Seguidores

terça-feira, 2 de janeiro de 2018

UM SOLDADO CHAMADO ADRIÃO


Adrião Pedro de Souza o soldado Adrião, foi a única baixa da Força Pública no ataque à grota do riacho Angico, em 28 de julho de 1938.

Mas, quem fora Adrião?

Adrião Pedro de Souza nasceu na cidade de Chã Preta, AL, no dia 1º de março de 1915. Era filho do casal Sr. Sebastião Alves de Oliveira e de D. Rosa Maria de Souza.

Adrião Pedro de Souza - o soldado "Adrião". única baixa militar no ataque aos cangaceiros no dia 28 de julho de 1938

Naquele tempo, Adrião viveu e fazia o que toda criança fez e viveu comumente. As diversões daquela época eram poucas, pois a criançada não tinha tempo para isso. A vida de toda criança, assim que se pode com uma lata d’água, ficasse taludinho, era ajudar seus pais nas lidas diárias da roça. 

Seus pais, mesmo necessitando dos seus serviços, o colocam na escola e ele aprende a ler e escrever. Destaque para época em qualquer pessoa.

Sua história nos faz ver que ele não seria mais um sertanejo a viver exclusivamente do ‘cabo da enxada’.

Assim, aquela criança continua seu aprendizado para a vida, parte ao lado dos pais e parte com os ensinamentos do professor.


Já adolescente conhece uma moça chamada Tereza Brandão de Jesus. Começam a namorar e aparece uma forte atração entre eles. Terminando por casarem-se civilmente no dia 04 de março de 1933, em Viçosa, cidade alagoana.

No dia 20 de abril, nasce sua primeira filha Maria Belizia de Souza. No dia 28 de julho de 1934, vem ao mundo seu segundo filho, Geovane de Souza. Porém, quis o destino que oito meses depois de nascido, venha a óbito.

No dia 21 de março de 1938, nasce seu terceiro filho, José Adrião de Souza.

A renda retirada dos serviços da agricultura não estava dando para o sustento da família. Foi então que Adrião Pedro de Souza, no dia 21 de março de 1936, contando com seus 21 anos de idade incorpora-se na Força Pública de Alagoas.

É designado para fazer parte da volante do Aspirante Francisco Ferreira de Melo.


“(...) Ferreira de Melo foi o responsável pela hecatombe do Angico naquela fria manhã do dia 28 de julho de 1938. Ali, o famigerado Lampião, Maria Bonita e sua horda deixaram este mundo, terminaram seus dias de crimes decapitados pelos facões afiados dos “macacos” e seus corpos serviram de alimento para os urubus (...).” (“A OUTRA FACE DO CANGAÇO – Vida e morte de um praça” – SOUZA, Antonio Vilela. 1ª edição, Recife, 2012)

O cangaço, Fenômeno Social gerado dentro de outro Fenômeno Social, o “Coronelismo”, é um tema incrivelmente complexo e recheado de ‘mistérios’. Tendo início no princípio da segunda metade do século XVIII, fora divido pelos pesquisadores historiadores em duas fases. A primeira fase encerra-se, dando lugar para o início da segunda, na fracassada tentativa de Lampião, Virgolino Ferreira da Silva, e seu bando, o nome maior do cangaço dentre os chefes cangaceiros, saquear a cidade de Mossoró, RN, em junho de 1927. Onze anos, um mês e alguns dias depois, 28 de julho de 1938, da tentativa desse ataque, Lampião e seu bando são atacados entre as barreiras de um riacho seco em terras sergipanas. Desse ataque, resulta a morte do “Rei dos cangaceiros”, sua “Rainha”, Maria Bonita, mais nove cangaceiros e um soldado da Força Pública alagoana, Adrião Pedro de Souza.



O que realmente aconteceu naquele ataque, jamais se saberá. Várias e várias hipóteses já foram feitas, mas, a realidade ainda não veio à tona, e acredito que jamais virá. Pelo simples fato de que, aqueles que sabiam, não disseram a verdade. Com suas mortes, morreu também o que sabiam.
Aspirante Francisco Ferreira de Melo


O pesquisador/historiador Antônio Vilela, citando Alcino Alves Costa, diz: “O nosso amado decano, caipira de Poço Redondo, é quem melhor fala dos ‘Mistérios e Mentiras do Angico’. “

“(...) É como se uma névoa escura envolvesse aquele lugar em mistérios indecifráveis. Ali, os segredos, mentiras e mistérios jamais serão revelados (...).” (Ob. Ct.)

Tenente João Bezerra da Silva - detalhe: o comandante militar, nesse registro, está usando parte da indumentária do chefe cangaceiro 'Lampião', como seu lenço de pescoço, suas cartucheiras, seu bornal e etc.

Tive o privilégio de participar de uma expedição de estudos lá na grota. Estudando, em outras duas viagens feitas ao local, maio de 2014 e julho de 2015, o lugar do desembarque da tropa e a trilha seguida por a mesma. Além das citações de várias pessoas de lá, do local, tanto do lado alagoano como sergipano, mostram-nos que a tropa subiu a trilha até o Alto das Perdidas pelo lado esquerdo do riacho. Isso é confirmado para nós pelo ilustre Alcino Alves em suas obras literárias e oralmente por um dos maiores conhecedores do fato Angico do tema estudado, José Sabino Bassetti. Onde hoje se encontra o Restaurante Eco-Parque, não foi aonde à tropa desembarcou, e sim mais acima, contrário a correnteza do Rio São Francisco, onde ainda está à casa de Durval Rosa, irmão de Pedro de Cândido que morava em Entremontes, AL, bem abaixo do local em que a tropa ancorou.

Após chegarem ao Alto das Perdidas, o comandante da tropa, tenente João Bezerra, divide a mesma em colunas e passa para seus oficiais as coordenadas a serem seguidas.

Historiadores/pesquisadores como Alcino Alves Costa, Jairo Luiz e Antônio Vilela e outros, nos mostram as brechas que ficaram quando do movimento, deslocamento, de aproximação para onde se encontrava Lampião.

O cabo Bertoldo e o Aspirante Ferreira de Melo com seus homens, descem em sentido leste, por uns 200 metros, pois a margem esquerda do riacho fica a essa distância e, depois de transporem essa distância, dentro da mata, Bertoldo segue subindo na margem esquerda do riacho, o aspirante transpõe a grota naquela altura, e começa a subir com seus homens, inclusive o soldado Adrião, no sentido contrário a correnteza das águas do riacho em direção ao acampamento do “Rei Vesgo”. O sargento Juvêncio, com sua coluna, sobe direto do lado esquerdo do riacho, a partir do Alto das Perdidas até certa altura e atravessam o riacho para o lado direito, seguindo a partir dai a correnteza das águas em direção ao acampamento de Lampião.

As outras últimas colunas restantes, a do sargento Aniceto e a do comandante João Bezerra, estavam muito próximos. Do Alto das Perdidas para o local onde estava a tolda de Lampião distam uns 200 metros. Seguindo direto, a coluna do tenente Bezerra, segundo Alcino Alves e Jairo Luiz, era a que deveria ter chegado primeiro, pois não tinham que descer nem subir, apenas seguir em frente. Não chegando junto, ficou a primeira “brecha”. A coluna comandada pelo sargento Aniceto, atrasa-se, também, e depois surge a conversa que se perdeu, deixando a outra “brecha”. E é justamente por essas duas “brechas” que fogem a maioria dos cangaceiros.

Quem primeiro atira, segundo relatos, são os soldados da coluna do Aspirante Chico Ferreira, a qual também é tida como a que mais matou inimigos naquele ataque. Abaixo, mostramos parte de um diálogo entre os pesquisadores, lá, nos arredores da Grota.

“- Espere aí! Nós vamos descer... Nessa descida não tinha volante. Uma estava na ponta do riacho e a outra volante na extremidade do riacho.” – disse Alcino.

“- Alcino, eu estou mostrando a você que o correto era uma volante descer por aí, eles estavam bem próximo.” – disse Jairo.

“- E quem atacou primeiro?”. - Pergunta Jairo.

“- Chico Ferreira”. - Respondeu Alcino

“- E quem matou mais cangaceiros?” - Pergunta de novo, Jairo Luiz a Alcino.

“- Chico Ferreira.” – Respondeu o caipira de Poço Redondo.

“– Jairo, você está me ajudando. Na realidade a volante do Aspirante Francisco Ferreira de Melo foi quem tomou a iniciativa do ataque ao bando de Lampião”. – Conclui Alcino. (Ob. Ct.)

Quando se inicia “o pego – pra – capá”, os homens da coluna do Aspirante Ferreira de Melo, se ‘avexam’ tanto que, segundo historiadores, alguns têm que recuar para poderem atirar nos cangaceiros, e isso tudo no miolo da grota, no leito seco do riacho.

Nesse reboliço todo o valente soldado Adrião é morto. Relatos posteriores de um cangaceiro, em revistas e livros, diz que atirou em um soldado. Lá, naquele dia só teve uma baixa militar. Estando deitado, quase que encostando o cano do mosquetão em um soldado, que o mesmo, ao receber o impacto, é atirado longe. Já vemos em outras obras literárias de que o digníssimo soldado da coluna do Aspirante Ferreira de Melo, Adrião Pedro de Souza foi abatido por fogo “amigo”.

Fonte "A OUTRA FACE DO CANGAÇO - Vida e morte de um Praça" - SOUZA, Antonio Vilela. 1ª edição. Recife, 2012.
Foto Ob. Ct.
cariricangaco.com

https://www.facebook.com/

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

MARIA BELÍZIA FILHA DO SOLDADO ADRIÃO MORTO NA CHACINA QUE VITIMOU LAMPIÃO, MARIA BONITA...


Maria Belízia filha do casal Adrião e dona Tereza Brandão, ao lado do professor/pesquisador/historiador antônio Vilela de Souza autor da obra "A Outra Face do Cangaço".

https://www.facebook.com/photo.php?fbid=743844792422742&set=gm.679326802231439&type=3&theater

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

EXPEDITA FERREIRA


Filha única do casal cangaceiro Lampião e Maria Bonita. Nasceu no dia 13 de setembro de 1932 na Fazenda Enxu no município de Porto da Folha em Sergipe. Foi criada pelo Vaqueiro Severo e sua esposa dona Aurora.

Expedita Ferreira viu seus pais biológicos somente por três vezes. Quando seus pais foram mortos Expedita Ferreira contava com apenas cinco anos de idade.

Atualmente Expedita Ferreira está com a idade de 85 anos reside juntamente com sua família em Aracaju no estado de Sergipe.

Geraldo Antônio de Souza Júnior

https://cangacologia.blogspot.com.br/search?updated-max=2017-12-18T12:49:00-08:00&max-results=7

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

ASPECTOS DO CASARÃO DA BARONESA DA ÁGUA BRANCA/AL. ASSALTADA POR LAMPIÃO E SEU BANDO EM 1922.

Por Geraldo Júnior
Frente do casarão da Baronesa de Água Branca/AL.

Local em que no dia 23 de junho de 1922 foi invadido por Lampião e seu bando.

O assalto ao casarão da senhora Joana Vieira de Siqueira Torres a “Baronesa de Água Branca” viúva do Barão Joaquim Antônio de Siqueira Torres, repercutiu nos grandes centros e foi destaque em vários jornais da época, dado a importância dos envolvidos e da grande quantidade de joias e dinheiro subtraídos pelo bando.

A invasão à casa da Baronesa de Água Branca foi o primeiro assalto promovido por Lampião como comandante de um bando cangaceiro. Sendo grande parte dos cangaceiros envolvidos nesse evento remanescentes do bando de Sinhô Pereira, o qual Lampião assumiu após a saída deste do cangaço.

No dia 05 de julho de 1922 o Jornal Diário de Pernambuco expediu a seguinte nota: 

"Mais de 100 Contos de Réis foram retirados de três imensos baús de cedro da baronesa, constando de brilhantes, jóias de raro valor, peças de ouro, pedras preciosas e dinheiro, incluindo uma peça toda de ouro em formato camafeu e um cordão de ouro de dois metros e meio de comprimento, com medalhão de ouro maciço."

Lampião começava à escrever o seu nome na história cangaceira. Era apenas o princípio de uma longa jornada.

Janelas e porta de acesso ao fundo (Quintal) do casarão.

Vista do fundo e da lateral do casarão da Baronesa de Água Branca/AL.

Quintal localizado no fundo do casarão.

Quintal localizado no fundo do casarão.

Portão localizado nos fundos do casarão.

Quintal localizado no fundo do casarão.

Quintal localizado no fundo do casarão.

Visão panorâmica do quintal do casarão que pertenceu a baronesa de Água Branca/AL,
Joana Vieira Sandes também citada na historiografia como Joana Vieira de Siqueira Torres
e Joana Vieira Sandes, assaltada por Lampião e seu bando no dia 23 de junho de 1922. Ao
fundo o portão localizado na parte traseira da casa tendo ao fundo o serrote por onde os
cangaceiros tomaram chegada ao local.

Fotos: Adenilton Sousa da Silva

Geraldo Antônio de Souza Júnior

https://cangacologia.blogspot.com.br/2017/12/aspectos-do-casarao-da-baronesa-da-agua.html

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

ACESSÓRIOS DO "CAPITÃO".

Por Geraldo Júnior

RÉPLICA DAS PLATINAS DE CAPITÃO QUE FORAM ENTREGUES A LAMPIÃO NA OCASIÃO DE SUA INCORPORAÇÃO NOS BATALHÕES PATRIÓTICOS...

... formados para dar combate à Coluna Prestes-Miguel Costa que marchava em solo brasileiro em busca de adeptos e apoio aos seus ideais.

Essa réplica das platinas pertence ao acervo pessoal do escritor e pesquisador Antônio Amaury Corrêa de Araújo, considerado um dos grandes estudiosos do assunto e responsável por inúmeros trabalhos de relevância e importância sobre o tema cangaço.

Geraldo Antônio de Souza Júnior

https://cangacologia.blogspot.com.br/2017/12/acessorios-do-capitao.html

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

GENTE DE LAMPIÃO

Por Geraldo Júnior

Na intimidade de Sila... ex-integrante do bando de Lampião.

Acredito que o grande sonho de toda mulher que um dia se embrenhou, voluntariamente ou não, nas veredas cangaceiras, era um dia abandonar aquela vida infernal e ao lado de seu Cabra constituir família e levar uma vida normal como as outras mulheres. Fato é que muitas não tiveram essa oportunidade, tiveram seus sangues derramados através das armas inimigas ou até mesmo pelas mãos de seus companheiros. Tiveram seus sonhos e projetos destruídos pela escolha que fizeram ou por terem sido forçadas a acompanhar os cangaceiros que as escolheram como suas amantes.

Sila (Foto) foi uma das mulheres que tiveram a sorte de sobreviver ao cangaço e ao lado de seu companheiro Zé Sereno, antigo chefe de subgrupo do bando de Lampião, teve a oportunidade de reconstruir sua vida, constituir família e de possuir um lar.

Sila prestou importante contribuição para o resgate histórico do cangaço ao expor suas memórias em livros e prestar importantes depoimentos que serviram como base para tantos outros trabalhos.

A fotografia acima em que aparece Sila (Ilda Ribeiro de Souza) durante afazeres domésticos é uma entre tantas outras que foram a mim cedidas por sua filha Gilaene “Gila” de Souza Rodrigues (In memorian).

Fica o registro.

Geraldo Antônio de Souza Júnior

https://cangacologia.blogspot.com.br/2018/01/gente-de-lampiao.html?spref=fb

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

ANTÔNIO SILVINO O "RIFLE DE OURO". NO DIA 02 DE DEZEMBRO DE 1914...

Por Geraldo Júnior

... O Jornal do Recife publicava em sua capa uma matéria falando sobre a prisão do afamado cangaceiro Antônio Silvino com o seguinte tema:

ODYSSÉA DE UM BANDIDO - PRISÃO DE ANTÔNIO SILVINO.

Antônio Silvino foi preso no dia 28 de novembro de 1914, após ter sido baleado e posteriormente capturado por uma Força Volante comandada pelo bravo pernambucano, Theophanes Ferraz Torres.

Antônio Silvino foi o mais afamado e temido cangaceiro antes da chegada de Lampião. Seu nome ecoava pelos sertões causando um misto de medo, ódio e admiração. Foi um cangaceiro que tinha como alvo principal os grandes fazendeiros (Empresários) e os governos e ao contrário de tantos outros cangaceiros zelou pela honra e integridade física e moral das famílias sertanejas de um modo geral.

Devido sua destreza e habilidade no manejo de espingardas ganhou o apelido de o "Rifle de Ouro", tendo sido inclusive o primeiro cangaceiro a ser denominado pelos jornais da época como o "Governador do Sertão", título que seria repassado a Lampião alguns anos depois.

A fotografia anexada a essa matéria foi registrada pelo Jornal do Recife, pouco tempo após sua prisão.

Geraldo Antônio de Souza Júnior

https://cangacologia.blogspot.com.br/2018/01/antonio-silvino-o-rifle-de-ouro.html?spref=fb

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

PÁSSAROS DISTANTES

*Rangel Alves da Costa

Hoje, infelizmente, apenas o silêncio dos pássaros. Triste acordar e não ouvir o canto passarinheiro. Triste caminhar pelas estradas e não sentir os seus voos e suas canções. Triste imaginar uma vida sem passarinhos.
Há um inquietante silêncio nos pássaros. Em muitos lugares os pássaros não cantam mais. Mas principalmente no sertão os pássaros não cantam mais. Não há como ouvir canto daquilo inexistente, não há mais como ouvir trinado passarinheiro se as aves arribaram de vez, sumiram das galhagens e deixaram a mataria sertaneja em doloroso silêncio. E também os ninhos, restando somente as gaiolas com seus prisioneiros tristonhos. Triste sina viver chorando e o seu dono pensar que está cantando.
Rolinha fogo-pagô, coleirinho, curió, sabiá, sofrê, cabeça, azulão, pintassilgo, toda uma passarinhada voava de galho em galho em cada palmo daquele chão. E também o caboclinho, o tiziu, o tico-tico, a lavandeira, o sanhaço, numa festança de vida por cima das catingueiras, baraúnas e quixabeiras. E ainda o lamento rouco do carcará, do gavião, do anum, da coruja e do caburé. Cadê o piar da nambu e o palrar do periquito?
Passarinho pousava na mão, cantarolava em plena janela, fazia ninho na cumeeira e pelas vagas das coberturas de palha ou telha. O menino era amigo do passarinho, conversava com ele e prometia que jamais iria puxar seu pescoço mesmo que a fome apertasse demais. Pelo seu voo e pela escolha do local do ninho, logo o sertanejo sabia se a chuvarada se aproximava. Eis que passarinho em alvoroçado voo ou quando faz moradia rente ao chão é porque pingo grosso vai cair. Todo bom sertanejo sabe que é assim.
Os ouvidos atentos do sertanejo não precisavam ir muito longe na mataria para sentir a presença da orquestra passarinheira. Nas margens das estradas, nas malhadas das fazendas, nas beiradas de riachos, tanques e açudes, onde houvesse proximidade com mato e água, ali sobressaía a plangência da cantoria. Muitas vezes difícil de avistar o cantor, eis que pequenino e escondido na copa da grande árvore, mas a certeza de sua presença.


Mas também um tempo diferente, um passado até recente onde as aves possuíam garantia de moradia e de pouso e repouso. Não precisavam voar muito para encontrar uma galhagem segura para construir seu ninho e procriar. Por todo lugar os arvoredos, ainda que nem sempre grandiosos e imponentes, permitindo o aconchego da passarada. Os viveiros se formavam entre os galhos, enquanto que os troncos e arredores acolhiam outras espécies da fauna sertaneja.
O sertão era assim, tomado de uma vegetação rica e adaptada às condições climáticas, sem ter que se curvar ressequida todas as vezes que a seca do dia a dia chegasse querendo a tudo devorar. Em meio ao xiquexique, facheiro, mandacaru, ao cipó e à macambira, as árvores amigas da catingueira se espalhando de canto a outro. Juazeiros, angicos, cedros, umburanas e bonomes dividiam espaço com plantas que trocavam folhas por espinhos. Paisagem tão conhecida, e muitas vezes entristecida, retratava a pujança e a fragilidade de uma terra.
Fragilidade sim, pois mesmo que o sertão seja visto como a Fênix que sempre renasce das cinzas e o seu habitante, o sertanejo, um forte, na expressão euclidiana, não há pedra fincada no tempo que resista à brabeza da seca maior. E tudo se curva e se dobra, esmorece e definha, se prostra esperando a gota d’água. Até mesmo o mandacaru, tido como imortal diante das inclemências, mantém seus braços ossudos e espinhentos em direção aos céus. E dizem que chora, dizem que implora.
Mesmo com as plantas ressequidas, com a nudez marrom-acinzentada, e mais tarde embranquecida, enfeando toda a paisagem, e o homem tudo fazendo pra manter água barrenta no fundo da moringa, ainda assim se ouvia o canto da passarada ao amanhecer. Cantoria que ia diminuindo quando os galhos já estavam nus e não restava nem lama no fundo do poço. Era o instante de a asa branca arribar para outras distâncias e lá permanecer até a invernada chegar. E toda a revoada passarinheira fazia o percurso de volta, enchendo de canto bonito toda aquela vida sertaneja.
Mas hoje não há mais passarinho nem quando os tanques estão cheios e as plantas rasteiras florescem verdejantes. A mão do homem, que antes aprisionava o pássaro, passou a utilizar de outra arma: devastar a moradia do pássaro. E onde não mais pé de pau, onde não há mais copa de árvore, não pode haver ninho nem passarinho. Apenas o silêncio.

Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

http://blogdomendesemendes.blogspot.com