Por Geraldo Maia do Nascimento
Eram homens
simples do velho sertão nordestino, com habilidades de acompanhar a caça pelos
seus vestígios. Perspicazes observadores, nada lhes escapavam ao olhar. Uma
pequena pedra revirada, uma imperceptível depressão no solo ou um graveto
partido, tudo eram indícios da passagem da caça. E quando o chão não lhes
oferecia indícios, apelavam para os matos, observando os pontos de atrito dos
ramos que, com a passagem de animais, mudavam o contato. Era uma técnica comum
aos povos caçadores, ligada ao sentido de orientação. Muitos faziam disso
profissão. Alguns se destacaram muito em suas regiões, passando para a história
pela perícia com que desempenhavam suas funções. Em Serra Negra havia Antônio
Coco que era contratado para rastejar cobras.
Tinha também naquela região Guilherme do Trapiá, fazendeiro rijo, sempre de bom humor, que era um rastejador de primeira qualidade, pois nunca um animal lhe escapou. Quando saia no seu encalço, sondando as pegadas, olhando as marcas que os cascos deixavam no chão, não raro atravessando riachos de barreira a barreira, passando por cima de lajedos, cortando moitas de mofumbo[GM1] ou quebrando espinhos de juazeiros, sempre trazia o bicho pela corda de volta a fazenda. Na chapada do Apodi tinha o negro João Jacó, famoso tangedor de gado de toda aquela ribeira, que tanto andava com boiada, como farejava pelo rasto os animais desaparecidos. Havia ainda Chico Pensão que foi o mais espiritado dos vaqueiros de toda região de Patu e Caraúbas.
Tinha também naquela região
Guilherme do Trapiá, fazendeiro rijo, sempre de bom humor, que era um
rastejador de primeira qualidade, pois nunca um animal lhe escapou. Quando saia
no seu encalço, sondando as pegadas, olhando as marcas que os cascos deixavam
no chão, não raro atravessando riachos de barreira a barreira, passando por
cima de lajedos, cortando moitas de mofumbo[GM1] ou quebrando espinhos de
juazeiros, sempre trazia o bicho pela corda de volta a fazenda. Na chapada do
Apodi tinha o negro João Jacó, famoso tangedor de gado de toda aquela ribeira,
que tanto andava com boiada, como farejava pelo rasto os animais desaparecidos.
Havia ainda Chico Pensão que foi o mais espiritado dos vaqueiros de toda região
de Patu e Caraúbas. Na Serra de Martins, tinha Pedro Balisa e muitos outros,
cujas famas ainda hoje são conhecidas. Caso havia, em que os serviços dos
rastejadores eram aproveitados para a elucidação de crimes e de assaltos. A
polícia, na perseguição de criminosos, sempre que podia, apelava para a
experiência dos rastejadores. E os malfeitores, por conhecerem as habilidades
dos rastejadores, tratavam de dificultar o máximo possível o trabalho daqueles
profissionais, saltando de pedra em pedra pelos lajedos, escolhendo chão mais
duro onde pisar, andando sobre trechos de cercas e até chegavam a utilizar
alpercatas cujos saltos estavam pregados na frente, para dar ideia de
caminharem em sentido contrário. Mas nada disso adiantava. Os rastejadores
sempre encontravam a sua “caça”. Nas crônicas de Mossoró encontramos um relato
do uso de rastejadores para solucionar um crime, contada pelo escritor Raimundo
Nonato, no seu “Visões e Abusões Nordestinas”: “Joaquim Teodorico Barbosa foi
autor da morte do Coronel Inácio Silva, fazendeiro, homem de grandes haveres.
Viajavam juntos, vindos pela estrada do Açu. Quando a certa altura, Joaquim
Teodorico Barbosa, que caminhava um pouco atrasado, gritou: “Corra meu
padrinho, que aí vem os cangaceiros”. E atirou no fazendeiro pelas costas.
Praticando o homicídio, roubou o dinheiro da vítima e foi apresentar-se na
cidade de Mossoró contando o fato, daquela forma, e afirmando que fugira para
não ser trucidado pelo bando. A conversa não convenceu a todos, apesar de bem
arranjada. E tomando medidas, e procurando investigar o caso, por outros meios,
“seu Rosado” (farmacêutico Jerônimo Rosado) mandou pessoa de sua confiança
examinar o local e verificar os rastos que tinham ficado na estrada depois do
atentado. O resultado não podia ser outro: o rastejador descobriu o fio da
meada. Só havia no chão, pelas imediações, pisadas de dois animais: um que
estacionara ali, por perto, e outro que saíra em disparada, em direção a cidade.
Apertado pelas provas, Joaquim Teodorico Barbosa contou tudo. Foi levado ao
Tribunal do Júri, e fez ele próprio a sua defesa, no dia do julgamento. Quem
presidiu a sessão e lavrou a sentença condenatória foi o então Juiz de Direito
da Comarca, Dr. Silvino Bezerra Neto. ” A literatura é vasta sobre esse
assunto. Oswaldo Lamartine de Faria, em seu no livro “A Caça nos Sertões do
Seridó”, narra muitos outros exemplos da perícia dos rastejadores. Luís da
Câmara Cascudo relata, em uma das suas “Acta Diurna”, conta o caso de um
fazendeiro que guardava as patas do seu antigo cavalo de campo e, um dia, para
confundir seu velho vaqueiro e maior rastejador, mandou calçá-los no chão do
roçado, e pediu ao compadre para identificar o animal que estava estragando a sua
lavoura. O vaqueiro, depois de estudar cuidadosamente o rasto, lamentou-se
junto ao patrão, da idade e caduquice que o fazia acreditar serem marcas feitas
pelos cascos da alma do cavalo fulano... [GM1]
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