Por: José Mendes Pereira
Entre as décadas de 40 e 50, do século XX
Luiz Gameleira de Barros era Açuense, mas registrado Mossoroense; ainda pequeno veio residir em Mossoró, em companhia da mãe, que ficara viúva logo que nasceu. Aos seis anos de idade, já ajudava a mãe, na profissão de engraxate, e até diziam que ele foi o primeiro engraxate de Mossoró. Os tempos foram se passando, o menino foi se formando, mas sempre zelando pela sua profissão.
Em uma das visitas a Mossoró, o advogado Dr. Café Filho, que ainda nem sonhava ser algum dia Presidente da República, Luiz Gameleira prestou os seus serviços de engraxate. Como Luiz era um jovem esperto, de bom papo, apesar de pouco ter frequentado escola, mas vivia no meio da gente instruída, usava o Português muito bem, com isso fez com que Dr. Café Filho desejasse levá-lo para trabalhar com ele como menino de recado, isto é (Office-boy). Se antes dominava o português, vivendo no meio dos sábios, muito mais se desenvolveu.
Acontece que em 1950, Dr. Café Filho foi eleito a Vice-Presidente da República, assumindo o cargo em 31 de janeiro de 1951; e com isso, desfez do seu escritório de Advocacia, mas prometendo a Luiz Gameleira que iria cuidar de um emprego para ele. Terminado o escritório de advocacia, Luiz Gameleira retornou a Mossoró, e aqui partiu para o comércio, estabelecendo-se à Rua Alberto Maranhão, no ramo de miudezas. Não era um comércio que se diz: “como é grande”, mas vivia muito bem, obrigado.
Os dias foram se passando, mês e mês, chegando a ano, e Luiz ainda aguardava o seu novo emprego, que como fora um bom empregado do então vice presidente da república, com certeza seria lotado no Palácio Presidencial, no Rio de Janeiro.
Em Agosto de 1954, o Presidente Getúlio Vargas suicidou-se, e Café Filho subiu ao maior posto de poderes do Brasil, agora era presidente da República.
Luiz Gameleira que sonhava ocupar um cantinho naquele governo, quem sabe, secretário, assessor do presidente, uma coisa qualquer, ou até mesmo uma pasta de um dos Ministérios, dois meses depois, que Café Filho assumiu o governo da república, um telegrama chegou à casa de Luiz Gameleira, comunicando-lhe que ele teria que se apresentar ao novo presidente brasileiro.
Se antes Luiz Gameleira gozava de certo prestígo em Mossoró, sua fama cresceu de vez, onde recebia parabéns a todo o momento, e nos tímidos lábios da população era o que bocejavam. E até já o chamavam de “Ministro”.
Com a convocação para se fazer presente ao novo presidente da república, Luiz empolgou-se tanto, que antes de viajar para o Rio de Janeiro, fez festas e mais festas com toda vizinhança. Alugou um prédio na mesma avenida, convocou a banda Municipal, que na época ainda não tinha conjuntos para festividades, e aí foi festão. Uma enorme bandeira do Brasil foi colocada em frente à entrada, e sobre ela, duas palavras diziam assim: “MORRA PELA PÁTRIA”
Um pobre bêbado que no momento rodopiava no meio da multidão, ao ver a frase sobre a bandeira, cuspiu-a, dizendo: “-Que morrer por pátria que nada! Morra quem quiser! Eu não!"
MORRA PELA PÁTRIA!
Luiz Gameleira ao ver o desprezo do bêbado com a bandeira, já se achando autoridade, mandou que fossem apanhar a polícia. E não demorou muito para que o miserável fosse guindado.
Lá pras tantas a festa terminou. Luiz precisava se arrumar para se dirigir até Natal, e lá, apanhar um velho e cansado transporte, indo até Recife e de lá pegaria outro até Rio de Janeiro. Foram mais de seis dias e seis noites de viagem, até que conseguiu colocar os pés na cidade maravilhosa.
Ao chegar, dirigiu-se a uma pequena e deteriorada pensão, “coisas doutros tempos”, e lá se amparou até o dia seguinte, quando iria se dirigir ao Palácio Presidencial, para receber o seu tão desejado emprego.
No dia seguinte, banhou-se, tomou café e se dirigiu ao Palácio. Levou três dias para conseguir audiência com o Presidente, até que falou com um dos assessores do Presidente, que levou o assunto a Café Filho sobre a presença de Luiz Gameleira ao Palácio.
Café Filho o disse que primeiro o levasse a um restaurante, alimentasse-o e depois retornasse com ele a sua sala. Mas antes lhe disse: “-Mande servi-lo bastante. Não deixe o homem com fome. Ele é nordestino e nordestino quando não está com fome, não demora muito ter fome, porque a fome sempre está ao seu lado”.
Terminada a refeição, voltaram ao Palácio. Café Filho já estava preparado para receber o seu conterrâneo. Se o homem era faminto, o presidente Café Filho, no momento, não, mas antes fora um dos tais.
Os abraços e lembranças antigas foram vividos entre os dois. Café Filho relatou as dificuldades que tinha quando os seus clientes não pagavam os seus serviços sobre causas judiciais, penais e serviços diversos.
Terminada a palestra entre eles, Café Filho abriu a página sobre o seu emprego. Iria mandá-lo para a Amazônia, trabalhar como seringal na extração do látex.
Um dos melhores empregos que no momento ele iria o ofertar. Explicou, explicou os riscos, as vantagens, o pagamento que seria feito mensalmente... E em seguida perguntou-lhe:
- Está pronto para trabalhar na Amazônia, na função de seringal, Luiz?
- O Senhor está me dizendo que é este o emprego que tem para mim?
- E dos melhores, Luiz. Está pronto para assumí-lo?
Não Senhor, Dr. Café Filho. Não Senhor! O senhor sabe muito bem que eu nunca trabalhei como seringal. Não tenho a mínima ideia como é este trabalho.
- Mas quem não sabe, aprende! Eu vivia lá em Natal, sofrendo juntamente com você. Hoje sou Presidente deste imenso Brasil... Eu não tinha a mínima ideia como se administrava um país...
- Sou franco em lhe dizer, Dr. Café Filho – dizia Luiz Gameleira já de cara fechada. Eu agradeço o seu emprego. E o Senhor me desculpe as minhas francas, grosseiras e sinceras palavras. "Quem tira leite de p.. é b....." - Disse e de imediato se retirou da presença do Presidente Café Fliho...
Minhas simples histórias