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sábado, 19 de junho de 2021

QUANDO KIRK DOUGLAS BRINCOU O CARNAVAL COM UM CHAPÉU DE VAQUEIRO E DORMIU EM UMA REDE POTIGUAR

Durante o Carnaval de 1963, Kirk Douglas, Um dos Maiores Astros de Hollywood, Conheceu e Descansou em Uma Típica Rede de Dormir Feita no Rio Grande do Norte, Usou um Chapéu de Couro e Conheceu a Cultura Nordestina Através do Natalense Sylvio Piza Pedroza, Ex-Prefeito de Natal e Ex-Governador Potiguar, Um Político Que Muito Valorizou a História da Sua Terra.

Rostand Medeiros – IHGRN

No início do ano de 1963 o Brasil era um país que vivia sob o signo da intranquilidade, principalmente no campo político. O gaúcho João Goulart, o Jango, era o Presidente do Brasil e ele ocupava o Palácio do Planalto há um ano e cinco meses, depois da nação ficar assombrada com a intempestiva renúncia do paulista Jânio Quadros.

Já a maioria da população brasileira ainda não possuía em suas residências os serviços básicos necessários para uma boa qualidade de vida, havia uma pesada crise econômica e a insatisfação de setores da sociedade com os rumos do governo Goulart fazia com que nuvens negras surgissem no horizonte político de Brasília.

Brasília, a nova capital brasileira – Fonte – https://conhecimentocientifico.r7.com/

Se dentro do país a situação se tornava complicada e seu povo vivia em meio a muitos problemas, a visão do Brasil no exterior até que não era das piores. No ano anterior a nossa seleção havia conquistado o bicampeonato de futebol no Chile, a Bossa Nova era cantada e elogiada em várias partes do mundo, o Cinema Novo começava a chamar atenção fora do país e Brasília encantava os estrangeiros com o arrojo de sua construção e sua bela arquitetura.

É nesse cenário que desembarcaram em Brasília o ator de cinema norte-americano Kirk Douglas e sua esposa Anne, que nascera na Bélgica e era produtora cinematográfica. 

Carnaval Em Brasília e Com Um Chapéu De Vaqueiro Nordestino

Esse astro de Hollywood, nessa época vivendo o auge de sua carreira, havia sido convidado para conhecer o nosso país e aproveitar os principais bailes de carnaval da novíssima capital federal e do Rio de Janeiro. O casal desembarcou na madrugada de sexta para o sábado de carnaval, dia 22 de fevereiro de 1963, no avião da Pan American Airways. Entre as figuras que aguardavam Kirk Douglas estava Luiz Severiano Ribeiro Junior, dono da maior rede de salas de cinema do país, e José Tjurs, proprietário do Hotel Nacional de Brasília. 

Kirk Douglas no Palácio do Planalto – Fonte – http://www.memoriascinematograficas.com.br

Na tarde de sábado o casal se encontrou com o prefeito Ivo de Magalhães e passearam por Brasília na companhia de Israel Pinheiro da Silva, o primeiro prefeito da cidade. Foram até mesmo ao Palácio do Planalto, mas o presidente João Goulart havia viajado para o Rio Grande do Sul (Correio Braziliense, 23/09/1963, págs. 3 e 8). Kirk Douglas se impressionou com a capital brasileira e comentou que “Para fazer isto tem que ter peito”. Vale ressaltar que o cargo de prefeito em Brasília foi extinto em outubro de 1969, passando os governadores do Distrito Federal a atuarem na prática como dirigentes da capital.

Capa da revista O Cruzeiro (Ed. 23/03/1963)

À noite o casal Douglas foi para o II Baile da Cidade, no Hotel Nacional, onde o carnaval rolou solto. O astro hollywoodiano, talvez por se encontrar na capital do país, foi vestido para o baile de maneira muito formal, envergando um bem talhado smoking. Mas na cabeça estava com um típico chapéu de couro do vaqueiro nordestino. Inclusive o astro foi fotografado com a indumentária sertaneja, beijando sua mulher Anne e a foto foi capa da revista O Cruzeiro (Ed. 23/03/1963), uma das principais do Brasil naquela época.

Dormindo Em Uma Tradicional Rede Potiguar, Mais Macia Que Sua Cama em Beverly Hills

No outro dia Kirk Douglas e Anne foram para uma casa alpendrada, feita de tábuas de madeira, as margens do Lago Paranoá, onde o ator de Hollywood foi fotografado tranquilamente dormindo em uma tradicional rede confeccionada no Rio Grande do Norte.

Revista O Cruzeiro, Ed. 16/03/1963 – Foto – Roberto Stuckert

Em outras fotos ele aparece sorrindo e abraçado a sua esposa Anne. Algumas pessoas estão sentadas em cadeiras e observam o casal. Na época essas fotos foram creditadas a Henri Ballot, mas na edição seguinte da revista houve uma retificação e o crédito passou ao jovem paraibano Roberto Franca Stuckert, então com 19 anos.

Revista O Cruzeiro, Ed. 16/03/1963 – Foto – Roberto Stuckert

A casa, pelo menos nas fotos, parece bem simples e rústica e segundo o crítico de cinema Ely Azeredo, que assinou o pequeno texto existente na revista O Cruzeiro (Ed. 16/03/1963, págs. 108 a 111), Kirk Douglas “experimentou pela primeira vez as delícias de uma rede no alpendre da casa de campo do Comodoro do Iate Clube Silvio Pedroso”. 

Mas o texto de Ely Azeredo possui um pequeno erro, pois o então Comodoro do Iate Clube de Brasília não era “Silvio Pedroso”, mas o ex-prefeito de Natal e ex-governador do Rio Grande do Norte Sylvio Piza Pedroza.

O PresiPresidente Juscdente Juscelino visitando o Iate Clube de Brasília em 1961, próximo ao final do seu mandato. Sylvio Pedroza está a sua esquerda – Fonte – www6.iateclubedebrasilia.com.br

Sylvio tinha então 45 anos de idade, era subchefe da Casa Civil da Presidência da República, cargo que assumiu ainda no governo Juscelino Kubitschek (1956 a 1961), passou pelo curto período de Jânio Quadros (1961) e continuava na função no governo João Goulart.

Provavelmente pela natureza do seu cargo e, quem sabe, pela sua fluência no idioma inglês foi que Sylvio Pedrosa se aproximou de Kirk Douglas e eles acabaram nas margens do Lago Paranoá.

Revista O Cruzeiro, Ed. 16/03/1963 – Foto – Roberto Stuckert

Talvez essa proximidade explique o chapéu de vaqueiro usado pelo astro de Hollywood no baile de carnaval no Hotel Nacional. Isso é bem possível, já que Sylvio Pedroza ficou conhecido no Rio Grande do Norte por sempre valorizar suas tradições e principalmente a história de sua terra.

E Kirk Douglas parecia bem à vontade naquela tradicional rede potiguar e naquela casa de aparência rústica e simples. O que não seria nenhuma novidade para um filho de imigrantes pobres nos Estados Unidos, que fugiram das perseguições e dos pogroms contra os judeus no Império Russo.

Revista O Cruzeiro, Ed. 16/03/1963 – Foto – Roberto Stuckert

O ator nasceu na cidade de Amsterdam, no estado de Nova York, em 9 de dezembro de 1916 e foi batizado como Issur Danielovitch. Aprendeu iídiche antes do inglês e conviveu com um pai alcoólatra e fisicamente abusivo, que bebia o pouco dinheiro que ganhava recolhendo lixo e deixava sua mãe e suas seis irmãs na miséria. Mesmo assim Douglas avançou nos estudos e conseguiu entrar na universidade, onde se formou em Direito em 1939. Durante a Segunda Guerra Mundial foi tenente a bordo de um pequeno caça submarinos no Pacífico, um tipo de barco que ficou conhecido na Marinha do Brasil como “Caça ferro”. Após ser dispensado devido a um acidente na sua embarcação, Kirk Douglas voltou para Nova York e começou a trabalhar no rádio, teatro e comerciais. Em 1946, fez sua estreia nas telas em The Strange Love of Martha Ivers e teve uma carreira de enorme sucesso no cinema, ganhando três indicações ao Oscar e um Oscar pelo conjunto de sua obra. Em 1960 atuou no papel principal do elogiado filme Spartacus, dirigido por Stanley Kubrick e ganhador de quatro Oscars, E foi pelo seu papel em Spartacus que Kirk Douglas foi bastante referenciado nessa visita ao Brasil.

Revista O Cruzeiro, Ed. 16/03/1963 – Foto – Roberto Stuckert

Antes que esqueça!

Kirk Douglas gostou tanto da rede de dormir fabricada em terras potiguares, que em um texto que escreveu para a revista O Cruzeiro (Ed. 23/03/1963, pág. 9) comentou…

“Pela primeira vez experimentei uma rede brasileira, mais confortável e macia do que minha cama em Beverly Hills”.

Tradição Potiguar

Para Sylvio Pedroza também não houve nenhum problema em oferecer ao astro de Hollywood uma típica rede potiguar, um hábito comum no Rio Grande do Norte, principalmente nos alpendres das casas existentes nas nossas belas praias.

Sylvio Pedroza, quando Prefeito de Natal, em uma solenidade na Escola Doméstica em homenagem ao Presidente da República João Café Filho, p único potiguar a chegar a esse cargo.

Nascido em Natal no dia 18 de março de 1918, Sylvio Piza Pedroza era filho de Fernando Gomes Pedroza e Dona Branca Toledo Piza Pedroza. Seu pai foi um agropecuarista e tido como um dos mais abastados comerciantes do Rio Grande do Norte. Sylvio estudou na Inglaterra e no Rio de Janeiro, onde se formou em Direito e ali morou por vários anos. Durante a Segunda Guerra retornou para Natal e em abril de 1945 foi nomeado membro do Conselho Administrativo do Estado do Rio Grande do Norte. No ano seguinte, quando tinha apenas 26 anos, foi indicado prefeito de Natal e foi sendo empossado pelo interventor federal Ubaldo Bezerra de Melo em abril de 1946. Ficou no cargo até fevereiro de 1950.

Posse de Sylvio Pedroza na Prefeitura de Natal

Durante as eleições de outubro de 1950 elegeu-se vice-governador do Rio Grande do Norte, assumindo a chefia do governo quando o então mandatário potiguar Jerônimo Dix-Sept Rosado Maia faleceu em um trágico acidente aéreo em Sergipe. Ficou no cargo até 1956, quando assumiu funções no Banco do Nordeste e depois tentou uma vaga ao Senado Federal, mas não se elegeu.

Ouvi de velhos políticos que Sylvio Pedroza atuou com simplicidade, sem pedantismo e que sabia ouvir os mais simples de sua terra. Além disso, incentivou o desenvolvimento de obras que trataram sobre a história potiguar, principalmente através de uma parceria com Câmara Cascudo.

Em 7 de março de 1947 Cascudo entregava ao jovem prefeito os primeiros exemplares do livro História da Cidade do Natal, até hoje uma referência sobre o tema (A Ordem, o9/03/1947, pág. 3). A parceria seria repetida em 1955, quando Sylvio Pedroza era governador potiguar e conseguiu com o Serviço de Documentação do Ministério da Educação e Cultura a impressão dos exemplares do livro História do Rio Grande do Norte. Uma obra com 524 páginas e cujos primeiros exemplares foram entregues ao governador em abril de 1956 (O Poti, 17/04/1956, pág. 16).

Para seus críticos Sylvio Pedroza utilizou esse apoio a Cascudo apenas como um estratagema para consolidar seu nome e torná-lo mais conhecido no Estado. Pelo fato dele ser considerado como alguém “de fora”, por apenas ter nascido em Natal e morado por muitos anos distante da terra potiguar, Pedroza não era conhecido da população local e nem do meio político e por isso a aproximação. Ouvi de velhos políticos que, se isso realmente aconteceu quem ganhou foi o povo potiguar com a qualidade do material produzido por Cascudo. Para esses homens Sylvio Pedroza atuou politicamente com simplicidade, sem pedantismo e que sabia ouvir os mais simples de sua terra.

Sylvio Pedroza e Getúlio Vargas em 1954

Câmara Cascudo, em seu livro Rede de Dormir: Uma pesquisa etnográfica (MEC, 1957, 1ª Ed. págs. 31 e 32), comentou que essa relação dos políticos do Rio Grande do Norte com as redes de dormir é coisa bem antiga.

“Muita rede foi enviada de presente aos companheiros do Sul. E era lembrança local apreciada, ”souvenir” dos deputados gerais e senadores do Império aos seus colegas meridionais. O Visconde de Mauá possuiu uma grande e confortável rede, dada pelo deputado pelo Rio Grande do Norte, Amaro Carneiro Bezerra Cavalcanti, Amaro Bezerra, o “Tintureira” bonachão e violento nas últimas décadas imperiais. Na República, o deputado Augusto Severo, que morreu na explosão do dirigível Pax em Paris (12 de maio de 1902), voltava do Natal para a Câmara levando um carregamento de redes de dormir e queijos de manteiga do Seridó, ofertas disputadas pelos seus amigos do Parlamento. O senador Pedro Velho obrigava a instalação de sua rede inseparável nos hotéis onde morava no Rio de Janeiro, rede em que Rui Barbosa se deitou, sorridente, e Pinheiro Machado balançava-se, enrolando palha de milho com fumo negro de Goiás.”

Sylvio Pedroza

E De Que Cidade Veio a Rede?

No início desse texto imaginava que essas redes que existiam na “casa de campo” de Sylvio Pedroza as margens do Lago Paranoá eram oriundas de Caicó. Pois na minha meninice dormi em ótimas redes vindas dessa cidade seridoense e ouvia falar da fama que esses materiais produzidas por lá tinham em relação a qualidade.

Mas recorrendo aos conhecimentos e a experiência do meu amigo Adauto Guerra Filho, para mim o maior historiador vivo do Seridó Potiguar e morador de Caicó, na época do episódio em Brasília realmente existiam boas redes, com ótima qualidade e sendo produzidas na Capital do Seridó. Mas eram em pequeno número e a produção estava em crise.

Mestre Adauto Guerra Filho, o maior historiador vivo do Seridó Potiguar, autor de quinze livros, grande conhecedor da história de sua região. É um homem humilde, solicito e amigo. Faz tempo que é merecedor de reconhecimento maior.

A informação de Mestre Adauto encontra respaldo em Câmara Cascudo, no livro Rede de Dormir: Uma pesquisa etnográfica, de 1957.

Cascudo informou que através do apoio do seu amigo Aderbal de França, que trabalhava na Inspetoria Regional de Estatística Municipal no Rio Grande do Norte, em 1950 existiam por aqui 42 fábricas de redes e em 1956 o número se reduziu a somente 4, sendo três em Mossoró e apenas uma em Currais Novos. No último período uma das fábricas mossoroenses produziu 20.000 e outra 6.304 redes.   

Dos tempos áureos da produção de redes no Rio Grande do Norte, segundo descobri pesquisando no site da Biblioteca Nacional, as indústrias nessa área que mais se destacaram no Rio Grande do Norte foram a Fábrica de Redes Potiguar, de J. Oliveira & Cia., de Natal e localizada no bairro da Ribeira, próximo ao Teatro Alberto Maranhão (A Ordem, 29/10/1938, pág. 1). Já em Mossoró se destacou a Fábrica de Redes São Vicente, de Osmídio & Cia. Ltda., que ficava na Rua Coronel Saboia (Almanak Laemmert, edição 1937, pág. 1.606). No final da década de 1940 mereceu registro a Fábrica de Redes e Tecidos Santa Maria, de José Dhalia da Silveira, com sede na Rua dos Pajeús, 1.713, bairro do Alecrim, em Natal (A Ordem, 21/06/1948, pág. 3).

Kirk “Spartacus” Douglas sendo “atacado” no Baile do Municipal do carnaval de 1963 no Rio de Janeiro

Independente da cidade potiguar que fabricou a rede que Kirk Douglas dormiu em Brasília, aparentemente ele descansou bastante. Aliás, ele precisou descansar, pois no domingo de carnaval partiu com na sua esposa para o Rio de Janeiro, onde participou, juntamente com mais de 5.000 foliões, no famoso Baile do Municipal. O ator foi fantasiado de Spartacus e caiu na farra. Apesar do “ataque” das cariocas ao astro de Hollywood, ele não desgrudou de Anne e chamou atenção no Rio pelo comportamento positivo e atencioso ao lado da esposa.

Kirk e Anne Douglas – Fonte – G1

Caso raro em Hollywood, o casal Douglas mantiveram-se unidos até a morte de Kirk, que ocorreu em fevereiro de 2020, quando ele estava com a idade de 103 anos. Já sua esposa Anne faleceu em sua casa em Beverly Hills, dias após seu 102º aniversário, em abril de 2020. 

https://tokdehistoria.com.br/2021/06/12/quando-kirk-douglas-brincou-o-carnaval-com-um-chapeu-de-vaqueiro-e-dormiu-em-uma-rede-potiguar/

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A PREFEITURA MUNICIPAL DE RIO DO FOGO E O GRUPO TOK DE HISTÓRIA DEBATEM TEMAS DO PASSADO DESSA BELA COMUNIDADE DO LITORAL POTIGUAR

 

Fonte – Prefeitura Municipal de Rio do Fogo.

Rostand Medeiros – IHGRN

O GRUPO TOK DE HISTÓRIA, um grupo que valoriza a democratização da informação histórica, esteve recentemente no município de Rio do Fogo, onde manteve um positivo encontro com membros da municipalidade sobre aspectos da história dessa cidade no período da Segunda Guerra Mundial.

O foco dos debates girou em torno dos acontecimentos ocorridos no dia 18 de abril de 1941, uma sexta-feira, quando pescadores locais se encontravam na área dos belos recifes de corais ali existentes e conhecidos como parrachos de Rio do Fogo, quando viram um barco com náufragos.

Praia de Rio do Fogo – Foto – German Zaunseder.

Eram os sobreviventes do navio de carga inglês Ena de Larrinaga, que havia sido torpedeado dias antes na região do Arquipélago de São Pedro e São Paulo, pela tripulação do submarino alemão U-105, comandado pelo Kapitänleutnant Georg Schewe.

Naquele dia vários pescadores rio-foguenses estavam em três jangadas na área externa dos parrachos e não tiveram dúvidas em ajudar os 19 náufragos estrangeiros. Além de dividirem sua água e comida, as três jangadas rebocaram o barco salva vidas até a beira mar. A comunidade de Rio de Fogo então ajudou esses homens com o que foi possível e demonstrou aquilo que as pessoas desse lugar têm de melhor: um forte espírito de solidariedade.

S.S. Ena de Larrinaga – Fonte – https://www.wrecksite.eu/wreck.aspx?15355

O texto completo dessa história é um dos capítulos do meu livro “Sobrevoo – Episódios da Segunda Guerra Mundial no Rio Grande do Norte”, lançado em 2018, mas que está disponível no nosso BLOG TOK DE HISTÓRIA neste link –https://tokdehistoria.com.br/2020/06/25/rio-do-fogo-1941-chegam-as-primeiras-vitimas/

A reunião foi muito positiva e o GRUPO TOK DE HISTÓRIA se colocou a disposição de ajudar no processo de democratização da informação histórica. Inclusive a Prefeitura Municipal de Rio do Fogo comentou em sua conta oficial do Instagram sobre o encontro, conforme é possível ver abaixo.

RESGATANDO NOSSA HISTÓRIA

Na última terça-feira, 15, os secretários de Turismo, Júnior Ferreira, e de Educação, Joária Vieira, receberam os historiadores que fazem parte do Grupo Tok de História.

Rostand Medeiros, Jerônimo Tinoco e German Zaunseder, vieram até nosso município falar e mostrar um pouco da pesquisa que os mesmos fizeram em resgate a história de nossa querida praia, incluindo detalhes sobre os náufragos sobreviventes da II Guerra Mundial que chegaram até nossa então vila de pescadores naquela época, em 1941.

A reunião que também contou com a participação da equipe de Comunicação da Prefeitura, teve como objetivo iniciar um planejamento para que futuras ações sejam realizadas com intuito de resgatar a história do município.

Para o prefeito Márcio de Cici, é de grande importância esse resgate, seja inserindo esse tipo de conteúdo no ambiente escolar, e também promovendo ações que enalteçam a história de luta do povo rio-foguense perante a comunidade local e aos turistas.

O GRUPO TOK DE HISTÓRIA gentilmente agradece a acolhida, bem como ao prefeito Márcio de Cici, aos secretários de Turismo, Júnior Ferreira, e de Educação, Joária Vieira, a equipe de Comunicação da Prefeitura e ao amigo Thiago Lopes pelos contatos realizados.

https://tokdehistoria.com.br/2021/06/18/a-prefeitura-municipal-de-rio-do-fogo-e-o-grupo-tok-de-historia-debatem-temas-do-passado-dessa-bela-comunidade-do-litoral-potiguar/

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ANÉSIA CAUAÇU: CONSIDERADA POR MUITOS COMO A PRIMEIRA CANGACEIRA

 Por Nordeste Fantástico

https://www.youtube.com/watch?v=w22vA3ktF8g&ab_channel=NordesteFant%C3%A1stico

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QUEM FOI LAMPIÃO?

 Por Benedito Vasconcelos Mendes1

Virgulino Ferreira da Silva, autodenominado “Capitão Virgulino, Governador do Sertão” e também conhecido pela alcunha de “Lampião, o Rei do Cangaço”, foi o mais famoso, o mais temido, o mais sanguinário, o mais cruel, o mais desumano de todos os cangaceiros brasileiros. Segundo a crença popular, a alcunha “Lampião” foi dada devido à rapidez com que ele manejava seu antigo rifle Papo Amarelo (rifle Winchester, modelo 1873, de fabricação americana), que nos combates noturnos provocava um clarão semelhante ao produzido pelo farol de iluminação caseira, conhecido por lampião a querosene.

Inteligente e conhecedor do ambiente seco e quente do Polígono das Secas, especialmente de sua vegetação, de seu território e de sua fauna, desenvolveu uma estratégia de sobrevivência na caatinga baseada no alimento, na água, na medicina caseira, no conluio com os coronéis coiteiros e na perícia de se defender e atacar as volantes (polícia) no ambiente sertanejo e, com isso, tornou-se o maior estrategista de combate na caatinga de todos os tempos.

Fenotipicamente, Lampião era uma figura esbelta, de estatura entre mediana e alta, amulatada, semicorcunda, queixo desenvolvido, mãos excessivamente grandes, com dedos finos e compridos e o olho direito cego por uma estrepada de espinho de quipá (cactácea nativa do Nordeste).

Foi um cangaceiro nascido no final do século XIX e que viveu nas três primeiras décadas do século XX, na região seca do Nordeste brasileiro. Veio ao mundo no dia 4 de junho de 1898, na cidade sertaneja de Vila Bela, hoje Serra Talhada, localizada no Vale do Rio Pajeú, em plena região semiárida pernambucana. Morreu no dia 28 de julho de 1938, quando estava homiziado com parte de seu bando de cangaceiros na Grota de Angico, no município sergipano de Porto da Folha. Com a criação do novo município, a Grota de Angico passou a pertencer ao município de Poço Redondo- SE. Foi morto a tiro de fuzil pelo soldado Sebastião Vieira Sandes, alcunhado de Santos, pertencente à volante comandada pelo então Tenente João Bezerra (João Bezerra da Silva, 1898- 1970), da Polícia Militar do Estado de Alagoas. Neste ataque morreram Lampião, Maria Bonita e mais nove cangaceiros, além do soldado Adrião Pedro de Souza, 1915-1938, da volante de João Bezerra. Suas cabeças foram expostas e fotografadas na cidade alagoana de Piranhas. As de Lampião e de Maria Bonita foram levadas para a Faculdade de Medicina da Bahia, em Salvador, para serem estudadas pelos médicos-legistas, com a finalidade de provar a existência ou não de

1Benedito Vasconcelos Mendes graduou-se em Engenharia Agrônoma pela Universidade Federal do Ceará, cursou o Mestrado na Universidade Federal de Viçosa-MG e o Doutorado na Universidade de São Paulo (USP). Foi professor titular e diretor da antiga Escola Superior de Agricultura de Mossoró ( ESAM), hoje Universidade Federal Rural do Semiárido (UFERSA ). características lombrosianas. Depois ficaram expostas no Museu Antropológico Estácio de Lima, localizado no prédio do Instituto Médico Legal Nina Rodrigues, até 1969, quando foi exigido na justiça o sepultamento. Lampião não possuía características faciais típicas (face lombrosiana) de quem tinha tendência para o crime violento, como preconizava a teoria do médico psiquiatra italiano Cesare Lombroso.

Pertencia a uma família de pequenos produtores rurais, tinha sete irmãos (quatro mulheres e três homens) e seus pais, ajudados pelos filhos, viviam como os demais catingueiros da região, tirando o sustento da família da exploração da terra, praticando a agricultura de subsistência, plantando feijão, milho, mandioca, batata-doce, melancia, jerimum e outras culturas, cultivando algodão mocó, criando aves domésticas, galinhas, capotes, patos e perus, criando cabras, ovelhas, jumentos, burros, cavalos e uns poucos bovinos, além de ter trabalhado como almocreve.

Nos sertões pernambucanos, os pequenos produtores rurais de sua época praticavam, também, o extrativismo de madeira para carpintaria, marcenaria, construção civil, cerca, lenha e carvão. Caçavam, pescavam e coletavam frutos comestíveis das plantas nativas e mel de abelhas silvestres. Podemos dizer que, socioeconomicamente, a família de Lampião pertencia à classe média baixa. Lampião, antes de entrar para o cangaço, sofreu as consequências da tenebrosa e severa seca de 1915, que foi tão bem descrita pela romancista cearense Raquel de Queiroz, em seu famoso livro O quinze. Já vivendo fora da lei, testemunhou as catastróficas secas de 1919 e de 1932. Como habitante do sertão semiárido, Lampião assistiu ao sofrimento dos sertanejos nos períodos das calamidades climáticas, quando, devido à carência de chuvas, não conseguiam cultivar seus roçados, faltavam água e alimentos para o gado e para o homem. O gado morria de fome e sede e o povo adoecia e perecia de fome e das epidemias de cólera, varíola e catapora. Os sertanejos que viviam na região atormentada pelas secas periódicas sofriam muito, pois as doenças, a falta de alimentos e a morte de seus entes queridos e de seus animais domésticos os obrigavam a fugir para os seringais da Amazônia, para trabalhar na coleta da borracha de seringueira e, tempos depois, passaram a migrar também para as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste do país.

Lampião foi alfabetizado na antiga e precária escola rural, onde o mestre-escola o ensinou a ler, escrever e a contar. Ele passou a infância e o início da adolescência trabalhando no campo com seu pai. Ainda muito jovem, trabalhou como artesão de couro, confeccionando arreios e outros artefatos, e como almocreve, transportando em lombos de burros produtos alimentícios para as feiras e casas comerciais das vilas e cidades regionais. Após a morte de seu pai, entrou para o bando de seu tio Antônio Matilde (Antônio José Ferreira) e depois para o grupo do cangaceiro Sinhô Pereira (Sebastião Pereira e Silva, 1896-1979), seu conterrâneo de Serra Talhada. Pouco tempo depois, em 1922, ocupou o lugar do seu chefe, que abandonou o cangaço e foi morar em Goiás. Lampião, ao entrar na vida bandoleira, levou seus dois irmãos mais velhos, Livino Ferreira da Silva,

apelidado “Vassoura”, e Antônio Ferreira da Silva, conhecido por Esperança, e tempos depois trouxe para o cangaço seu irmão mais novo, Ezequel Ferreira da Silva, cognominado Ponto Fino.

Foram seus pais José Ferreira da Silva e Maria Vieira da Soledade. Seu pai foi morto a tiro pelo Segundo Tenente José Lucena de Albuquerque Maranhão (1890), no terreiro de sua casa, na cidade alagoana de Mata Grande, onde, poucos dias antes, também tinha morrido sua esposa. Segundo a literatura, Lampião, seu pai e sua mãe usaram vários sobrenomes, daí o grande número de nomes próprios que tinham, principalmente sua mãe. O documento de onde tiramos a data de nascimento de Lampião e o nome completo de sua mãe foi a sua Certidão de Batismo (Batistério), fornecida pelo Vigário da Paróquia de Floresta, da Diocese de Pesqueira-PE, Padre Joaquim Antônio de Siqueira Torres, com data de 6 de agosto de 1961.

Lampião pertencia a uma família valente e muita unida, sob a liderança firme de seus atormentados pais, que passaram os últimos anos de vida envolvidos em confusões criadas pelos seus três filhos mais velhos (Antônio, Livino e Virgulino). Sua família teve que deixar sua terra natal, Serra Talhada, e fugir para outras cidades, primeiramente para a fazenda Poço do Negro, próxima a Nazaré do Pico, Distrito de Floresta-PE, e depois para os municípios alagoanos de Água Branca e Mata Grande, sendo este último o município onde morreram sua mãe e seu pai. José Ferreira, pai de Lampião, foi morto pela polícia em consequência de roubos e brigas praticados por seus filhos. Sua mãe faleceu de morte natural. O primeiro litígio da família Ferreira ocorreu ainda quando ela residia em Serra Talhada, ocasião em que seu vizinho José Saturnino (José Alves de Barros) entrou em desavença com os filhos de José Ferreira, por motivo de roubo de criações. Devido a esta briga, a família de José Ferreira ficou peregrinando por vários lugares em Pernambuco e Alagoas, para fugir das perseguições policiais, a mando de José Saturnino e/ou em consequência de roubos e confusões realizados pelos irmãos Ferreira. Em um curto período de tempo, a família Ferreira mudou-se de Serra Talhada para Floresta-PE e daí para a cidade alagoana de Água Branca e de lá para Mata Grande, também em Alagoas. O clima de conflito entre a família Ferreira e a de José Saturnino induziu Lampião e seus irmãos para o banditismo. José Saturnino, quando menino, era amigo de Lampião. Sua família tinha mais posses do que a de Lampião, mas não chegava a ser considerado coronel do sertão.

Naquela época, os latifundiários, que eram as pessoas mais ricas do sertão, eram chamados de coronéis, pertenciam a uma classe social privilegiada, e, além de serem detentores de extensas áreas de terra, possuíam poder econômico e político nas vilas e cidades sertanejas, e se arvoravam de donos da lei e da polícia. Com prepotência, truculência e arrogância perseguiam, prendiam, torturavam e matavam seus desafetos. Mandavam no povo porque tinham dinheiro, prestígio e “votos de cabresto” para eleger os políticos que lhes garantiam o poder local. O povo pobre,

abandonado pelo poder público, só tinha uma opção: aceitar a ordem estabelecida pelos ricos e poderosos.

José Saturnino, embora não fosse considerado coronel do sertão, era valente, tinha prestígio com a polícia, enfrentava e perseguia o pai, o próprio Lampião e seus irmãos.

Os irmãos Ferreira sentiam-se injustiçados e não aceitavam a prepotência e os insultos de Saturnino, o que os estimulou a pretenderem fazer justiça com as próprias mãos, escolhendo a vida cangaceira.

A religiosidade de Lampião, dos demais cangaceiros e de todo o povo do sertão era baseada no misticismo herdado dos tapuias, na romaria para venerar os santos populares, eleitos pelo povo, como Padre Ibiapina, Padre Cícero e Beato Antônio Conselheiro. No sertão semiárido, existem os santos populares, santificados pelo povo, mediante o endeusamento dos líderes religiosos carismáticos, como ocorreu com o Padre Ibiapina, Beato Antônio Conselheiro, Padre Cícero, Frei Damião, Beato Zé Lourenço, Beato José Senhorinho e outros.

Lampião acreditava nas orações fortes, para adquirir corpo fechado, e nos amuletos, para se proteger das armas dos inimigos. Ele usava orações manuscritas dentro da carteira de dinheiro e/ou acondicionadas em saquinhos de couro, pendurados no pescoço, como proteção contra facadas e balaços. Era um devoto incondicional do Padre Cícero e se ajoelhava em plena caatinga para rezar e pedir proteção aos santos de sua devoção.

Era costume dos cangaceiros pedir às rezadeiras sertanejas para fechar seus corpos com a oração de São Bento. Eles acreditavam que, tendo o corpo fechado, estariam protegidos das armas dos seus inimigos.

Os cangaceiros praticavam a medicina popular usada pelos sertanejos para a cura de suas doenças. Seus remédios caseiros geralmente eram as banhas de animais e aqueles feitos com partes de plantas. Para o tratamento de muitas doenças, usavam a banha de tejo, banha de cobra cascavel, banha de raposa, banha de cágado, banha de jia, banha do peixe traíra e banha de galinha. Utilizavam também raízes, cascas de caules, folhas, flores, sementes e frutos das plantas, para fazer unguentos, cataplasmas, chás, xaropes, garrafadas e lambedores, visando curar os mais diferentes males. Os ferimentos a bala eram sarados com pimenta malagueta e sal grosso. Os golpes de faca eram costurados com linha zero e agulha grande de coser tecido grosso.

Nas horas de lazer, em seus esconderijos na caatinga, alegrados pela cachaça, Lampião e seus cangaceiros declamavam poesias de cordel, cantavam, tocavam sanfona, zabumba e dançavam o xaxado (dança para homens, na qual a mulher era substituída pelo rifle). Jogavam baralho (cartas), dados (bozó) e outros jogos para se distraírem.

A alimentação dos cangaceiros tinha como base o feijão de corda; o milho; a farinha e a goma de mandioca; a rapadura; o queijo de coalho; a manteiga da terra; a banha, o toucinho e a

carne de porco torrada e mergulhada na gordura e a carne de gado seca (carne de boi salgada e seca ao sol). A cabra, o carneiro, a galinha, os peixes de água doce nativos dos rios da região (curimatã, traíra, piau, cangati, muçum, cascudo e outros) e as caças de animais silvestres (preá, mocó, tejo, tatu, tamanduá, veado catingueiro, avoante, rolinha, juriti, marreca, pato selvagem, asa branca e muitos outros animais) também faziam parte da alimentação dos membros do bando.

Os cangaceiros usavam uma vestimenta especial, que lhes conferia uma estética própria, formada pelo chapéu de couro, bornal, cabaça d’água, matulão, cartucheira, lenço de pescoço e casaco de mangas compridas e bolsos. Calçavam alpercatas de couro e suas armas brancas eram o punhal, com cabo artisticamente trabalhado, e o facão, que era usado para serviços gerais e, às vezes, para decepar a cabeça de inimigo já morto. O punhal de Lampião era exageradamente grande, com 82 centímetros de comprimento, muitas vezes usado para ser introduzido na “saboneteira” ( fossa clavicular esquerda, localizada acima da clavícula) para atingir o pulmão e o coração de suas vítimas. Lampião usava como armas de fogo a pistola (Parabellum), o rifle Papo Amarelo, usado até 1926, e o fuzil Mauser, modelo 1908, calibre 7x57, usado após 1926.

A indumentária dos cangaceiros do grupo de Lampião primava pela beleza e utilidade. O chapéu de couro e o bornal eram enfeitados com artísticos bordados. O chapéu típico do cangaço tinha as abas dobradas e decoradas com belas peças de couro, moedas de prata ou ouro, medalhas de santo e estrela de David feita de metal, pregadas na aba da frente do chapéu. Lampião era um exímio costureiro e usava máquina de costura manual.

Lampião, muito vaidoso que era, gostava de ver e ler nos jornais a sua fotografia e a de seu bando de cangaceiros, bem como as reportagens e artigos que escreviam sobre ele e seu grupo de malfeitores. Fazia seu marketing pessoal nas entrevistas que dava, quando se autoproclamava Capitão Virgulino, o Rei do Cangaço e Governador do Sertão. O povo o tinha como muito corajoso, valente, malvado, rico e poderoso. Ele gostava de distribuir dinheiro em moedas para as crianças e de retribuir favores aos coiteiros. Lampião, ao longo de seus mais de 20 anos de vida cangaceira, praticou, ele e seus cabras, os mais cruéis castigos e mortes às suas vítimas. O povo amedrontado imputava os mais hediondos crimes a Lampião e seu grupo, como os de castrar, estuprar, sangrar, cortar a língua, cortar orelha, ferrar no rosto com ferro quente e outros terríveis suplícios. Um dos mais hediondos métodos de matar usado por Lampião e seu bando era sangrar a jugular ou a carótida de suas vítimas. Degolar seus inimigos e expor as cabeças em estradas e em outros locais públicos eram uma prática comum entre os cangaceiros e volantes, usada como forma de intimidação.

Lampião conquistou um grande leque de amizades entre os coronéis sertanejos, aqueles latifundiários que detinham o poder político e econômico no sertão e por isso dominavam a justiça e a polícia. Nos sertões nordestinos, na primeira metade do século XX, vigorava a “lei do mais forte”.

Os coronéis eram pessoas privilegiadas, que conseguiam o que queriam pela força das armas. Geralmente residiam em suas fazendas de criação de gado, cuja casa-sede em que habitavam era semelhante a um bunker, guarnecido pelos jagunços. Possuíam verdadeiros exércitos de capangas, disfarçados de vaqueiros. Esses coronéis geralmente mantinham estreita aliança com Lampião, na esperança de, quando necessitassem, receber o reforço armado do Rei do Cangaço, em suas eventuais contendas políticas. Forneciam a Lampião armas, munições, hospedagem, proteção e comida para o bando, quando estavam arranchados em suas fazendas. Esses coronéis políticos do sertão eram detentores de grande prestígio e eram cortejados pela sociedade. Geralmente eram coiteiros do Rei do Cangaço e, sem eles, jamais Lampião teria se mantido tanto tempo vivo e sem ser preso.

Com exceção do Maranhão e Piauí, Lampião atuou em todos os outros Estados nordestinos, invadindo fazendas, vilas e cidades para roubar dinheiro, jóias, alimentos, armas e munições. Extorquia e matava com crueldade, como meio de vida, com o único objetivo de tirar proveito material. Lampião aterrorizava a população sertaneja para impor seu poder. Provocava o medo e a intimidação para se manter com autoridade perante o povo. Não tolerava traição e aquele que comunicasse às volantes (polícia) o local do seu esconderijo pagaria com a vida, após ser brutalmente torturado, para servir de exemplo aos demais moradores da região.

Os grupos de cangaceiros eram formados somente por homens, mas em 1930 Lampião inovou o cangaço levando Maria Bonita para conviver com ele, passando ela a fazer parte do seu grupo de cangaceiros e a partir daí começou-se a permitir a presença de mulheres no cangaço. A entrada de mulher no grupo de cangaceiros só era permitida se ela fosse amante de algum membro. Lampião não aceitava mulher descompromissada no seu bando, tinha que estar amigada com algum cangaceiro. As mais famosas cangaceiras foram Maria Bonita (Maria Gomes de Oliveira, 1911- 1938); Dadá (Sérgia Ribeiro da Silva, 1915-1994), companheira de Corisco; Lídia de Zé Baiano; Enedina de Cajazeira, Sila, mulher de Zé Sereno; e Durvinha, amante de Moreno.

Lampião visitou o Padre Cícero (Cícero Romão Batista, 1844-1934) em Juazeiro do Norte em 1926, onde recebeu a patente falsa de Capitão do Batalhão Patriótico, criado pelo Deputado Floro Bartholomeu da Costa (1876-1926) para combater a Coluna Prestes, que à época estava rondando os sertões nordestinos. Lampião recebeu também fardamento e fuzis doados por Floro Bartholomeu, com a justificativa de que iria combater a Coluna Prestes.

A maior façanha de Lampião foi invadir a cidade de Mossoró, no Rio Grande do Norte, no dia 13 de junho de 1927. À época, esta cidade já era desenvolvida e populosa, com cerca de 25 mil habitantes. Os invasores foram rechaçados pela população.

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