Seguidores

sexta-feira, 5 de julho de 2019

A GUERRA CHEGA AO AGRESTE POTIGUAR – A QUEDA DE UM CATALINA EM RIACHUELO


Devido problema no momento da postagem sugiro clicar no link para ler o que o historiógrafo Rostand Medeiros escreveu.


http://blogdomendesemendes.blogspot.com

A GUERRA CHEGA AO AGRESTE POTIGUAR – A QUEDA DE UM CATALINA EM RIACHUELO

Um hidroavião Consolidated PBY-5 Catalina e grande parte dos oficiais e subalternos do esquadrão VP-45, antes de sua transferência para Belém do Pará. Foi uma aeronave similar a essa que caiu na área da antiga fazenda Lagoa Nova, município de Riachuelo, Rio Grande do Norte.Fonte: National Archives and Records Administration – NARA

Rostand Medeiros – Historiador, escritor e membro do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte – IHGRN

Publicado originalmente no livro Sobrevoo – Episódios da Segunda Guerra Mundial no Rio Grande do Norte, de Rostand Medeiros, Natal-RN:Editora Caravelas, 2019, págs. 283 a 305.

Devido problemas de erros no momento da publicação clique no link para você ver todo texto do Rostand Medeiros.


http://blogdomendesemendes.blogspot.com

ESSE ALGUÉM SEM NOME

*Rangel Alves da Costa

Segundo o Gênesis bíblico, no sexto dia Deus criou o homem e a mulher. Distinguiu, pois, as espécies segundo o sexo. Contudo, o passar dos anos, e para efeito de indicação do ser ou espécie humana, os sexos feminino e masculino deram lugar apenas aos termos homem, sujeito, pessoa ou indivíduo. Tanto é assim que o substantivo homem, dentro de determinado contexto, serve para indicar tanto o homem propriamente dito como a mulher.
Pois bem. Tal introito tornou-se essencial no sentido de reconhecer o poder humano de transformar o dado em algo desejado. Desejou que o termo homem passasse a designar o ser humano em geral, bem como criou outras nomenclaturas para designar a existência de seres humanos espalhados mundo afora. Daí se falar em agrupamento, em coletividade, em sociedade. O ser humano, assim, passou a se disseminar segundo contextos diversificados.
Contudo, os novos conceitos, nomenclaturas e designações, bem como a tendência cada vez maior de ver os seres humanos como uma totalidade, no amplo contexto social, não tiveram o condão de ofuscar a importância do ser individual, daquele ser nele mesmo, com suas aptidões. Um ser sem nome, pois apenas em ser em sua plenitude. E a todo instante cresce a importância desse alguém sem nome. Aquele alguém existente em cada um.
Esse alguém sem nome, que é o próprio homem em sua plenitude, está evidenciado em cada ser humano existente na face da terra. E sem nome porque apenas pessoa, e pessoa humana, podendo ser homem ou mulher, menino ou velho, pobre ou rico, de qualquer raça ou cor, habitante de qualquer lugar. Eis que nesse contexto o que importa e merece ser valorizado é a pessoa em si, aquele alguém sem nome identificável, porém tão reconhecível pela sua existência.
Esse alguém sem nome forma a sociedade, está nas regiões mais distantes, nos centros urbanos, nos subúrbios e arredores. Trabalha para o progresso, labuta para sobreviver, se esforça para subsistir. Acorda na madrugada, se sacrifica para chegar ao trabalho, bate o ponto, anseia para ouvir o apito sinalizando o fim da jornada do dia. Também se entrega ao trabalho no campo desde o amanhecer, planta, colhe, e esperançoso suporta e consegue vencer os sacrifícios da vida.
Esse alguém sem nome também está nas esferas de poder, nos governos, nos órgãos de mando, mas do mesmo modo encontrado nos barracos das favelas, nos submundos dos lixões, embaixo de marquises, pelas esquinas e ao relento. De família nobre ou apenas mais um de uma origem qualquer, nada disso importa, pois no contexto social todos devem ser reconhecidos na igualdade do ser humano. Por isso apenas pessoa, gente, ser humano, ou um alguém sem nome.


Esse alguém sem nome sou eu e é você. Somos nós. Esse alguém sem nome é aquele que lhe diz não e outro que lhe diz sim; é o amigo e o desafeto; é o parente ou o desconhecido. Não precisa sequer saber da existência do outro, pois sabendo que existe em algum lugar, pois cada um que agora está no seu afazer, na sua lida. E é preciso acreditar que todos, enquanto seres humanos, são igualmente importantes, ainda que apenas um indivíduo vivendo na solidão de uma ilha.
E esse alguém sem nome possui tamanha importância que poucos já tiveram a capacidade de analisar e reconhecer. Eis que ninguém sozinho faz importantes transformações, impulsiona uma revolução, faz uma manifestação para mostrar indignações, ou mesmo modifica qualquer coisa de forma duradoura. Sempre necessitará de apoio, da ajuda do outro, ainda que apenas como agente passivo da ação.
Esse alguém sem nome estava em cada um que já fez a guerra. Estava nas lutas renhidas pelos processos de independência das nações. Estava segredando revoltas nas escuridões dos porões. E também está, neste momento, traçando alianças, discutindo os destinos dos povos, agindo em nome do poder e em nome do futuro dos todos. Daí que o alguém sem nome pode ser um general, um governante, um líder, uma pessoa qualquer. E sem nome porque qualquer pessoa poderá um dia estar incumbido da tomada de decisões.
Disso tudo decorre a certeza da importância de cada um, de cada ser humano. Se é tido como um nada hoje, amanhã poderá ser diferente. Exsurge, assim, a necessidade da valorização de todos, e independente do que seja ou do que faça. Alguém desconhecido poderá se tornar presença constante na vida, alguém cuja humildade e singeleza de vida não mereça mais que um olhar passageiro, este talvez traga consigo a sabedoria tão importante de ser ouvida e seguida.
Daí a importância desse alguém sem nome, que é a importância de cada ser humano existente na terra. E por isso mesmo não se deve subjugar, discriminar ou desvalorizar quem quer que seja. Todos são importantes naquilo que fazem. Mas principalmente por ser humano, por ser um igual.

Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

OS PRIMEIROS DIAS DE LAMPIÃO NA BAHIA

Por Nelson Cadena

Em 21 de agosto de 1928 Lampião cruzou a fronteira do São Francisco e adentrou na Bahia para homiziar-se durante algum tempo no sertão. Fugia da implacável perseguição de policiais de vários Estados desde quando ousará invadir Mossoró, em junho do ano anterior, então a maior cidade do Rio Grande do Norte. Iniciativa esta atrevida e mal sucedida.

Vista aérea de Mossoró

Lampião aportou na Bahia com o propósito de dar um tempo, recompor forças, restaurar o seu bando e planejar novas investidas longe das fronteiras pernambucanas que a polícia desse Estado se apressou em controlar temendo o retorno do Capitão Virgulino. Lampião chegou na Bahia faminto, cansado, porém com muito dinheiro na mochila; assim declarou na época ao Coronel Petronilo de Alcântara Reis, chefe político de Santo Antônio da Glória.

Lampião e o coronel Petronilo

Entenderam-se o bandido e o Coronel em torno de um acordo de proteção, cogitaram negócios em comum, desentenderam-se mais tarde. Em represália o rei do Cangaço botou fogo nas propriedades do  chefe político e matou várias cabeças de gado. Este reagiu, segundo conta 

Oleone Coelho Fontes

Oleone Coelho Fontes no seu livro “Lampião na Bahia”, contratando mais de 50 jagunços em Pernambuco, a maioria criminosos comuns, para defender seu patrimônio.


Os primeiros dias de Lampião na Bahia sequer foram percebidos pelo governo e pela imprensa. Contribuiu para isso a atitude pacífica do cangaceiro que encarou essa etapa de sua vida como um momento para relaxar, mantendo-se por um tempo longe das forças policiais determinadas a capturá-lo. Então, descreve Oleone Coelho Fontes, assistiu festas de casamento, bebeu na companhia de soldados, foi perdulário nos gastos, promoveu vaquejadas e rodeios com ele mesmo como protagonista e ainda organizou animados arrasta-pés em concorridas festas com a sua sanfona de 8 baixos marcando o tom.

Durou pouco esse estado de espírito do Rei do Cangaço. Meses depois, em dezembro de 1928, reaparecia em público na Vila do Cumbe (hoje Euclides da Cunha) para extorquir dinheiro dos fazendeiros da região e retomar a sua rotina de saques e violência. Os primeiros dias de Lampião na Bahia poderiam ser interpretados, no contexto aqui retratado, como um período de férias.


http:/blogdomendesemendes.blogspot.com

POR ONDE PASSOU LAMPIÃO


CLIQUE NO SITE PARA VER O CAMINHO DE LAMPIÃO


http://blogdomendesemendes.blogspot.com

FAZENDA PEDRA D'ÁGUA - UM DOS COITOS DE LAMPIÃO NO ESTADO DE SERGIPE.

Por Geraldo Junior

À época de propriedade de Delfina Fernandes dos Santos (Foto) a Fazenda Pedra D'água foi um dos pontos de apoio de Lampião e seus comandados no estado de Sergipe. 

Cangaceiro Jurity


No ano de 1941 na Fazenda Pedra D´água o cangaceiro Jurity (Manoel Pereira de Azevedo), que na ocasião já se encontrava anistiado pelo governo federal, foi preso pelo 

Sargento Deluz

Sargento Deluz (Amâncio Ferreira da Silva), pernambucano, que na época atuava como delegado na cidade de Canindé do São Francisco em Sergipe e sem chances de defesa foi condenado pelo sargento e executado, sendo amarrado e lançado, ainda com vida, dentro de uma enorme e flamejante fogueira, onde foi consumido pelas chamas. 


Escombros da Fazenda Pedra D'água (Canindé do São Francisco/SE).

Foi nessa fazenda em meados do ano de 1937, que Lampião travou seu último grande combate contra Forças Policiais Volantes.


Delfina Fernandes dos Santos antiga proprietária da Fazenda Pedra D'água.

Lembrando que dona Delfina Fernandes dos Santos foi a única mulher na história, que se tem notícias, a ser presa sob a alegação de ser coiteira de cangaceiros, ou seja, de prestar apoio aos bandoleiros.

Da antiga casa da fazenda atualmente resta apenas os escombros e que aos poucos vão desaparecendo, apagando lentamente parte da história cangaceira ocorrida naquele pedaço de chão.

Fotos: Cortesia do escritor e pesquisador José Sabino Bassetti.

Foto - Fazenda Pedra D'água (Canindé do São Francisco - Sergipe). 


http://blogdomendesemendes.blogspor.com

DIÁRIO DE PERNAMBUCO, EDIÇÃO DE 11 DE NOVEMBRO DE 1979

Morreu solitário o homem que Lampião mais temia

Por Marco Túlio
Ilustração e correções Lampião Aceso 

Manoel de Souza Neto nasceu no dia 01 de novembro de 1901, num lugar denominado Ema no município de Floresta do Navio. Não tendo estudado no período de infância em virtude da falta de professores no Sertão, dedicou-se ao trabalho agrícola. Era destemido, demonstrando desde cedo tendências para a vida militar. Apreciava com muita curiosidade o movimento de tropas e cangaceiros na região, transformando-se mais tarde num justiceiro, que combatia impiedosamente os cangaceiros que assolavam os sertões nordestinos.
Acervo Lampião Aceso

Durante toda a adolescência conservou-se um rapaz igual aos outros sertanejos, cuidando da agricultura, do gado e comovendo-se com a paisagem e o pôr-do-sol. Um dia, no entanto após uma caminhada a pé pelo município de Rio Branco, consegui uma passagem para vir ao Recife, onde com a ajuda de Antônio Boiadeiro, ingressou na Força Pública.

Inicialmente foi destacado para servir em Santo Amaro, bairro conhecido na época, pelos altos índices de criminalidade e onde prestou relevantes serviços.

No dia 24 de janeiro de 1925 foi mandado para Vila Bela atualmente Serra Talhada/PE, a fim de participar da Força Volante naquele município para dar combate ao cangaço.

Os primeiros combates

Dias após ter chegado à Vila Bela o então Soldado Manoel Neto comandado pelo Pedro Cavalcanti foi a cidade de Triunfo/PE, onde Lampião e seu bando havia cercado a Fazenda de Clementino de Sá. Destacando-se no combate. Manoel Neto foi elogiado por seu superior e considerado o Soldado mais corajoso da Volante. Nessa batalha Lampião foi obrigado a fugir, sendo perseguido até a fronteira da Paraíba, de onde a Volante teve de regressar, pois o governo paraibano não permitiu que os Soldados pernambucanos entrassem em seu território, o fato que contribuía para Lampião se reorganizasse e voltasse a atacar.

Em 10 de novembro de 1925 na localidade Cachoeira, distrito de São Caetano, ocorreu outro combate contra Lampião. Na ocasião morreram ou fugiram da luta o Sargento José Leal e o seu auxiliar direto José Terto. Manoel Neto assumiu então o comando da Volante, conseguindo uma vitória surpreendente contra Lampião que passou a se interessar pela valentia do “macaco” que conseguira lhe infligir tão grande derrota. Em função da façanha, Manoel Neto foi promovido ao posto de Anspeçada, isto é, intermediário entre Soldado e Cabo.

Outras bravuras

A partir desse episódio, Manoel Neto passou a ser o terrível perseguidor de Lampião, sempre lhe mandando recados, desafiando-o para que lutassem de homem para homem numa batalha para pôr fim aos crimes no Sertão.

No tiroteio da Fazenda Favela, localizada no município de Floresta, Manoel Neto foi emboscado pelo bando de Lampião, ficando gravemente ferido, com duas pernas quebradas. Segundo contam, sempre ia à frente de seus comandados, alegando que como comandante cabia a ele receber ou disparar o primeiro tiro.

Certa ocasião, foi chamado pelo Tenente João Bezerra da Policia Militar de Alagoas, para arquitetarem o plano da morte de Lampião por envenenamento. (Fato que carece de maiores esclarecimentos).

Manoel Neto mostrou-se imediatamente contrário àquele tipo de assassinato. Dizendo para o Tenente:
- Lampião é meu inimigo pessoal e ele também me considera assim. Se eu puder pegá-lo no ponto do meu Mosquetão, acabarei com ele. Porém não o matarei envenenando a água que beba, pois Lampião sabe que o rastejo e nunca envenenou a água que eu bebo, mesmo lhe perseguindo.

Certa vez no município de Triunfo, vários bandoleiros que habitavam uma serra, resistiram a ação da Polícia Militar. Sem condições de subirem a montanha, os Soldados eram duramente repelidos a tiros de rifles. Ao tomar conhecimento do fato, o Capitão Manoel Neto, fazendo acompanhar de oito Soldados subiu a serra e aproveitando o silêncio da noite, foi invadindo casa por casa. Ao amanhecer todos estavam amarrados e desmoralizados.

O relógio de um dos apartamentos do Hospital da Policia Militar de Pernambuco,marcava exatamente sete horas e quarenta e cinco minutos do dia 3 de novembro [de 1979], quando falecia um dos maiores heróis da história do combate ao cangaço em Pernambuco. Tratava-se do coronel Manoel de Souza Neto, conhecido em seis estados do nordeste como "Mané Neto" e apelidado por Lampião como "Mané fumaça", pois, segundo a lenda, aparecia repentinamente de vários locais ao mesmo tempo.


Manoel Neto viva sozinho, residindo em um dos hotéis da cidade de Ibimirim [PE] quando foi acometido de uma doença renal.

Ao tomar conhecimento de que o coronel era portador da moléstia incurável,o comandante da Polícia Militar de Pernambuco, João Lessa, determinou a sua remoção imediata para o Hospital Geral do  DERBI. Lá, o velho combatente do cangaço faleceu aos 78 anos, após 14 dias de internamento. Seu corpo foi trasladado para o município [distrito] de Carqueja, onde foi sepultado com honrarias militares.

Além da luta ao bando de Lampião, Manoel Neto também participou de Revoluções, chegando inclusive a ser o homem de confiança dos governadores: Carlos de Lima Cavalcanti [1892 – 1967] e Estácio Coimbra. [1872-1937]. Perdeu a farda por ocasião da derrota do partido que defendia, mas conseguiu voltar a ativa em virtude do reconhecimento do seu trabalho e atos de bravura.  

Pescado em Cangaçologia - Página de Geraldo Jr. no Facebook

CLAUDE EYLAN A JORNALISTA FRANCESA QUE DESEJOU ENCONTRARLAMPIÃO

Transcrito do “Diário de Pernambuco” – 23/01/1938 por Antonio Correia Sobrinho

Henri KAUFFMANN
(Para os “Diários Associados”)

- Como foi a viagem?

Ao formularmos a pergunta banal, quando a poucos dias, Claude Eylan desembarcou de Pernambuco, esperávamos, de certo, alguns detalhes pitorescos, observações justas e profundas palavras amáveis.

Nossas previsões, porém, foram de muito ultrapassadas e verificamos mais uma vez que ver e ouvir não são apenas sentidos. São dons, e dons raros. Todo mundo registra uma vista ou um som; somente os privilegiados recebem das visões e dos sons a emoção que, segundo os casos, se transforma em obra de arte, página de literatura ou “impressões” no sentido mais completo e mais elevado da palavra.

Claude Eylan manifesta sua alegria.

- Tenho tantas coisas para lhe contar – dia a jornalista e escritora francesa. – Pensava até telefonar-lhe, não que eu julgasse ter novidades para contar sobre uma terra já muito visitada, mas porque quero agradecer publicamente a fidalguia com que me trataram no Recife e no sertão, todas as atenções que recebi de todos, desde o governador até o mais humilde dos caboclos.

A escritora da “Revue des Deux Mondes” pronuncia com amor essa palavra “caboclo”, e um ligeiro sotaque, a par da ternura da voz, dão a essa palavra nossa o sabor inesperado e raro d’uma fruta da selva num ambiente de luxo.

Havíamos preparado algumas perguntas, mas deixamo-las de lado.

O entusiasmo da Baronesa de Boccop (verdadeiro nome da escritora) externa-se de tal forma – calor e sinceridade – que toda tentativa no sentido de canalizá-lo entre os paredões dum questionário lhe prejudicaria a espontaneidade.

A GENTE PERNAMBUCANA

Holandesa, pelo seu casamento, Claude Eylan não podia deixar de ligar a visão de Pernambuco a certo período de seu passado:

- Compreendendo – assevera – porque os holandeses sentiram a atração dessa região que recorda suas paisagens: os canais, frequentemente o próprio céu, lembram o ambiente dos Países Baixos. Não falarei, porém, da paisagem tantas vezes descrita, mas sim da gente pernambucana, pouco conhecida, ao que me parece, e injustamente mal apreciada. Disseram-me, quando preparava minha viagem, que o Norte não progredia e que faltava ao nortista o espírito empreendedor e o gosto do trabalho. É absolutamente falso, pois, somente encontrei em Pernambuco, gente ativa e trabalhadora.

- Conheci as cidades e percorri o interior; estive em contato com intelectuais e operários, homens políticos e gente do sertão, ricos usineiros e modestos empregados, e encontrei em todos as mesmas características que revelam uma civilização várias vezes centenária; uma atividade que não é febril nem espalhafatosa, mas que repousa na vontade de vencer e encontra motivo de satisfação nas realizações do passado, nos empreendimentos do presente e nos planos para o futuro.
Outra característica de Pernambuco, e isso também se aplica a todas as classes, é a educação. Mesmo em pleno sertão, entre três caboclos e a natureza ainda rebelde, a gente se sente num ambiente de fidalguia. O pernambucano é um “gentleman”.

EXCURSÃO À CACHOEIRA DE PAULO AFONSO

Claude Eylan, a todo momento, fazia referência ao sertão e aos sertanejos. Visivelmente, nosso interior impressionou-a, e seu entusiasmo desperta nossa curiosidade. Perguntamos onde foi, quando e como.

- Por iniciativa de um grupo de amigos, foi organizada uma excursão à cachoeira de Paulo Afonso. Acompanhou-me o escritor pernambucano Mario Melo, grande conhecedor do sertão e dos índios da região.

Partimos de automóvel, com um itinerário que incluía uma visita a várias vilas do interior e a diversos acampamentos de índios. Passamos a primeira noite em Caruaru, uma cidadezinha que achei muito interessante, mais pitoresca, para nós, que as do Sul, porque conservou seu caráter e dela emana a tradição do passado e da civilização pernambucana.

A escritora continua:

- Daí fomos a Garanhuns, onde tivemos a sorte de chegar num dia de feira, espetáculo curioso em que aparecem ao olho do estrangeiro muitos detalhes que são outras tantas revelações sobre os usos e costumes.

Que vida e que cores! Como teria gostado de ser pintora e poder fixar essa visão. Bem entendido, não fugi às praxes turísticas; comprei uma porção de coisas que achei curiosa e também, por uma espécie de pressentimento (podemos ter uma pane – disse ao doutor Mario Melo) adquiri uma rede.

- Seguindo viagem, paramos em Águas Belas, onde fica um acampamento de índios. O que o governo faz para adaptar os silvícolas à nossa civilização é admirável. É uma grande obra, mas não esconderei que o espetáculo desses índios, na fase transitória em que se encontram, me deixou uma impressão de tristeza, já não são mais índios e ainda não são nossos iguais, quanto à civilização. Perderam sua personalidade, estão se desfazendo de suas características, mas não são assimilados; deixaram seus costumes e não adquiriram outros. Não podem ser defendidos, porque ainda não se definiram.

A escritora francesa teve visivelmente a sensibilidade despertada, e sua admiração pelo esforço gigantesco e pelas realizações tinge-se de piedade. Mas a narrativa é como a viagem: uma pequena pausa e, novamente, a marcha rumo a outros horizontes.

A SOMBRA DO FACÍNORA

Passaram a segunda noite da excursão ao sertão num pequeno hotel, cuja dona, segundo a expressão de Claude Eylan, a recebeu “como uma dama”.

No dia seguinte, chegaram à Cachoeira de PAULO Afonso. Espetáculo grandioso, em que a escritora se esforçou por não ver a usina.

- Aprecio demasiadamente a natureza – explica.
O regresso foi cheio de peripécias.

- A estrada não era das melhores – diz Claude Eylan com indulgencia – e, durante a noite, veio a inevitável “pane”. Estávamos em pleno sertão, e nas povoações que havíamos atravessado disseram-nos que Lampião estava nas proximidades. Que perspectiva, mas que bela reportagem. Aliás tudo bem pensado, esse “bandido” não deve ser muito perigoso: a gente sertaneja é tão amável.

- Mesmo assim, eu e minha rede abandonamos o carro e depois de uma hora de marcha, ao luar, encontramos uma choupana. Estendi a rede e dormi uma das minhas noites mais belas. O luar sobre o sertão, as carícias do ar. Mesmo assim, a ideia de Lampião voltava por vezes a me preocupar, tanto mais que havia um pássaro, ou uma ave (cujo nome esqueci), que, de vez em quando, fazia “hou.. hou... hou...” com uma vez igual a das pessoas quando se chamam umas às outras. Com certeza era pessoal de Lampião – pensava eu – mas não fazia mal, não; a gente do Norte é gente tão boa. Aliás que venha o Lampião. Tenho na bolsa o recorte duma entrevista que dei a O JORNAL. Ele a lerá.

Compreenderá que sou uma jornalista estrangeira e não deixará de me tratar bem. É capaz até de me pedir para publicar sua fotografia na “Revue des Deux Mondes”.

Creio que será difícil; eles lá são muito conservadores. “Hou... hou...” dizia a ave; a lua projetava, em feitios estranhos, a sombra dos cactos sobre o deserto; os passos do chofer, que chegava do carro à busca de ferramentas, ressoavam no silêncio da noite sertaneja. Mas Lampião não apareceu. É pena teria gostado de encontra-lo; não deve ser tão ruim quanto dizem. Não há gente ruim no Brasil. E com esse pensamento consolador e reconfortante, tornei a dormir até o romper do dia.

OUTRA PARADA INVOLUNTÁRIA

- Mal tínhamos começado a nova etapa, houve outra pane. Mas uma vez abandonamos o carro e caminhamos à procura de uma habitação. Dessa vez a casa era de um rico caboclo, casa de luxo para o lugar. Ofereceram-me tudo quanto havia e foram procurar tudo quanto podia ser encontrado de frutas e verduras para não me fazer infringir meu regímen vegetarinário.

Claude Eylan percebe nosso sorriso.
- Sei, vegetarianismo no sertão...

E sem transição:

- Vivi pensando no Portinari. Não podia ver caboclo algum ou negro sem pensar no retrato que Portinari teria feito dele. Aprendi muita cousa com Portinari, principalmente a ver. Assim como há escritores que nos fazem descobrir nossos próprios sentimentos, assim os pintores como Portinari abrem literalmente nossos olhos sobre o mundo. Conheci-o em Ouro Preto; foi uma revelação: entendi, então, as formas e as cores.

RECIFE

Indagamos das impressões da escritora quanto à cidade do Recife.

- Uma capital em pleno desenvolvimento – respondeu – grande centro de atividade, com exata noção dos valores, inclusive da do tempo. Notei, com prazer, que a cultura francesa era ali muito de perto acompanhada. O pernambucano, aliás, ficou muito latino; a civilização americana não o atingiu tanto quanto ao brasileiro de outras regiões. Admirei, sem dúvida, os belos edifícios modernos, os parques e os jardins, as usinas com seus aperfeiçoamentos, o “Hospital de Crianças” grande realização médico-social. A curiosidade de viajante fez, porém, com que me detivesse mais nas velhas construções, nas casas-grandes e nos mocambos. Já conhecia umas e outras através da literatura brasileira e da pintura. Os mocambos surpreenderam-me pelo seu asseio e pela satisfação de seus moradores por ali residirem: água bem pertinho, peixes à vontade. Visitei, também, muitas igrejas que contêm tesouros de arte, e muito apreciei as casas revestidas de azulejos, que transportam a gente três séculos atrás, embora frequentemente estejam entre dois prédios modernos.

Nome quase masculino, uma vida ativa de jornalista como poucos homens a têm, Claude Eylan não deixa, por isso, de ser mulher.

Assim concluiu nossa conversação e suas impressões do Recife:
- E isso, hein? (apontava o elegante tailleur de linho azul, que trajava com chique). Pois foi feito no Recife, meu caro senhor. Mandei fazer três outros. E vou usá-los em Paris, sabe?


http://blogdomendesemendes.blogspot.com

MORENO (ANTÔNIO IGNÁCIO DA SILVA) É O TERCEIRO A CONTAR DA DA DIREITA.



http://blogdomendesemendes.blogspot.com

SEMINÁRIO SERTÃO CANGAÇO



http://blogdomendesemendes.blogspot.com