dentro do barraco somente uma velha cama com colchão de palha forrada com trapos e algumas panelas sobre um armário. Seus bens mais preciosos cabiam dentro de uma lata vazia de leite em pó. Ali eram guardados a certidão de nascimento e um folheto evangélico, nada mais. “Quando quiser escrever uma carta (e pretende pedir uma casa ao Governo), recorrerá à dona Maria e ao seu Miguel, os compadres crentes”.

- O senhor sabe o nome atual do Presidente da República?

- Não sinhô.

- Quais o que o senhor se lembra?

- O Hermes da Fonseca, o Floriano Peixoto.

“Para ele o mundo era ali. O radio da vizinha irradia ao longe o jogo Fluminense e Olaria transmitido do Maracanã. Um avião quadrimotor passa baixo em direção ao Galeão. Vem de longe também música no rádio, ouvindo-se Jards Macalé cantando “Hei Cantareira” de Jackson do Pandeiro”.

Ali, naquele fim de mundo “Guaraciaba não tem luz, gás, telefone, campainha, porteiros, síndicos, cobradores, talvez nunca tenha sido recenseado pelo IBGE, os Correios não sabem seu endereço. Mas dorme com canto de grilos nos matos, olhando as estrelas nos céus das noites limpas sem poluição”. Na chegada da noite chuvosa, despediu-se dos repórteres desejando boa viagem e perguntando se sabiam seguir pela estrada até Magé. Agradecidos, eles prometeram voltar para atender o seu pedido:

- Trais uns agasaios pra mim, viu? Aqui faz muito frio.

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