*Rangel Alves da Costa
Abrir a porta e as janelas para uma nova manhã: as manhãs de setembro. E fazer com que o coração, pela luz do olhar, percorra os horizontes, os primeiros sóis, os matizes desse novo tempo que vem chegando. Fé, esperança, certeza de que uma nova canção vai ecoar na vida.
Sorte que o medo dos desgostos de agosto já foi embora na ventania dos tempos. Agosto se foi e agora as sementes da primavera já começam a gestar nos canteiros. Pois logo virá a estação primaveril, o acontecimento mais esperado no mês de setembro. E basta esse fato para que o novo mês já desponte com as melhores expectativas possíveis.
Mas a tão esperada estação somente desabrochará já próximo ao fim do mês. O povo, contudo, parece não se importar muito com isso. Do mesmo modo, nem se lembra que está indo embora a estação chuvosa, com temperaturas mais amenas, e que não demorará muito para o calor tornar-se insuportável novamente. Nada disso importa, pois o pensamento já avista as flores da primavera e as manhãs já serão, daqui em diante, mais apreciadas ao abrir a janela.
Não há como deixar de avistar as flores, ainda que só se encontre os lírios alquebrados de agosto. É essa predisposição mental, essa sensação de alegre encontro com a mais bela das estações, que possui o dom de possibilitar ao indivíduo a busca da renovação e alcançar novas forças para reacender as chamas da alma e do espírito. Assim, o aspecto mais positivo: a força do renascimento do ser.
Então, rejubilem-se os setembrinos, os primaverianos, os esperançosos, os faustuosos. Cantem a vida e ecoem cada vez mais alto, pois chegaram as manhãs de setembro. Pereceram os lírios entristecidos de agosto, murcharam as desesperanças tantas. Eis o surgir de um novo tempo, de novos e promissores dias, a partir das manhãs que surgem em festivas alvoradas. Manhãs nas manhãs de setembro.
Com setembro também o abrir a janela para os novos ares que chegam na brisa, para o aroma das flores que logo virá. Mais adiante a primavera tomará o lugar do inverno e semeará novas cores pela natureza. E as manhãs que surgirão, as tão belas manhãs de setembro, chegarão acompanhadas de matizes, gorjeios e esvoaçamentos pelos jardins e canteiros adiante. E no olhar o solene e deslumbrante rito do fortalecimento espiritual.
Mas antes de a primavera chegar, que nos contentemos com as manhãs invernais, pois também manhãs de setembro. E de suma importância que aconteça assim, vez que a chuva caindo lá fora estará molhando a terra, preparando-a para gestar a semente e fazer brotar os frutos da nova estação. As flores ainda não surgidas diante do olhar, ainda que em muitos os jardins já estejam florescentes, já estão formosas e perfumadas debaixo da terra ou na haste ainda frágil da pequenina planta que já irrompeu.
Por isso os motivos de tanta alegria e embevecimento, as razões para que as janelas sejam abertas logo na aurora e os sorrisos e olhares se encham de luz. São as manhãs assim, assim como as manhãs de setembro, que fazem brotar sentimentos bons e que pareciam escondidos em baús. E dádiva da vida que a pessoa reencontre a ternura e a afeição, a meiguice e a alegria.
Por isso manhãs que chamam a correr pelos campos, a abrir os braços rumo ao firmamento, a glorificar as grandezas da vida e bendizer as belezas da existência. E cantar a doce música de Vanusa, aquela inesquecível canção que após reconhecer amarguras da caminhada, reencontra a razão de viver a partir das manhãs de setembro.
“Fui eu quem se fechou no muro e se guardou lá fora/ Fui eu quem num esforço se guardou na indiferença/ Fui eu que numa tarde se fez tarde de tristezas/ Fui eu que consegui ficar e ir embora/ E fui esquecida, fui eu! Fui eu que em noite fria se sentia bem/ E na solidão sem ter ninguém, fui eu!/ Fui eu que em primavera só não viu as flores e o sol nas manhãs de setembro/ Eu quero sair, eu quero falar, eu quero ensinar o vizinho a cantar/ Eu quero sair, eu quero falar/ Eu quero ensinar o vizinho a cantar nas manhãs de setembro/ Nas manhãs de setembro, nas manhãs de setembro, nas manhãs!...”.
Eu também preciso abrir a janela, também quero sair, correr, cantar, amar. Também preciso viver as manhãs de setembro.
Escritor
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