Seguidores

segunda-feira, 6 de abril de 2020

O COMBATE DE MARANDUBA

Por Leonardo Ferraz Gominho
Obs: foto tirada na fazenda jaramataia

A perseguição continuou, enfrentando a força de Manuel Neto as mais difíceis privações, passando muita fome e sede. Ao final do ano, na segunda quinzena de dezembro de 1931, a volante voltou a Jatobá (Petrolândia) para ali passar as festas de final de ano. “Para entrar na localidade, foi preciso” esperar o “anoitecer, isto porque a força vinha quase despida.”Passadas as festas e refeitos, logo no início de janeiro Manuel Neto partiu à procura dos cangaceiros. Tomara conhecimento de que o grupo se encontrava na vila de Canindé (SE), “ferrando moças”. Requisitou o trem e seguiu para Piranhas. Atravessou o rio e entrou no território de Sergipe, indo dormir na sexta-feira, dia 8 de janeiro (1932), já perto dos cangaceiros.No dia seguinte continuaram rastejando, aproximando-se cada vez mais dos bandidos. Na vanguarda, o destacamento de Manuel Neto e, mais atrás, os homens sob o comando do tenente do Exército Liberato de Carvalho, na ocasião com o comando geral das forças.Seguiam na frente os sargentos João Cavalcanti e Hercílio de Souza Nogueira. O primeiro, por volta das 16 horas, avistou os cangaceiros. Pediu a Hercílio que não atirasse; esperasse a força encostar. Assim o ataque surtiria maior efeito. O bando estava bem posicionado, num local estratégico, nas proximidades da fazenda Maranduba.

Manoel Neto

Impetuoso, Hercílio respondeu que não esperaria por ninguém. Cada qual fizesse o que pudesse. Convidou o companheiro a ver quem avançava mais. Abriu fogo e partiu para cima dos bandidos que, de imediato, reagiram, disparando e avançando contra os dois sargentos e os companheiros que os seguiam. Já próximo do acampamento dos bandidos, Hercílio foi atingido e caiu.

- “Vala-me, Nossa Senhora. Logo na cabeça...” -, teriam sido suas últimas palavras.Ao seu lado tombou João Cavalcanti, ou João de Anísia, como era conhecido (Cavalcanti era, por sinal, primo do célebre Horácio Cavalcanti de Albuquerque). Tomando conhecimento da morte de Hercílio, Adalgiso, de apenas 15 anos de idade, abandonou o comando do tenente Liberato e correu ao encontro do irmão. Foi atingido, tombando morto sobre o corpo de Hercílio.

Seguiu-se o mais terrível combate travado no eixo Bahia-Sergipe, envolvendo as forças conjuntas e o bando de Lampião. Esclarece Billy Chandler (obra citada, p. 183) que, “embora o número de soldados ultrapassasse o dos cangaceiros na proporção de três para um (aproximadamente 100 soldados para 32 cangaceiros), foram eles quem mais sofreram”. O bando tinha bastante munição e a polícia não conseguiu boa posição para o ataque. “Liberato, em vez de flanquear os cangaceiros, imprudentemente tentou atirar por cima das cabeças de seus colegas pernambucanos. Em duas horas de combate, as perdas da polícia, tanto infligidas pelos cangaceiros como por seus próprios colegas, foram inúmeras. Pelo menos cinco soldados morreram na cena do combate; entre os doze ou mais feridos, diversos morreram mais tarde, a maior parte por falta de cuidados médicos.”

A batalha de Maranduba

De Nazaré, caiu morto também Antônio Benedito da Silva. E os cangaceiros, aparentemente, perderam quatro homens, dois dos quais no local da luta. “Contam que havia um outro tão ferido que Lampião, diante do seu sofrimento, matou-o a tiros.”João Lira (obra citada, p. 512) diz que Manuel Neto, mais tarde, lhe confidenciaria que “nunca tinha visto tanta bala como viu ali”, num “fogo cerrado de ambas as partes, misturados, sem haver recuo”, lutando-se por duas ou três horas com bandidos alcoolizados.

Comandante e delegado

A perseguição a Lampião não cessou. Manuel Neto continuou enfrentando os cangaceiros, destacando-se nos tiroteios da Baixa da Moça, Serra da Canabrava, Serra do Bobodó e do Ninho, e em Caldeirão (22.04.1932), aqui ao lado do tenente Abdon Menezes. Isso no eixo Bahia-Sergipe.Chandler (obra citada, p. 191) diz que, em 1932, os sertanejos baianos viviam aflitos com a presença dos bandidos e, muito mais, com a da polícia. E, de todas as volantes, os nazarenos, “sob o comando de Manuel Neto, eram os mais temidos. Perseguindo Lampião com um zelo fanático, empregavam qualquer método para obter informações”. E, à página 57: “Durante toda a sua carreira, Lampião encontrou poucas pessoas que se empenharam tanto a persegui-lo como esse grupo. Muitas vezes, outros o perseguiram de longe, temendo por suas vidas, enquanto outros podiam ser subornados. Mas os nazarenos, não. Caçaram-no em Pernambuco, Alagoas, Paraíba e Ceará, e quando, anos mais tarde, ele mudou seu centro de operações para Bahia e Sergipe, foram atrás dele lá”.

Em 1933, Manuel Neto distribuiu armas e munições com alguns fazendeiros e colocou pequenos destacamentos nos locais mais sujeitos aos ataques dos cangaceiros que, vindos da Bahia, “realizavam sanguinárias incursões em Pernambuco”.

Ainda como tenente, foi Comandante das Forças em Operação no Interior do Estado (PE), sendo então obrigado, devido à alta posição de comandante, a afastar-se do confronto direto com os bandidos. Entretanto, ainda haveria de enfrentá-los, como o fez em Porteiras, no município de Floresta, em 1935. Com o levante comunista daquele ano, o tenente instruiu seus comandados, fazendo-os voltar à sede das volantes para dali, sob seu comando, seguirem para o Recife a fim de dar combate aos comunistas e sufocar o movimento armado que eclodira.

A sua ação, sempre incisiva, ensejara-lhe a promoção a capitão, o que se verificou aos 3 de janeiro de 1936. E, aos 27 de fevereiro, recolheu-se das Forças em Operação no Interior do Estado, passando a prestar serviços na capital. Virgulino e seu bando fixara-se no eixo Bahia-Sergipe e diminuíra suas incursões em Pernambuco. Mesmo assim, Manuel Neto ainda continuou a realizar missões no interior, trabalhando de uma forma intensa e desgastante. Enfim, em dezembro de 1936, entrou em gozo de férias, benefício que não obtivera nos anos de 1929, 1930, 1932, 1934 e 1935, o que, por si só, demonstra o empenho do nazareno no combate ao banditismo.

Na capital pernambucana, comandou a 3ª, 2ª e 1ª Companhia do 1º Batalhão, assumindo interinamente por diversas vezes as funções de subcomandante daquele Batalhão. Ficou à frente do Esquadrão de Cavalaria de dezembro de 1938 a junho de 1940. Nesse período, foi louvado “pelo esforço e dedicação demonstrados durante a extinção do grande incêndio verificado num dos tanques da Standard Oil Company of Brazil”, ocasião em que se postou sempre ao lado do comandante Geral, “auxiliando em tudo que era possível, transmitindo ordens e colaborando para a manutenção da ordem pública”.

Mais tarde, ao deixar o Comando da Força, o Cel. Rogaciano agradeceu ao capitão Manuel Neto, louvando-lhe o “contingente de esforço dado a sua interinidade no Comando da Força.”

O último grupo de cangaceiros, o de Corisco, foi desbaratado naquele ano de 1940. Chegava ao fim uma luta em que os nazarenos se engajaram desde o princípio, e que levara à morte mais de quinze filhos do povoado e daquela região. Olhando para o primo Manuel Neto, Manoel Flor “achava espantoso que esse homem, ainda com balas no corpo e com tantas cicatrizes, tivesse sobrevivido”.

Manuel Neto, “espigado, de falar macio e andar cauteloso de gato do mato, cujo nome varava o Sertão como uma legenda de bravura” (Luís Cristóvão dos Santos, J. do Commércio - 02.12.82), participara de 35 combates e foi, sem dúvida, o maior perseguidor de Lampião. A sua atuação contra os bandidos deu-lhe oportunidade de mostrar qualidades nas missões mais difíceis, sempre a ele confiadas. “Sua peregrinação pelos sertões foi longa e vitoriosa”.

Lampião temia a sua volante: disciplinada, corajosa e guerreira. Quando avançava sobre os bandidos, não media sacrifícios, o que fazia Virgulino dizer que preferia brigar com ele, Manuel Neto, a brigar com Euclides Flor. E explicava: Euclides, além de valente, era cauteloso e hábil estrategista, procurava sempre deixar a salvo os seus companheiros e comandados. Manuel Neto “era doido”, costumava dizer Lampião. Partia para cima dos cangaceiros “feito cachorro azedo”, o que de certa forma facilitava a reação dos bandidos.

O bravo nazareno parecia desconhecer o significado da palavra medo. Parecia, apenas, pois poucos tinham, como ele, tanto medo... de alma! Tinha verdadeiro pavor pelas coisas do outro mundo.

Deixando, em 1940, o Comando do Esquadrão de Cavalaria, o capitão Manuel Neto voltou a comandar a 1ª Companhia, assumindo depois o cargo de Subcomandante Interino do 2º Batalhão, onde foi elogiado pelo comandante que realçou a “dedicação ao trabalho, o empenho em serviço, o amor à disciplina, traduzidos nas diversas modalidades e ainda mais no acatamento ao chefe; o dom da iniciativa e o espírito de corporação”.

A 19 de fevereiro de 1943, foi nomeado Delegado Regional da 11ª Zona Policial, com sede em Ouricuri. Ali permaneceu até o mês de setembro do mesmo ano. Voltou à capital e assumiu o Comando da 2ª Companhia e, no ano seguinte, novamente o Esquadrão de Cavalaria.

Aos 14 de dezembro de 1944, foi nomeado Delegado Regional da 8ª Região Policial, com sede em Sertânia, onde permaneceria até fevereiro de 1946. Nesse cargo, em março de 1945, recebeu elogio do C.el José Arnaldo: “Oficial de muito boa vontade. Rigoroso no cumprimento do dever”.

Em Sertânia, levaria um grande susto: no dia 5 ou 6 de junho de 1945, ao se dirigir a um preso, foi por ele alvejado no abdômen, tendo sido levado em estado grave para a cidade de Pesqueira, onde foi operado e passou a receber todos os cuidados médicos, restabelecendo-se, finalmente. Sete meses depois, foi promovido a major, por merecimento. Mas, em ato posterior, o Interventor Federal considerou sua promoção “por antigüidade.”

Em agosto de 1946, assumiu a Chefia da Assistência do Material e, mais uma vez, recebeu referências elogiosas: “Também é de justiça elogiar o major Manuel de Souza Neto, que vem de ser designado para a Chefia da Assistência do Material, pela dedicação em que se houve no exercício do comando do 3º B.C.. É o que faço com satisfação.”

E logo em setembro do mesmo ano, foi “louvado pelo esforço, dedicação e amor à Corporação, manifestado por ocasião dos treinamentos para a parada de 7 de setembro, concorrendo para o brilhantismo alcançado pela Força Policial de Pernambuco, pelo garbo, marcialidade e disciplina com que se apresentaram seus elementos em público.”

Ao final de 1947, entrou numa fase difícil de sua vida, afastando-se do trabalho por um ano, para tratamento de saúde. Em novembro de 1948, foi operado e desligado do serviço por mais um ano. Finalmente, aos 27 de outubro de 1949, foi transferido, a pedido, para o Quadro Suplementar.

PREFEITO

Na década de 1950, com o apoio do líder político João Inocêncio, o coronel Manuel Neto foi eleito prefeito de Ibimirim, passando a fazer uma administração responsável. Deixando a prefeitura, passou a viver exclusivamente de sua aposentadoria. Nasceu pobre e morreu pobre, nada deixando para a família.

Calado, introspectivo, não deixava transparecer o homem valente que era. Dificilmente falava sobre suas lutas contra o banditismo. Achava que isso poderia influenciar ou estimular negativamente os jovens.

Com a avançada idade de 78 anos, faleceu às 7 horas e 45 minutos do dia 3 de novembro de 1979, no Hospital da Polícia Militar, no Derby (Recife). Seu corpo foi levado para sua terra natal, sendo sepultado no cemitério de Nazaré.

Morreu solteiro. “Quando se perguntava por que não casava, respondia que era um homem de intrigas e que vivia sujeito” a ser morto “a qualquer momento”. E assim fugia ao casamento. Mas deixou pelo menos dois filhos com Otacília Gomes de Sá:

1º - Margarida Siqueira Campos - Casada, deixa oito filhos.

2º - Manoel Gomes de Souza - Casou-se com Josefa Ester de Araújo. Deixa onze filhos: Maria Cícera Araújo Souza Marques (casada com Rinaldo Leite Marques de Sá, é a mãe de Raniere, de Krausia e de Rinaldo Júnior), João Gomes de Araújo, Sandra Araújo Souza Torres, Olga Maria Gomes Araújo Pires (mãe de Washington e de Letícia), Margarida Gomes Araújo, Filomena Gomes de Araújo, Carlos Vital Gomes de Souza, José Gomes Araújo, Francisca Araújo Gomes Nunes, Emílio Gomes de Souza e Maria das Dores Araújo Souza.


http://blogdomendesemendes.blogspot.com

TENENTE JOÃO BEZERRA DA SILVA E ESPOSA CYRA BRITTO


O SILÊNCIO DAS PROCISSÕES

Clerisvaldo B. Chagas, 6 de abril de 2020
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 2.287
IGREJA DE SÃO PEDRO. (FOTO: B. CHAGAS/LIVRO 230).

Padre Cirilo no comando, sacristão Jaime batendo a matraca e o longo cortejo sem fim, pela Rua Antônio Tavares. Respeito absoluto de Santana do Ipanema à Semana Santa em lutos milenares nos corações santanenses. Cântico tradicionais, imagens isoladas no roxo, rio triste e calado, na areia, nas águas, nas pedras... Um vácuo no mundo. Na prévia das casas o bacalhau, o peixe, coco, bredo,  beldroega e sentimento tocando à culinária. Vestido comprido, tule preto, cabeça descoberta, homens e mulheres comovidos na procissão transbordante de amor. A multidão se arrasta pelas ruas, praças e avenidas sobre o barro, sobre pedras quadriculadas. Charolas navegam naquele mar de gente entre calçados ricos e pés descalços.
Tocadas pelo temor e a cautela do novo assassino do planeta, as aglomerações retiram-se das vias citadinas. Esvaziam-se templos e logradouros numa transmutação do físico para o abstrato, dos edifícios para os sentimentos, da terra para o espaço onde moram as entidades. O homem confinado reflete e se refugia no destemor do espírito fortalecido. Roga por trás dos ramos caseiros do Domingo; na lembrança fugidia do Encontro da Quarta; e chora recolhido com a tragédia da Sexta. Não têm hinos, não ecoam as matracas, não têm os pés lavados, mas bate dentro de si um primitivo e forte sentimento das dores do Senhor dos Mundos. O ar é o mesmo, os pássaros da liberdade cantam para os recolhidos por trás das paredes, dos luzidios e metálicos portões do confinamento.
De nova maneira, a Terra vira tristeza. E pela primeira vez em décadas, não tem Semana Santa... Mas tem Semana Santa no coração que pulsa nos tecidos magnânimos. Não se enchem as ruas, mas se enchem a pele, a carne, os nervos no temor e no amor divino. Novamente as remembranças fazem desfilar um longo cordão de humanos nas vielas, nos becos, nas avenidas nos mesmos propósitos divinais da mente libertária.
Vamos fazendo em casa a Igreja do Deus Vivo.
Os templos estão dentro de nós.
Ontem foi domingo de Ramos, abrindo a Semana Santa, mas  nunca sairá do peito amoroso o ruído ou o SILÊNCIO DAS PROCISSÕES.


http://blogdomendesemendes.blogspot.com

GOSTAR DE CASA

*Rangel Alves da Costa

Por mais estranho que possa parecer, mas a saudade do cafezinho chega mesmo quando a gente não está muito distante dele. Basta olhar pra cozinha, pro fogão, pra garrafa ou xícara. Ou basta que o relógio biológico sinalize que já chegou de mais um cafezinho.
Mas não somente o cafezinho causa saudade. A gente se acostuma de tal modo ao que é nosso, ao que tem gosto de casa, que nada de lá fora parece ter sabor igual. A comida pode ser chique, de nome estrambólico, mas a nossa, mesmo aquela simples e de quase todo dia, sempre melhor.
É sempre assim: quando a gente está distante ou por momentos se afastou daquilo que tanto gosta, então a real valorização chega em forma de saudade grande, de desejo de ter novamente, de nunca mais se afastar. Acontece sempre comigo.
Quando viajo por alguns dias e mesmo estando entre amigos, mesmo sem um só instante que não haja alegria, festividade e compartilhamento, mesmo com os prazeres do conhecimento do novo e da sabedoria alcançada, ainda assim sempre bate uma saudade danada de casa.
Ora, quem ama nunca afasta do pensamento aquilo que tanto tem e tanto quer. É como se água mineral nunca matasse a sede, nunca suprisse a água com gosto de barro da moringa e do pote. É como se o café encorpado, perfumado e diferenciado na mistura, jamais pudesse ter melhor aroma e sabor que o café da cozinha de casa.
É como se a comida - por mais diversificada e bonita que seja - nunca consiga ter o mesmo gosto e prazer daquela tão conhecida e apreciada no dia a dia da vida. É como se a cama fosse dura demais, o banheiro estranho demais, a porta de entrar e sair não deixasse entrar nem sair do mesmo modo que aquela da costumeira moradia.
Um povo amigo em reencontro, as palavras novas surgindo de boca em boca, os abraços e os carinhos por todo lugar, os olhares que sorriem a cada encontro, mas mesmo assim sempre diferente do encontro com o conterrâneo, com o povo do meu lugar, com João, Zabé, Aristarco, Gerúsia...
Com aquela esquina, com aquela praça sem praça e sem banco de praça, com Dona Maria de Lenço na cabeça e Seu João Berdoega passando o cigarro de fumo nos beiços. Quanta estranheza há entre o vasto mundo e o mundo que é meu, o seu, o de cada um!
E se vai de avião, então dá vontade de ser passarinho e voejar ligeiro para o doce e afetuoso ninho. E se vai de carro, logo dá vontade de sair correndo e fazer o caminho de volta. E se vai pra ficar três ou quatro dias, então as horas e os segundos passam a ser contados na palma da mão. Por que assim acontece?
Não por que o local visitado seja ruim, não por que os amigos reencontrados não trouxessem alegria e satisfação, mas simplesmente pelo fato de que é na nossa casa, seja de tijolo e cimento ou no cipó e barro, que nos completamos de alma e coração.
É na nossa casa que sabemos onde estão espalhadas todas as nossas páginas de vida. E as juntamos para verdadeiramente ser o que somos. E as escrevemos para que os outros não rabisquem nem falseiem as linhas de nossa história.
E somente na nossa casa, que é a moradia e a terra, que é a porta e o chão, é que nos sentimos assim: livres, grandes, passarinhos, donos do nosso destino.

Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

NO COLÉGIO DAS FREIRAS


Por Inalda Cabral Rocha

Chegamos no colégio, na verdade, Ginásio Sagrado Coração de Maria, mas até hoje conhecido por Colégio das Freiras.

A diretora era uma jovem freira portuguesa, cujo nome não me lembro mais. Diziam que ela era muito educada e as alunas nunca seriam apresentadas a ela.

Estudei com Guió em regime de externato até 1941, quando no ano seguinte padrinho Chico resolveu nos internar. Acho que ele tomou a decisão porque no final do ano resolvi levar, escondido na farda, um dos romances que encontrei nos livros dele, chamava-se História de João e Mariquinha.

Uma coisa proibitiva para minha idade, mas consegui ler. Era a estória de um rapaz rico, João, com uma menina pobre, a Mariquinha. João morria e o so-gro ficava feliz porque agora seria um homem rico. Não havia nada demais, além disso.

A prefeita do colégio, irmã Iracema, me pe-gou em flagrante com as amigas lendo o livro e cha-mou padrinho Chico que não gostou. Ele voltou para casa com o livro embaixo do braço e só disse isso:

- Olhe, Inalda, no dia primeiro de dezembro, você irá para Fortaleza passar as férias.

Adelzira precisava se operar de apendicite em Fortaleza e ele garantiu a mamãe que confiava em mim. Eu iria tomar conta de Adelzira. Éramos hóspedes de Raimundo ‘Mundico’ Fernandes e dona Leonor Hoyos Fernandes, uma peruana, que moravam numa mansão na avenida Barão de Aracati, na Aldeota. Na porta ha-via uma placa Éramos Seis, pois eram pais de seis mo-ças. Mundico era irmão de seu Ezequiel Fernandes.

Quando iniciou o ano letivo de 1942, padrinho Chico disse-me:

- Inalda, você só fala em ser freira. Precisa conhecer o reverso da medalha. Vou lhe internar com Guiomar, para você não namorar e ter educação do-méstica.

Foi a maior satisfação da minha vida, quando recebi essa notícia. Achei ótimo e me abracei a ele. Não havia cumprimentos de beijos naquele tempo.

Para ser internada naquele tempo padrinho Chico teve que comprar o enxoval que era:

- duas camas

- quatro lençóis

- dois travesseiros

- material de higiene

- duas fardas para cada: uma de gala branca, com chapéu branco, para as festas de gala, como desfi-les escolares nos dias 7 e 30 de setembro;
- quatro pares de meias compridas, acima do joelho;

Fui matriculada no último ano ginasial, o que corresponde hoje a 8ª. série. Uma professora portugue-sa, Carmelinda, ao final da primeira aula disse:

- Inalda, você não pode estudar nessa série porque não dá para acompanhar.

Não me conformei e disse que dava para acompanhar muito bem aquela série, que queria estudar com minha irmã Guiomar. Sem querer eu já estava começando a mandar no colégio. Irmã Carmelinda mandou retornar à tarde para fazer trabalhos manuais.

Na época o colégio aceitava alunos do sexo masculino, pequenos.

Achei o ambiente maravilhoso, mas um meni-no fez um barulho na sala de aula. Irmã Carmelinda tirou o sapato e bateu no bumbum dele. Eu que tinha pânico de pêia, fiquei horrorizada e achei o colégio pior, pois deduzi que sapato doía mais do que palmatória.

Os trabalhos manuais consistiam em fazer al-mofadas de veludo e pano de mesa, com linhas que vinham da Ilha da Madeira. Era o que as freiras diziam. Aprendi e ainda sei o ponto Paris.

Tinha aula de música, lecionada por irmã Io-landa, uma freira baiana. Um dia ela me perguntou se não queria ser freira, pois tinha notado que eu vivia re-zando na capela. Falou que tinha uma coisa para ocu-par o meu tempo. Estava selecionando um grupo de meninas para formar o coro. Eu participaria das festas de gala do colégio. Para isso teria que ter duas fardas: a farda normal, de saia azul, mangas compridas, cheia de botões. A farda de gala, era saia e blusa, tudo branco.

Eu muito curiosa e sonhando com a vida de freira, perguntei se era fácil ser freira. Ela disse que meu pai teria pagar seis contos de réis e teria que ir para Por-tugal. Gostei da idéia porque era um meio de conhecer de perto Nossa Senhora de Fátima, que apareceu a Francisco, Lucia e Jacinta.

Cheguei em casa e contei a Chico Cabral que estava muito contente com o colégio. Ele me prometeu se eu aprendesse piano, comprava um para mim. Que-ria também que aprendesse pintura. Mas me advertiu:

- Tenha cuidado com essa freira da Bahia, pois você anda conversando muito com ela e na Bahia só tem feitiço.

Respondi:

- Ah! Sabe, padrinho Chico? Eu perguntei: tem feitiço na Bahia? Ela disse: Tem, Inalda! Eu mesma vi. Já vi moça dar bolo para rapaz comer e ele se apaixonar por ela.


http://blogdomendesemendes.blogspot.com

UM CIVILIZADOR NO CARIRI - PARTE DOIS

Por Bruno Yacub Sampaio Cabral

Para lembrarmos dos 80 anos de falecimento do primeiro chefe político e o gestor municipal de maior duração na história de Brejo Santo, A Munganga Promoção Cultural disponibiliza para os leitores, o texto "Um Civilizador no Cariri", de autoria do Padre Antônio Gomes de Araújo e publicado na revista A Província; Ano 3; N° 3; em 7 de julho de 1955; Crato - Ceará; págs. 127 a 146. O texto será dividido em três partes.

CORONEL BASÍLIO GOMES DA SILVA
80 ANOS DE FALECIMENTO

08.04.1940
08.04.2020

UM CIVILIZADOR NO CARIRI
PARTE DOIS

O CONSELHO DE INTENDENTES

Os membros do Conselho de Intendência da nova vila, Basílio Gomes indicou-os à nomeação governamental, e, todos, foram nomeados: Lourenço Gomes Silva, seu irmão; Benevenuto Bezerra da Paixão, seu primo e genro; José Florentino de Araújo, seu compadre e sogro de um de seus filhos; José Nicodemos da Silva, meu pai, e José Moreira Tavares, seu compadre, a quem fez tabelião, o primeiro do novo município.

No dia cinco de novembro de 1890, em sessão extraordinária, presente Basílio Gomes na qualidade de chefe politico do município, aqueles Intendentes inauguraram a Vila, por intermédio do intendente Lourenço Gomes da Silva, antes eleito chefe do executivo pelos seus pares.

Ata da Inauguração da nova Vila de Brejo dos Santos, como abaixo se declara:

“Aos cincos dias do mês de novembro do anno de mil oitocentos e noventa, na Sala das Sessões desta Casa, destinada para a realização das sessões do Conselho de Intendência municipal desta Villa de Brejo dos Santos, creada por decreto do Governador do Estado, coronel Luiz Antônio Ferraz, número quarenta e nove (49), de vinte e seis de agosto do corrente anno, ás dez horas da manhã, presentes os Intendentes Lourenço Gomes da Silva, Benevenuto Bezerra da Paixão, José Florentino de Araújo Lima e José Moreira Tavares, nomeados por acto do Governador do Estado, de vinte seis de Agosto, também do corrente anno, e, todos, juramentados perante o Conselho de Intendência Municipal da Villa de Porteiras, da qual foi esta Villa desmembrada, por aclamação foi escolhido o intendente presidente do Conselho, o intendente, cidadão Lourenço Gomes da Silva, qual, após, tomou assento à cabaceira da mesa e convidou para exercer as funções de secretário, ao intendente, cidadão José Moreira Tavares, o qual, assumindo o cargo, tomou seu respectivo logar. Em seguida. declarou o presidente, que, havendo número legal de intendentes, declara aberta a sessão. Então declarou inaugurada a municipalidade desta Villa, e que se lavrassem ofícios de participação da presente sessão ao Exmo. Governador do Estado; ao Conselho de Intendência Municipal de Porteiras, ao Doutor Juiz de Direito da Comarca e as autoridades e empregados públicos, aqui, existentes, da antiga Municipalidade, Para conhecimento de todos, lavrou-se a presente Acta. Determinou-se o dia seguinte para a instalação da primeira sessão ordinária do mesmo Conselho. Ordenou o Presidente, que se extraísse uma cópia da Acta e se remetesse ao Doutor Juiz de Direito da Comarca, para os devidos fins, e outra, para ser afixada em parte da Casa deste Conselho, para conhecimento dos povos deste Município. Do que, para constar, lavrei a presente Acta. José Moreira Tavares, servindo de Secretário, a escrevi. Sala das Sessões do Conselho da Intendência de Brejo dos Santos, 5 de Novembro de 1890. Segundo Anno da Republica - Lourenço Gomes da Silva, 1° Presidente; Benevenuto Bezerra da Paixão; José Florentino de Araújo Lima; José Moreira Tavares.” (Extraído do Livro de Lançamentos das Actas das Sessões do Conselho de Intendência da Villa de Brejo dos Santos, fls. 1 e 2).

O ADMINISTRADOR

Basílio Gomes fundou, e dirigiu até 1912, a secção brejo-santense do Partido Republicano Cearense, também vulgarmente chamado Partido Aciolino, alusão ao supremo chefe estadual dessa agremiação partidária, o governador Antônio Pinto Nogueira Acioly.

Eleita a primeira Câmara de Vereadores em 1892 sob a influência decisiva do Patriarca, nela predominaram desde então, elementos a ele ligados, por parentesco, oligarquia que não degenerou nos males, a que a instituição conduz graças ao espirito de Basílio Gomes, que conciliava a autoridade com a liberdade, quanto o permitiam as circunstâncias do meio e da época.

Nomeado chefe do executivo municipal em 1896, cargo que já vinha exercendo desde 1893 por escolha dos intendentes, seus pares, manteve-se neste posto até 1909, inclusive.

Estando tudo por fazer, foi esse, o período CRUCIAL da administração do município, o da construção. Apoucadíssimas, as rendas orçamentárias. O orçamento de 1891, por exemplo, consignou a receita de dois contos, setecentos e noventa mil réis, e a arrecadação somou apenas a quantia de seiscentos mil réis! Ainda, em 1908, a receita não ultrapassou um conto, quinhentos e cinquenta mil réis.

Forrado da estrutura de administrador, expressa em iniciativas rasgadas, ação fecunda e honestidade catiônica e profundo espírito público, Basílio Gomes impôs-se á confiança de seus munícipes.

No afio de 1898 esboçou o primeiro código de posturas do município. Apresentado à Câmara Municipal em forma de projeto, discutido e aprovado, ele o promulgou no dia onze de novembro desse ano.

A 14 de junho do ano mencionado, a Câmara Municipal aprovou esta moção: “Paço da Câmara Municipal da Villa de Brejo dos Santos em 14 de Junho de 1898. Ilmo. Sr. Tenente Coronel Basílio Gomes da Silva, M. D. Intendente deste Município. A Câmara Municipal desta Villa, reunida, hoje, em sessão extraordinária, votou, sob proposta de seu Presidente, a moção seguinte: A Câmara Municipal, jubilosa pela maneira por que têm sido mantidos a administração e serviços públicos da mesma Câmara a cargo de V.S. ª. como Intendente deste Município, cargo que V.S. ª. tem desempenhado com probidade e acrisolado patriotismo, esta Câmara aproveita a ocasião para reiterar a V.S. ª. a mais sincera solidariedade, reconhecendo-o como chefe prestimoso do Partido Republicano deste Município, cuja duração, há muito, está a cargo de V.S. ª.. Pelos seus relevantes serviços prestados á causa pública, tem V.S. ª. aberto novos horizontes ao engrandecimento e prosperidade do mesmo Partido, que tão honradamente V.S. ª. dirige, de perfeita solidariedade com o Exmo. Sr. Doutor Nogueira Acioli, chefe do Partido Republicano Cearense - Saúde e Fraternidade. João Pereira da Silva, Manuel da Silva Bastos; Manuel Inácio dos Santos”.

Em data de 23.07.1903, a Câmara Municipal, em outra moção, congratula-se com o Intendente. O documento referiu a probidade que marcava a administração municipal, o trato das finanças e a aplicação dos dinheiros públicos. Enumerou, entre outras, as seguintes realizações: construção da Cadeia Pública, do Quartel da Policia, a edificação (em andamento) dum prédio destinado ao funcionamento do executivo municipal, da Câmara dos Vereadores e da Pretória. A moção traz a assinatura dos seguintes vereadores: João Inácio de Lucena, presidente; João Antônio de Moura, Pedro Bento de Figueiredo, Jerônimo Alves da Costa. Eram realizações à base de rendas que continuaram magras, pois o orçamento de 1904 consignou uma receita de apenas um conto, seiscentos e vinte réis.

Aos vinte de novembro de mil de novecentos e três, Basílio Gomes compareceu à Câmara Municipal, então reunida em sessão extraordinária, leu uma mensagem relacionada com a gestão municipal desse ano, numa franca prestação de contas. Comunica, por exemplo, a conclusão do edifício destinado à Câmara Municipal, dotado de todos os móveis, encravado na Praça da Matriz, com duas portas de frente, quatro janelas de oitão, rodeado de calçadas, e com três mesas envernizadas, uma estante, cadeiras de palhinha, etc. (Declara a ata dessa sessão magna que os serviços de construção foram administrados pessoalmente pelo intendente Municipal, e consumiram um conto, oitocentos e oitenta mil, duzentos e sessenta réis).

Terminada a leitura, ou da mensagem, entregando o prédio à Câmara, ato logo, pregado em alta voz pelo Porteiro das Audiências. Determinou o Presidente, que se extraísse cópia dessa ata inaugural para publicação, ata assinada pelos vereadores: Joaquim Gomes da Silva, presidente da Câmara; João Inácio de Lucena, Manuel da Silva Bastos, (citado); Jerônimo Alves da Costa; José Tavares Moreira, já referido; José Leite de Moura e Pedro Bento de Figueiredo.

Assina-a, por igual, Basílio Gomes.

Como um exemplo, a mais, do sentido do espírito público, que animava o Patriarca, transcrevemos a sua mensagem à Câmara, pessoalmente lida, no dia 29 de julho de 1907, comunicando a constituição do patrimônio do Município: “Senhores Vereadores. Para que a Câmara adquirisse um patrimônio em bens de raiz, que assegurasse o seu futuro, tratei de tomar medidas, as mais eficazes, a fim de economizar, quanto possível, os rendimentos da mesma Câmara nestes três últimos exercícios financeiros, conseguindo, com isso, acumular um pecúlio de 868,000 (oitocentos e sessenta e oito mil réis), restantes dos saldos da receita e despesas dos ditos exercícios, capital que se acha empregado nas seguintes propriedades: uma casa de tijolo e telha com duas portas de frente, armação de loja e balcão, e fundo correspondente na Praça do Comércio desta Vila; 4 ditas de porta e janela de frente, à rua Coronel Ferraz; 1 dita com uma porta de frente e outra na traseira, assoalhada, na mesma rua Coronel Ferraz no Comércio Velho; mais uma armação de loja com balcão avulso. Além de duas casas anteriormente adquiridas por esta Câmara, juntar-se-ão seis prédios que atualmente constituem o patrimônio municipal. Senhores Vereadores! Não é com finanças lisonjeiras que, no Caráter de Chefe do Poder Executivo Municipal, tenho levado avante essas realizações, e, sim, por certa economia, posta em prática no intuito de dotar nosso Município de um patrimônio garantido em bens de raiz, cujo resultado, não padece dúvida, entrará, muito breve, no orçamento do mesmo. Os referidos prédios acham-se devidamente documentados por meio de escrituras públicas na conformidade da lei. Em conclusão, peço a vossa aprovação para os actos por mim praticados, diante dos fundamentos expendidos”.

Texto do ato de aprovação dessa mensagem: "A Câmara Municipal, considerando, patrióticos, os atos do Intendente, resolve aprovar o relatório apresentado pelo mesmo, em toda a sua plenitude, para consignar, na presente Acta, um voto de louvor ao Coronel Intendente Municipal, que tem imprimido aos negócios do Município, boa orientação - Antônio Gomes de Santana, João Pereira da Silva, José Tavares Moreira, Antônio da Silva Bastos, João Antônio de Moura, Pedro Bento de Figueiredo, José Leite de Moura".

Aquele patrimônio não mais se ampliou desde 1909, ano em que o coronel Basílio deixou definitivamente o executivo municipal, para continuar incontrastável, como antes, na chefia política de sua comuna. Não se ampliou o patrimônio, senão há poucos anos. O prédio da Prefeitura continua o mesmo, apenas acrescido de um andar, apoucado e feio.

FLEXIBILIDADE

Basílio Gomes não considerava monopólio individual ou dum grupo, a atividade política ou administrativa. Se foi o supremo chefe político de sua terra por meio século (a partir de 1876, data da criação do distrito), e chefe do executivo municipal de 1893 a 1909, pelos seus excepcionais predicados de guia e comando, os quais o impuseram ao meio brejo-santense, que teve, nele, a encarnação do espírito público em ação permanente e fecunda. Exceção feita das famílias Martins e Cardoso, que, isoladas em suas fazendas de criar, conservaram-se à margem da política e administrativa do município e de seu progresso urbano - todas as demais famílias categorizadas participavam daquela vida: os Lucenas, os Mouras, os Araújo Lima, tudo sem sombra autoritarismo do chefe.

Já referi como o Patriarca transitou do regime monárquico para o republicano, inspirado pelo seu bom senso e senso político sensível ao curso dos acontecimentos.

Em 1909, seu amigo e correligionário, já, então, prestigioso elemento político local. Manuel Inácio de Lucena, manifestou desejo de ocupar a direção do executivo municipal. Basílio Gomes se antecipou a qualquer atitude concreta do amigo e lhe cedeu a Intendência. E passou a apoiá-lo.

Politico e administrador por vocação, educação e destino, não o empolgava, entretanto, a volúpia do poder. Acima de todas as solicitações, colocava a grandeza da comunidade brejo-santense.

Por força dessa elevação moral, Brejo Santo gozou dos benefícios da paz entre seus filhos, enquanto o Patriarca influenciou decisivamente em seus destinos políticos e sociais.

Ainda por força de sua envergadura moral e politica, mais moral do que politica, Basílio Gomes desfrutava de justo e autêntico prestígio, junto a outros chefes políticos do Cariri, seus correligionários, ou não. Conjurou mais de um choque armado entre eles.

A Crato, onde presidiu algumas eleições a convite do coronel José Belém, a Crato se transportou quando esse chefe politico preparava-se para resistir ao coronel Antônio Luiz, que se apresentava para arrebatar-lhe o poder municipal pela força, costume, então, adotado, no Cariri, onde, na época, se conquistavam, vezes muitas, a chefia local e o poder executivo municipal, à mão armada, conquista, logo sancionada pelo Governador Acioli, homem do fato consumado. Tentou, em vão, convencer ao compadre e amigo, a que cedesse ao império das circunstancias, entregando o poder ao Cel. Nelson da Franca Alencar, seu correligionário. E finalizou a démarche com estas palavras realísticas: “Você, Zebelém, se arrependerá. Saiba que politica não é bem de raiz”. E quinze dias depois, as armas de Antônio Luiz depuseram José Belém.

Essa flexibilidade democrática valeu-lhe haver presidido a mais de assembleia particular, de chefes políticos caririenses, face à confiança que nele depositavam impressionados com a estatura moral correligionário, tão rigidamente pacifista a ponto de nem sequer admitia um morador de suas terras na posse de um clavinote, exceção, nesta zona, naqueles escuros. A propósito, escreveu o padre Leopoldo Fernandes ex-vigário de Brejo Santo, referindo-se à ação pacificadora do Patriarca naquela comuna caririense: “Quando tudo parecia converter-se em sangrenta deflagração, surgia a figura simpática e enérgica do coronel Basílio, e apenas com a sua autoridade moral, conseguia o desarmamento de todos e a consequente tranquilidade da população”.

Foram correligionários e contemporâneos do Patriarca de Brejo Santo, os seguintes chefes políticos do Cariri, entre outros: Dr. Antônio Augusto de Araújo Lima e Domingos Furtado Leite, em Milagres; Raimundo Cardoso dos Santos (Porteiras); Joaquim Alves Rocha, Romão Sampaio Filgueiras e José de Anchieta Gondim (Jardim); Antonio Róseo Jamacaru e Antônio Joaquim de Santana (Missão Velha); Manuel Ribeiro da Costa, Antônio Pereira Pinto e João Raimundo Macêdo (Joca do Brejão) (Barbalha); José Belém de Figueiredo e Antônio Luiz Alves Pequeno (Crato); padre Cícero Romão Batista e Floro Bartolomeu da Costa (Juazeiro do Norte); Roque Pereira de Alencar (Santana do Cariri) e Pe. Augusto Barbosa de Menezes (Caririaçu).

Continua.

O Brejo é Isso!

Por Bruno Yacub Sampaio Cabral

A Munganga Promoção Cultural

Extraído do texto "Um Civilizador do Cariri"; do Padre Antônio Gomes de Araújo; publicado na revista A Província; Ano 3; N° 3; em 7 de julho de 1955; Crato - Ceará; págs. 127 a 146.

Clique e veja todas as fotos:


http://blogodmendesemendes.blogspot.com

O CANGACEIRO ARVOREDO


Cangaceiro Arvoredo, que a população local e os demais cangaceiros chamavam "Alvoredo", tinha por nome Hortêncio Gomes da Costa. Também ficou conhecido, por assim se identificar, como Hortêncio Gomes da Silva, Hortêncio Gomes de Lima, José Lima e José Lima de Sá.
.
Depoimento de "Arvoredo", quando preso. 1927, copiado em extrato em inquérito policial de 1929:

José Lima, (que é o mesmo Hortencio Gomes de Lima ou José Lima de Sá, vulgo “Arvoredo”) estava;em Juazeiro, onde foi preso a pedido da autoridade policial de Jaguarary, alli;chegou a 5 sendo ouvido em auto de perguntas. Declarou “ser filho de Faustino Gomes, vulgo “Banzé” e Maria de Jesus, natural de “Salgado do Melão”; que dalli partiu;com destino a São Paulo, encontrando–se em Varzea da Ema com João de Souza,;(Cicero Vieira Noia) seu conhecido e João Baptista (que é o mesmo Christino ou “Curisco”); que em caminho se encontraram com Manuel Francellino, vindo em sua;companhia para Jaguarary, pernoitado em casa delle os tres; que moraram cerca de oito dias em casa de Antonio Piahy, até que alugaram uma casa a Demosthenes Barboza, por intermedio de João Baptista, seguindo na terça feira, 30 de Agosto para Juazeiro, a negocios, sendo alli preso na sexta feira ultima, dois do corrente; que antes de chegar á “Santa Rosa” com seus companheiros de viagem, o de nome João Baptista propoz para todos mudar de nome, ficando o depoente com o de Jose Lima, lembrando–se tambem que depois de se acharem nesta Villa, com João Baptista e João de Souza ou Cicero, foram á cidade de Bomfim, alli se hospedando na pensão de Piroca, por indicação do cel. Alfredo Barboza; que pretende não se juntar mais com João Baptista e João de Souza, caso se encontre ainda com os mesmos, pretende se retirar desta Villa depois de pagar o que deve ao senhor coronel Alfredo Barbosa”. (fls.208–210).
De depoimento da mãe de "Arvoredo", colhido em inquérito policial, em 1929:

"Maria de Jesus e tambem da Conceição, mulher de Faustino Gomes da Costa (“Banzé”) ou “Pae Velho”, do grupo de “Lampeão) foi ouvida nesta mesma data e affirmou que ha tres mezes reside em “Olhos d’Agua”; que o apellido de “Arvoredo” foi posto em Hortencio por seus irmãos, quando era pequeno; que tem cinco filhos – Hortencio, Ambrosio, Raphael, Sylvestre e Manoel, vulgo “pé de meia”, os quais têm sobrenome de Gomes da Costa que Hortencio tem, alem deste nome, o de José Lima; que seu filho “Arvoredo” acompanha “Lampeão”, por ser amigo de infancia de Christino, conhecido por João Baptista da Silva, vulgo “Corisco”; que João Baptista é filho de Firmina, empregada na fabrica de linhas da Pedra, Estado de Alagoas e Manoel de tal, já fallecido, na Matinha de Agua Branca, com parentes residentes na fazenda “Sitio”, de Salgado do Melão."

Como referência não tanto inédita, mas completamente esquecida no estudo do Cangaço, ressurge aqui informação de que Pae Velho, o cangaceiro que morreu junto com Mariano e Pavão (que na foto abaixo aparece equivocadamente denominado Zeppelin), era pai do também cangaceiro Arvoredo.

Outro ponto discutido é se "Arvoredo" e "Corisco" eram primos.

Estes trechos, tirados de inquérito policial com o depoimento de dois dos irmãos de "Arvoredo", confirmam este ponto:

"Declararam, então Raphael Gomes da Costa, filho de Faustino Gomes da Costa e Maria de Jesus que: “seu pae é criminoso em Santo Antonio da Gloria; que seu pae ha pouco chegou em Salgado do Melão devido á perseguição da força contra o mesmo; que no grupo denominado “Lampeão” tem os parentes Hortencio Gomes de Lima ou José Lima de Sá, vulgo “Arvoredo”, irmão do depoente, e Christino de tal, vulgo “Curisco”, ex soldado da policia de Sergipe, primo do depoente; que o grupo de “Lampeão” ha cerca de um mez fôra visto no “Serrote da Macambira”, de Santo Antonio da Gloria, com destino a Sergipe, de cujo grupo constavam entre outros, “Lampeão”, Curiscu, Arvoredo, o menino conhecido por “Volta Secca” e outros; que “Arvoredo”, seu irmão, já lhe escreveu por duas vezes e mandou recado convidando o respondente a fazer parte do bando “Lampeão” que tambem já mandou fazer esse convite. Perguntado que respostas deu a esse convite, respondeu que por hora ainda não decidiu nada.”

José Gomes da Costa fez quase identicas declarações, referindo tambem que recebera convite de “Arvoredo” e “Lampeão” para fazer parte do seu bando, não tendo ainda resolvido nada a respeito."

Arvoredo morreu em 26 de maio de 1934, na serra, próximo à estação ferroviária da Barrinha, por então conhecida como Angicos.

Os dois matadores foram Cícero José Ferreira, o Xisto, que nasceu em 1911, e João Biana da Silva, que nasceu em 1913.

Uma imagem cuja dificuldade para conseguir foi grande, mas, graças ao senhor Raimundo, de Jaguarari, ex-cunhado de João Biano, e a gentileza imensa da filha e do filho deste valente matador de Arvoredo, aqui a única foto existente... de João Biano:
.
Muito chamado por "João Biana" é uma alteração posterior ao evento da morte de Arvoredo.

O nome correto é João Biano da Silva.

No texto de Oleone Fontes, em seu livro "Lampião na Bahia", aparecem os matadores citados como Xisto e João Martins da Silva... Este erro apenas reproduz o cometido pelo coronel Alfredo Barbosa, de Jaguarary, que, à época do evento, relatou-o, errando no nome de João.
João Biano está enterrado na Fazenda Saco, em Jaguarari.

Partícipe, com o amigo João Biano, na morte do cangaceiro Arvoredo, esta é a única foto restante de Cícero Ferreira, o Xisto.

A dificuldade para se conseguir esta foto foi imensa, mas, finalmente, graças ao sobrinho de Xisto, Messias, e à filha adotiva daquele, a "Neguinha", consegui esta imagem.

Xisto está sepultado na Fazenda Mulungu, em Jaguarari.
fonte: http://cangaconabahia.blogspot.com/…/arvoredo-o-cangaceiro-… do professor e pesquisador do cangaço Rubens Antonio.


http://blogdomendesemendes.blogspot.com

LAMPIÃO EM EUCLIDES DA CUNHA BAHIA, SEQUESTRA O AUTOMÓVEL DO PADRE MONS. BERENGUER.



Este acontecido foi no dia
15 de dezembro de1928.
Com mais de 3 meses na Bahia
Lampião parou na fazenda Araçá
Precisava de um guia de confiança
Para sobre Cumbe se informar.

Nesta fazenda de Dedé de Abreu
Lampião chegou no alvorecer do dia
Para conseguir um bom informante
E que o acompanhasse como guia.

delegado dessa época
De nome Luiz Caldeirão
Foi muito bem tratado
Pelo já famoso Lampião

Chegar num dia de feira
Para Lampião foi um achado
Ele e os demais cangaceiros
Conseguiram um bom catado.

E como era dia de festa
Muita gente o viu chegar
Uns ficaram sem entender
O lampião neste lugar

Muita gente se assustou
Na velha Praça do Barracão
Alguns chegaram a correr
Quando viram o Lampião

Os mais velhos se lembraram
Do chefe da 3ª expedição
Mas depois se tranquilizaram
Com a visita de Lampião

Qual seria o mais malvado?
Moreira Cesar ou Lampião?
Nem no Cumbe nem no Araçá
Não foram eles violentos não

Lampião não quis saber do “ Lua”
Intendente de Cumbe na ocasião
Preferiu o Delegado de Polícia
Para recebê-lo como anfitrião

Em Cumbe, Lampião não perde tempo
Primeiro o dinheiro, depois a diversão
Tanto que em menos de meia hora
Começa o trabalho de arrecadaçã

Lampião, o “Rei do Cangaço”
Não quis saber de briga não
Houve festas, músicas e paz
Graças ao delegado Caldeirão

Na histórica casa de Seo Dantas
Perto de Nossa Srª da Conceição
Por cerca de três anos já residia
O amigo e genro Luis Caldeirão

Seo Dantas correu às pressas
Para ver a sua filha querida.
Mas todos estavam tranquilos
Sem nenhum perigo de vida!


Muitos comerciantes e fazendeiros da região fizeram doações de quantias de dinheiro ao próprio Lampião que ficou satisfeito com a obediência do povo local. Foi quando o fomigerado Cangaceiro perguntou quem tinha um automovel. Foi quando o Mons. Francisco de Paula Berenguer Cesar ia chegando à vila do Cumbe com seu Ford 1927. 

E Lampião pediu ao delegado que falasse com o padre que levasse ele e seus Cangaceiros até a cidade de Tucano! O padre chegou a relutar em entregar o seu carro, mas acabou sedendo e disse que Lampião arrumase um motorista e o delegado chamou um de seus assitentes por nome Zé Rico para dirigir o carro para o comboio de Lampião! 

Depois de tomarem em torno de 5 litros de conhaque macieira tocaram de carro rumo à cidade de Tucano bêbados e amotoados no Ford 27.


Fonte: Museu do Cumbe.