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quarta-feira, 25 de janeiro de 2023

REVISTA "REGIÃO" DE CRATO/CE. A vingança do Tenente Antônio

 Reportagem de Osvaldo Alves

Jornalista Osvaldo Alves de Souza
Dizendo chamar-se legitimamente Antônio Manuel Filho, o tenente Antônio de Amélia, famoso por haver vingado a morte de um sócio, matando três cabras de Lampião, recebeu o repórter na sua Fazenda Piau, a cinco quilômetros da cidade de Ouricuri. Naquela visita fizemo-nos acompanhar do Dr. Edilton Luna, Promotor de Justiça de Bodocó e do jornalista Francisco Rocha, correspondente de "Região" no estado de Pernambuco.

A historia do tenente Antônio é longa e cheia de lances perigosos. Nascido em Alagoas, na cidade de Mata Grande, AL pertenceu a Policia pernambucana, na época de Lampião. Hoje é tranquilo fazendeiro em Ouricuri, somente molestado pela insistente curiosidade de algum repórter da revista Região, pois fomos os únicos, até agora, a localizar, no seu retiro, o valente oficial reformado da Policia pernambucana, muitos anos depois de sua arriscada aventura.

Trajando calça escura e camisa branca, óculos de grau a ponta do nariz, foi assim que encontramos Antônio de Amélia no alpendre da Casa Grande da Fazenda Piau. Inicialmente meio arredio, mas logo se derramou em cordialidade e falou com toda franqueza contando sua historia, suas proezas, suas aventuras, finalmente o desfecho com a morte de quatro elementos do grupo de Lampião. Foi bate-papo longo, aqui e acolá entremeado de risos do nosso entrevistado, quando recordava um episódio cômico ocorrido em meio a mais terrível expectativa, nas horas de maior perigo.

Corisco sangra Mizael e desfecha-lhe dois tiros na cabeça.


Primeiro veio a noticia: mataram Antônio Mizael. Corisco - Conta-nos o Tenente Antônio - Tocaiou o meu sócio Mizael. Ele tinha uma propriedade - O sitio Catinga. Deu feira em Inhapi, e depois foi empreitar umas terras para plantação de feijão.

Em lá chegando deparou com Corisco, cabra do grupo de Lampião. Com a ajuda de outros três bandidos Corisco amarrou o meu sócio, em seguida sangraram-no e depois deu dois tiros na cabeça. Recebi telegrama em Caruaru comunicando o fato.

Meio tonto com a noticia fui a Inhapi e comuniquei ao Prefeito Antônio Mota que iria fazer uma tragédia com a morte de Mizael. Só Deus evitaria de matar um dos cangaceiros. Mizael será vingado, custe o que custar. E preparei o plano.

Familiares do Tenente eram amigos de Lampião. 

Após um cafezinho servido as visitas, Antônio de Amélia prossegue no seu relato: "Estando, certo dia, em uma firma comercial, em Inhapi, em companhia do meu amigo corretor Pedro Paulo, expliquei para ele o meu desgosto por ter sabido da grande amizade de pessoas de minha família com Lampião e seus cangaceiros. Sendo eu da família, prefiro ir embora a ver acontecer alguma coisa desagradável com eles. A uma perguntas de Antônio Paulo, que o maior relacionamento de Lampião era com o meu parente Sebastião. Soube até que ele tem um rifle do bandido para consertar, além de um cantil que eles mandaram fazer de zinco e tem ainda umas cartucheiras enfeitadas de metal, também para conserto.

 O encontro com Sebastião

Sem mencionar o sobrenome de Sebastião, Antônio de Amélia conta as providências tomadas na articulação de seu plano para vingar a morte do sócio Mizael. Protestando, de inicio, suas ligações com o grupo de Lampião, Sebastião findou concordando com Antônio de Amélia. No momento travou-se este dialogo, entre os dois:
- Sebastião, vamos liquidar esses cabras?
- Não, porque ninguém pode. Eles são muito desconfiados e valentes como cobras venenosas.
- Confie no meu plano. Garanto que dará certo.
- Estou até esperando por alguns deles, para entregar umas encomendas.
 A longa espera

Atendendo a uma sugestão de Sebastião, Antônio de Amélia conta que, em companhia de pessoa indicada por Sebastião, se dirigiu para o local não muito distante do sitio onde o seu parente teria encontro com os cabras de Virgolino. Ali aguardaria as noticias de Sebastião ou a ordem para se apresentar na casa onde estavam os bandidos. Antônio de Amélia conta que, durante oito horas, escondido no mato, ficou a espera de Sebastião, que só apareceu as dez da noite, esclarecendo que teve que realizar algumas compras em Inhapi e, de volta, demorou numa festinha de casamento.

- Pensei - disse Antônio de Amélia - que você tivesse denunciado o plano e nós é que iriamos morrer: A seguir Sebastião meio pessimista quanto ao bom resultado do plano do seu parente:

- Não vai dar jeito para vocês, apesar de Lampião não ter vindo com os cabras que já estão aqui. Quem veio comandando os cangaceiros foi Luiz Pedro, agora, tem muita gente. Estão distante daqui, uma légua.


Fingiram haver morto um soldado para gozar da confiança dos cangaceiros. 

Distante uma légua do sitio onde se encontravam Antônio de Amélia, seu primo Sebastião e Antônio Tiago, compadre do primeiro e amigo para enfrentar as mais difíceis situações, estava acampado um dos grupos do famoso bandoleiro do Pajeú. Foi neste local, conta Antônio de Amélia, que Sebastião, conhecido do grupo, pois para eles trabalhava em serviço de consertos de armas, costura de embornais e outras atividades de sua profissão, apresentou-me a mim e ao compadre Antônio Tiago: - Aqui é gente minha - esclareceu na hora da apresentação, adiantando: - Eles mataram um soldado e estão refugiados na Casa de João Aires. A policia os anda perseguindo, embora não saiba onde eles se encontram.

A historia da "morte" do soldado, ardilosamente criada por Antônio de Amélia, foi o bastante para que os estranhos passassem a gozar da simpatia e confiança do grupo. Para eles, cabras de Lampião era herói quem assassinasse um soldado e duas vezes herói quem matasse um oficial.

Integrados ao grupo, Antônio e seus companheiros passaram a dar os últimos retoques no plano. Pelo menos já haviam conseguido penetrar no bando, o que muito facilitaria a execução de tudo quanto imaginaram perpetrar para vingar a morte do sócio Mizael. Naquele mesmo dia, a sombra das árvores, comeram, beberam e dançaram, homem com homem.

Antônio de Amélia é o 4º à direita.

Interessante observação nos fez o Tenente Antônio de Amélia, a nos explicasse que mesmo sendo em pequeno grupo, os cabras de Lampião jamais dormiram todos agrupados num mesmo local. Na hora de dormir se espalhavam a fim de garantir uma reação no caso de serem surpreendidos por uma visita desagradável dos volantes policiais.

Encontro com Lampião. 

Reunidos ao grupo chefiado por Luiz Pedro, prossegue Antônio de Amélia na sua narração - Fomos a Fazenda de Pedro Ferreira, um amigo de Lampião.

Ali recebidos com muito queijo e carne seca de bode. Neste local os cabras demoraram pouco tempo. Daí seguiram ao encontro do chefe. A apresentação da mais nova aquisição do bando foi feita por Luiz Pedro.

- É gente de Sebastião - explicou o apresentador sob o olhar meio desconfiado de Lampião. Dada a grande confiança que gozava Sebastião junto a Lampião e seus cabras, os visitantes logo puderam ficar a vontade.

Grupo se divide para confundir as volantes

Contou-nos Antônio de Amélia: Todos os elementos do grupo estavam reunidos. Lampião, tendo ao seu lado a companheira inseparável Maria Bonita, começou a distribuir ordens. Precisava demorar, por muito tempo, naquele acampamento, para repouso, depois de longas caminhadas e reiterados encontros com as volantes policiais e de ataques a indefesas cidades nordestinas. Chamando Suspeita, um dos seus fiéis comandados, ordenou que fosse a cidade de Mata Grande. E prosseguiu o Rei do cangaço:
- Receba umas encomendas de Sebastião e depois, da Mata Grande mate Alfredo Curim, Zé Horácio da Ipueira e faça 6 ou 7 mortes na família dos Bentos que é para ficarmos aqui despreocupados. De lá viaje para onde quiser, que passe fora uns 15 dias a um mês. 
Alegando Suspeita, que os cangaceiros do seu grupo precisavam arrumar certas coisas, Lampião autorizou que retirasse elementos de outros grupos. Foi aí que Fortaleza, que era do grupo de Luiz Pedro, Medalha, que sempre acompanhava o chefe, e Limoeiro, que pertencia a outro, passaram a compor o pessoal de Suspeita para o cumprimento daquelas ordens. Ao mesmo grupo nos incorporamos. Isto é, eu, Sebastião e Antônio Tiago. Mais tarde, quando estávamos de passagem pelo município de Santana, Zeca, irmão de Sebastião e Alfredo, seu primo, se reuniram a nós, após as necessárias apresentações.

Em diferentes direções outros grupos saíram.

Seguindo as ordens do capitão Virgolino, diversos grupos seguiram em diferentes direções, com o mesmo objetivo de desviar a atenção das volantes e facilitar a permanência de Lampião, naquele local: Um deles, disse-nos Antônio de Amélia, se dirigiu a Matinha de Agua Branca, terra da famosa baronesa, cujas joias foram roubadas por Lampião, no inicio de sua carreira.

Cangaceiros deram para desconfiar.

Acampados no meio da mata, Suspeita e sua gente aproveitaram a presença de Zeca, primo de Sebastião, que era bom rabequista, para, ao lado de uma fogueira, dançarem e beberem durante toda a noite.

Antônio de Amélia prossegue na sua narração: Aproveitando os cabras entretidos na dança, chamei Sebastião e disse para ele: vamos ter um pouquinho de cuidado com os cabras. Parece que eles estão um pouquinho desconfiados. Chamei depois o meu compadre Antônio Tiago e combinamos:
- O primeiro tiro será dado por mim em "Fortaleza". Compadre Antônio cuida de "Limoeiro" e Sebastião de "Suspeita".
Aguardaremos, com cuidado a melhor oportunidade. Neste momento pude observar que Suspeita e Fortaleza se isolaram do grupo e, todos equipados, se dirigiam a um riacho nas proximidades do lugar de nosso acampamento.

Foi aí que Sebastião se dirigiu até o local onde os dois se achavam e perguntou:
- O que está havendo com você, Suspeita, que está triste e capiongo? 
Ao que Suspeita exclamou:
- Nada não, companheiro. Quem anda nessa vida precisa ter todo cuidado. Precisa confiar desconfiando. 
Sebastião retrucou:
- Então está desconfiando de mim que tudo tenho feito por vocês e gosto de você e do Capitão? Neste caso não mande mais me chamar para coisa nenhuma. E saiu para perto da fogueira. 
Diante da reação de Sebastião tudo voltou ao normal no acampamento, mesmo porque advertir, - disse Antônio de Amélia - para cessar a dança e o barulho da rabeca, pois dada a pequena distancia daquele local para a estrada, poderiam ser surpreendidos por alguma volante.

Tentativa frustrada.

Prosseguindo na entrevista, comenta Antônio de Amélia: todos reunidos ao pé da fogueira contavam anedotas ou relembravam fatos pitorescos ocorridos em outras ocasiões. Medalha levanta-se e se encontra a um pé de catingueira, enquanto Fortaleza se ampara em um toco escorou o embornal e ficou voltado para o fogo. Limoeiro, ao lado de Antônio Tiago, ouvia as historias que outros contavam. Foi neste momento que, ao me aproximar cautelosamente de Fortaleza, baixei o mosquetão em cima dele mas pinou a bala. Foi quando procurei despistar colocando rápido o rifle as costas e fui passando debaixo dos galhos das árvores.

Nisto gritou Limoeiro:
 - O que foi? 
- Foi o galho que pegou aqui na mira do rifle. 
Passando o episódio, frustrada a primeira tentativa de liquidar os bandidos, pude distanciar-me um pouco e sacudi a bala fora, colocando outra na agulha. Antes, justifiquei o caso afirmando inexperiência no uso de armas daquele tipo.

A hora da vingança.

O momento da vingança chegou: disse o tenente Antônio, de volta após mudada a bala que falhou e colocada outra na agulha, desci o mosquetão e o primeiro tiro pegou na cara do bandido Fortaleza, que enterrou os pés e caiu em seguida por sobre os paus. Dei o segundo tiro que o atingiu no ombro. Nisto ouvi disparo: Era compadre Antônio Tiago havia atirado em Limoeiro, enquanto numa sequência rápida, Sebastião pegou Suspeita pelo meio.

Alfredo ataca Medalha e saíram aos trancos e barrancos numa luta corporal danada. Corri para lá e encontrei suspeita com Sebastião imprensado na ribanceira do riacho tentando puxar o punhal que, por ser grande demais, não dava para arrancar da cintura. Sebastião então grita para mim: chegue se não este cabra me mata. Bati com a boca do mosquetão no pé do ouvido do cabra que o sangue acompanhou. Nisso Sebastião pode dominar Suspeita e joga-lo no chão. Quis usar novamente o mosquetão, mas Sebastião gritou:
Não atire que você pode errar e me atingir, e mesmo o bandido já está morrendo.
Em seguida corremos para o lugar onde António Tiago e Limoeiro se engalfinhavam numa luta de gigantes. Eram dois negros enrolados numa luta feroz.

Nisso Sebastião pegou nos cabelos de Limoeiro e exclamou: foi este bandido que sangrou o o finado Mizael. Fui mandado, disse Limoeiro.
- Pelo amor de Deus não me sangrem. Atirem na minha cabeça, mas não me sangrem. 
Um tiro reboou na mata. Caia morto o terceiro bandido. Estava vingada a morte do amigo de Antônio de Amélia. Partimos para o lugar onde Alfredo, pegado com medalha, tentava mata-lo. Alfredo é desses cabras vermelhos de cabelo ruim que quando pegam um não soltam. Ao nos ver disse:  
- Decá uma faca. Deixem eu matar este peste. 
Não permiti que matasse, explicando que deveria levá-lo para ser entregue as autoridades.

O diálogo entre Sebastião e Medalha

Outro episodio que nunca foi citado nos livros e reportagens sobre o rei do cangaço foi o que passamos a enfocar: já amarrado, pés e mãos, Medalha exclamou para Sebastião a que passou a tratar de Tião:
- Como é que você faz dessas... chamar seus parceiros para vir matar a gente?
Ao que Tião responde:
- Vocês estão acostumados a matar com facilidade, nós também podemos matar vocês na facilidade.
- Eu não sou homem para ser preso, me atirem na cabeça... me sangrem que eu fico satisfeito.
- Você está preso e garantido, explicou Tião.
No meio da luta uma segunda vingança

Praticamente encerrado o impasse entre matar ou prender, entra em cena novamente Alfredo, de arma em punho. Com revolver colocado por cima dos ombros de Tião, desfechou um tiro certeiro na cabeça de medalha. Tombou o quarto bandido. É o próprio Tenente Antônio de Amélia, explica a interferência de Alfredo no caso Medalha:

No meio da luta o velho Félix, pai de Alfredo, ao se aproximar do local do acampamento foi atingido por uma bala no peito esquerdo e foi fulminado na hora. O filho, como um louco, viu o pai cair morto e não teve outra alternativa a não ser a de matar, com a pistola de Limoeiro, mais um bandido do grupo sinistro de Lampião.

Exposição macabra dos bandoleiros e no caixão Félix Alves,
pai de Alfredo.



 O enterro coletivo dos quatro cangaceiros no cemitério de Mata Grande.
Noite Ilustrada, Edição 319 de 12 de outubro de 1935. Página 10
 Cortesia do scanner: Robério Santos

Créditos: Roberto de Carvalho
Transcrição Antonio Moraes para o Blog do Sanharol
Correções e adição de imagens: Lampião Aceso

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Adendo Lampião Aceso

A literatura nos diz que este grupo foi orientado pelo tenente Joaquim "Grande", mas em nenhum momento este ou outro oficial é citado por Antônio de Amélia. De acordo com a legenda das duas primeiras fotografias o fato ocorreu entre 18 e 19 de setembro de 1935 em Mata Grande Alagoas.

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VOCÊ SABIA?

 Clerisvaldo B. Chagas, 25 de janeiro de 2023

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica:  2.832


      Você sabia que a maior ilha fluviomarinha lagunar do Brasil está localizada em Alagoas? Se não sabia fique sabendo que a maior ilha fluvial (rio) do Brasil é a do Bananal, no estado do Tocantins, que fica entre dois rios. E a maior ilha fluviomarinha do mundo é a de Marajó no estado do Pará. Em Alagoas, a ilha de Santa Rita é a maior ilha fluviomarinha lagunar do Brasil. Situada na laguna Mundaú, faz parte de um arquipélago e está situada no município de Marechal Deodoro, vizinho a Maceió. A ilha de Santa Rita possui quatro povoados, são eles: Santa Rita, Siriba, Jacaré e Barra Nova. A propósito, a Ilha de Marajó possui 40.1 mil km 2, a ilha do Bananal 19.162 kme, a nossa ilha de Santa Rita 12 km2 Nessas alturas o leitor pode indagar, então, qual seria a maior ilha oceânica do Brasil. Partindo para essa vertente, iremos encontrar a Ilhabela, em São Paulo, vizinha a cidade de São Sebastião, com 346 km2.

Mas, voltando a Alagoas, mesmo fazendo comparações entre extensões de ilhas, a Santa Rita até que é enorme! É um dos lugares mais procurados tanto pelo maceioense quanto pelos turistas, devido principalmente às suas belezas naturais e gastronomia de tradição lagunar e praieira. Olhando com outros olhos, é um verdadeiro livro  de Geografia escrito e ilustrado pelo Grande Arquiteto do Universo. Passar pelo menos um turno na região, é jogar pela janela o lixo do estresse de cada dia. Vale salientar que o local é área de preservação e tem a vantagem para quem quiser visitá-la, da proximidade com a capital do estado e do acesso rápido e fácil que proporcionam conforto ao visitante.

Vale salientar que tanto a ilha quanto as imediações, são repletas de belezas como praias, manguezais e paisagens arrebatadoras. Em alguns lugares da rodovia que liga Maceió a Marechal Deodoro, encontramos toldas de guloseimas dos tempos da vovó: broas, suspiros, cocada, bolos e muitas outras que derretem na boca na primeira mordida. Isso você só vai encontrar no povoado Pé-Leve, entre Arapiraca e Limoeiro. Mas o que é mesmo uma ilha? É uma quantidade de terras cercada de águas por todos os lados. E arquipélago é um conjunto de ilhas. Depois vêm os detalhes das ilhas, cada qual com seu nome específico.

Quer saber mais sobre a ilha de Santa Rita? Pneu na estrada, “véi”

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A MORTE DO SARGENTO DELUZ - PARTE III

Por José Mendes Pereira

Sargento Deluz

Continuando a nossa história sobre a morte do sargento Deluz, o escritor Alcino Costa, conta que o pai da Dalva, o João Marinho sempre tentava resolver aquele problema sem desassossegar a sua estimada família; sabia que a filha não tinha um tico de sossego, mas pior seria se pior fosse, uma desavença laçando todos da família. O que o patriarca mais queria, era a paz naquele lar. Jamais desejou ser inimigo do seu próprio genro, pai de sua netinha que nascera no meio da infelicidade. Já tinha cedido, uma parte de terra numa região de mata fechada, lá no Araticum. Naquele local o delegado desajustado fez uma fazendinha.

Mesmo com toda essa tribulação, surge mais uma novidade que deixa todos os seus familiares tristes, a Dalva engravida novamente do bruto delegado. Meses depois, a criança nasce, e é batizada com o nome Maria Luíza, mas entre família, chamavam-na de Zizi. 

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Mas parece que as coisas iriam tomar outros rumos, porque, o militar estava cheios de projetos, e desejava aumentar suas terras, assim alguém se abestalhasse e fizesse o seu desejo de lhe doar mais terras. E sendo o Valadão seu amigo e concunhado, casado com a Mariinha, propõe-lhe a cessão de um pedaço de terra. E sem muita demora, o seu pedido foi atendido, o Valadão fez a doação da área de terras do seu desejo, e lá, negociaram que, seu pedaço de terra começava pelo um trilho que se iniciava em um riacho chamado da Barra. Com essa doação, o delegado Deluz criou gosto em seus projetos, e a sua fazenda Araticum passou a ser de grande porte.

Mas essa doação, o seu sogro João Marinho não ficou satisfeito, e resolveu não mais entregar os documentos de posses ao genro. E com essa negação de não entregar os documentos da terra que cedera ao Deluz, as desavenças aumentaram entre genro e sogro. O sargento ficou furioso com a atitude tomada pelo seu sogro, e as confusões aumentaram mais ainda entre eles.

O Deluz não se contentou somente com as terras cedidas pelo Valadão, seu concunhado, e passou a desejar uma parte da grande propriedade do sogro. Como ele sempre foi arrogante, procurou o velho João Marinho e falou sobre a sua intenção, adquirir mais terras para aumentar os seus projetos. Mas o João Marinho não concordou, e nesta confusão, entrou a sogra do sargento Deluz. Dona Maria Gomes se aborreceu com a solicitação, ou olho grande do bruto genro. E além dos maus-tratos com a esposa, por último, queria investir sobre as terras do Brejo, e como era poderoso, não temia ninguém, porque se considerava o melhor da lei e da justiça. A sua posição de delegado fazia pensar que era dono de tudo, sem que ninguém o incomodasse. E tinha que obedecer as suas exigências e ordens.

O fazendeiro João Marinho ficou sem saber o que iria fazer. O militar já atrapalhando a boa vida que tinha sua filha Dalva, agora só lhe faltava esta, querer se apossar do que não era dele. Aquela terra custou o seu suor, a sua vida, desde muitos anos foi cuidar das suas terras, e sem menos nem mais, de repente, surge um infeliz querendo tomá-la do seu poder.

Apesar de ter sido um homem bruto, ignorante e outros mais adjetivos, o Deluz odiava qualquer tipo de trapassa, e sempre quando isso era para ser resolvido por ele, como militar, agia pela razão e conforme mandava a justiça.

Um deles foi o caso de Zuleica, uma das filhas de uma senhora chamada dona Delfina da Pedra D’água, que estava nos primeiros dias de resguardo, e tivera uma discussão com um jovem chamado Raimundo, um dos empregados de um senhor de nome Mestre Cícero. Tomando conhecimento da discussão que tivera o Raimundo com a parturiente Zuleica, o delegado Deluz intimou-o e ordenou que ela desse-lhe uma surra de chicote, daqueles fabricados com couro cru, mas a Zuleica não aceitou a ordem. Revoltado com a rejeição da Zuleica, o Deluz fez-lhe a segunda proposta: se ela não surrasse o Raimundo, quem iria apanhar era ela. E sem outra solução, mesmo contra vontade, o rapaz foi surrado pela Zuleica. Como a Zuleica ainda estava no seu resguardo e debilitada, e não esperava aquela ordem tão severa, findou adoecendo e dias depois, ela faleceu.

Existe um outro fato que aconteceu com um jovem, que ao ver algumas meninas brincando, dentre elas estava Adélia, filha do sargento Deluz e da infeliz Dalva, o jovem mostrou os seus órgãos genitais a elas. Assim que Deluz soube, prendeu e mandou que as meninas desse-lhe uma surra de chicote naquele indivíduo.

Calma! Continuarei amanhã!

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A MORTE DE ANTÔNIO CANELA

 Por Alcino Alves Costa


"Certa vez, por e-mail, Alcino Alves Costa me disse que gostaria de ser lembrado através desta foto - 
José Mendes Pereira"

O sertão está alegre. A chuva tem caído com abundância. O inverno é bom e farto. Tudo é bonança e grandeza. O mimoso se espalha belamente pelas caatingas, balouçando, daqui pra ali, ao sabor gostoso do vento. O capim, a beldroega, o feijão brabo, a jitirana e a marmelada cobrem os loros das selas e as barrigas dos animais. Vaqueiros, animados e felizes, todos os dias ficam mudando a gadama, de uma fazenda pra outra, nos trabalhos de apartação.

Nas serras do Curralinho uma pequena fazenda – Camarões – está em festa. Alguns vaqueiros (Chiquinho de Aninha, Flávio, seu Alves, Libéu, Angelino, João Cirilo) ajuntam o rebanho para apartação. A ideia é levar o gado de Juvêncio Rodrigues para a Pedrata.

A cachaça rola e a chuva cai.

Lá, no início da malhada, desponta Antônio Canela. O caboclo está caçando um jumento. Soube do ajuntamento que ali estava acontecendo e com vontade de beber uma cachacinha seguiu para a fazendinha de Juvêncio.

Canela era um galho familiar da Caldeira. Nascido e criado nas Alagoas, num lugarzinho chamado Bonito. Carregava uma provação em sua vida. Um dia acompanhou alguns amigos que foram até o povoado “Entre Montes” esperar Lampião com o intuito de enfrenta-lo. O cangaceiro não apareceu mais a notícia dos preparativos para a reação contra ele se espalhou.

Tempo depois o rapaz se muda para Sergipe, indo residir no Curralinho. Jamais poderia imaginar que aquela sua aventura com as armas iria lhe trazer tão trágico dano. Mas, um mensageiro da desgraça assim não pensava, era ele “Zuza de Invenção”, cabra ruim e mal-intencionado que, levado pela maldade e vontade de agradar os bandidos, conta a história de Canela a eles.

O moço não sabia que estava na mira dos bandoleiros. Sem nenhum temor caminha por todos os arredores, mesmo sabendo que aquelas redondezas estão infestadas de cangaceiros.

Na fazenda do ajuntamento os vaqueiros aboiam e bebem. A chuva não para e cai com vontade. Grossas bátegas se esparramam pelo barro vermelho daquelas serras. Os grotões e riachos estão empanzinados e roncando. O sertão mais parece um paraíso.

Antônio Canela se demora. Gosta da farra e da cachaça. A chuva é forte e demorada. O melhor é esperar e beber.

A chuva diminuiu e foi embora. João Cirilo abre uma das janelas. Surpreso exclama:

 - Ói Cuma vem genti ali, e só podi ser cangaceiro.

A malhada está coalhada de cangaceiro. O grupo é chefiado por Mané Moreno. Todos estão com as roupas encharcadas. Chegam ao telheiro. Os presentes são saudados com um aperto de mão. Quando chega a vez do rapaz de Alagoas, Mané Moreno é que pega na sua mão e para espanto de todos diz:

O cangaceiro Mané Moreno

- Você tá preso!

A afronta a Lampião iria ser vingada.

Angelino e João Cirilo tentam pedir pelo condenado. A sentença já estava consumada.

Mané Moreno encerra a conversa dizendo:

- Não adianta pidido ninhum pra este cabra Ele vai morrer pruque merece.

Canela era um homem destemido. Mesmo não desconhecendo o seu fim tem forças para perguntar:

- E o qui foi qui eu fiz?

Pancada é quem responde:

- Se esqueceu qui andava armado pra atirá im Lampião?

- Foi mesmo. Só tivi pena porque ele num apareceu.

Alecrim cabra perverso, arranca um canivete e com desmedida fúria enfia a arma várias vezes no corpo do prisioneiro. Um outro bandido – Cravo Roxo -  não deixa por menos, com o coice de seu mosquetão bate com furor desmedido no rosto de Canela. A cabroeira está irritada com a ousadia do rapaz.

Os cangaceiros Áurea,  (errado Gorgulho) é Cravo Roxo e Mané Moreno

O cangaceiro era a personificação da desgraça e da morte. A fazendinha e os vaqueiros agora estavam envoltos num manto de tristeza e dor. Acabara-se a festa e a alegria. Agora tudo havia se transformado em horror e agonia. O povo sertanejo não pode ser feliz enquanto aqueles malsinados bandoleiros dominarem o seu sertão. Impossível se ter paz e sossego naquele mundo dominado pelo cangaceiro e pelas volantes.

Antônio Canela estava sendo supliciado. Amarram-no na garupa do animal e alecrim e viajam. Canela pergunta a Áurea, companheira de Mané Moreno e filha de Antonio Nicácio, se os cangaceiros vão mata-lo. A bandida acena com a cabeça que sim. Desesperado, ao receber a confirmação de seu fim, o rapaz, num ato extremado, tenta escapulir. Consegue pular do animal e corre loucamente serra abaixo. É perseguido pelo bando e rapidamente alcançado.

Mané Moreno está possesso. Obriga o infeliz abria a boca e comprovando o monstro que era puxa sua arma e atira. Canela teve tempo apenas de virar sua cabeça para um lado e, então, em vez de atirar na boca, atirou no ouvido do moço.

Canela não caiu e recebe o segundo tiro. Este no rosto. Desaba por cima das macambiras. É ainda sangrado por Pancada.  Acontece, então, a grande prova do negrume daqueles seres que não eram humanos e sim verdadeiros monstros. O cangaceiro Cravo Roxo se acerca da cor inerte de Canela, fica ao seu lado acocorado e como se fosse um monstro, e mostro ele era – bebe o sangue que borbulha da veia do pescoço do infeliz que está estirado no chão duro daquelas serras.

Do telheiro da fazenda, Juvêncio, seu Alves João Cirilo, Angelino Libéu e Chiquinho de Aninha abobalhados, observam a triste e aterradora cena. Lá embaixo, na serra, mais um sertanejo acaba de ser ceifado deste mundo por força do flagelo que há tantos anos vem assolando aquela região antes tão pacata e feliz.

Desolados e temerosos os vaqueiros soltam o gado e retornam para Curralinho.

Fonte: “livro Lampião Além da Versão Mentiras e Mistérios de Angico”
Autor: Alcino Alves Costa
Páginas: 195, 196 e 197.
Edição 2ª. Edição
Ano: 2011

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BRIÓ E ANTÔNIO CANELA: QUANDO AS PALAVRAS E AS AMEAÇAS SÃO SENTENÇAS DE MORTE

 *Rangel Alves da Costa

Muitos foram os acontecidos no solo sertanejo de Poço Redondo, no sertão sergipano, naqueles idos cangaceiros, principalmente a partir dos anos 30. Fato curioso é que a saga cangaceira na região não envolveu somente a ferrenha luta entre cangaceiros e volantes, mas também personagens que mesmo estando à margem das vinditas, ainda assim foram alcançados pela cruel sangria.

Mais curioso ainda é o fato de que dois destes importantes acontecidos, de consequências verdadeiramente trágicas, tiveram por motivação as palavras ditas e as ameaças impensadas. Ou mesmo de forma pensada, mas sem se imaginar no fatal desfecho depois de proferidas. Depois da análise do relatado abaixo, logo será fácil compreender que perante o cangaço - incluindo o mundo das volantes - a palavra e o gesto possuíam tamanha força, tamanha consequência, que exsurgiam até como sentença de morte para aquele que erroneamente se expressasse.

Assim aconteceu, por exemplo, com Brió e Antônio Canela. Este de trágico fim nas proximidades da Estrada de Curralinho (Estrada Histórica Antônio Conselheiro) e aquele ladeando a Estrada da Maranduba (região das Queimadas, nas beiradas do Riacho do Braz), bem próximo ao local onde, em 1937, Zé Joaquim (José Machado Feitosa), um rapaz de Poço Redondo foi torturado e morto pelo grupo de Juriti e Zé Sereno, sob a falsa acusação de ter dito a Zé Rufino que o bando de Lampião estava emboscado à sua espera na Lagoa da Cruz.

Como dito, Antônio Canela, um modesto vaqueiro vivente entre as beiradas alagoanas de Bonito e sergipanas de Curralinho, falou demais e, além disso, ameaçou demais, e acabou trucidado pelas próprias ações do passado. Segundo consta, nos idos de 1937, o vaqueiro se juntou com outros sertanejos e prometeu dar cabo a Lampião assim que este chegasse a Entremontes, nas barrancas das Alagoas. Pegou em armas, preparou a tocaia, mas nada de o bando aparecer. Contudo, a história ganhou o vento e foi parar aos ouvidos da cangaceirama.

Certamente que amedrontado com a irrealizada promessa e as juras de dar fim ao rei cangaceiro, Antônio Canela resolveu se bandear para o outro lado do rio, região sergipana do Curralinho. Oficiando como vaqueiro, um dia foi atrás de um jumento pelos arredores da fazenda Camarões e mais adiante avistou, na sede da propriedade, uma festança. Vai até lá e se junta à beberança. Não sabia, contudo, que logo a cangaceirama chegaria para cobrá-lo na dor e no sofrimento aquela emboscada feita pra Lampião.

E a cangaceirama que chega é a comandada por Mané Moreno. O líder do subgrupo já havia sido informado que o vaqueiro “metido a valente” poderia estar por ali. Tanto estava que logo o reconheceu. Identificou e logo deu início à cruel vingança. Sem dar o mínimo de atenção aos rogos dos sertanejos ali presentes, o cangaceiro logo sentencia o vaqueiro de morte. E de forma mais bestial ainda ante a confissão feita de que só não matou Lampião por que este não apareceu. Uma coragem que equivalia a pedir pra morrer.

A morte de Canela foi de indescritível perversidade. Picotado pelo canivete de Alecrim, tombado ante o açoite do mosquetão de Cravo Roxo, e depois disso amarrado a um animal e levado à morte certa. Foi Mané Moreno quem deu o tiro fatal. Mais um. E já morto é sangrado. E, segundo Alcino Alves Costa em seu Lampião Além da Versão (p. 196), o cangaceiro Cravo Roxo se acerca do corpo e bebe do sangue que borbulhava em seu pescoço.

Antes disso, nos idos de fevereiro de 1935, o sertanejo Brió (Benjamin, irmão do cangaceiro Demudado), um moço de Poço Redondo, igualmente falou demais e pagou no além da conta pela sua ousadia. Num meio onde a mera suspeita de ser alcoviteiro de volante já era correr perigo, que se imagine um cabra dizer - mesmo mentirosamente - que iria se juntar ao comando de Zé Rufino para perseguir aqueles que fossem amigos, coiteiros ou protetores de cangaceiros.

Num forró na fazenda de Julião do Nascimento, pai do mesmo Zé de Julião que mais tarde se tornaria no cangaceiro Cajazeira, Brió se desentendeu com a família dos Lameu e, raivoso, disse que todos pagariam bem pago assim que entrasse na força de Zé Rufino, o que já estava prestes a acontecer. Mentiu, contudo. E sua mentira teve uma trágica consequência. Sua verdadeira intenção era se juntar ao grupo de cangaceiros que estavam acoitados naquelas proximidades, nas Capoeiras. Iria servir ao subgrupo do perverso Mané Moreno, contando ainda com Zé Sereno e Juriti.

Sem saber que Brió se juntaria ao grupo, então Zé de Julião apareceu no coito para contar a novidade: Brió havia prometido ser cabra de Zé Rufino. Foi o fim de uma mentira. Não demorou muito, eis que Brió se apresenta àquele que seria o seu futuro grupo cangaceiro. Só não sabia o que lhe esperava. A sentença foi rápida: morte certa ao traidor. Tentou desfazer a todo custo o mal-entendido, mas não teve jeito. Os cangaceiros levam-no até o Riacho do Braz e o enforcam.

Indaga-se: por que enforcamento e não de outra forma? Apenas por que Brió, ante a certeza da morte, rogou para não ser nem enforcado nem afogado. Assim a vida cangaceira e daqueles que estavam ao seu redor, suas sagas e seus desatinos, seus tortuosos caminhos.

Escritor

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