No final do
século XIX o país passava por muitas mudanças com a Abolição, em 1888, a
República, em 1889, e as diversas facções políticas se realinhavam, se
reestruturavam e lutavam pelo poder. Havia grandes desavenças políticas, e os
Partidos Liberal e Conservador se readaptavam à nova ordem.
Em 5 de agosto
de 1891 foi promulgada a primeira Constituição Republicana da Paraíba, trazendo
modificações nas instituições, pois as províncias haviam sido transformadas em
estados, cada um com constituição própria. A reorganização política dos
municípios abalou estruturas de poder consolidadas, com ameaças à oligarquia
dominante.
Foi nesse
contexto de profundas transformações políticas que cresceu Augusto de Santa
Cruz Oliveira, nascido em 1875, filho de João de Santa Cruz Oliveira e de
Ornicinda Bezerra, sendo esta filha do Tenente Manoel dos Santos Bezerra, de
tradicional família da vila de Alagoa do Monteiro, na região do Cariri
Paraibano.
João de Santa
Cruz Oliveira havia chegado àquela localidade na segunda metade do século XIX
proveniente da vila de Correntes, no Agreste de Pernambuco. Logo se tornou
figura destacada na região, dono de várias fazendas, coronel da Guarda
Nacional, político influente e deputado provincial pelo Partido Liberal na 25ª.
Legislatura (1884/1885). O casal João/Ornicinda teve cinco filhos: Miguel,
Arthur, Augusto, Theotonio e Francisca. Os três primeiros se formaram na
instituição de ensino mais prestigiada do país àquela época: a Faculdade de
Direito do Recife, onde Miguel formou-se em 1891 e Artur e Augusto em 1895.
Durante alguns
anos, em Monteiro, o comando político havia sido da família Santa Cruz. Além do
Cel. João de Santa Cruz Oliveira, Miguel de Santa Cruz Oliveira, seu filho mais
velho, também se destacou na vida pública, tendo sido deputado provincial em
1892 e 1894.
O Dr. Augusto
de Santa Cruz Oliveira, era mais afeito à política do que os irmãos Arthur e
Miguel, que preferiram dedicar-se à magistratura, tendo ocupado ambos e por
várias vezes cargos de juiz e promotor em diferentes comarcas da Paraíba,
Pernambuco e Alagoas. O irmão Theotonio de Santa Cruz Oliveira, conhecido por
“Seu Santos”, mais novo, apaixonado pelas lides rurais, vivia nas fazendas da
família. Pelo temperamento, pelo gosto da luta e pela vocação, Augusto foi o
herdeiro político natural do pai, que havia falecido antes de 1895. Aos 23
anos, em 1898, já era promotor público em Monteiro.
No início do
século XX, o presidente da província da Paraíba Álvaro Machado querendo
desmantelar o poder exercido pelos Santa Cruz na região, resolveu investir na
liderança do Cel. Pedro Bezerra da Silveira Leal, homem de origem humilde, que
havia galgado seu posto às custas de esforço pessoal, sem proceder de família
importante. Além disso, era semi-analfabeto. Aos olhos do poder central,
sediado na capital, seria uma figura mais fácil de manobrar do que o
voluntarioso e ilustrado bacharel Santa Cruz, afeito ao poder, ao mando,
carismático, possuidor de vontade própria, com projetos políticos pessoais e
liderança consolidada e inconteste.
A indicação
pelo governo central do coronel Pedro Bezerra soou para Augusto como um
desprestígio, um insulto às suas qualidades. Formado, promotor, ilustrado,
rico, filho de família tradicional, não se conformava em ser preterido dessa
forma. A mesma coisa havia ocorrido no vizinho município paraibano de Teixeira,
onde o comando político havia sido transferido para o Coronel Dario Ramalho de
Carvalho Lima, em detrimento do Dr. Franklin Dantas, médico, líder político até
então.
Rompido com os
chefes locais, o Dr. Augusto Santa Cruz protagonizou uma série de episódios
onde imperou a violência, com perseguições, espancamentos, invasões de vilas,
tiroteios e mortes. Em 1910, rompeu com Pedro Bezerra, envolveu-se em
emboscadas e invadiu a vila de São Tomé (atualmente a cidade de Sumé-PB).
Por esses
crimes foi pronunciado pela Justiça. Inconformado, em maio de 1911 cercou a
vila de Monteiro com 200 homens armados sob o seu comando, quebrou a cadeia,
libertou os presos e fez vista grossa aos desatinos que seus homens cometeram
pela cidade, quebrando portas, saqueando lojas e bens dos inimigos. Ao final da
escaramuça, tomou como reféns as autoridades locais, conduzindo os prisioneiros
para sua fazenda Areal. Augusto Santa Cruz pretendia negociar a liberdade deles
em troca de anistia dos crimes pelos quais estava sendo acusado.(2)
O governador
ignorou os pedidos de negociação e enviou força policial a Monteiro para
prendê-lo e libertar os reféns. A fazenda Areal foi atacada pelas tropas e
depois de intenso tiroteio Santa Cruz conseguiu evadir-se com seus homens. Os
reféns foram sendo soltos aos poucos, ou foram fugindo, aproveitando as brechas
da segurança. A força policial, depois do cerco, queimou completamente a
fazenda, destruindo tudo o que encontrou pela frente.
Mas Santa Cruz
não desistiu. Reorganizou suas forças, aliou-se a Franklin Dantas, líder também
desprestigiado no Teixeira, junto com o qual traçou planos de invadir a capital
da Paraíba. Para isso, conseguiu reunir um “exército” de mais de 400 homens,
entre moradores, empregados, fugitivos da justiça, ex-cangaceiros, amigos e
parentes(3).
Em maio de
1912, à frente dessa beligerante coluna, o Dr. Augusto Santa Cruz invadiu
Patos, Taperoá, Santa Luzia do Sabugi, Soledade e São João do Cariri. A partir
daí, frente à resistência oferecida pelo governo estadual e vendo a
impossibilidade de continuar tendo sucesso no tresloucado projeto, fugiu para
Pernambuco e em março de 1913 foi submetido a júri popular em Monteiro, com os
irmãos Miguel e Arthur atuando na defesa, sendo absolvido por unanimidade.
Depois disso,
exerceu o cargo de juiz de Direito em várias localidades de Pernambuco.
Aposentou-se em Limoeiro-PE, onde faleceu, em 31 de outubro de 1944, aos 69
anos de idade.
NOTAS
1. SUASSUNA,
Ariano. Romance d’A Pedra do Reino. Rio de Janeiro, Livraria José Olympio
Editora, 1972. 3. ed. p. 57.
2. As
autoridades seqüestradas foram: Pedro Bezerra, prefeito; José Inojosa, promotor
público; Capitão Albino, comerciante e fazendeiro; Major José Basílio,
comerciante e fazendeiro; e Victor Antunes, chefe da Agência do Correio da Vila
de Alagoa do Monteiro. NUNES FILHO, Pedro. Guerreiro Togado: fatos históricos
de Alagoa do Monteiro. Recife, Ed. Universitária, 1997. A fazenda Areal se
localiza atualmente no município de Prata-PB
3. Desse
exército, fazia parte, como seu lugar-tenente e homem de confiança, Julio
Salgado, irmão de Teotônio Salgado de Vasconcelos, meu bisavô. Julio Salgado e
sua mulher Quitéria Amélia Borba Salgado (Sinhá), meus tios-avós, foram
padrinhos de batismo de minha mãe, Cleuza Santa Cruz Quirino.
Fonte: facebook
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