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domingo, 3 de junho de 2018

LUIZ GONZAGA E IRMÃO


Por Guilherme Machado

Tiramos diretamente do túnel do tempo! Fotografia da família Gonzaga... Luiz Gonzaga Juntamente com o Seu irmão caçula Aluísio Januário dos Santos (O Luizinho de Exu) esta fotografia foi exclusiva da cerimonia do Casamento da minha amiga irmã! Silvana Ávila, filha do Saudoso Aluísio, Sobrinha do Rei do Baião Luiz Gonzaga, a cerimonia se deu no ano de 1979 no Rio de Janeiro.

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LIVROS SOBRE CANGAÇO É COM O PROFESSOR PEREIRA


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NENÉM DO BAIÃO


Por Lindomarcos Faustino

Nosso eterno rei do baião mossoroense - NENÉM DO BAIÃO - Pobre Mossoró não fez ainda nenhuma homenagem a este filho ilustre de sua terra, alô Câmara Municipal, faça uma homenagem a este cidadão que muitas vezes cantou e encantou no Mossoró Cidade Junina.

ADENDO NENÉM DO BAIÃO


Por Kydelmir Dantas

Edmundo Maria do Nascimento (1941-2011) – Segundo ele, começou sua vida de sanfoneiro com o nome de Neném do Rojão, porém após apresentar-se ao lado do seu ídolo maior, teve seu nome artístico trocado para Neném do Baião, dado pelo próprio Luiz Gonzaga, era um mossoroense apaixonado por forró, e admirador de o Rei do Baião.

Foi componente na primeira formação da Orquestra Sanfônica Otaviano Pinto, nos anos de 1999 e 2000; conforme o Maestro da sanfônica, sanfoneiro e compositor Cláudio Henrique: “Neném foi, sem dúvidas, uma das figuras mais relevantes e expressivas da arte folclórica-musical mossoroense”.

Neném do baião e sua sanfona

O sanfoneiro esteve presente em quase todas as edições do Mossoró Cidade Junina, tocando forró, que todo ano era montado dentro da Estação das Artes.


Era uma figura que representava, com orgulho, a cultura nordestina, se espalhando no seu ´dolo maior e cantando suas músicas. Sua simplicidade fazia com que ganhasse fãs e admiradores, além de muitos amigos(a)s. Costumava se apresentar nos shows vestido com figurino igual ao de Luzi Gonzaga. Considerado o “Luiz Gonzaga de Mossoró. O sanfoneiro morreu numa quinta-feira do dia 08 de setembro de 2011 de infarto, aos 70 anos.

Coronel Pereira e Neném do Baião

Assim, a família o homenageou colocando em cima do caixão o chapéu de couro e o gibão. Também, a camisa do Baraúnas, seu time do coração.

Kydelmir Dantas é da cidade de Nova Floresta no Estado da Paraíba; poeta, escritor, pesquisador do cangaço e gonzaguiano.


Fonte: “Luiz Gonzaga e o Rio Grande do Norte”
Autor: Kydelmir Dantas
Ano de Publicação: 2012
Páginas: 140

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FERIR POR FERIR

*Rangel Alves da Costa

O mundo está cheio de covardias. Todas as pombas brancas simbolizando a paz já foram feridas de morte e desde muito lançadas em poças ensanguentadas. Será sempre hipocrisia pregar a concórdia e depois lançar ódios e violências.
Ferir por ferir. Eis a prática humana mais corriqueira. O sadismo da violência não estava somente na chibata sangrando o corpo negro, mas continua voraz em todos os tipos de violência, seja proveniente da autoridade, do policial ou da pessoa comum.
Ferir por ferir, apenas isso. Quando um se imagina superior ao outro, então logo o escraviza. Acreditem, mas ainda há gente que pensa que pode usar a sola dos sapatos para esmagar pessoas ou sua caneta para dar rumo aos destinos humanos.
Será que há sentimento de uma época distante espelhando ainda a escravização, a submissão, o mando doentio? Será que o homem de hoje ainda não desapartou da crença do poder como meio de apenas oprimir, ferir e escravizar?
A ferida é aberta e sangra, e quando aberta logo o lamento, logo a palavra de repúdio e de revolta. Contudo, nem a marca é cicatrizada e novamente o lanho, o corte, a agressão, por cima da mesma ferida anteriormente chorada. E assim numa eternidade de cicatrizes que jamais se fecham.
Veja que ideia genial a do homem, vejam que uso o homem dá ao seu poder de realização: premedita um atentado para matar dezenas, centenas ou até milhares de pessoas. Não só premedita como coloca em prática sua obsessão doentia pela violência. É o instinto do mal nos seus mais perversos açoites.


Será que há insanidade em todo aquele que pratica violência gratuita, que provoca perdas irreparáveis, que fulmina de morte uma dezena de pessoas? Logicamente que não. Apenas a maldade se expressando na sua forma mais cruel do atingir: a sede cega de destruir, de matar, de dizimar.
É um ferir por ferir, e simplesmente ferir, como se a vida humana, a do outro, a da vítima, fosse um verdadeiro nada. O algoz levanta a espada e desce sobre o pescoço, o feitor levanta a chibata e a desce com força no lombo negro, o inocente é levado ao paredão e fuzilado. E tudo isso na maior normalidade do mundo. Mas isso é normal da vida, é normal do ser humano?
Não deveria ser, mas sempre foi e cada dia se torna mais requintado o uso da violência. Fere por que ferir e está acabado, deve ser assim que se imagina. Mata por matar e tudo está resolvido, deve ser assim que se pretende. É a mera banalização da vida, o brinquedo que se pretende ter na vida humana.
Perante muitos, o ser humano é apenas uma barata que deve ser pisoteada. Para muitos, a vida humana nada mais que algo reciclável que num instante é jogada fora. Para grande parte das pessoas, tanto faz que a ação cause dor, sofrimento, que mate, pois sempre importa mesmo acionar o brinquedo da destruição.
Mas não é ferir apenas com a arma, o punhal ou outro artefato, mas também pela palavra, pela arrogância, pelo autoritarismo. Tão afiado quanto o punhal é a arma do mando, do poder, da política, da chefia, da gerência, do cargo, do poder delegado.
Tudo é ferir por ferir. E nesta relação, aquele que fere apenas vê o outro, a vítima, como sua antítese. Ele pode tudo e o outro nada. Inclusive viver. Este, que sequer pode viver perante a sanha do outro, é aquele mesmo que já quase não vive temendo as consequências da violência. E desta acaba sendo vítima.

Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

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O DOCUMENTÁRIO QUE FALTAVA POR AQUI DE MAURICE CAPOVILLA "O ÚLTIMO DIA DE LAMPIÃO" 1975



Sinopse:

"Depoimentos documentais somam-se à reconstituição das últimas 24 horas de Virgulino Ferreira, o Lampião.

Com narração de Sérgio Chapelin, registram-se imagens e vozes de soldados da Volante e, também, de cangaceiros sobreviventes da emboscada (ocorrida em 28 de julho de 1938), na qual morreram Lampião, Maria Bonita e nove cangaceiros.

O cineasta pergunta a todos eles: 'onde você estava aquele dia?'. As filmagens contaram o episódio narrado, tanto sob o ponto de vista dos cangaceiros, quanto do ponto de vista dos 'macacos' (Soldados da Volante).

Começa em Piranhas, Alagoas, onde a tropa iniciou sua movimentação, até montar a emboscada na grota de Angico. Os sobreviventes foram levados aos locais onde tudo se passou. Atores e populares (alguns parentes dos envolvidos no conflito) atuaram.

A Polícia Militar de Alagoas forneceu o armamento e soldados da PM." , sinopse extraída do livro 'Cangaço, o Nordestern no Cinema Brasileiro', org.: Maria do Rosário Caetano, Avathar Soluções Gráficas, DF, 2005.)

Observações do Diretor

O tema do cangaço chegou à Blimp Film por acaso. *Um dentista, pesquisador do cangaço, era conhecido do diretor de produção da Blimp. Por isso, ele nos deixou, para nossa avaliação, enorme texto com dados importantes dos diversos bandos de cangaceiros, especialmente do bando de Lampião. O Guga (Carlos Augusto de Oliveira) me deu o material para eu dar uma olhada. Eram informações gerais e dispersas, abarcando um amplo universo dos conflitos do cangaço.

Achei interessante, pois a pesquisa citava nomes de cangaceiros e suas localizações no espaço geográfico do Nordeste. Entre eles, muitos se encontravam no coito de Angico por ocasião da morte de Lampião.

Propus então realizar um programa que centrasse o foco nos últimos dias de Lampião, isto é, as últimas 24 horas do bando. O Guga topou na hora e o Boni (José Bonifácio Oliveira Sobrinho, irmão dele e executivo da Globo) analisou e aprovou o projeto. Necessitávamos da aprovação dele, uma vez que o orçamento para esse filme extrapolava custos habituais.

'O último dia de Lampião' foi realizado em duas etapas. Na primeira viajei com a equipe precursora e subi de Salvador, passando por Alagoas e Sergipe, Até chegar ao Recife. Fui encontrando e captando depoimento dos cangaceiros. Em Alagoas encontrei dois soldados da volante, Abdon e Panta - este foi o militar que matou Maria Bonita.


Soldados Abdon e José Panta de Godoy


Em Piranhas, consegui o depoimento dos traidores, Joca Bernardes e Durval, o irmão de Pedro de Cândido, os dois coiteiros de Lampião, que nunca tinham confessado a traição.

João de Almeida Santos, o Joca Bernardes.

Voltei a São Paulo com o material, montei e segui para a segunda etapa, que consistia em reconstituir, a partir das entrevistas feitas, os fatos que culminaram com a morte de Lampião. De grande ajuda foi Cila, mulher de José Sereno - que estava hospitalizada em São Paulo. O depoimento dela tem valor de confirmar informações contraditórias. Cila era a melhor amiga de Maria Bonita, era também a figurinista do bando e foi a nossa também. Os chapéus foram confeccionados por Dadá, mulher de , na Bahia. 

Soldado João Bengo

Enfim, tive sorte de encontrar testemunhas oculares da história, que deram a credibilidade necessária à reconstituição dos fatos (...)'

Trecho de depoimento de Maurice Capovilla, extraído do livro 'Cangaço, o Nordestern no Cinema Brasileiro', org.: Maria do Rosário Caetano, Avathar Soluções Gráficas, DF, 2005."

"Depoimentos dos remanescentes do grupo residentes na capital paulistana que se achavam presentes no dia da morte de Lampião e daquele que deu o tiro inicial, Abdon, nunca antes entrevistado".

Vamos ao deleite...


Fonte: Canal do Dj Fr3d no You Tube. Texto: www.cinemateca.gov.br
Fotos: DocsPrimus e Prints do vídeo.


*O dentista em questão é nosso estimado amigo Antonio Amaury

http://lampiaoaceso.blogspot.com/search/label/Joca%20Bernardes

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VIVA A CULTURA E O RICO ARTESANATO DE POÇO REDONDO

Que o Cariri Cangaço já começou em Poço Redondo, isso é verdade. A cidade já está mobilizada. É só ver na foto abaixo Lampião e Maria Bonita na arte do crochê da Professora Dilma Feitosa.

Várias bordadeiras ocupam o dia costurando e bordando em ponto de cruz os aiós, artesãos em madeira fazendo canetas e pentes, livros e folhetos de cordel sendo escritos, os grupos de xaxado já ensaiam as danças, ateliês de costuras e bordados costurando e bordando vestimentas, a cavalhada, as sanfonas afinadas, os pifanos e zabumbas dos Vito e as escolas mobilizadas e desenvolvendo a temática com os estudantes, etc. Os temas história de Poco Redondo, Cangaço e cultura nordestina nunca foram tão procurados como agora. E a grande surpresa que eu e Rose tivemos na noite de hoje: Recebemos da professora Dilma Feitosa Lampião e Maria Bonita feitos para presentear o curador do Cariri Cangaço Manoel Severo. O Cariri Cangaço, "celebrando o chão sagrado de Alcino", já está nas escolas, nos ateliês e na alma do povo poço-redondense.Parabéns professora Dilma Feitosa!

Mestre Tonho aguarda o Cariri Cangaço

Na manhã de hoje, 31 de maio, estive novamente no ateliê do Mestre Tonho, localizado ali na Praça Antônio Conselheiro, no centro de Poço Redondo. Vi ali, como todas as vezes que visito o Mestre, as suas magníficas esculturas feitas em madeira de umburana. O artesão Mestre Tonho exibe traços da nossa cultura nos objetos em madeira de Umburana que produz diariamente em seu simples ateliê, algumas vezes de forma consciente ou outras vezes inconscientemente. Muitas de suas tradições, como crenças e símbolos mágicos, estão marcadas em suas peças. E é no seu ateliê que o Mestre Tonho produz e vende suas peças. Um artesanato todo feito em madeira de umburana, onde estão evidenciadas suas crenças, hábitos e tradições. Já são quase 30 anos que o Mestre Tonho produz suas esculturas. O Mestre Tonho é um ícone da cultura popular de Poço Redondo. E já está contando os dias para participar do Cariri Cangaço Poço Redondo 2018, no período de 14 a 17 de junho.

Manoel Belarmino
Comissão Organizadora
Cariri Cangaço Poço Redondo


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FOI COROADO DE ÊXITO, O EVENTO DO FÓRUM PERMANENTE DE ESTUDOS E DEBATES PELO CEARÁ. - Prof. Dr. Benedito Vasconcelos Mendes

Prof. Dr. Benedito Vasconcelos Mendes
Foi realizado ontem (2-6-2018), no Náutico Atlético Cearense, em Fortaleza, palestras e debates sobre participação dos jovens na política, promovido pelo Fórum Permanente de Estudos e Debates pelo Ceará. 


O Prof. BENEDITO VASCONCELOS MENDES, ao lado de destacadas personalidades cearenses, como o Ex-Governador Gonzaga Mota, o Ex-Ministro Ubiratan Aguiar, a Professora Fátima lemos, a Professora Querubina Bringel, o Ex-Secretário Josbertine Virgílio Clementino e de outros intelectuais, forneceu importantes sugestões para estimular a participação políticas dos jovens. 

A Presidente do Fórum, Escritora Maria Nirvanda Medeiros e o Presidente de Honra Francisco de Assis Clementino Ferreira mostraram-se muito satisfeitos com os resultados do referido evento.  


O Fórum foi muito prestigiado por escritores, historiadores, estudantes e por entidades culturais. Diversas Academias de Letras e instituições afins prestigiaram o citado evento. Um dos pontos altos do seminário foi a apresentação teatral e temática dos estudantes que fazem parte da Academia de Letras do Colégio Maria Ester, organizada pela Professora Fátima Lemos.

Enviado pelo professor, escritor, pesquisador do cangaço e gonzaguiano José Romero de Araújo Cardoso

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A VIDA DEPOIS DO CANGAÇO O ENCONTRO DE ZÉ SERENO E O EX-SOLDADO ADRIANO

Matéria da revista Realidade, transcrita por Raul Meneleu

O que faz dois homens não esqueceram suas rixas depois de três décadas do último encontro bélico entre eles? O soldado Adriano e o cangaceiro Zé Sereno, nos contam nesse histórico e eletrizante encontro ocorrido há 48 anos em um restaurante em São Paulo, promovido pela jornalista, historiadora e pesquisadora do cangaço, Cristina Mata Machado, no ano de 1968, 30 anos depois da morte de Lampião no ataque das volantes a seu esconderijo/coito da Grota do Angico. Vamos à leitura! 

Trinta anos depois do cerco de Angico, Alagoas, onde Lampião, Maria Bonita e mais nove cangaceiros foram mortos e decapitados, reencontraram-se em um restaurante de São Paulo cinco participantes do combate na Grota do Angico. Eram quatro ex-integrantes do bando do "Rei do Cangaço" e um antigo membro da "volante", tão temida quanto os cangaceiros.

Depois da madrugada de 28 de julho de 1938, eles tomaram rumos diferentes. Deixaram o sertão, construíram uma existência sem aventura, tiveram filhos, tornaram-se cidadãos comuns. Todo aquele passado voltou, num relance dramático, quando o grupo começou a ser apresentado ao antigo "volante", o ex-soldado Adriano.


Adriano pareceu receber um choque ao ouvir o nome de Zé Sereno, o ex-bandido que ele perseguiu todo esse tempo, para vingar-se, e que hoje é um pacato zelador de um colégio. Adriano Ferreira de Andrade andou caçando Zé Sereno durante muitos anos. Em verdade, entrou na polícia, ficou três anos e meio na "volante" pervagando o alto sertão, unicamente para vingar-se de Zé Sereno.
Tinha umas contas a acertar com o cangaceiro desde um dia qualquer de 1936.

  - Pensei em dar uns conselhinhos pra ele, bem devagar, pra não sofrer muito.
 

Adriano cultivava seu ódio de morte por Zé Sereno. Jamais se esqueceu da provação que o cangaceiro lhe impôs em Jeremoabo, na Bahia, quando se avistaram pela primeira vez. Adriano trabalhava na fazenda do Coronel João Dantas e, um dia, viajava com a boiada quando passou por uma fazenda. Um coiteiro, sujeito que se especializara em homiziar cangaceiros, advertiu-o de que devia mudar o caminho, parque a estrada era ruim.
 

- Fui parar noutra fazenda. Quando menos esperava. estava cercado por cinco cangaceiros. Eles disseram que eu era delator, me amarraram e me deixaram preso durante três dias. Fui até obrigado a ir numa festa com eles e me mandaram dançar. Imagine se uma pessoa que vai morrer tem vontade de dançar. O dono da fazenda. que me conhecia, falou com os cangaceiros e pediu pra não me matar. Foi assim que eu me salvei de morrer mesmo. Quando eles me soltaram. disseram assim:
 

- "Agora pode andar sossegado". Mas eu disse pra mim mesmo: "Sossegado, hein?"

Em vez de sossegar, Adriano entrou para a "volante" e fez uma jura: — Enquanto existir cangaceiro, eu não saio da polícia. Só saio quando não tiver mais nenhum vivo.

A vingança, quase

Por duas vezes a vingança de Adriano esteve por se consumar. A primeira foi no cerco do Angico, comandado pelo Tenente João Bezerra, que reunira várias "volantes para liquidar Lampião. Não se tratava de pega-lo vivo ou morto mas eliminá-lo sumariamente.

O Tenente soube par intermédio de coiteiros que Lampião e diversos cabras se encontravam na Fazenda Angico. Foi para lá, obrigou outro coiteiro. que sempre fora amigo de Lampião, a dar notícias dos cangaceiros. Apresentou um ultimato: — Ou você me põe no lugar onde se encontram os bandidos ou então vai morrer. O "coiteiro" preferiu viver.

As 5 da manhã, Lampião estava sitiado. As demais 'volantes' já haviam tomado posições diferentes cercando o refúgio do 'Governador do Sertão' quando o Tenente chegou à área que lhe cabia. O embate durou 20 minutos, talvez menos. O grupo do Tenente travara vários choques com cangaceiros, que corriam para tomar posição ou fugir ao cerco. O oficial já estava baleado. Ao chegar à barraca de Lampião, casa e trincheira ao mesmo tempo, viu muitos cangaceiros mortos. Um soldado gritou:

— Lampião morreu, Seu Tenente!

Entre a fugitivos estavam Zé Sereno, Sila sua mulher, Marinheiro e Criança. Adriano chegara um pouco tarde. Entre as onze cabeças decepadas na mesma hora, para mostrar ao povo do sertão que Lampião "mostrar ao povo que Lampião morrera mesmo", não estava a de Zé Sereno.

Na segunda vez, Adriano empreendeu sozinho a caça a Zé Sereno. Foi dois anos depois, em 1940. Ele soube em Jeremoabo que o cangaceiro estava lá. Havia festa na cidade, os cabras fatalmente iriam. Adriano preparou o fuzil, procurou um rapaz que estivera preso com ele na fazenda, convidou-o para a vingança, dava-lhe até outro fuzil. O rapaz não quis. Aquilo já passou. Adriano foi sozinho.

— Armei uma tocaia pro Zé Sereno. Só que ele não passou. Se passasse eu torava ele.

Mas Zé Sereno não foi à festa. Adriano gravou bem o bando de cangaceiros que o prenderam e humilharam. Além de Zé Sereno, do grupo, fazia parte: Diferente, Zabelê, Meia Noite, Manuel, Moreno. O chefe era Zé Sereno, por isso Adriano pensava em se vingar nele.

O antigo volante não sabia que no almoço, tantos anos depois, estariam Zé Sereno, sua mulher e mais dois ex-cangaceiros. Ele reaviva o velho ódio ao relembrar o seus passado na "volante", na qual ficou até a morte de Corisco, o Diabo Louro.

Corisco, lugar-tenente de Lampião, vingou a morte do chefe, matando toda a família do coiteiro que o denunciou. (Nota: O coiteiro que Corisco matou, não o tinha traído, veja detalhes no artigo O Coiteiro que traiu Lampião. 


Matou inclusive duas mulheres pura "vingar Maria Bonita e Enedina", também mortas e decapitadas no cerco de Angico.

Com a morte de Corisco, desaparecia o último cangaceiro. Adriano cumprira sua jura, podia deixar a "volante". Foi o que fez. Trocou a profissão de soldado pela de comerciante, ficou em Jeremoabo até 1947, negociando com gado, viajando muito. Numa dessas viagens parou em São Paulo, torno-se laminador. Exerce o oficio até hoje numa fábrica perto de casa. Antes de ser oficial, fez um aprendizado lento, como auxiliar.

Aos sessenta anos Adriano conseguiu o que queria. Criou os dois filhos. Maria, casada e mãe de cinco filhos, e João, oficial de uma costura. O rapaz tem clientes famosos: Chico Buarque de Holanda, Wilson Simonal, Edu Lobo. Adriano só não conseguiu achar Zé Sereno. Dizem que ele mora aqui em São Paulo. Mas não sei não. Se eu encontrasse ele hoje... Não quero nem saber...

Um dia de Surpresas

Também os antigos cangaceiros não sabem como será esse encontro no restaurante. Só Sila sabe, e está impaciente.

— Cadê o pessoal?

 Zé Sereno é o primeiro a chegar. Não estranha a presença da companheira. Agora vem Marinheiro, irmão de Sila, cunhado de Zé Sereno. Depois chega Criança. Os abraços são apertados, de longa saudade. Risos, lágrimas. Criança é o que estivera mais tempo afastado dos outros nestes trinta anos. Sila se dirige a ele com carinho, sorrindo:

— Como o senhor está forte, compadre!

Numa briga Criança era uma cobra

Criança mal consegue sorrir, a emoção o sufoca. Custa a responder:

— Comadre Sila também está forte e cheia de saúde.

Zé Sereno olha com admiração para Criança. Ainda o trata de "menino". Criança contempla o companheiro, cinquentão como ele, e traz o mesmo respeito de outrora, quando Zé Sereno era o seu comandante. Zé Sereno fala. Criança se envaidece, mas baixa a cabeça, modesto, ao ouvir um elogio:

— Esse menino aqui era muito valente. Sempre calmo. Numa brigada, ele ela uma cobra.

Zé Sereno é o mais desembaraçado de todos; entre os demais, preserva ar de comando, vestígio do antigo chefe de grupo do bando de Lampião. Marinheiro o respeita como cunhado e como antigo líder. Tem razões para isso.

— Zé Sereno — lembra — encarou duas vezes o Capitão Virgulino.

A conversa agora é entre amigos íntimos. Casos e histórias são repassados. Um fala, outro completa a narrativa, corrige Ou acrescenta um pormenor.

Ao grupo se junta agora um estranho, que é posto frente a frente com Zé Sereno. Adriano. O antigo volante. Os dois se olham. Zé Sereno cumprimenta o recém chegado mais por cortesia, sem saber ao certo de quem se trata. Adriano reconhece logo o antigo inimigo: sua imagem jamais abandonou a sua memória. Zé Sereno franze a testa, morde os lábios e volta rápido ao passado sem saber quem é aquele que chegou:

—Zé Sereno este é Adriano, ex-volante e seu ex-inimigo.

Zé Sereno não esqueceu as mínimas coisas de sua vida de cangaceiro. Há nove anos trabalha como zelador num colégio, mas antes disso fez muitas coisas. Trabalhou como ambulante, vendendo peixe nas nas, foi operador de fábrica, depois esteve num frigorífico. Em São Paulo. criou os filhos, todos "bem encaminhados". O mais velho, Ivo. é dono de uma imobiliária: o caçula Wilson pediu engajamento na Aeronáutica, é cabo; Gilaene trabalha numa grande empresa.

Zé Sereno nunca revelou a ninguém que pertenceu ao bando de Lampião. Antes por segurança do que por vergonha de sua outra vida. Temia que algum inimigo lá de Alagoas, onde o desejo de vindita é transmitido como herança de família, tentasse vingar algum fato do passado. Vergonha não tinha nem havia por que. Foi anistiado por decreto do Presidente Vargas, no fim da ditadura do Estado Novo; não tinha contas a prestar. Além disso, lá no Sertão, não tinha escolha:

— Naquele tempo tinha que ser cangaceiro mesmo ou entrar na volante.  tanto um como outro passava maus bocados.

Dois tios e dois primos de Zé Sereno, Antonio de Engrácia, o velho Cirilo, Zé Baiano e Antonio Honório — eram cangaceiros, sem querer, acabaram por empurra-lo para o mesmo destino.

— Houve uma briga e dois soldados foram mortos pelos meus tios. O pai de um dos soldados, de nome Lau, resolveu se vingar em mim. Disse que ia me matar. Como não sou cabrito pra morrer dependurado numa corda, resolvi sair pro mato. Me lembro bem, isso foi em 1930, eu tinha sé dezessete anos.
 

Zé Sereno foi ao encontro de Lampião. O Capitão Virgulino, como era chamado, estranhou a presença do quase garoto e foi logo perguntando:

— O que é que faz esse macaquinho aqui?

Zé Baiano, primo de Zé Sereno, respondeu:

— Na minha família só tem gente valente. Esse menino não vai negar a raça.

Lampião quis a prova, e a teve. Arrrumaram uma briga de Zé Sereno com Volta Seca, também muito jovem, os dois se digladiaram durante muito tempo. Lampião deu um basta e ditou a sorte de Zé Sereno

— Esse menino é valente mesmo. Vai longe.

Lampião, o justiceiro

Zé Sereno, Antonio Ribeiro na pia de batismo, guarda por Lampião um respeito quase religioso. Ainda se refere a como "o capitão", patente com que o "Rei do Cangaço contemplou a si mesmo.

— Ele era corajoso e ajudava os pobres. Gostava muito das coisas justas e respeitava quem merecia respeito.

Uma vez. no sertão baiano. conta Zé Sereno, o grupo de Lampião encontrou um rapazinho que queria falar com o ''Capitão". Estava desesperado, porque o dono da fazenda não queria pagar os homem direito.

— Nós trabalhamos e ele não paga. Dinheiro ele tem; o que não tem é vergonha na cara.

Lampião mandou um recado:

— Você não fala pra ninguém que nós vamos lá.

No dia seguinte — relembra Zé Sereno — nós fomos na fazenda. O Capitão, chamou o fazendeiro, mandou reunir os empregados e obrigou ele a pagar todo mundo. Quando nós íamos saindo, o Capitão falou pro fazendeiro:

— Vou sair e não quero saber que mandou um empregado desses embora; Se mandar, eu volto aqui.

Ao falar da "volante'', Zé Sereno se exalta. Como Adriano, também ele conservou seu ódio.

— Eles perseguiam muita gente inocente. Matavam em nome da lei. Chiquinho de Imbuzeiro, um volante, pegou meu tio Firmino, que era vaqueiro, amarrou as pernas e os braços, acendeu uma caieira de fogo e jogou ele dentro, vivo. Só porque ele tinha os parentes no Cangaço. O Tenente Soares também matou dois primos meus, um a bala e outro queimado.

Antes de chegar a São Paulo, Zé Sereno passou pelo município de Rio Novo Camamu na Bahia e Jordânia em Minas Gerais. Dali chegou a Martinópolis no norte de São Paulo. Em Rio Novo Camamu, trabalhou em uma fazenda administrada pelo Sargento Cardoso. que pertencera a "volante" mas também empregava ex-cangaceiros. No sertão, cangaceiro era profissão. Zé Sereno trabalhou dois anos e meio na fazenda, nunca conseguiu receber o dinheiro do salário. Teve então a última aventura de violência de sua vida.

— Eu disse pros meninos: 'guenta ai com os capangas do Sargento que eu vou falar com ele'. Os meninos deitaram no chão, cada um com sua peixeira de uns 75 centímetros e ficaram cortando a grama, rindo do que estava acontecendo lá dentro. Eu cheguei pro sargento e falei: "Vai pagar e é hoje", ele respondeu que não tinha dinheiro. "Não quero saber" eu disse. Fiquei firme. ele teve de pagar mesmo. No dia seguinte, eu já estava no meio da estrada. Sabia que vinha bala atrás.

Um filho no mato 

Aos 45 anos Sila ainda é uma mulher bonita. Tipo sertanejo, concorreu em beleza com Maria Bonita e Dadá. Tem uma expressão meiga, a voz pausada, mansa. O olhar é triste. Sorri apenas quando olha para os filhos.

— Não é bonito o Wilson?

Aos catorze anos, Sila teve o primeiro contato direto com os cangaceiros. Sabia costurar qualquer tipo de roupa, deparou um dia com dois homens que lhe pediram para coser algumas peças. Eram Zé Baiano e Zé Sereno com o qual passou a viver. Nunca atirou. mas não deixou o companheiro em suas andanças. A persiga — a perseguição das "volantes" — era implacável.

— Nós não tínhamos nem água nem comida quando a persiga era muita. As vezes viajávamos três dias sem parar, sem dormir, sem comer, sem sossego, num calor horrível, pelo mato da catinga. Já imaginou ter um filho no mato? Foi o que aconteceu comigo  quando tinha quinze anos. Nós estávamos acampados perto dc Canindé em Sergipe. Nasceu um menino, que levou o nome de João. Como eu não podia ficar com ele mandei levar pra família de Galdino Leite, cunhado do Tenente Literato. Os ou-troa só nasceram quando deixei esta correria.

Sila ficou apenas dois anos no cangaço. O oficio que aprendeu em menina ajudou-a a se adaptar em São Paulo, onde sempre teve muito serviço, muita costura encomendada. Entre suas freguesas estava Dona Luisinha, tia afim de Hebe Camargo. Dona Luisinha sempre a procurava, tratava-a pelo nome de batismo, Hilda — Hilda Gomes de Souza. Sila trabalha como dama de companhia de uma senhora. Em breve, vai Maar um mês na Europa com a patroa.

Toda a família de Sila sofreu por causa do cangaço. 



— Quando sai de Poço Redondo, em Sergipe, as volantes começaram a perseguir meus pais. Dai para cá nunca mais vi eles. Por minha causa era tanta a persiga naquela região  que meus irmãos resolveram entrar no bando de Lampião. Mergulhão, que morreu no cangaço; Novo Tempo, que vive em Montes Claros, Minas Gerais, e Marinheiro, que tinha apenas treze anos. Hoje estamos aqui, numa vida nova, vendo crescer nossos filhos e esperando netos.

Sila tem do cangaço uma memória amarga. Só morte, fuga, sacrifício.

— Vi coisas horríveis. Tinha uma arma pequena só pra me defender se fosse preciso, mas não houve necessidade, nem mesmo no cerco do Angico. Pra nós mulheres, nessa hora não dava pra enganar a volante e dizer que era amigo. A polícia não levava mulher. Se nos pegasse era um horror. Matava logo. Enedina morreu ao meu lado. Fugi com Criança e só depois encontrei Zé Sereno.

"É companheiro!"

Criança confessa que não foi fácil romper o cerco em Angico, com Sila e Marinheiro.

— Nunca vi tanta volante na nossa frente. Era tiro pra tudo quanto é lado. Enedina caiu morta aos meus pés. A gente Saia correndo, ouvindo tiro e dando tiro. O que salvou é que as volantes usavam a mesma roupa que nós e isso confundia. Nós passávamos perto dos "macacos" como a gente chamava os soldados, e dizia fingindo que também, era da volante: "É companheiro!"

Criança, ou Vítor Rodrigues Lima, é muito calmo, os olhos se mexem devagar, a voz também é lenta, arrastada. É casado há 22 anos com Dona Ana Caetano Lima, filha de um ex-policial na época da Coluna Prestes. Baiana de Barra. Ela é costureira profissional. O casal tem três filhos. Aduíse, já casada, Vicentina e Adenilson e agora adotou uma menina, Edna Márcia. Quando os dois se casaram, Dona Ana conhecia o passado de Criança:

— Sabia que tinha sido cangaceiro, mas isso não me assustou. Não tive tempo para saber tudo antes, porque nos conhecemos num dia e dezessete dias depois já estávamos na igreja.

Criança tem uma quitanda e casa própria. Gosta muito de São Paulo, onde o "homem que trabalha não morre de fome". Com Zé Sereno, Marinheiro e mais seis, trabalhou na fazenda Maralina dois anos e meio, foi para Martinópolis em 1942. Quatro anos depois, no dia de Natal, casou-se com Dona Ana. Foi cangaceiro como podia ter sido polícia.

— Eu nasci em Bonfim e estava em Jeremoabo onde a coisa estava danada lá pra 1930. Um dia a volante Me pegou pra Cristo, queria que eu dissesse o que não sabia. Eles me ameaçaram e prometeram voltar. Antes que voltassem, entrei no bando de Mariano. Estava com dezessete anos incompleto. Depois de sua morte, fiquei com Zé Sereno. Conheci Lampião logo que entrei no cangaço. Antes tinha medo dele. Depois, vi que era um homem que não tinha nada daquilo que falavam. Falavam que o Capitão matava crianças. Era tudo mentira. Ele não gostava de matar ninguém a toa, matava só pra se defender. Naquele tempo, quem tivesse dezesseis, dezessete ou dezoito anos tinha de se alistar no cangaço ou na volante ou então ficava à mercê dos dois.

Criança se habituou à ideia de que poderia ser morto de um tiro.

— Quando a gente está na luta, nem tem medo de nada. A gente até se esquece. A pólvora dá fogo à pessoa, que nem se lembra se vai morrer. Quando a morte está por perto, a gente tem que lutar pra não morrer.

O pequeno cangaceiro 
Marinheiro era ainda mais jovem que Criança quando entrou no cangaço. Foi em 1936, ele estava com treze anos.

— Fui chamado pelo meu cunhado Zé Sereno. porque a volante queria me caçar. Depois que minha irmã Cila resolveu acompanhar o Zé, minha família passou a ser perseguida.
 
Até então, Marinheiro era vaqueiro de seu tio China, na Fazenda Recurso, em Sergipe. Voltou a ser vaqueiro depois do cerco de Angico, do qual escapou "correndo como louco no meio das volantes". Estava transtornado. Vira Maria Bonita morrer, bem de perto.

— Ela estava desarmada, nem pôde se defender.

 Como Zé Sereno, Marinheiro foi trabalhar na fazenda dirigida pelo Sargento Cardoso. De lá seguiu a mesma trilha: Palestina, Martinópolis, São Paulo. No começo, em São Paulo, a vida foi muito dura. Por dez anos, trabalhou na lavoura. Depois. passou para a indústria química, onde está até hoje. Vive satisfeito com o trabalho, com a vida.

— O cangaço era um inferno. Nem se podia dormir. Mas a gente não tinha outro jeito, não tinha encolha. Aqui a gente tem liberdade e pode dormir sossegado.

Marinheiro casou-se com a filha de um ex-volante, mora em casa própria. As filhas mais velhas, Maria José, de vinte anos, e Ivani, de dezessete, trabalham para ajudá-lo. Um dos meninos, Isaurino, está no quarto ano primário, e o outro, Wilson, de seis, saiu agora do jardim de infância.

— Se Deus quiser, eles vão ter na vida o que o pai não pôde ter. Marinheiro foi um dos raros cangaceiros que jamais sofreu um ferimento de bala. Corria no sertão que ele tinha "corpo fechado", fora encantado para ficar imune a tiro ou golpe de arma branca. Ele jura que não.

— Eu não tenho não. Mas tem muita gente que tem.

"O que passou passou" 

Zé Sereno é muito católico, organiza romaria todos os anos, em outubro, a Aparecida do Norte, sua padroeira. A mulher, Sila, é espírita, médium, mas ele é devoto da santa; usa sempre, fora da camisa, uma medalha de Nossa Senhora Aparecida. É outro homem, diferente do cangaceiro Zé Sereno. Agora sabe ser tolerante. Após a apresentação ao ex-volante Adriano, fechou o rosto, contrariado, mas logo se descontraiu, abriu a guarda. Passada a surpresa, abre os braços, aceita a confraternização com Adriano, vai abraçá-lo.

— Não guardo rancor. O que passou passou.

Adriano agora sorri, ainda surpreso, incrédulo, é como se visse um fantasma — o homem que êle procurara tanto estava ali diante de seus olhos. Também é sensível à reconciliação, abraça o antigo inimigo, procura explicar as razões da mudança de atitude.

— Eu tinha raiva mesmo era do coiteiro. Ele é que foi perverso. Vocês estavam na vida de vocês mesmo. Eu compreendo. Se eu achasse aquele coiteiro, agora, ele ia ver.

Zé Sereno está mais animado. Puxa o antigo volante para o lado, oferece-lhe uma batida, Adriano aceita, os dois bebem, começam o bate-papo. O cangaceiro intercala o diálogo com as mesmas expressões. — O que passou passou. Adriano quer explorar o terreno. Faz sondagens. Arrisca:

— O que eu queria mesmo é saber por que aquele coiteiro me mandou desviar do caminho. Você que mandou, Zé?

— De jeito nenhum, Adriano. Pra dizer a verdade, nem me lembro bem de quem era o coiteiro. Só sei que você tinha fama de delatar cangaceiro, e queria nos pegar. Os coiteiros é que diziam.

— Não é verdade, Zé. Eu vivia minha vidinha até aquele dia em que você e mais quatro me amarraram e fizeram o diabo comigo. Aí eu resolvi entrar na volante e ser contra vocês.

Zé Sereno desconversa, se desculpa, tenta recompor o passado.

— Os coiteiros às vezes falavam demais e mentiam pra gente. Sabe como é que é. A gente vivia num aperto danado, não podia descuidar.

Uma invenção que pegou 

O almoço demora, Adriano toma a iniciativa de pedir "mais uma". Há uma surpreendente facilidade de comunicação entre o ex-cangaceiro e o ex-volante. Os dois agora recordam casos e combates. Zé Sereno quer saber se Adriano esteve na "brigada de Maranduba".

— Não, não estive, mas estava bem perto. Soube dos estragos. Vocês perderam três cabras, né?

— Perdemos, mas a volante perdeu muito mais. Morreram mais de quinze macacos. Adriano não gostou do termo "macacos". A súbita cordialidade está sob ameaça. Indaga com ar de reprovação:

— Por que vocês costumavam chamar os soldados de macacos?

— Isto quem inventou foi o Capitão. E pegou. Pra ele toda volante era macaco. Como é que você queria que a gente chamasse uns homens que estavam sempre na nossa persiga?

Adriano agora faz sinal de que concorda. Zé Sereno ganha fôlego.

— A volante é que fabricava mais cangaceiro. Está vendo aqui? — aponta para o cunhado, Marinheiro.

— Esse menino, com treze anos, teve que entrar no cangaço pra não morrer dependurado numa árvore.

A hora é de expiação de culpas. Adriano não revela o menor desejo de defender a volante. Já dissera que entrara na polícia apenas por desejo de uma desforra pessoal. Ouve atentamente Zé Sereno, faz-lhe uma confissão.

— Sabe de uma coisa, Zé? Volante e cangaço era tudo igual. Os dois atrapalhavam a vida do povo.

O almoço começa a chegar, bem à nordestina: cabidela de galinha, peixe e camarão no coco, vatapá, sarapatel. Zé Sereno senta à cabeceira da mesa. Para um ex-comandante, um lugar de destaque. Adriano vai ao bar do restaurante em busca da batida que demora. É a última, "para abrir o apetite". Volta, o grupo come, esquecido do cangaço, das "volantes"; prefere elogiar as virtudes dessa cabidela de galinha, as qualidades do peixe, as virtudes do coco, a substância de um vatapá, um sarapatel.

Chega a hora das despedidas. O volante toma a iniciativa:

— Zé Sereno, espero agora você na minha casa.
— Não, Adriano, você é que vai lá em casa.
— Mas eu tenho prazer em receber você, Zé.

Mas Zé Sereno ainda teme uma traição.

— Lá, não. Lá eu não vou.

A custo Zé Sereno revela por que recusa o convite:

— Lá no bairro dele tem dois cabras que querem fazê a minha pele.

Adriano continua a insistir, mas o ex-cangaceiro já decidiu: não vai mesmo. Afinal, o ex-volante cede na discussão, que se prolonga por alguns minutos. Faz uma promessa:

— Está bem, Zé Sereno. Vou lá comer um sarapatel quando você matar aquele porco que está cevando no fundo do quintal.

O instinto venceu 

Longe de Adriano, já de volta a casa, Zé Sereno se dispõe a revelar os nomes dos homens que querem "fazer a sua pele". Um, o ex-volante Euclides Marques, suposto matador de Maria Bonita. Ele fica mais tranquilo ao ser informado de que Euclides cumpre pena num presídio de São Paulo, por ter assassinado a esposa. E o outro nome? Zé Sereno faz certo mistério, mas acaba confessando que é mesmo o do ex-volante Adriano. Nesse instante o instinto do cangaceiro ressurgiu no pacato zelador de colégio.

— Sabe? A gente precisa ter certo cuidado. A pior coisa é traição.

FIM
  

Lampião e seus cangaceiros adoravam fotografias. No grupo estão os sobreviventes de Angico: Sila (segunda à esq.) , Zé Sereno (terceiro) , Criança (quinto) e Marinheiro (sexto).
 

FONTE DA MATÉRIA:  Revista Realidade de Janeiro de 1969 (acervo Geziel Moura)  

Do blog do pesquisador Kiko Monteiro - 

http://lampiaoaceso.blogspot.com/2018/06/a-vida-depois-do-cangaco.html

http://blogdomendesemendes.blogspot.com