Ela não fazia
jus ao nome Anésia, que, em grego significa repouso. Pelo contrário.
Mulher valentona como poucas, nasceu em Jequié, Bahia no início do século
20 e foi a primeira cangaceira, 13 anos antes de Maria Bonita.
A diferença
entre elas, não está só no tempo, mas nas atitudes. A mulher de Lampião foi a
primeira a entrar no bando e Anésia criou um bando.
Lutava
capoeira com punhal, bebia cachaça temperada nas bodegas, fumava cachimbo de
barro, atirava para decepar os dedos dos inimigos numa distância de 100 metros,
galopava feito vento, dançava nos terreiros de candomblé recebendo Iansã, um
orixá guerreiro. Foi ainda a primeira mulher da região a usar calças compridas
e a montar cavalo escanchada igual a homem.
Tem mais:
conseguia se “invultar” (sumir) durante os combates se transformando em uma
pedra ou tronco de árvore. Assim, reza a lenda.
Anésia Adelaide
de Araújo entrou na vida cangaceira para vingar a morte de um parente em 1917.
Ela pertencia a uma família de agricultores e tinha vários irmãos. Todos
conhecidos pela valentia. Mas Anésia criou um grupo para combater a morte
injusta, como dizia. E essa destemida ficou conhecida como Anésia Cauaçu.
Sua fama
cresceu rápida em todo Sertão da Bahia e até a polícia temia o confronto com
ela. Nessas ocasiões, ela atirava de todo jeito até mesmo para trás acertando
em quem queria. Dava surras e tapas na cara dos homens deixando todos
assombrados.
Sua fama e
atitudes cresceram ao ponto de o então governador da Bahia mandar 240 soldados
para prender Anésia. E não adiantou. Ela passou seis anos no Cangaço com irmãos
e primos fazendo justiça ao seu modo. Bonita, branca, alta e de olhos azuis,
casou com o mascate Isaias e tiveram uma filha. Moradores de Jequié garantem
que ela existiu. Fica difícil separar o real do imaginário, atesta o professor
Domingos Ailton, que escreveu livro sobre essa vaqueira-cangaceira, mais
valente que Dadá.
Há exatos 100
anos, dia 25 de outubro de 1916, coincidentemente data do aniversário de
Emancipação Política de Jequié, o Jornal A TARDE trazia como manchete JEQUIÉ,
Cauassus, Marcionilio e Zezinho dos Laços. A empreitada dos crimes. Narrativa de
uma Cauassu ao nosso repórter, com uma foto da cangaceira Anésia Cauaçu ao lado
de uma criança.
Na primeira página e nas páginas internas do jornal, Anésia
narra a trajetória da família Cauaçu cuja grafia da época se escrevia Cauassu,
dando conta de que seus familiares eram simples agricultores e comerciantes e
que se tornaram cangaceiros por conta de uma vingança.
Em Ituaçu, antigo Brejo Grande, na Chapada Diamantina, duas famílias disputavam
o poder local: os Silvas, chamados de "rabudos", e os Gondins,
denominados de "mocós”.
O major Zezinho dos Laços (um dos líderes dos
“rabudos”) exige que Augusto Cauaçu acompanhe seu grupo de jagunços em uma
emboscada contra a família Gondim. Por conta da recusa de Augusto, este é
assassinado a mando de Zezinho dos Laços. Então, a família Cauaçu se reúne e
resolve vingar a morte, assassinando Zezinho dos Laços seis anos depois em uma
tocaia na Fazenda Rochedo.
Chefes dos “rabudos”, a exemplo do coronel
Marcionílio de Souza e de Casseano do Areão passam a perseguir e matar membros
da família Cauaçu e de seus aliados, comandados por Anésia e seu irmão José
Cauaçu.
Antonio Muniz Sodré de Aragão - https://pt.wikipedia.org/wiki/Ant%C3%B4nio_Muniz_Sodr%C3%A9_de_Arag%C3%A3o
Pressionado pelos coronéis, o então governador da Bahia, Antônio Muniz,
denomina o movimento armado dos Cauaçus de "conflagração sertaneja” e
envia para Jequié mais de 240 soldados em três expedições da polícia militar da
Bahia, com participação inclusive de oficiais que combateram na Guerra de
Canudos, a exemplo do tenente-coronel Paulo Bispo. Ocorre então a Guerra do
Sertão de Jequié, conflito envolvendo os cangaceiros Cauaçus, policiais
militares e jagunços dos coronéis.
A força policial pratica uma série de atos
violentos não só contra os cangaceiros, mas também contra a população inocente
de Jequié e região. O alferes Francisco Gomes – Pisa Macio obriga um homem a
comer lama no povoado do Baixão, crucifica outro nas margens do Rio das Contas
e lança crianças para o ar,que são amparadas com a ponta das baionetas e levava
suspeitos para um pequeno morro no Curral Novo onde eram sangrados com
requintes de perversidade. O local ficou conhecido como Morrinho da Matança.
O genocídio é denunciado pelo Jornal A TARDE, que envia um repórter para fazer
a cobertura das expedições policiais em Jequié e na ocasião entrevista Anésia
Cauçu, dando destaque a sua narrativa a respeito da história do bando e do
histórico conflito daquele ano de 1916.
Anésia Cauaçu foi uma mulher que esteve à frente do seu tempo. Foi a primeira
mulher nordestina a ingressar no cangaço, uma vez que em 1911, ano do
nascimento de Maria Bonita, Anésia já lidera um bando de mais de 100
bandoleiros.
Maria Bonita de Lampião
Ela também foi a primeira no sertão de Jequié a praticar montaria de
frente, já que as mulheres de sua época montavam de lado em uma sela denominada
silhão, e a pioneira das terras jequieenses a vestir calças compridas (as
mulheres do período em ela viveu apenas usavam vestidos e saias), para
facilitar o combate em cima do cavalo.
Historiador Emerson Pinto de Araújo - https://memoriasdejequie.wordpress.com
O historiador Emerson Pinto de Araújo,
que registou a história da cangaceira assim a descreve:
“era uma mulher branca,
de olhos azuis, bons dentes, alta e delgada, que tomava suas pingas, sem que
ninguém ousasse faltar-lhe com respeito. Numa época em que não existiam
academias de defesa pessoal, ela tinha ginga de corpo, conhecia- ninguém sabe
com quem aprendeu - os ´rabos-de-arraia da capoeira, batendo forte nas fuças de
muitos valentões que tentavam avançar o sinal. Manejando armas de fogo com uma
pontaria invejável, jogava pra escanteio os melhores atiradores. Certa feita,
bafejada pelo acaso, numa distância de trezentos metros, cortou o dedo do
sargento Etelvino, quando este indicava aos seus comandados a direção em que
deveria atacar”.
Com base na memória coletiva de tradição oral, em documentos
escritos e no meu imaginário, escrevi um romance histórico que tem como
protagonista Anésia Cauaçu.
Inspirado neste texto ficcional, o poeta e
cordelista José Walter Pires produziu um livro de cordel e o compositor e
cantor Jonas Carvalho compôs uma música sobre a saga de Anésia Cauaçu.
cantor Jonas Carvalho
Diversos
estudos acadêmicos foram e estão sendo desenvolvidos sobre essa guerreira do
sertão de Jequié. A entrevista publicada em 25 de outubro de 1916 e as matérias
publicadas pelo Jornal A TARDE há 100 anos sobre os conflitos na região de
Jequié constituem relevantes documentos da história do coronelismo e do cangaço
na Bahia.
Há 145 anos,
nascia em, o cangaceiro Antônio Silvino, que morreu no dia 31 de julho de
1944.
Há 130 anos,
nascia em Pernambuco, o historiador João Peretti, que morreu no dia 2 de
maio de 1953.
Há 80 anos, se
apresentava no Teatro de Santa Isabel, a Companhia de Comédia Moderna, com
a peça Minha Mulher … É um Homem, de Celestino Silva. No elenco o
ator Palmerim Silva.
Há 55 anos,
nascia em Pernambuco, o jogador Edivaldo Martins da Fonseca, que morreu no
dia 14 de janeiro de 1993.
Há 15 anos, morria no Rio de Janeiro, o sambista Oswaldo Sargentelli, que nasceu no dia 8 de dezembro de 1925.
O aprisionamento de Lampião não se me afigura impossível. Nada importa diga ele que prefere a morte. Antônio Silvino também o dizia, mas, apenas se viu baleado, foi o primeiro em fazer questão de mansamente se entregar à justiça. Restabelecido ulteriormente, voltaram-lhe no presídio os ímpetos brutais, como na manhã em que, entre descomposturas do calão mais vil, sacudiu um pão na cara de um desembargador.
Quando a captura de Lampião parece a tanta gente sonho irrealizável, vem a propósito recordar como se deu a de seu terrível predecessor.
O que desgraçou Antônio Silvino foi a perseguição sem tréguas que lhe moveu uma de suas vítimas mais humildes. Bem diz o povo que “não há inimigo pequeno” e que “mutuca é que tira boi do mato”…
José Alvino Correia de Queiroz era obscuro comerciante no sertão de Pernambuco, quando Antônio Silvino lhe saqueou o pequeno estabelecimento. Reduzido à miséria, jurou vingar-se e entrou a polícia daquele Estado. Acreditaram nos seus propósitos e fizeram-no sargento.
Inteirado de que Silvino transitaria por certa faixa do município de Taquaritinga, o Sargento Alvino buscou informações de João Vicente e Joaquim Pedro, moradores naquelas paragens. Ambos negaram a pés juntos ter qualquer conhecimento a respeito. Mas, tão jeitosamente o miliciano conduziu as investigações, que a esposa de João Vicente o orientou:
– Quando o Sr. chegar à casa de nosso vizinho, o Joaquim Pedro, e encontrar as mulheres torrando galinhas ou fazendo comedoria de sobra, pode apertar o pessoal que o “capitão” Antônio Silvino está escondido perto, no mato…
No dia esperado, 27 de novembro de 1914, os policiais, sob o comando do Alferes Teófanes Torres e do Sargento José Alvino, estavam no local referido, de nome Lagoa Laje.
Assim que penetrou na residência de Joaquim Pedro, o Sargento Alvino se encaminhou diretamente para a cozinha, atrás de cuja porta se lhe deparou pendurada uma banda de ovelha. E viu chegar desconfiado, pelo quintal, um rapazola com um tabuleiro à cabeça, cheio de tigelas, colheres e pratos. Interrogado, o recém-vindo explicou, titubeante, que havia ido deixar comida a uns “trabalhadores”, num roçado.
Concomitantemente, o Alferes Teófanes submetia Joaquim Pedro a interrogatório, e este negava que soubesse do paradeiro de Silvino.
Aparece o sargento e, depois de falar na ovelha morta e de mostrar o tabuleiro com os restos de comida, pede permissão para forçar o velho sertanejo a não continuar mentindo. Ato contínuo, tranca-lhe, numa alcova, a mulher e os filhos e ordena que os soldados desembainhem os sabres.
Nesse momento, mais nervosa, uma filha do ameaçado pede, da alcova:
– Meu pai, por caridade, descubra logo!
Joaquim Pedro roga que não lhe batam e justifica-se, alegando que logo não disse a verdade por temer a vingança de Silvino, no caso de a polícia o não prender ou matar. E confessa que o celerado está escondido não longe dali.
Eram cinco horas da tarde e urgia assaltar os cangaceiros, antes que a noite sobreviesse.
Sob as ameaças de ser liquidado, se desse o menor sinal aos bandidos, Joaquim Pedro vai mostrar o esconderijo deles. Com todas as precauções imagináveis, a tropa se aproxima da malta criminosa.
Antônio Silvino estava deitado numa pedra, sobre a qual se debruçava copada oiticica. Perto, divertiam-se alguns de seus cabras, a jogar um sete-e-meio. Ao ouvir a primeira descarga, Silvino gritou, motejante:
– Espera aí, rapaziada! Deixem, ao menos, os menino acabar esta mão!
Mas o fogo irrompeu violento e sem intermitências, dos dois lados.
Com o cair da noite, o tiroteio deixou de ser correspondido. O Alferes Teófanes e o Sargento Alvino acreditaram que Silvino tivesse fugido. Suspeitando, todavia, que ele se quisesse vingar de Joaquim Pedro, foram entrincheirar-se na casa deste.
Coisa bem diversa se passava. Silvino fora atingido por uma bala nas espáduas e o seu companheiro Joaquim Moura tivera quebrada uma perna. Os demais cangaceiros se embrenharam, desorientados, na caatinga, favorecidos pelo negrume da noite.
Estando a perder muito sangue, Silvino convidou Joaquim Moura a se entregarem, mas este repelira o convite e, depois de dizer que macaco do Governo não tinha o gosto de botar-lhe as mãos em riba, ele vivo, suicidou-se com um tiro na cabeça.
Impressionado ainda mais com o trágico fim do último assecla que lhe restava, Silvino despojou-se das armas e arrastou-se para a casa da mulher que ele ignorava tivesse sido quem o denunciara. O marido dela, João Vicente, a estava censurando por sua leviandade, persuadido de que Silvino, sabedor da denúncia, lhes não perdoaria.
De repente, batem à porta. Quando, de fora, uma voz anuncia que quem bate é Antônio Silvino, João Vicente encomenda a alma a Deus, convicto de que vai morrer. É sua mulher quem se afoita a atender ao chamamento.
Ao se abrir a porta, aparece, à luz da lamparina, o vulto do grande salteador. Quase desfalecido e com as vestes rubras de sangue, Silvino está escorado no portal.
– Capitão, que horror é este?
– Mataram-me… arqueja aquele que, acovardado, começava a expiar crimes sem conta.
Conduzido a uma rede, ele pede que chamem a polícia. Vai alguém a Taquaritinga, mas não encontra lá os soldados. Na confusão em que todos se viam, ninguém a princípio se apercebeu de que os policiais poderiam estar pernoitando na fazenda de Joaquim Pedro. À mulher de João Vicente ocorre agora essa possibilidade. Despacham para ali o portador. Quando este bate à porta de Joaquim Pedro, os soldados aperram as armas, crentes de que é Silvino quem chega. Aberta a muito custo uma janela, o mensageiro dá contas de sua incumbência: vem avisar que Antônio Silvino, sozinho, desarmado e gravemente ferido, está em casa de João Vicente e quer entregar-se à prisão.
O Alferes Teófanes suspeita que se trate duma cilada e opina que se aguarde o raiar do dia. Tanto insiste, porém, o Sargento Alvino que, afinal, o seu comandante se dispõe a ir ver Silvino. Ainda assim, o recadista vai seguro pelos cós e advertido de que receberá uma punhalada, ao primeiro tiro com que a tropa seja surpreendida.
Cercada com cautelas a morada de João Vicente, houve grande alegria, quando se patenteou aos olhos de seus perseguidores a mísera situação daquele que se gabava de que, embora sem saber ler, governava todo o sertão! O Sargento Alvino parecia o mais contente. Exigiu que se não fizesse o menor mal a Antônio Silvino e saiu, pelos matos, a cortar umas folhas de quixabeira para lhe lavar as feridas.
Fora destronado o Átila bronco que, durante dois decênios, apavorara a gente matuta do meio-norte e assoalhava não ser passarinho que morasse entre grades… Por trinta anos ia se fechar atrás dele o portão da Penitenciária de Recife!
Foi à tenacidade do Sargento Alvino, à sua argúcia e vontade firme de vingança que se deveu a prisão de Antônio Silvino. Forçoso é, porém, reconhecer que colaborou inestimavelmente nisso a indiscrição duma mulher.
Acontecerá o mesmo, algum dia, a Lampião? Até na ruína dos cangaceiros terá aplicabilidade o cherchez la femme.
Texto acima é do Cearense Leonardo Mota, inserido no seu livro “No tempo de Lampião” e publicado pela Of. Industrial Gráfica, do Rio de Janeiro, em 1931. Esta reprodução é da segunda edição, de 1967. Leonado Mota era cearense da cidade de Pedra Branca, nasceu em 1891 e faleceu em 1948. Estudou a fundo o sertão nordestino, onde descreveu vários aspectos da região em obras memoráveis.
Antes de Lampião, Antônio Silvino era o cangaceiro mais famoso e seu apelido mais conhecido foi “Rifle de Ouro”. Nascido no dia 2 de dezembro de 1875, em Afogados da Ingazeira, Manoel Batista de Morais entrou para a história como Antonio Silvino. Durante 16 anos, driblou a polícia, praticou saques e assassinou inimigos, mas era tratado pelos poetas populares como um “herói” por respeitar as famílias. A invencibilidade de Silvino terminou no dia 27 de novembro de 1914, quando ocorreu o seu último tiroteio com a polícia. Atingido no pulmão direito, conseguiu se refugiar na casa de um amigo e disse que ia se entregar. Da cadeia de Taquaritinga seguiu, dentro de uma rede, até a estação ferroviária de Caruaru, onde um trem especial da Great Western o levou para o Recife. Uma multidão o aguardava na Casa de Detenção, atual Casa da Cultura. Antonio Silvino tornou-se o detento número 1.122, condenado a 239 anos e oito meses de prisão. Em 4 de fevereiro de 1937, depois de vinte e três anos, dois meses e 18 dias de reclusão, foi indultado pelo presidente Getúlio Vargas. O ex-rei do cangaço morreu em 30 de julho de 1944, em Campina Grande, na casa de uma prima.
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Essa foto foi antes de RAÍ me proibir de chegar ao
menos perto da ladeira de Curralinho. Avisou que se eu chegar por lá,
imediatamente manda me deportar pro outro lado do rio, pras bandas do
Pontaleão.
Mas a culpa é de Belarmino, que inventou ter encontrado um documento
onde Raí é reconhecido como Régio Senhor do Rio e seus Arredores, El-Rey das
Beiradas e das Serras, Imperador das Águas e Guardião das Carrancas Perdidas.
Quer dizer, dono de tudo, de Curralinho e seus arredores. É por isso que RAÍ
faz da calçada da Igreja do Conselheiro um trono e vai repetindo: “Tudo isso é
meu, meu, meu...”.
E quem quiser ir até lá tem de pedir autorização com
antecedência. Menos eu, que estou perpetuamente proibido. E tudo isso porque
certa feita eu postei uma fotografia com ele correndo por medo de uma piaba. E
gritando: “Socorro, socorro, o tubarão quer me pegar!”.
Do acervo do escritor Luiz Serra, mas foi escrito pelo jornalista e compositor potiguar Nélson Freire.
Arraial
de Canudos não se rendeu Registro: Flávio Borges
(fotógrafo correspondente do Exército Brasileiro)
Na Feira
Internacional Literária de Parati, haverá neste mês merecido tributo ao
escritor maior da nacionalidade brasileira. Autor da monumental obra Os
Sertões, equivalente nacional d’Os Lusíadas em termos de recriação dos valores
humanos nacionais, abstraindo-se de teses antropológicas e atendo-se ao enfoque
na realidade indomada.
“Canudos não
se rendeu. Exemplo único em toda a história, resistiu até o esgotamento
completo”. (Os Sertões).
O autor de
Pedra do Reino, Ariano Suassuna, referiu-se a Euclides quando mencionou ter o
magno ensaio dos sertões entrado na cena do Brasil real, em contraste com o
Brasil oficial, da autoridade imperiosa, distante, e não equidistante.
Suassuna
externou que o “poeta maior da nacionalidade” foi Euclides da Cunha no livro
"Os Sertões". Deixou este registro:
“Eu vivo
dizendo, quem não entender Canudos, não entende o Brasil. Porque ali pela
primeira vez o Brasil real tentou se organizar, não da maneira que diziam a ele
como ele era. Tentou se organizar de maneira política, econômica, social... aí
o país oficial foi lá e cortou a cabeça na pessoa de Antonio Conselheiro. Ele
já tinha morrido de um estilhaço de granada... Eram cinco mil homens contra
quatro, no fim. Um velho, um adulto e duas crianças, que tinham escapado. Diante
de quem, como dizia Euclides da Cunha, rugiam as baionetas de cinco mil
soldados... Foi um exemplo único na história, não sobrou ninguém. Fizeram isso.
Nós fizemos isso”.
Antônio
Conselheiro no Arraial do Belo Monte de Canudos .No quadro a reparar aranhas e
cobras em modo metafórico ao discurso do beato de Canudos. Almiro Borges,
artista plástico, oriundo de Santa Luz, sertão da Bahia.
O prêmio Nobel
de Literatura Mario Vargas Llosa, no prólogo de seu Guerra do fim do mundo, com
base n’Os Sertões, assim enfeixou a tese:
.. “De um lado um catolicismo popular, de forte ênfase escatológica, algo
heterodoxo, liderado por um santo carismático, repudiado pela própria
autoridade eclesiástica. Do outro, a religião da República, do secularismo, do
progresso, do positivismo. Eram dois tipos de fanatismo incompatíveis e
mutuamente incompreensíveis. Nenhum dos lados dispunha de meios ou motivos para
sequer começar a compreender o outro”.
Feriu-se a
guerra de incompreensões naquele fim de mundo barbarizado. A meu ver a sorte
das tropas acuadas e trôpegas de Artur Oscar na Favela... foi em derradeiro
lanço trazida pelo general Savaget que chegou com cargueiros de víveres e
munições!
Estava salva a República!
FLIP 2019 - 10
de julho a 14 de julho de 2019
Local: Bourbon Music Festival Paraty, Paraty, Rio de Janeiro
Durante a FLIP
haverá debates temáticos em torno da obra maior, dos ensaios de Euclides e da
sua vida e a sua polêmica morte. Serão exibidos materiais e relíquias de suas
pesquisas, como o resgate de uma das cadernetas usadas pelo escritor para
anotar os apontamentos e fatos que consubstanciaram o grande enredo
cívico-histórico-social.
Vida: Euclides
Rodrigues Pimenta da Cunha Nasceu em Cantagalo, 20 de janeiro de 1866 e morreu
no Rio de Janeiro, 15 de agosto de 1909 aos 43 anos.
Antônio
Beatinho trouxe à tropa cerca de 400 mulheres, crianças e velhos, que não
suportavam vários dias sem água e comida. Sobreviventes de Canudos. Beatinho
teria sido levado à "poeira" (caatinga) e sido degolado. Refistro:
Flávio de Barros.
A razão da
morte ainda envolta em polêmicas, visto que a única testemunha o então cadete
Dilermano de Assis, que afirmou “ter reagido em duelo”, tese contestada. Ocorre
que “os tiros atingiram Euclides pelas costas”, e, noutra hipótese, que o
escritor “sempre andava armado desde o Acre, e teria ido para conversar sobre a
situação dos filhos”.
Os
Sertões. Andre Sandoval
Anunciam-se novas pesquisas acadêmicas em vista a sair do prelo; a controvérsia
do “Crime da Piedade” continua na lida investigatória de historiadores.
Importa fixar
a obra, sob pena de cerceamento de uma das mais importantes descritivas de um
povo no maior cenário abrasivo das
Texto reproduzido no Blog Ponto de Vista, do jornalista e compositor potiguar
Nélson Freire.
Os botos
cinzas (boto-tucuxi) estão rareando ao longo do alto Araguaia e em outros rios
da Amazônia.
Lembro-me de,
nos tempos das missões da FAB na Amazônia, década de 70, ao acamparmos à margem
do rio, ouvir incessante à noite o chio lamentoso e alto, com a rotina de
respiração dos botos, mamíferos aquáticos, que precisam subir à superfície da
água em busca de oxigênio.
Uma realidade:
os botos-cinzas estão sumindo em tantos lugares.
Uma
advertência preocupante: a população de botos-cinza ou tucuxi (Sotalia
fluviatilis) vem caindo pela metade a cada nove anos na Reserva Mamirauá, no
Amazonas, afirmam os cientistas.
Há vários
motivos: barcaças em travessia de comunidades, com o óleo que se esvai no
correr dos rios; o crescimento das cidades ribeirinhas; a pesca sem controle em
certas regiões, em que os pequenos peixes, alimentos dos botos, são vítimas da
pesca predatória.
Não há
descrição pior do que constatar que um divertido boto-cinza foi arpoado e
encontrado inerte à beira de um rio.
Mas há a
esperança de sempre, esa vindo do Rio Grande do Norte: os chamados golfinhos
tem sido tema de estudos há alguns anos pela UFRN, no Departamento de
Biociências, com a profa. Renata Sousa-Lima e a pesquisadora Nara Pavan Lopes,
examinando a “variação acústica nos botos-cinza”. No estudo em tela houve a
coleta e verificação de que no rio Potengi em estuários da Baía Formosa,
litoral sul potiguar, em maio de 2015, verificou-se a presença de cerca de 60 a
90 indivíduos da espécie. Ainda a confirmar se a positividade dos dados.
E o
boto-tucuxi (além do cor-de-rosa) também é folclore e cultura.
Na arte e na
cultura o boto-tucuxi é reverenciado nas festas do Amazon Fest todos os anos,
além dos terreiros das celebrações em povoados e aldeias ribeirinhas.
Ainda no
capítulo da pesca danosa ao meio ambiente, cabe ao ICMBio a fiscalização. A
invasão das comunidades, a pesca que denota haver mais peixes nessas áreas do
que noutras. E a salvação é a preservação do ambiente, para permitir a
reprodução das espécies. Que assim seja!
Resta-nos a
poesia da selva, como a de uma mato-grossense inspirada:
Desde pequena eu ouvia
Tuas estórias contar,
Veja só que ironia
Em banco se transformar.
Reaja, boto, reaja!
No rio volte a nadar.