Por José Mendes Pereira
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O escritor
Alcino Alves escreveu em seu livro “Lampião Além da Versão Mentiras e Mistérios
de Angico” que Manoel Vitório dos Santos era proprietário da Fazenda Cassussu,
e era casado com uma moça do ribeirinho do Bom Sucesso. O casal construiu
numerosa prole, Temistocles (popularmente chamado de Temisto das Queimadas),
sendo este famoso coiteiro de Lampião, Benjamim, Geminiano, Alice, Porcina,
Bela, Júlia e mais dois filhos, uma menina e um menino. Os dois últimos eram
filhos de Manoel Vitório com Maria das Virgens, que era a esposa de um senhor
chamado Cante e, sendo esta, mãe do cangaceiro Canário.
Em fins de
1934 o cangaceiro Zé Fortaleza que já era chefe de um bando de cangaceiros, ficou
arranchado juntamente com os seus comandados aos arredores da fazenda Cassussu,
e lá, uma rês foi morta. Como precisavam cozinhar a carne, alguns cangaceiros
foram até a pequena fazenda pedir uma panela emprestada. Com desejos de agradar
aqueles delinquentes, o próprio Manoel Vitório foi até ao coito deixar a
panela. Mas o catingueiro não sabia que
aquele gesto de humildade, iria trazer problemas terríveis e cruéis, tanto para
ele, como sua generosa e amada família.
Ao chegar,
entregou a panela e animadamente conversou com os bandoleiros sem temer nada.
Recebeu um agrado (gorjeta), e por Zé Fortaleza, foi advertido que, não
espalhasse na região que eles estavam ali, arranchados.
Elesbão que
era filho de Maria das Virgens com o seu pai Manoel Vitório, estava passando
uns dias com os seus irmãos, filhos da moça de Ribeirinho de Bom Sucesso, vendo
os cangaceiros na casa do pai, ao retornar para Poço Redondo, contou o que viu,
isto é, a presença dos cangaceiros na fazenda Cassussu do seu pai. E logo, a
notícia se espalhou, e a partir daí a desgraça estava preste a acontecer.
Os desocupados
fuxiqueiros que não faltam em uma comunidade qualquer, correram e foram contar
a Zé Fortaleza o que estava se passando. Raivoso, o facínora põe toda culpa em
cima do fazendeiro Manoel Vitório, e com desejo de vingança, disse que o Manoel
Vitório iria ter o seu castigo, pela sua fraqueza de ter espalhado a sua
presença com os seus comandados aos arredores da sua fazenda.
Como o sertão
nordestino estava em dificuldades, devido à grande seca que assolava aquelas
regiões, Geminiano foi morar no Estado de Alagoas, e lá, arrumou um pequeno
trabalho numa fazenda chamada de “Soledade”, de um senhor chamado Neco Brito. E
como as dificuldades continuam lá na Fazenda Cassussu, Geminiano levou o seu
irmão Benjamim para sua companhia, e arranjou um trabalho para ele, numa
fazenda de nome “Horizonte”, que ficava perto de onde ele morava. Benjamim
havia se casado com uma moça de nome Mila, uma das filhas do renomado alagoano
Joãozinho Correia.
No ano de
1935, o inferno foi muito bom em toda região nordestina, farturas e mais
farturas estavam nas mesas dos camponeses. O mês de junho, o mês das
festividades juninas, e Geminiano convidou o seu pai Manoel Vitório para passear
pelas aquelas belas terras alagoanas, que tão bem haviam o acolhido e o seu
irmão Benjamim.
Uns quinze
dias das festas de São João seu Vitório chegou à fazenda “Soledade”, O baile,
as fogueiras e os fogos foram na Fazenda “Mata Grande”, de um senhor chamado
Pedro Cadeira, um dos seus parentes alagoanos. Os dias se aproximavam para os
festejos, e seu Vitório nem se lembrava, que os festejos seriam no dia
seguinte.
Geminiano
conversava com o pai, e o avisou que as festividades juninas seriam no dia seguinte:
- Papai,
amanhã móis vamos para a Mata Comprida. Vamos para o São João de lá.
O velho põe-se
a pensar nas festividades de Poço Redondo, e sem querer ir para as festividades
de Mata Comprida, de imediato disse para o filho Geminiano:
- Vá, meu fio,
vá! Pode ir! Destá, meu fio, que eu cuido dos afazes da fazenda.- Garantiu ele
ao filho.
O velho ficou
sozinho. Bem perto da Fazenda em que ele estava, trabalhava o seu filho
Benjamim na Fazenda “Horizonte”. A sua esposa tinha ido às festividades, mas
ele permaneceu em casa, na propriedade, junto com um dos seus amigos, um senhor
de nome Pedro Serafim.
Nesse dia, era
um domingo. Na “Soledade”, Manoel Vitório foi cuidar de apartar os bezerros. A
noite chegou e o velho foi para o telhado cuidar de lavar os pés. Depois,
cuidou de um café, assou carne de bode e ali mesmo comeu misturada com farinha,
e de costume, procurou dormir.
Por volta da
meia noite, deste domingo, o visitante da Fazenda “Soledade”, o seu Manoel
Vitório foi convidado para abrir a porta. Mesmo não sendo daquelas terras,
abriu-a sem nenhum receio, e viu de cara os velhos cangaceiros Zé Fortaleza,
Limoeiro, Suspeita e Medalha.
O chefe do
grupo, o Zé Fortaleza que não tinha a mínima ideia aonde estava morando Manoel
Vitório, e o reconhecendo, mas mesmo assim, lhe faz uma pergunta:
- O senhor é o
Manoel Vitório lá da Fazenda Cassussu?
Manoel Vitório
não temendo nada, respondeu-lhe:
- Sim senhor,
sou eu mesmo o Manoel Vitório!
- Que bom!
Fazia um bom tempo que nóis istava a sua porcura. No seu rasto. Você sabe aonde
fica o Cabôco?
- Não num sei
não. Eu sou lá das terras de Sergipe, e por aqui eu não cunheço nada não sinhô!
Zé Fortaleza
que estava querendo vingar aquele boato que saiu, que eles estavam acoitados próximo
à sua Fazenda Cassussu, perguntou-lhe:
- Você tá
lembrado quando nóis fizemos coito perto da sua fazenda e lhi pidimo uma panela
emprestada, e você ispaiou a nutiça onde a gente tava, e si esqueceu que eu lhi
pidi qui num dissesse nada a ninguém?
_ Seu Zé
Fortaleza, o sinhô pode acreditá qui eu num falei nada a ninguém! – Respondeu o
Manoel Vitório.
- E quem
contôu?
- Deve ter
sido o meu fio Alesbão. Eu me arrecordo que naquele mesmo dia eli foi pra Poço
Redondo. – Responde o sertanejo com desespero.
O Manoel
Vitório mais ou menos já estava sabendo o que iria acontecer com ele, vez que
marginal, principalmente cangaceiro, não perdoa nada a ninguém.
Apoderado de
ódio, o Zé Fortaleza perde o seu controle emocional, dizendo-lhe:
-Tá
cunvessando, veio safado! Só pruquê si cumpricou, agora Istá quereno colocá o
rabo de fora, e cum isso, acusa o seu fio, hein?!
E em seguida,
ordena a um dos seus comandados:
- Medaia,
amarre esse miseravi traidor!
Agora o velho
sertanejo está amarrado, e irá passar por coisas que, até o momento, não tinha
acontecido com ele.
Os facínoras o
levaram até a fazenda onde o seu filho Beijo (Benjamim) trabalhava. Beijo é um
rapaz fortíssimo e destemido. Como a sua esposa Mila tinha ido para as festas
juninas, e ele estava acompanhado do amigo Pedro Serafim, Beijo está dormindo
na sala, sobre um banco, apoderado de um travesseiro, o chapéu e um faca
peixeira, esta, iria ser o instrumento de sua desventura.
Os bandidos
estão ali, e logo um bate em sua porta, fazendo acordar os moradores. O
primeiro a atender é o Pedro Serafim, e sem ter como reagir, o alagoano ficou
totalmente dominado por dois cangaceiros, Limoeiro e Suspeita. Os outros dois,
o Zé Fortaleza e Medalha tomaram de conta da casa, invadindo-a.
Despreocupadamente,
ou possivelmente ainda não havia percebido o que ganhara naquele momento, Beijo
continuava deitado sobre o banco. Medalha vai e por uma das pernas, o fez cair
do banco. Os facínoras não esperavam a reação do Beijo que era dono de muita
força física, sem medo, o enfrentou, e o Medalha é dominado.
O cangaceiro
Zé Fortaleza que acompanhava a luta do Beijo e do Medalha resolveu ajudar o seu
companheiro. Vendo a faca do Beijo no chão, apanhou-a, e aproximou-se dos dois
lutadores, e cortou os órgãos genitais do pobre Beijo. Feito esta castração,
Beijo deu um enorme grito, e em seguida, ficou totalmente desacordado.
O pai, o
Manoel Vitório continuou amarrado, e nada pode fazer em favor do filho. E
acreditava que ele está sendo judiado, sangrado pelas mãos dos perversos, mas
sem nunca imaginar, que o filho tinha sido castrado.
Desesperado,
fez pedido aos que se diziam justiceiros:
- Pelo amor de
Deus, num mate meu minino! Eli é um inocente! Num fez nada! Deixi meu minino
viver!...
O companheiro
de Beijo o Pedro Serafim que estava na sua companhia não sofreu nada, e o Beijo
estava estirado como morto. O Manoel Vitório estava enlouquecido, urrando como
uma rês. A dor que sentia o Manoel Vitório era maior do que a dor que sentia o seu
filho.
O Manoel
Vitório iria pagar pelo o que não fez. Os cangaceiros acreditavam que foi ele
quem espalhou o boato, que eles estavam acoitados lá nas terras de Cassussu.
Zé Fortaleza
estava escalado para eliminá-lo deste planeta, e sem nenhuma piedade,
misericórdia ou outra coisa semelhante, com a mesma faca que castrara Beijo
desferiu 13 facadas, e um tiro no infeliz sertanejo das terras de Poço Redondo.
Feito a vingança, a malta saiu da fazenda “Soledade”, e foi embora, feliz por
ter justiçado um homem injustamente.
Pela manhã, a
triste notícia tomou rumo a todos os lugares do sertão alagoano. Geminiano
levou os amigos e transportaram o Beijo para cidade de Pão de Açúcar, para os
devidos procedimentos médicos.
Infelizmente,
Beijo ficou sexualmente inutilizado, mas tinha em casa, a Mila, uma senhora
honrada, e que nunca desrespeitou o seu nome e nem manchou o nome do marido;
cuidava dele com carinho e muito amor. Beijo e Mila só se separaram quando a
morte os levou para seu mundo desconhecido.
Depois das
perversidades feitas pelos os 4 cangaceiros, Zé Fortaleza, Limoeiro, Medalha e
Suspeita não sabiam que o destino iria lhes cobrar o que fizera com aqueles
pobres inocentes. Ao chegarem ao município de Mata Grande, encontraram a morte
juntamente com o civil Félix Alves.
Fonte de Pesquisas
Livro: "Lampião Além da Versão Mentiras e Mistérios de Angico
Páginas: 205, 206, 207 e 208
Edição: 3ª.
Autor: Alcino Alves Costa - O Caipira de Poço Redondo
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