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quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

UM DIA DIFERENTE

Por Clerisvaldo B. Chagas, 16 de fevereiro de 2017 - Escritor Símbolo do Sertão Alagoano - Crônica 1.636

Hoje fomos despertados pelos espanta-boiadas que em bando fazia seu taralhar pelos terrenos baixos do rio Ipanema. Que alegria imensa era aquela, minha gente, que repassava para nós como se fôssemos receber boas novas. E para sertanejo, alvíssaras é a mudança de tempo azul para o cinza das nuvens carregadas.

Nos últimos dois dias, o vento soprava mais forte no período vespertino e as nuvens formavam-se rodeando os municípios sertanejos. Uns achavam que as chuvas viriam, outros pensavam ser apenas enganação. Barreiros e açudes vazios representando a tradição imorredoura das secas apresentam-se no cenário crestado sertanejo. O cinza dos garranchos endurecidos transmite a cor da tristeza ao solo poeirento e nu onde as magérrimas reses passam os beiços no nada.

O Médio Sertão sofre desesperadamente com o tempo de estio prolongado, mas o Alto Sertão mostra até inúmeras casas de fazenda fechadas, cujos proprietários e moradores arribaram.

Como não ficar alegre, muito mais eufórico do que os próprios arautos das noticias, os espanta-boiadas! Com o aviso de mudança chegou mesmo uma garoa a muito desaparecida molhando as telhas da cidade perto do amanhecer. Mesmo assim prossegue o dia nublado no Sertão, onde se aguarda o grosso escondido nas trovoadas que não vieram em janeiro. Sabe-se, porém, que durante esse tempo, chuva fraca por aqui é sinal que em outros lugares da redondeza receberam o líquido dos céus em abundância. Só poderemos confirmar essa versão quando os pássaros humanos do semiárido atestarem metendo a boca no mundo.

Mesmo assim, a garoa trouxe esperanças e no mínimo amenizou a temperatura que estava danada e constante.

Daqui de Santana do Ipanema, a “Capital do Sertão”, vamos tentando captar novos sinais concretos de satisfação climática. Ô mundo bom!


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O SORRISO DE LAMPIÃO: LEITORES E COMENTÁRIOS

*Rangel Alves da Costa

Uma absoluta certeza: o tema cangaço vem despertando cada vez mais atenção e interesse. Isso se comprova em cada texto que escrevo acerca de Lampião e seu bando ou sobre a saga cangaceira em geral. Logicamente que quando mais for instigante a escrita mais a atenção do leitor é despertada. Contudo, um fato inusitado aconteceu.

Inusitado mesmo. E assim por que eu jamais imaginaria que um texto tão despretensioso como “O Sorriso de Lampião” fosse alcançar tamanho número de leitores e tantos comentários elogiosos. E digo despretensioso por que um escrito bem menos contundente que o anterior intitulado “O coiteiro Pedro de Cândido e as evidências da traição”.

Contudo, publicado o texto na última terça-feira nos grupos que sigo no Facebook sobre a temática cangaceira (Historiografia do Cangaço; O Cangaço; Ofício das Espingardas; e Lampião, Cangaço e Nordeste), até a presente data cerca de 500 seguidores se demoraram em leitura, curtiram e muitos destes acabaram tecendo comentários de todos os tipos, mas quase sempre enaltecendo a figura de Lampião e a qualidade do texto.


Entre tantos, recolhi alguns que dizem respeito ao texto e autor:

Davi Antonio: Que texto tremendo, dispensa qualquer comentário.
Geovane Rico: Excelente postagem.

Clayton Maia: O mais lindo texto que já tive o privilégio de ler, bravo, magnífico parabéns o autor.

Lucilene Medeiros: Texto maravilhoso, ficaria o dia todo mergulhada na leitura, me perco nas viagens que faço ao ler. Parabéns!!!!!

Analucia Gomes: Sensacional amigo. Parabenizo-te pela forma simples e bem escrita do texto. Para você meu melhor sorriso!

Francisca Alencar: Muito bom!

Voltaseca Volta: Só uma palavra... Esse Rangel Alves da Costa arrebenta em suas crônicas. Certa feita, o mestre e escritor Alcino Alves Costa falou em uma roda de escritores: “... Lampião vive a zombar de todos nós, pois ninguém, até hoje, conseguiu decifrar os mistérios de sua vida".

Rivia Maria Santos: Belo texto, forte e verdadeiro, uma profecia que fica forte a cada dia.

José Carlos dos Anjos Wallach: Bom de ler.

Marcos de Carmelita: Brilhante.

Erika Pecher: Coisa mais linda de texto; esse sorriso deu nó na garganta pra sempre. Salvem Virgulino, Velho Lua e agora Rangel Alves da Costa!
Veronica Pires: Gosto muito dessas histórias que marcaram uma fase revolucionária dentro do Nordeste.

Jonas Rangel: Gostei muito você e bom ei.

João Paulo Olyveira: Magnífica narração de quem foi o verdadeiro Lampião... Parabéns!!

Lucia Helena Souza Que texto belíssimo!... Puxa!... Cheguei a me emocionar, pois este é o Lampião que eu conheço e tanto admiro. Parabéns, Rangel Alves da Costa, por texto tão maravilhosamente escrito.

Fatos assim só nos enchem de alegria e contentamento. O escritor necessita desse reconhecimento para continuar escrevendo, criando e recriando mundos reais ou imaginários. E quando o assunto é Lampião, é cangaço, é sertão, então o prazer da escrita se une ao conhecimento de causa. E tudo flui mais prazeroso e convidativo ao leitor.

Escritor
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ALGUNS ASPECTOS DO TRÁGICO FIM DO CORONEL GONZAGA E A HECATOMBE DE OUTUBRO DE 1922 EM BELMONTE, PERNAMBUCO

Autor – Valdir José Nogueira de Moura 

Gonzaga nem era Pereira, nem era Carvalho e na cidade onde a política era polarizada entre as duas tradicionais e rivais famílias do Pajeú, isto significava ser forasteiro. As principais lideranças locais não viam com bons olhos a sua rápida ascensão política, social e econômica que, até certo ponto, deixava-as em escanteio.

Com sua rápida ascensão política e social, prestigiado pela família Pessoa de Queiroz, que era sua amiga e deseja fazê-lo prefeito de Belmonte, vaidoso que era Gonzaga queria a todo custo arranjar mais proteção ainda e, comprometido com o governo, começou a ajudar a polícia na perseguição a Sebastião Pereira (Sinhô Pereira) e Luiz Padre. 

Sinhô Pereira sentado e Luiz Padre em pé

Sabendo disto, Sinhô Pereira não gostou e mandou dizer-lhe que podia até aceitar perseguição da polícia, pois este era o seu papel, mas de particular não aceitaria perseguição sob nenhuma hipótese e o deixasse viver em paz, se quisesse viver. Foi um ultimato enérgico, todavia Gonzaga, cioso de seu poderio emergente, não se intimidou com as ameaças de Sinhô Pereira, e sempre que podia, dava ajuda financeira às volantes policiais que perseguiam os cangaceiros. Por isto, Belmonte passou a ser visitada por volantes policiais até de outros Estados.

Estava Gonzaga um dia ausente de casa quando chegou um mensageiro, vinha da parte de um grupo de cangaceiros e trazia uma relação de pedidos a serem atendidos; sua esposa indignada negou-se a atender as exageradas solicitações, com um comentário final que o irritou: “Que fossem trabalhar como seu marido sempre o fizera”.

Em maio de 1922, Sinhô Pereira e seu grupo, nas suas correrias e incursões, interceptou um comboio do coronel Gonzaga nas cercanias de Rio Branco (atual Arcoverde), sendo uma grande parte da mercador ia arrebatada e fartamente distribuída entre os componentes do bando, e a outra parte queimada. 

Crispim Pereira de Araújo

Essa atitude de Sebastião Pereira teve de ser alterada com a intervenção de Crispim Pereira de Araújo, mais conhecido como Iôiô Maroto, primo de Sinhô Pereira, e duplamente compadre de Gonzaga, que foi requerido para isto pelos parentes e amigos, e o conseguiu mediante a promessa de alguns contos de réis.

Luiz Gonzaga 

Sebastião Pereira cumpriu o seu trato e exigiu mais tarde a contraprestação de outros. Ioiô Maroto foi obrigado a procurar pelo recebimento da quantia, mas encontrou Gonzaga pouco disposto a satisfazê-lo. Era que Gonzaga estipendiária agora gente armada. A situação se apresentava mais em condições de garantia.

Algum tempo depois, dava-se pelo município de Belmonte a passagem de um tenente da Polícia do Ceará, de nome Peregrino Montenegro, conhecido por sua violência e pela indisciplina de seus comandados. Essa força volante, encarregada de perseguir o banditismo, visitou, no dia seguinte a sua passagem e estada e estada na cidade, a propriedade Cristóvão, pertencente a Ioiô Maroto, e ali cometeu toda sorte de abusos, arbitrariedades e desmandos, surrando moradores, ameaçando de morte o próprio Ioiô Maroto, a quem injuriaram e sujeitaram a humilhações, desrespeitando a família deste. Basta dizer que toda sorte de ultrajes e maus tratos foram realizados pela soldadesca.

Ao se retirar daquela fazenda, o tenente Montenegro mostrou uma carta a Ioiô Maroto, dizendo que agradecesse o que sofrera ao seu amigo e compadre Luiz Gonzaga, que fora quem lhe incumbira daquele serviço. Neste ato insensato de Peregrino Montenegro, estava o estopim da terrível chacina futura que tanto abalou Belmonte.

Convencido, assim, Ioiô Maroto da responsabilidade do seu grande amigo e compadre Gonzaga nos ultrajes que sofrera, resolveu vingar-se. Ninguém podia mais dissuadi-lo dessas idéias e ele começou abertamente a declarar os seus propósitos de desagravo, que chegaram diretos a Gonzaga, com recados intimativos de que não moraria mais no Município de Belmonte. Que um dos dois havia de mudar-se.

Ciente da atitude de Ioiô Maroto, apesar de todas as suas afirmativas públicas e particulares de não ter tido a menor interferência nos atos de vandalismo praticados pela força do tenente Montenegro, o coronel Gonzaga, temendo a realização das ameaças e vinditas de Ioiô Maroto, procurou acabar com seus grandes negócios em Belmonte. Tendo se retirado para a Bahia e Sergipe, buscava escolher local para se estabelecer, mas avisado pelas garantias do Governo de Pernambuco e aconselhado pelos amigos da Capital, também ligados ao governo estadual, voltou ao município de Belmonte, e continuou a frente dos seus negócios que o retinham sempre, tendo agora além da força pública, um pessoal em armas.

A volta do coronel Luiz Gonzaga Gomes Ferraz para o município de Belmonte, cercado de todas essas garantias, enraiveceu ainda mais Ioiô Maroto, que publicamente declarava mais uma vez que os dois não poderiam viver no Município, diante da afronta que ele, Maroto, sofrera e que sua vingança estava sendo preparada.

Ora, certo dia Gonzaga é procurado por um irmão do próprio Ioiô, conhecido como Antônio Maroto, com quem entrou em negócios de algodão. Diante disto, o coronel Gonzaga se convenceu de que tudo estava terminado, dispensando o seu pessoal e recolhendo na sua casa as armas e as munições que estavam em poder do mesmo pessoal.

Na foto vemos de pé, na extrema esquerda da foto, José Alencar de Carvalho Pires e sua tropa de policiais Fonte – Valdir José Nogueira de Moura

A visita de Antônio Maroto à casa de Gonzaga indignou os habitantes das cidades, que achavam que o mesmo não deveria dar crédito nenhum de confiança ao pessoal de Ioiô Maroto. Preocupado também com este fato, José Alencar de Carvalho Pires (Sinhozinho Alencar), na época 2º sargento comandante do destacamento de Belmonte, casado com uma sobrinha de Gonzaga, pediu que o mesmo não se confiasse e que retornasse o seu pessoal em armas para garanti-lo. Era sabido por todos que a fazenda Cristóvão regurgitava de cangaceiros e que Ioiô havia declarado abertamente: 

“Se eu morrer sem desforra, minha alma voltará a Belmonte para fazer o que eu não fiz”. 

Respondeu Gonzaga a Sinhozinho: 

“Vá cuidar de sua saúde e não tenha receio dos cangaceiros que estão em casa do compadre Ioiô, que eles não virão a Belmonte”. 

Retrucou então o sargento: 

“Não há tempo, Coronel, para poder confiar-me em cangaceiros. Enquanto o senhor desarma seus homens eu armo os meus soldados até os dentes.”

É de imaginar a boataria que tomou conta de Belmonte na época. Ioiô Maroto, na sombra, começou a por em prática o seu plano de vingança. Em suas maquinações e idéias sinistras, começou a aliciar parentes e moradores seus, cangaceiros, formando um numeroso bando capitaneado por ele próprio, a gente de Tiburtino Inácio, bem conhecido também nos fastos do banditismo e a malta do célebre bandoleiro Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, e resolveu atacar Belmonte e assassinar o seu compadre Luiz Gonzaga.

Bando de Lampião

Familiarizado por longos anos de convivência com os mais terríveis bandoleiros de então, primo e amigo do célebre cangaceiro Sinhô Pereira, que assentava principalmente seus arraiais no Município de Belmonte, Ioiô Maroto reuniu com facilidade a gente necessária e preparou com uma tática seguríssima o fato criminoso que levou a efeito.

Ele sabia dos fracos recursos do destacamento de polícia comandado pelo sargento Alencar. Oito ou nove praças tão somente. Quase todas as testemunhas ouvidas durante o inquérito procedido pela justiça, falam que logo tomaram conhecimento do inesperado ataque do grupo de Ioiô Maroto, os soldados entraram em ação. Sabia que o coronel Gonzaga dispensara ultimamente alguns defensores que trazia em armas para sua guarda; sabia assim que em casa daquele só se encontrava este, sua mulher e filhos menores.

Assim concebido e resolvido o seu plano de vingança, que se aproveitava da realização do casamento de um filho do fazendeiro Franco Lopes de Carvalho, de nome Jacinto Gomes de Carvalho com Gertrudes Maria de Carvalho (filha do coronel Moraes), que na manhã de 20 de outubro de 1922 deveria ter lugar na fazenda Santa Cruz, distante da cidade umas duas léguas, e que para este casamento haviam sido convidadas as pessoas gradas da cidade, entre as quais o sargento Alencar de Carvalho, que ao mesmo casamento deveria comparecer, ficando assim o destacamento sem o seu chefe e comandante.

A festa de outubro, dedicada ao Sagrado Coração de Jesus, e realizada anualmente na cidade de Belmonte, era das mais concorridas. Como ordenava a tradição, as comemorações se iniciavam com a tradicional alvorada, os sinos repicavam, fogos explodiam no ar, banda de música e pífanos alegravam as ruas… Aquela animada noite de 19 de outubro de 1922 teve como patrono o coronel Luiz Gonzaga Gomes Ferraz. Este senhor ao deixar a Matriz de São José juntamente com o padre José Kherlle, seguiu para a Casa Paroquial. Lá o reverendo então o interpelou sobre a sua situação com Ioiô Maroto.

Padre José Kherlle

Respondeu o mesmo que a malquerença entre ambos havia terminado, pois um irmão de Ioiô entrara com ele em negociações, tendo emprestado ao mesmo a quantia de três contos de réis e cedido o vapor para serviço de Maroto, e que também havia dispensado o seu pessoal que, por prevenção, trazia armado.

Recusando, então, o convite do padre para pernoitar na Casa Paroquial em virtude da chuva, às onze horas o coronel Gonzaga deixava aquela casa e retornava ao seu lar. Lá chegando, deu de cara com o seu vaqueiro Manoel Pilé, que espantado relatou que ficara sabendo que Ioiô Maroto estava juntando um considerável número de gente em armas na sua fazenda Cristóvão. Não dando crédito às desconfianças de seu vaqueiro, Gonzaga tranquilizou-o dizendo que não havia mais questão entre ele e seu compadre Ioiô.

O certo é que pelas nove horas dessa mesma noite, Ioiô Maroto havia saído de sua fazenda com os seus companheiros e cangaceiros, parentes e moradores, em número superior a 45 homens, com rumo certo para a cidade de Belmonte, onde realizaria a empreitada na forma pretendida.

De 4 para 5 horas da madrugada, do dia 20 de outubro de 1922, a cidade de Belmonte era despertada ao ruído de tiros que se disparavam de mais de um ponto da rua e das suas imediações. O tiroteio ia crescendo de intensidade e duração, dando a entender, dentro em pouco, tratar-se não de bombas que vinham sendo frequentes, por motivos dos festejos religiosos do Coração de Jesus, mas de detonações de armas de fogo num verdadeiro assalto.

Naqueles tempos de cangaceirismo, em que ninguém tinha a propriedade e a vida seguras, as povoações, as cidades, não se eximiam desses terrores e era um ataque em regra que se fazia a Belmonte.

Numeroso grupo invadira por um dos lados, o do norte, o quadro da cidade e sustentava dali nutrido fogo, dominando inteiramente à frente da casa do coronel Gonzaga. Uma parte desse grupo, 12 ou 15 homens, atacava, por sua vez, pelos fundos a casa do referido negociante. Para penetrar na dita casa, dois bandidos, Varêda e José Dedé – este conhecido por Baliza – escalaram o muro e, uma vez dentro, sustentaram fogo para que o restante dos atacantes arrombasse o portão de entrada para o quintal da residência do dito coronel. Nesse ínterim, João Gomes, parente e vizinho de Gonzaga, ouvindo o barulho que fazia os assaltantes junto ao referido portão, saiu para o quintal, que era comum às duas casas dele e Gonzaga, e conseguiu ainda dar uns tiros, indo se refugiar depois em sua casa, pois nesse momento, ultrapassando todos os obstáculos, o grupo particularmente incumbido de dar a morte ao infeliz negociante, penetrava em sua residência, colhendo-o então inerme e indefeso.

Senhores da casa, cujas portas abriam a machadadas, foi esta invadida, e o coronel Gonzaga, desorientado, correu para se refugiar no sótão. Todavia, uma tábua do assoalho cedeu e ele caiu na sala de visitas, quebrando os dois braços. Porém, fugindo da fúria de seus perseguidores, tentou galgar uma janela de um quarto junto a sala de visitas, dá para o oitão da casa, mas é abatido sobre o peitoril, sendo varado pelas balas assassinas.

A casa, o quintal, tudo estava ocupado e os bandidos fizeram mão baixa no que puderam levar, quebrando, arrebentando móveis, baús, na embriagues do saque e da pilhagem.

A família de Gonzaga, sua mulher e filhos, assim como o jovem José Demétrio, que na época, era encarregado da estação telegráfica de Belmonte e também noivo de Bida, filha de Gonzaga, nada sofreram fisicamente. Um dos bandidos, o de nome Cajueiro, recebeu de seu chefe, Ioiô Maroto, a incumbência de poupá-los, e assim foram segregados num quarto que dá para a sala de jantar.

Ante o tiroteio realizado pelo grupo chefiado por Ioiô Maroto, o sargento Alencar, que não fora ao casamento do filho do fazendeiro Franco Lopes de Carvalho, na Santa Cruz, reagiu, com o seu destacamento e alguns paisanos, contra os atacantes.

Desde as 4 horas da manhã daquele dia, o mesmo acordara alarmado por forte tiroteio. Pernoitara em casa de João Lopes, seu sogro, pois ali se encontrava doente uma filha. Levantou-se aos primeiros tiros e seguiu para a sua casa, situada na mesma rua. Ali chegando, armou-se. Abrindo o depósito de munição, verificou que existiam cerca de 4.000 mil balas, e carregando o seu fuzil correu a cidade. Observou que toda a Rua do Açougue estava tomada pelos cangaceiros, e das casas do velho Quintino Guimarães e seu genro, Pedro Vítor, especialmente do Açougue, partia forte fuzilaria. Deitando-se, então, atrás de uma antiga cajazeira que havia no meio da rua que, por sinal, servia de casa-de-feira, detonou cerca de 50 tiros, visando especialmente às casas de Quintino Guimarães e Pedro Vítor. Todavia, não chegando, portanto, nenhum soldado para auxiliá-lo, o destemido Sinhozinho Alencar foi procurá-los no quartel e em suas próprias residências, somente encontrando dois, Severino Eleutério da Silva e José Francisco da Silva. Com essas praças resistiu até às 5 horas e meia, quando se apresentaram mais três soldados: Manoel Rodrigues de Carvalho, José Antônio de Oliveira e Luiz Mariano da Cruz; o primeiro, do destacamento local, e os dois últimos, do de Vila Bela, os quais haviam chegado no dia anterior com licença daquele destacamento. Às 6 horas apareceu o soldado José Miguel dos Anjos. Contando, no entanto seis praças, o imbatível comandante fez a seguinte distribuição: Luiz Mariano da Cruz, na esquina da casa de Neco Medeiros; José Miguel dos Anjos, em casa de seu sogro, João Lopes Gomes Ferraz, e os demais lutando com ele, ora no meio da rua, ora entrincheirados em sua casa ou no portão do muro da mesma, fazendo cessar forte fuzilaria que partia do cemitério, onde se entrincheirara grande número de bandidos.

Às 8 da manhã, mais ou menos, o sargento Alencar, temendo o fracasso por falta de munição, pois dos quatro cunhetes existentes, apenas um restava, e os soldados Severino Eleutério e José Francisco da Silva estavam já com armas curtas, pois seus fuzis haviam deflagrado pela culatra, consequência da intensidade do fogo, retirou-se então com os soldados José Antonio de Oliveira e Manoel Rodrigues de Carvalho. O dito sargento deixou os demais resistindo, e com dois companheiros assaltou o cemitério, pondo em debandada o grupo que ali estacionara. depois, pela retaguarda, atacou o Açougue Público e suas adjacências, causando verdadeiro pânico no meio dos bandidos que julgaram estar sendo atacados por grande número de soldados, e colocou em fuga os bandidos a quem seguira em perseguição até um quilômetro fora da cidade. Ao retornar pelo beco do Açougue, gritou ao coronel Gonzaga que estava tudo salvo, pois que os bandidos haviam fugido. Porém, nesse momento, para surpresa sua, ouviu de Quintino Guimarães que, nessa ocasião, apareceu à porta de sua residência, as seguintes palavras: “Gonzaga está morto desde muito cedo, os cangaceiros entraram em sua casa antes de haver tiros; os primeiros foram dados nele”. Angustiado com tal notícia, Sinhozinho Alencar entrou sozinho na casa do coronel Gonzaga, encontrando-o morto, banhado em sangue, em um quarto próximo à sala de visitas, e a sua família presa em outro quarto.

Da reação oposta pela polícia, ajudada por alguns civis, tiveram os atacantes alguns mortos. Foi essa reação que, certamente, conseguiu impedir que as consequências do assalto se estendessem para o estabelecimento comercial de Gonzaga, a Rosa do Monte, que ficava no mesmo correr de sua residência, porém com certa distância, pois havia de permeio outros prédios. A não ser pela frente e por uma porta do único oitão que deitava para um beco, o estabelecimento comercial se acabava, por sua vez, no campo de mira de alguns defensores do coronel Gonzaga, como o civil Manoel Gomes de Sá Ferraz, junto aos seus filhos João e Antônio, que devotados a ele, atiravam em posição fronteira.

Soldado Heleno Tavares de Freitas – Fonte – Valdir José Nogueira de Moura

Além do coronel Gonzaga, cujo assassínio era o fito principal do ataque, a ação dos criminosos vitimou ainda o soldado Heleno Tavares de Freitas, que caiu em poder dos bandidos quando acudia o chamado para a defesa; o velho Joaquim Gomes de Lira; e João Gomes de Sá, que foi saqueado, roubado e ferido. Da parte dos atacantes, morreram o famoso Baliza e Antonio da Cachoeira (este, após o tiroteio, faleceu de parada cardíaca), e entre os inúmeros feridos estavam Zé Bizarria, Cícero Costa e o próprio Ioiô Maroto, que ficara aquartelado na casa do velho Quintino Guimarães.

Entre as jóias roubadas durante o saque, estava um anel de brilhante pertencente e usado pelo coronel Luiz Gonzaga, que dizem ter sido visto depois em um dos dedos do bandoleiro Lampião. Daí aquela famosa quadra de larga divulgação no sertão:

“A aliança de Gonzaga
Custou um conto de réis
Lampião botou no dedo
Sem custar nenhum derréis.”

Família do coronel Luiz Gonzaga Gomes Ferraz , morto por Lampião em 1922 – Fonte – Valdir José Nogueira de Moura

Em 1928, foi aberto inquérito para apurar os acontecimentos que tiveram lugar em 20 de outubro de 1922, no Município de Belmonte. Em 7 de outubro de 1929 era publicada no Diário Oficial do Estado de Pernambuco a sentença de pronúncia proferida nos autos do Processo criminal daquele trágico acontecimento que resultou entre outros, na morte do coronel Luiz Gonzaga Gomes Ferraz, diante da denúncia do Promotor Público de Olinda, em comissão no Município de Belmonte: Crispim Pereira de Araújo (Ioiô Maroto), Virgulino Ferreira da Silva (Lampião), José Terto (Cajueiro), Antonio Cornélio, José Bizarria, José Teotôneo da Silva (José Preto), João Porfírio, Feliciano de Barros, Antônio Padre(irmão de Luiz Padre), Pedro José Clemente(Pedro Caboclo), Francisco José (Varêda), Tiburtino Inácio (filho do Major José Inácio do Barro-CE), Antônio Moxotó, José Dedé (Baliza). Meia Noite, José Ovídio, Papagaio, José de Tal (Caneco), Miguel Cosmo, Raimundo Soares do “Barro”, Antonio Ferreira da Silva, Livino Ferreira da Silva, José de Tal (Caboré), Cícero Costa, Terto Barbosa, José Benedito, Manoel Barbosa, Olímpio Benedito (Olimpio Severino Rodrigues do Nascimento), Francisco Barbosa, Dé Araújo, José Flor (Manjarra), Antonio Caboclo (Pente Fino), Laurindo Soares (Fiapo), Manoel Benedito, Antonio pereira da Silva (Tonho da Cachoeira), João Cesário (Coqueiro), Sebastião de Tal (Sebasto), Manoel Saturnino, Beija Flor, Pilão, Lino José da Rocha. Quanto aos outros indivíduos que tomaram parte do ataque, ignora-se ao certo o nome ou sinais característicos de cada um.


Carta da viúva do coronel Gonzaga, contando sua dor e as ocorrências que envolveram seu finado esposa e publicada no jornal recifense A Provincia, de 1 março de 1923, pag.2 – Fonte – Coleção Rostand Medeiros

https://tokdehistoria.com.br/2017/02/16/alguns-aspectos-do-tragico-fim-do-coronel-gonzaga-e-a-hecatombe-de-outubro-de-1922-em-belmonte-pernambuco/

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FOTOS FEITAS NO PERU

Por Benedito Vasconcelos Mendes

Últimas fotos tiradas no Peru. Ponte do Suspiro, no Bairro Boêmio de Barranco, em Lima.






Enviado pelo professor, escritor, pesquisador do cangaço e gonzaguiano José Romero de Araújo Cardoso

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VISITA AO PERU

Por Benedito Vasconcelos Mendes
Benedito Vasconcelos e esposa Suzana Goretti

Ruínas Inca de "Huaca Pucllana"- O Templo dos Adoradores do Mar, situada no Bairro Miraflores, em Lima-Peru. Estas ruínas feitas de tijolos de barro cru deixaram de ser utilizadas antes da chegada dos espanhóis e apesar dos tremores de terra próprios desta região, ainda hoje existem. A ausência de chuvas e de ventos fortes ajudaram a preservar este sítio arqueológico.





O Museu do Ouro do Peru, localizado em Lima é um testemunho da arte refinada e da riqueza em peças de ouro, prata, cobre e bronze manufaturadas e usadas pela civilização pre-hispânica do Peru. A beleza e a grande quantidade de vasos, cântaros e outros objetos metálicos, usados no cotidiano e nos rituais religiosos dão uma noção aproximada de como era desenvolvida a civilização nativa, antes da chegada dos espanhóis. Além da metalurgia avançada, a técnica de preparação de múmias também chama a atenção dos visitantes. Múmias com cabelos, dentes e pele preservados, inclusive com tatuagens bem conservadas, demonstra a evoluída técnica de preparação de múmias dos Incas.



Enviado pelo professor, escritor, pesquisador do cangaço e gonzaguiano José Romero de Araújo Cardoso

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CANUDOS (TRAGÉDIA ÉPICA)

Por Joab Aragão

Prezado Romero, 
Navegando pela internet, dei de cara com um site da ABL. 
Não é que em formato PDF está ali arquivado o livro CANUDOS (Tragédia épica) de autoria de Francisco Mangabeira, estudante de medicina, integrante do corpo médico da quarta expedição? 
Vale a pena lê-lo. 
Aí vai o endereço:

www.academia.org.br/.../caa-030-tragedia_epica-francisco_mangabeira-miolo-para_i...

de A de Athayde 
Um abraço.
Joab Aragão

Enviado pelo professor, escritor, pesquisador do cangaço e gonzaguiano José Romero de Araújo Cardoso

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HOJE É DIA DO REPÓRTER!


Repórter é um jornalista que pesquisa a informação apresentada em diversos tipos de meios de comunicação. É o responsável por trazer aos leitores as últimas notícias.


Em Jornalismo, furo é o jargão para a informação publicada em um veículo antes de todos os demais. O furo é dado quando uma equipe de repórteres e editores consegue apurar uma notícia, um fato ou um dado qualquer e publica esta informação sem que os veículos concorrentes tenham acesso a ela. Embora não necessariamente, grande parte dos furos no jornalismo diário é constituída por denúncias de crimes, corrupção e outras atividades ilícitas.


O termo em inglês para furo é scoop.

Dia 16 de fevereiro é dedicado como "Dia do Repórter", cuja origem não é conhecida. No Estado de Mato Grosso foi estabelecido o dia 31 de outubro como "Dia do Repórter Político".

"O blogdomendesemendes parabeniza todos os repórteres de Mossoró e do Brasil". 

https://pt.wikipedia.org/wiki/Furo_(jornalismo)
https://pt.wikipedia.org/wiki/Rep%C3%B3rter

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PRISÃO DO CANGACEIRO VOLTA SECA!


(...)

Jaguar - Bom, conta cumé que você foi preso?

- Bom, o seguinte foi esse: a minha prisão foi por causa de um colega meu mesmo. Foi mais por causa de eu me doer por causa dos outros e, no fim, me deram um chute. E quem padece sempre sou eu. Mas agora eu já deixei isso prum lado, que não dá certo. O caso foi esse: nesse combate de Massaranduba, onde morreram três e saiu um baleado – o baleado chamava-se Bananeira. Foi baleado na rótula, mas nós não tinha visto ele. Nós tava brigando, e quando terminou a briga, que nós se arretiramos e chegamos na frente, ele ficou dando com a mão de lá. Então, eu olhei e falei: "ô capitão, lá tem um chamando e é um dos nossos". Aí ele suspendeu a cabeça e eu vi que era o Bananeira e ele tava baleado. E eu disse: "Vamos lá". Ele disse: "Eu já saí e num vou voltar mais lá". Eu digo: "Mas como é que é que o senhor falou que é um por todos e todos por um? Vamos salvar o rapaz, ele tá vivo, num tá morto ainda". Aí ele disse: "Eu num vou mais, se você quiser ir, vai. Eu num vou". Eu chamei o Fortaleza e falei que o Bananeira tava baleado e ele perguntou: "Já chamou o capitão?" Eu disse: "Já. Ele disse que já terminou o combate e que ele não vai lá mais". Eu disse: "Você é forte, cê carrega ele e eu agüento o fogo". Então fomos. Aí, chegamos lá e botamos o fogo. O rapaz botou ele no ombro e tiramos ele pra fora. Quando nós tiramos ele fora e trouxemos, eu disse: "Capitão, o rapaz taí e tá baleado na perna. Nós temos que salvar ele, levar ele pra um lugar qualquer aí e dar remédio que o homem vai ficar bom". Lampião disse: “Bom, então você leva ele. Você que foi lá buscar, então, você leva ele".

Ziraldo - Mas por que o Lampião tomou essa atitude? Você não tem uma ideia?
- Num sei. Ele se aborreceu justamente porque eu disse que ia buscar ele. Aí, eu apanhei o rapaz, levamos e chegando na frente ele disse: "Bom, você fica aí que eu vou ver se pego um animal pra montar ele. Porque nós não podemos levar ele na rede".

Aí o Fortaleza disse: "Mas cumé que o capitão faz uma coisa dessas?” Eu disse: "Eu acho que ele tá mal satisfeito!" Aí Lampião disse: "Então, você vai, pega o animal e leva ele". Aí chamei um outro, nós pegamos um cavalo lá, fizemos uns negócios, montamos ele e saímos. Lampião disse: "Bota ele na frente que quando os macacos aparecerem, nós tamos aqui. É tempo de você ir e tirar ele pra lá".

Eu disse: "Tá bem." Aí ele disse: "Como é, bota ele pra frente"! Eu digo: "Mas outra vez? Cê num tá vendo que ele tá machucado e não pode ir assim?” Ele disse: "Mas você num foi tirar ele de lá? Então cê pode". Aí eu vi que ele queria me provocar e digo: "Bom, se é isso, não tem problema não. O senhor manda um outro aí ajudar que eu monto ele e passamos pra frente".

Ele disse: "Não, monta ele sozinho". Aí, o Bananeira disse assim pra mim: "Nada, deixa isso pra lá, ele fica com pilunga contigo. Eu num sei porque. Eu não tive culpa de ser baleado".

Eu digo: "Não, mas você num vai ficar sozinho não. Cê vai comigo". Aí, chamei um rapazinho que tinha lá - Pocorante (Pó Corante).

Chamei ele e disse: "Vamos embora". Aí, pegamos ele e fomos embora. Nós levamos ele pra frente, quando chegamos lá no lugar que ia tratar dele, na fazenda, eu digo:

"Eu vou viajar. Mas o rapaz tem que ser medicado. Num vai ficar assim não". Lampião disse: "Ah, porque num sei o quê". Eu digo: "O senhor tem razão de falar, porque o senhor é o chefe. Mas o senhor não devia fazer isso não”. Mas esse Pocorante, esse colega meu, tava mesmo procurando um negócio. Aí, Lampião pegou e disse:
"Você vai lá pegar o meu burro". Aí, depois, Lampião chegou pra mim: "Ele não encontrou o burro, não. Você vai lá e dá umas voltinhas, vê se encontra o burro". Aí, eu saí e o burro tava em pé ali. Eu cheguei e disse: "Mas você não encontrou o burro? O burro tava aqui, como é que você não viu o burro?” Lampião então falou pra ele: "Eu tava bem era de dar um murro na sua cara".

E o Pocorante ficou calado. depois eu fui procurar o Pocoronte e disse: "Escuta rapaz, cumé que um home diz que dá um tapa na sua cara e você fica calado? Escuta, pra que é que você tem um fuzil na mão? Pra que que você tem tanta bala? É pra você mesmo? Ah, num pode dizer nada, que é com o capitão? Ah, bom, então, amanhã ele se enche de gozo e diz que bate na minha cara e eu dou-lhe um tiro na cara dele também". Aí, Pocorante disse: "É, mas é todo mundo colega da gente mesmo. Na hora ele opina contra, não sei o quê..." Digo: "Não sei o quê, nada". Ele saiu, amarrou a camisinha e foi direto a ele. "Ó capitão, o senhor disse que ia bater na minha cara. Eu disse pro Volta Seca e ele disse que se o senhor dissesse que ia bater na cara dele, ele dava um tiro na sua cara.” Fez uma fofoca direto. Aí, eu venho de lá pra cá e Lampião mandou me chamar: "Você disse que se eu te desse um tapa você me dava um tiro". E eu: "Dava, não, eu dou. Dava é uma coisa, eu dou. Quer ver? Experimente". Aí, ele ficou falando, num sei o quê...

Jaguar - Ele num tava num bom dia, hein, rapaz?
- Sei não.

Millôr - Enquanto isso, onde estava o ferido, o Bananeira?
- O Bananeira tava numa fazenda, sendo medicado.

Ziraldo - Eu acho que Lampião não tava querendo arriscar o bando dele por causa de um que já tava morrendo.
- Eu acho que era isso. Bom, aí ele pegou com aquele negócio comigo, todo dia tendo uma conversinha. E quando foi de noite, mandou me chamar. Eu fui, chegou perto, me fez a mesma pergunta e eu respondi a mesma coisa. Aí, veio a Maria mesmo e disse: "Lampião, você deve deixar isso pro lado. Você fica toda hora procurando uma coisa e deve deixar. Ele é seu amigo, você é amigo dele, é superior a ele, é tudo. Mas ele tá certo. Ninguém vai querer tomar tapa na cara, isso num fica certo. Então, você não deve fazer isso. Deve parar com esse negócio". Aí, bem, parou.

Quando é de noite, ele mandou me chamar e eu mandei dizer que não ia mais lá. Aí, ele ficou falando que no outro dia de manhã ia me almoçar, num sei o quê... Os outros vinham e me diziam:
"Olha, cuidado, o Lampião disse que vai te almoçar amanhã".

Eu disse: "Num faz mal, não. Diz pra ele que eu janto ele agora de noite também".

Aí, quando foi mais ou menos meia-noite, ele botou gente em roda pra eu não sair, que queria falar comigo de manhã.

Eu disse: "Num faz mal". Aí, veio o cunhado dele mesmo, o Virgínio: "Volta Seca, cê sabe que eu gosto de você, o Mariano também. É todo mundo seu amigo, ele pode mandar matar você e nós num pode fazer nada. E vai ser uma coisa. Então, vai embora, vai por teu caminho, vai embora".

Eu digo: "Tá certo". Aí, ele mandou pedir as armas e eu disse que não dava. Mandou que eu entregasse fuzil e munição e eu disse que não entregava. Mas não entregava mesmo. Aí, com o auxílio dos outros, eu fui embora.

Ziraldo - A pé ou a cavalo?
- A pé. Eu fui embora. Aí, ele mandou recado pra tudo quanto é fazenda, que no lugar que eu passasse, ia me matar.

Ziraldo - Aí você ficou numa ruim, né?
– Pois é. Aí, fiquei contra. Mas não tem nada, não. O destino é esse, é esse mesmo. Se morrer hoje, morri; se morrer amanhã, morri. É tudo a mesma coisa. Quatro dias depois encontro com o oficial com a volante. Um cara lá, que era meu amigão, moleque sem-vergonha, me cagoetou.

Jaguar - Qual era o nome dele?
- Chamava-se Adão.

Jaguar - Onde você conheceu ele?
- Lá na fazenda.

Ziraldo - Ele já morreu?
- Eu não sei se ele tá vivo ou se tá morto. Só sei que chamava Adão. Então, ajuntou lá um time e me cagoetou com a polícia.

Sérgio Cabral - Isso onde?
- Lá no Estado da Bahia.

Ziraldo - Que cidade?
- Não é cidade não, é mato mesmo, Lagoa da Onça. Aí, eu cheguei lá e um rapaz falou comigo que era pra eu tomar cuidado que a polícia tava por ali. Eu disse: "Pode deixar comigo que eu sei sair". Quando foi de manhã, eu saí e matei um garrote. Quando eu tava tirando o couro do garrote, eles me cercaram dentro de uma roda...”

Millôr - Estava matando o garrote pra comer?
- É. E aí mandaram bala em mim. Tinha um rapazinho comigo ali e ele logo recebeu um na cabeça e caiu logo ali.

Jaguar - Era amigo, seu, esse cara?
- Era, tava comigo.

Sérgio Cabral - Num queriam nem prender, queriam era matar?
- O negócio num era prender, não. Era matar.

Ziraldo - Como é que você escapou dessa?
- Como que eu escapei? Eu saí, arrombei a cerca por baixo, cheguei por detrais dele, dei uns dois tiros e caí fora. Eles ficaram lá, brigando umas duas horas, eles mesmos, sozinhos. Eu fui embora. Cheguei lá, fiquei sentado, chupando melancia. E a minha vontade era de ir lá, só escutando eles gastando bala feito diabo. E eu quieto, quietinho lá no meu canto. depois, eu saí e fui na casa desse cara. Num sabia de nada.

Millôr - Do Adão?
- É, desse Adão. E ele já tinha chamado a turma dele toda lá, tava tudo dentro de casa. Eu num sabia de nada, era amigo, né? Aí, quando cheguei lá, ele disse: "Ôpa, que que há, rapaz?” Eu digo: "nada". Ele diz: "O que que foi aquele tiroteio?” Eu digo: "Eles me encontraram ali e me deram uns tiros: eu dei uns dois também neles e caí fora". Ele diz: "Ô rapaz, a tua mão num tá de calo, não?” Olha, cê vê como que pode. A falsidade dói como o diabo... Ele de novo: "Escuta, rapaz, sua mão num tá de calo, não?” E eu: "Que nada, rapaz, isso é bobagem". Ele pegou a minha mão e apertou. Quando ele apertou, eu digo: "Ô rapaz, deixa disso". Ele disse: "Você tá preso". Eu digo: "Preso? Olha, rapaz, eu pego você sem Deus me ajudar".

Foi a palavra mais errada que eu disse na minha vida. Ele aí avançou em cima de mim. Quando ele avançou, eu chamei ele e botei no chão. Aí ele gritou: "Me acode!” Quando eu vi, já tava todo mundo em cima de mim. Uns 15.

Millôr - Você tinha uns 14 anos, né? Um menininho...
- Era garoto, mas era forte. Andei tombando uns dois lá, e aí, pronto. Eles me amarraram igual um porco. Diziam: "Eu mato, num mato..." Aí, veio a irmã dele, que queria dar boa vida a ele, e disse: "Num façam isso com ele não. Já que vocês prenderam, leva ele e entrega na polícia". Eu, amarrado, que que podia fazer? Eles me pegaram e foram me entregar justamente a esse tenente que estava baleado. Lá no tiroteio ele tomou um tiro e tava com as costas toda esfacelada. Aí, quando chegaram lá e me entregaram, foi o mesmo que entregar um mosquito nas mãos de urubu. Empurra pra lá, empurra pra cá, eu num vi mais nada. Eu olhava pra cara daqueles fedorentos e endoidei, fiquei maluco. Aí, chegou um crioulão com um chapelão: "O negócio é matar". Aí foi dar um tapa na minha cara. Eu abaixei e dei um pontapé nele...

Millôr - Tava amarrado ainda?
- Amarrado. Aí, veio o tenente lá, todo emplastado: "Num toca nesse homem não!” É um tenente alagoano – eu esqueci o nome do homem. E foi logo dizendo: "A hora de vocês matarem ele era lá, na hora que vocês estavam brigando. Eu recebi esse tiro e vocês saíram correndo. Então, era nessa hora que vocês deviam ter matado ele. Aqui ele tá garantido por um homem e pela lei e ninguém precisa pôr um dedo nele".

Ziraldo - Cê acertou o coice no sargento?
- Acertei e foi um coice desgraçado. Ele caiu lá com a mão, rolando pelo chão. Eu digo: "E se dane". O tenente é Joaquim, Zé Joaquim. Ele disse: "O homem tá garantido e eu não entrego a ninguém a não ser o (sic) chefe da polícia. Num sendo ele, num sai da minha mão. E qualquer coisa que triscar nesse homem aí, já pode saber que vai expulso e preso".

Ziraldo - Ele sabia que você era o Volta Seca?
- Sabia.

Millôr - Isso foi em Alagoas?
- Foi na Bahia mesmo, Santo Antonio da Glória. Aí, eu fiquei lá, num comia nada.

Ziraldo - Na prisão eles não davam comida?
- Não, vinha de tudo, farinha pura...

Jaguar - Você ficou preso em Santo Antonio da Glória?
- Foi. Não tinha fome nem sentia nada, revoltado.

Ziraldo - Os jornais anunciaram essa prisão lá na cidade?
- Só depois. Aí, eu digo, tá certo. Viro daqui, viro dali, o tenente diz: "Aqui ninguém toca em você, nem nada". E passou logo um telegrama pra polícia, pro chefe da polícia, que era o capitão João Facó. Aí, ele mandou reforço: "Diga que garanto o homem, num toca num dedo dele, nem nada, me traz o homem". E disse: "Entrega pro coronel Costinha que ele recambia ele daqui pro Rio, pra Bahia". O coronel Costinha mesmo foi me buscar, mas o tenente disse: "Não, eu mesmo levo e entrego lá. Num tenho confiança de deixar vocês levarem ele".

Millôr - Bacana o homem, hein?
- É, tá certo, bacana. Nós saímos e quando nós chegamos lá no trem, ia pra mais de 300. Um carro do trem, uma traça daquela, não cabia ninguém, a não ser eu e a polícia só. Um carro só, e veio cheio que não tinha lugar pra sentar.

Millôr - Cheio de polícia pra levar você, né?
- É. Pra me levar. Eu tava amarrado, porque Lampião mandou recado que se não me segurasse, eles iam me pegar no lugar que eu tivesse. No trem, no caminhão, no diabo que fosse. E botou diversas emboscadas, mas eles souberam fazer o troço. Chegando lá, me entregaram, e de lá me tocaram pra Bahia.

Millôr - Eles te entregaram perto de Canudos?
- Não, muito pra baixo.

Ziraldo - Se o Lampião pegasse você, cê tava perdido dos dois lados, né?
- Tava não, ele já queria me salvar. O negócio era esse.

Millôr - A essa altura ele já queria te salvar, né? Então, você chegou na Bahia...
- Me tocaram pra Salvador.

Millôr - Você nunca tinha ido à capital?
- Não.

Jaguar - Quanto tempo você esperou pra ser julgado? Uns dois anos?
- Uns dois anos.

Ziraldo - Quando você foi julgado, aqueles dois primeiros crimes estavam no julgamento?
- Não, aqueles já tinham sido prescritos.

Ziraldo - Eles não ficaram sabendo daquilo, né? Aquilo era lá dos cafundós...


...Jaguar - Só foi julgado pelos casos do cangaço, né?
- Só, e eles mesmo num davam nada não.

Aparício - Quem te defendeu?
- Quem me defendeu foi Deus e eu mesmo. Não tinha ninguém por mim.

Ziraldo - Cê num teve advogado?...

Millôr - Cê num teve julgamento com promotor de acusação?
- Na hora teve uma moça, uma advogada, chegou e disse: "Eu vou defendê-lo e vou botá-lo na rua". O juiz num aceitou.

Ziraldo - Quem era esse juiz e essa advogada?
- Ela eu num me lembro do nome, não. Era uma moça de Vila Nova da Rainha. O juiz eu num quero nem tocar no nome dele, deixa esse negócio de juiz pra lá.

Millôr - Agora, Volta Seca, é verdade que você tem um jornal guardado pra fazer o Jorge Amado engolir?
- Isso eu falei, mas agora já acabou.

Millôr - Acabou o jornal ou acabou a pinimba?
- Acabou a pinimba.

Jaguar - Por quê?
- Ele escreveu num livro dele que me conheceu muito, em Água de Menino, na Bahia. E se ele me conheceu, foi quando fui preso, porque, na Bahia, eu nunca tinha ido na capital. E ele então escreveu que tinha visto eu em Água de Menino, sendo capitão de areia.

Sérgio Cabral - Ele falou mal de você?
- Me chamou de capitão de areia. Então, eu disse mesmo: "Eu tenho o jornal guardado pra um dia dar pra ele comer". Mas eu já deixei pra lá. Deixei até de ganhar dinheiro um dia desses, só porque me disseram que ele ia também. Era no Hotel Serrador, ia ter uma peça e ele ia também. Então, quando me falaram que ele ia, eu disse: "Pode me tirar fora, vou não".

Ziraldo - Num gosta de mentiroso...
- Eu não. Quando falar, fala verdade. Tá certo falar aquilo que aconteceu, mas mentir!...

Jaguar - Você cumpriu a pena onde?
- Na Bahia.

Jaguar - Fugiu quantas vezes?
- Só duas.

Jaguar - Voltou ou te pegaram?
- Pegaram, voltou o quê? Se eu fugia, cumé que eu ia voltar?

Ziraldo - Podia. Tá ruim cá fora, né?
- Tava não, eu fazia grana.

Millôr - Você viu, por acaso, aquele filme, Cangaceiro, do Lima Barreto?
- Eu trabalhei também. Aquilo tudo foi orientação mais minha.

Jaguar - Como você soube da morte de Lampião, cumé que foi?
- Ora, eu tava lá pertinho, a notícia correu logo.

Sérgio Cabral - Qual foi a sua reação quando soube que Lampião tinha morrido?
- Nenhuma.

Millôr - Agora, você não ficou revoltado com aquela exposição daquelas cabeças? Nós todos somos revoltados com aquilo.
- Tanto que eu saí daquilo. Aliás, eu pedi muito, porque aquilo que fizeram... Aquilo foi mais uma revolta. Aquilo seria uma grande revolta pra família, pra criar novamente a mesma coisa que era. Enterra, tá certo. Morreu, acabou. Mas aquilo...

Millôr - Como se chama essa rua aqui?
- Eles chamam Rua da Barreira.

Millôr - Isso aqui é ramal extinto?
- Funciona, vai até a base.

Jaguar - Você é funcionário da Leopoldina, né?
- Sou.

Millôr - Você se dá bem com os seus vizinhos, né?
- Muito bem.

Ziraldo - Eles te chamam de seu Antonio ou de Volta Seca?
- De qualquer jeito que eles me chamar tá bom. Brinco com todos, são meus amigos.

Millôr - Você está com 55 anos, né? Depois de toda essa luta você tem o quê? Por exemplo, tem casa própria?
- Não, é aluguel. Eu pago Cr$ 150,00.

Millôr - Qual é a sua fonte de renda?
- A minha fonte é o meu trabalhozinho só.

Millôr - Quanto você ganha?
- Eu estou ganhando Cr$ 197,00. Eu tô encostado.

Millôr - Seus filhos ajudam você?
- Tão parados também. Um, por ora, é soldado; o mais velho tá parado...

Millôr - Estão todos educados, vão a colégio pelo menos?
- Os pequenos, ainda uns... tão. Um dia vai, um dia num vai... uns já sabe alguma coisinha. Só o menorzinho é que não sabe nada.

Jaguar - Mas os outros estão estudando em escola?...

...Millôr - Mas como é que vocês vivem, o seu dinheiro num dá pra pagar as despesas...
- É, mas eu tenho que viver é assim. Dando uma reportagenzinha hoje aqui, outra ali, e tal... E vou vivendo .

FIM.


Publicada na edição de nº. 221 - Setembro/Outubro



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