Serra Grande
'89 anos' - Por José João de Souza
Em março de 1926, Lampião recebeu do Batalhão Patriótico de Juazeiro do Norte,
a patente de capitão. Mesmo considerando que a patente não era legítima, o
cangaceiro se tornou mais fortalecido e mais violento, também. Nesse ano,
ocorreu uma série de atentados na região do Pajeú, com diversas mortes e
sequestros, episódios que culminaram com a famosa Batalha da Serra Grande,
ocorrida em 26 de novembro de 1926, a cinco quilômetros do distrito de Varzinha
município de Serra Talhada.
Lampião tinha sequestrado Pedro Paulo Magalhães Dias, um inspetor da Standard
Oil Company. O fato aconteceu na estrada de Triunfo para Vila Bela (atual Serra
Talhada). Pedro Paulo era natural da cidade de Sabará, em Minas Gerais, e, por
isso, ficou conhecido como Mineiro. Lampião pedia vinte contos de réis para
libertá-lo, o dinheiro deveria ser entregue na Fazenda Varzinha, local indicado
por Lampião.
Quando o bando chegou a Fazenda Varzinha, foi direto à residência de Silvino
Liberalino, o qual tinha sido subdelegado de Vila Bela, no ano de 1911. Logo
que viu a tropa, Silvino não percebeu que estava diante dos comandados de
Lampião, pois, naquela época, as roupas dos cangaceiros eram iguais às da
polícia. Então, saltou na calçada, com um rifle na mão, e fez a seguinte
pergunta:
- É Lampião ou
é Força?
O bando
respondeu:
- É a Força
Volante.
Silvino
Liberalino se sentiu mais seguro e disse:
- Então podem
entrar. Se fosse Lampião, ia comer bala.
Os cangaceiros
entraram e pediram água para beber, quando Silvino colocou a mão no pote para
retirar água, os cangaceiros o seguraram e se identificaram:
- Você
está falando é com Lampião, cabra!
E o prenderam,
e para comemorar, deram alguns tiros em frente da residência, ainda hoje,
existem algumas marcas de balas nas portas da casa.
Os bandoleiros que já vinham com o refém, Pedro Paulo Magalhães Dias (o
Mineiro), levaram também, Silvino Liberalino, os dois presenciaram a Batalha na
Serra Grande.
A intenção do bando de Lampião na Fazenda Varzinha, além de receber o resgate,
era uma vingança por um antigo assassinato, ocorrido na Serra Negra, no
município de Floresta, cometido por José de Esperidião, que se mudara para
Varzinha.
O resgate foi levado por intermédio de Manuel Macário, homem da confiança de
Cornélio Soares, no entanto, já na Fazenda Varzinha, o portador foi flagrado
pela força policial do sargento Manuel Neto, que lhe aplicou severas torturas e
recolheu o dinheiro.
O bando seguiu em direção à casa de José de Esperidião, cuja esposa, Rosa
Cariri de Lima, ao ver de longe, a multidão, avisou o marido, alertando-o para
que se retirasse. José de Esperidião perguntou:
- Quantas
pessoas você acha que vêm?
Ela respondeu:
- Uns vintes
homens.
Ele disse:
- Não
corro com medo de vinte homens.
A mulher
calculou muito mal, o quantitativo do bando era de aproximadamente, 68
cangaceiros.
José de Esperidião pegou seu rifle e dois bornais de balas e ficou
entrincheirado no quarto. O tiroteio foi grande, de toda ribeira se ouvia o
barulho das balas, após certo tempo de tiroteio, o bando resolveu colocar fogo
na casa. Para tanto, retiraram toda madeira do curral, que ficava em frente da
residência. Segundo o livro, o Canto do Acauã de Mariloudes Ferraz, na Varzinha
o bando encurralou um rapaz que, sozinho, lutou até esgotar a munição.
Tiburtino Estevão ainda tentou socorrer o amigo. Pegou seu rifle e tentou se
aproximar, mas foi visto por alguns cangaceiros, que passaram a atirar em sua
direção. Uma bala atingiu uma galha de xique-xique, próximo da cabeça de
Tiburtino. Vendo que nada podia fazer, o homem retornou à sua residência.
No dia seguinte, foram retirar o corpo de José de Esperidião para fazer o
sepultamento, não encontraram marcas de balas no corpo dele, portanto,
chegou-se à conclusão de que a morte fora por asfixia provocada pela fumaça.
José Pereira Lima, conhecido por Cazuza, filho da vítima, com apenas sete dias
de nascido, encontrava-se deitado em uma rede na sala, no momento do tiroteio.
Foi baleado, ficando com uma marca no pé pelo resto de sua vida. Geralmente,
quando ia comprar sapatos, adquiria dois pares, um par 41 e outro par 42, pois
o pé defeituoso ficara menor.
O bando seguiu viagem rumo às ribeiras do tamboril, chegando até o Sítio dos
Nunes no município de Flores, de onde voltaram. Ao chegar ao Sítio Morada, hoje
município de Calumbi, Lampião estava ciente que a policia estava no seu
encalço, portanto, ali mesmo, abasteceu o bando e pegou o rumo da Serra Grande.
O sequestro de Pedro Paulo Magalhães Dias e os fatos acontecidos na Fazenda
Varzinha foram interpretados como sendo um desrespeito às autoridades, por
terem ocorridos na comarca de Vila Bela, na época, a sede do comando militar de
combate ao cangaço no interior de Pernambuco. Portanto, foi preparado um
destacamento com mais de 300 soldados, chefiados por seis comandantes de
volantes, todos fortemente armados, inclusive com duas metralhadoras Hotchkiss,
e muita munição, era um verdadeiro exército. Tudo inspirava confiança e dava a
certeza da vitória.
Lampião estrategicamente com seus 68 cangaceiros, subiram a serra, e
prepararam uma emboscada, em um local onde existem grandes pedras e fendas
profundas, que lhe dava uma visão completa sobre o campo da batalha.
O combate teve início antes das 9 horas da manhã e terminou ao anoitecer, a
polícia mesmo com um quantitativo superior, e os soldados atacando
corajosamente, não conseguiram vencer a resistência do capitão Virgulino
Ferreira e seus comandados.
A localização dos cangaceiros era ótima, conforme disseram os policias. Segundo
o cangaceiro Ventania, no local que Lampião estava, nem canhão tirava ele de
lá, no entanto, a posição dos soldados era extremamente precária,
entrincheiravam-se como podia, sem comando, sem tática, salve-se como puder.
Arlindo Rocha recebeu um balaço no rosto que lhe fraturou o maxilar inferior,
ainda no início do tiroteio, Manuel Neto foi baleado nas pernas, Luiz Careta de
Triunfo faleceu com uma bala na cabeça, Euclides Flor recolocou ainda em
combate as vísceras abdominais de Vicente Ferreira (Vicente Grande), atingido
na altura do umbigo, o soldado Luiz José sofreu um ferimento na coxa.
Para provocar os policiais, o cangaceiro Genésio deu um aboio triste e sonoro,
os soldados se sentiram encurralados como gado, Antônio Ferreira não se conteve
e se expôs totalmente, gritando como vaqueiro: Ei, booooi... Nesse momento, o
sargento Filadelfo Correia de Lima, deu-lhe uma rajada de metralhadora, a
partir de então, a polícia acreditava que Antônio Ferreira tinha morrido no
combate.
Com a chuva de balas vindas de cima da serra, os soldados ficaram desesperados,
portanto, aproveitavam a cobertura de fogo das metralhadoras para se debandar
na caatinga, deixaram grande quantidade de armas, munições, cartucheiras,
cantis, bornais, etc. Levavam apenas alguns companheiros feridos, quando
podiam. Após a batalha, os cangaceiros recolheram 27 fuzis e mosquetões.
A Batalha da Serra Grande é considerada a mais violenta da história do cangaço,
segundo o historiador Frederico Bezerra Maciel, morreram "26"
policias e "38" saíram feridos, no bando dos cangaceiros não houve
registro de morte.
Foram a Serra Grande verificar os fatos de perto, o Major Theóphanes Torres
comandante de Vila Bela, o juiz de direito Dr. Augusto de Santa Cruz e o
promotor de Salgueiro.
Antes do regresso para Vila Bela, o Tenente Higino ainda providenciou o
sepultamento de sete corpos em uma única cova, no rancho de Pedro Rodrigues
(proprietário local).
Tomaram parte na batalha os seguintes cangaceiros: Luiz Pedro, Maquinista,
Jurema, Bom Devera, Zabelê, Colchete, Vinte e Dois, Lua Branca, Relâmpago,
Pinga Fogo, Sabiá, Bentevi, Chumbinho, Ás de Ouro, Candeeiro, e seu irmão
Vareda, Barra Nova, Serra do Mar, Rio Preto, Moreno, Euclides, Pai Velho,
Mergulhão, Coqueiro, Quixadá, Cajueiro, Cocada, Beija-Flor e seu irmão
Cacheado, Jatobá, Pinhão, Mormaço, Ezequiel e seu irmão Sabino, Jararaca, Gato,
Ventania, Romeiro, Tenente, Manuel Velho, Serra Nova, Marreca, Pássaro Preto,
Cícero Nogueira, Três Coco, Gaza, Emiliano, Acuana, Frutuoso, Felão, Biu,
Cordão de Ouro, Genésio, Ferreirinha, Antônio Ferreira, Lampião e outros.
No dia seguinte à Batalha da Serra Grande, Lampião, já na Fazenda Barreiros,
entregou uma carta a Pedro Paulo Magalhães Dias, endereçada ao então governador
de Pernambuco, Dr. Júlio de Melo, propondo dividir o estado em dois, com os
seguintes limites: ...Governo o sertão até as pontas dos trilhos em Rio Branco
(Arcoverde), e vosmecê daí até a pancada do mar no Recife...
O relato sobre a Batalha da Serra Grande encontra-se no processo criminal
contra Virgulino Ferreira et al., de 28 de novembro de 1926, 1° Cartório de
Serra Talhada PE.
Adendo Lampião Aceso
A Serra Grande
dista da sede do município 25 km. Na rodovia que liga Serra Talhada a Custódia,
terra de meu amigo "Re-mí-gio". A Standard Oil Company of Brazil hoje
é a companhia Esso.
Tanto a quantidade de cangaceiros e soldados quanto o numero de baixas foi e
ainda é passível de muita discussão durante estes anos. Muitos biógrafos
trabalham com um numero,entre duzentos e noventa e cinco a trezentos homens no
front. O numero de cangaceiros varia de 68 como apontado no texto, 90 e até de "130" cabras
da peste, segundo um depoimento dado pelo Sr. Pedro Paulo "Mineiro"
ao Jornal pequeno na edição de 29 de novembro de 1926.
O Boletim geral de nº 262 do dia 1º de dezembro de 1926 transcrito
no Livro do confrade Geraldo Ferraz "Pernambuco no tempo do cangaço" (pág
147) apresenta relatório em que consta o numero de "260" (duzentos
e sessenta) soldados.
O mesmo acontece quanto ao numero de soldados mortos: Autores, a exemplo do
Bezerra Maciel citado no texto sugerem de vinte, até vinte e oito.
O Boletim
geral de 29 de novembro de 1926 em trecho transcrito na pág 93
do livro "Lampião, Entre a espada e a lei" de Sérgio Dantas
aponta o número de 14 feridos e "10" vitimas fatais.
O mesmo número
consta no boletim de 1º de dezembro transcrito no livro de Geraldo Ferraz
(páginas 143 e 144) e que estes dez mortos (soldados das forças de Pernambuco)
foram devidamente identificados e enterrados sob orientação do major Theophanes
Ferraz. que a propósito, e o texto já deixa claro, não participou diretamente do
combate, pois estava em Vila Bella em contato com o Derby (Recife) Chegando só
depois do fogo.
http://lampiaoaceso.blogspot.com.br/2013/01/a-maior-batalha-de-lampiao-em-solo.html
http://blogdomendesemendes.blogspot.com