Por Junior
Almeida
Manoel Severo e Júnior Almeida
A palavra
“macaco” era usada pejorativamente pelos cangaceiros para se referir aos seus
inimigos os policiais volantes. O termo é bem antigo, pois, Doutor Oliveira
Xavier nos diz em seu livro, “Beatos e Cangaceiros,” de 1920, que na luta
armada que ficou conhecida na história como a “Sedição do Juazeiro”, seis anos
antes, os cabras que guerreavam já usavam tal expressão. A língua formal diz
que “mico” é um macaco de pequeno porte e cauda longa, soinho ou sagui. Esse
pequeno animal nada tem haver com os militares, porém, na gíria, mico é uma
situação vexatória, que causa vergonha, constrangimento. Alguns que usam tal
expressão vão além quando a situação é de constrangimento extremo, ao invés de
falarem que pagaram um mico, dizem que pagaram um “King Kong”, numa alusão ao
macaco gigante do cinema.
O cangaço,
assim como toda história, também teve seus micos. Situações tão absurdas que
nem toda criatividade hollywoodiana seriam capaz de criar os enormes “macacos”
acontecidos nos sertões nordestinos. Podemos até achar graça em alguns micos da
saga cangaceira, mas, é impossível sorrir diante das situações vexatórias e
surreais que levaram milhares de pessoas ao sofrimento e muitas vezes à morte.
O que dizer da
“brilhante” ideia dada por um leitor de um jornal, de usar um avião para
exterminar Lampião e seu bando? Esse mico até que dá pra dar boas risadas,
assim como se pode mangar muito do doido de pedra, o tenente Casaca de Couro,
que prometeu capturar o Rei do Cangaço e o entregar amarrado às autoridades. O
tagarela recifense, Augusto Gouveia, achava que tudo que via nos jornais sobre
as ações de Lampião era exagero, balela, era corpo mole dos sertanejos. Parece
que como hoje, desde os tempos do cangaço, algumas pessoas por morarem em
grandes cidades, acham que os “matutos” do interior, não sabem de nada.
Pois bem, o
senhor Augusto Gouveia pediu ao chefe de polícia de Pernambuco, Eurico de Souza
Leão, apoio para a sua empreitada, que era trazer Lampião no laço, assim como
um boi brabo. Doutor Eurico, mediante a insistência do sujeito lhe nomeou
tenente e o enviou para o Sertão, sob comando do major Teophanes Ferraz. Por só
viver usando paletó, os sertanejos logo o apelidaram de “Casaca de Couro” ou
“Casaca Preta.” O militar comissionado que tanto se pabulava não passou nem no
primeiro teste de fogo. Ao encontrar-se com Lampião em Calumbi Pernambuco, deu
uma carreira tão grande com medo de Virgulino e seus cabras, que ainda hoje
deve estar correndo em meio à caatinga sertaneja.
Outras
patacoadas que nos conta a história foram os sangrentos fogos da Serra Grande,
município de Serra Talhada, Pernambuco, em novembro de 1926 e da Fazenda
Maranduba em Poço Redondo, Sergipe, em janeiro de 1932. Nesses combates
atitudes precipitadas e imprudentes de comandantes de tropas contribuíram em
muito para manchar de vermelho o solo nordestino. Na peleja perto de Vila Bela
os volantes caíram numa emboscada bisonha. Ao invés de se precaverem e darem a
volta na serra para tentar pegar os cangaceiros de surpresa, decidiram utilizar
o caminho preparado pra eles por Lampião. Pareciam bois indo pra sangra.
Segundo
Frederico Bezerra Maciel, nesse fogo morreram 26 volantes e 38 ficaram feridos,
dentre eles os célebres Arlindo Rocha e Mané Neto. A tragédia só não foi maior
por que Antônio Ferreira, irmão de Virgulino, durante o intenso combate foi
aboiar acompanhando o cangaceiro Genésio, que “tangia o gado” pra morte, quando
foi atingido por uma saraivada de tiros de metralhadora. Nesse momento alguns
volantes se salvaram. Uns por serem socorridos por colegas e outros saindo em
disparada em meio à caatinga, deixando para trás equipamentos, armas e munições.
Existe a versão que a morte de Antônio Ferreira na Fazenda Poço do Ferro, do
coronel Anjo da Gia, foi em decorrência desse ferimento, sendo a versão de um
“sucesso” que envolveu Luiz Pedro, mentirosa.
No fogo da
Maranduba pode-se dizer que no mínimo os comandantes das volantes foram
irresponsáveis, por levar muitos dos seus comandados à morte, por falta de
estratégia e principalmente por falta de humildade. O número da força era muito
superior ao de cangaceiros, eram três militares para cada sicário e mesmo assim
a volante se mal. Alcindo Costa conta em seu livro, “Mentiras e Mistérios de
Angicos,” que existia uma disputa da volante de Nazaré, comandada por Mané
Neto, com a da Bahia, que tinha o tenente Liberato de Carvalho como comandante.
Cada militar
que quisesse ser mais valente do que o outro, disputa essa que chegou até os
comandantes das tropas. Antes de partirem para Maranduba, nenhum comandante deu
descanso aos seus homens, mesmo tendo eles vindo de exaustiva jornada. O
escritor de Poço Redondo diz ainda que os comandantes desprezaram todas as
normas militares, por orgulho, prepotência e empáfia, e sentencia que “o
despeito e a vaidade dos dois comandantes, foram a causa da perdição da
numerosa tropa.”
O tiroteio
durou do meio dia ao por do sol. Lampião durante todo o combate nunca se viu
apertado, mesmo tendo perdido três cabras, teve sempre a situação na mão.
Destroçou boa parte da volante, que ficou no meio do fogo cruzado, inclusive em
meio de um “fogo amigo”. A de se pensar: estando as volantes descansadas e não
tendo seus comandantes orgulhos comportamentos, teria tido o fogo da Maranduba
o mesmo desfecho?
Os casos
absurdos descritos neste texto são apenas alguns que vieram à mente, mas, o que
considero a maior besteira da história do cangaço, o mico dos micos, o
chipanzé, o orangotango ou mesmo King Kong de toda a saga, foi sem dúvida a
“brilhante” ideia de tirar os sertanejos de suas casas para acabar com o
cangaço. Só rindo para não chorar. Será mesmo que passou na cabeça de alguém
que a ideia do interventor baiano Juracy Magalhães e o capitão João Miguel,
nome esse que virou sinônimo de coisa ruim, de fome, de seca, daria certo? Pela
ideia do volante sim, pois ele achava que todo sertanejo era um potencial
coiteiro, e sem coiteiros o cangaço não sobreviveria. Santa inocência.
Milhares de
sertanejos foram expulsos de casa debaixo de ameaças. Deixaram tudo pra trás,
entregue a própria sorte. As estradas do Sertão se encheram de miseráveis
maltrapilhos, cidades sem a menor infra estrutura receberam esse povo faminto,
sem trabalho, sem dinheiro, jogado à própria sorte. Como não poderia deixar de
ser, a grande besteira dos mandatários da Bahia não deu certo, servindo de
mangação dos cabras.
Quem não achou
graça nenhuma foi o povo simples, sempre lascado no meio de cangaceiros e a
força volante. Quatro meses passados, e os sobreviventes dessa triste decisão,
voltaram às suas casas, muitas delas saqueadas, invadidas pelo mato e animais
selvagens. As poucas criações tinham morrido com a seca ou tinham fugido.
Outras foram roubadas por cangaceiros ou volantes, com a facilidade de os donos
não estarem em casa.
Quem pagou o
prejuízo desse povo? Ninguém é claro. E os que morreram de fome, quantos foram?
Quantos perderam a terra por dela terem se ausentado? Isso tudo por conta de
irresponsáveis almofadinhas que não conheciam a realidade dos sertanejos e com
suas idéias mirabolantes. Esses mesmo sem puxar o gatilho, mataram muitos.
https://www.facebook.com/photo.php?fbid=1088915367886968&set=gm.778465965650855&type=3&theater
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário