Alexander Vassilievitch Chayanov,
Engenheiro Agrônomo, Economista e Sociólogo Russo, em 1920, escreveu um texto
de caráter utópico futurista denominado ‘’ Viagem do meu irmão Alexei ao país
da utopia camponesa’’. De um modo geral, a história se passa em uma realidade
onde a dicotomia urbana x rural não mais existe. Chaynov era um esperançoso do
estreitamento dos laços rurais e urbanos, já nessa época, ele detectava indiferenças
nessas relações e sonhava com suas superações.
A dicotomia
urbano-rural teve origem na divisão social do trabalho que determinou
atividades econômicas e formas de análises distintas para esses espaços. Essa
separação foi difundida pela Geografia e Sociologia, formando uma análise teórica
clássica sobre os espaços. No entanto, essa concepção é obsoleta e falsa. Do
ponto de vista das características do território, existe uma diferença, mas
isso não significa uma oposição em relação a seus funcionamentos.
Os espaços
rurais e urbanos se fundem de forma cada vez mais intensa, formando um novo
arranjo social, político e econômico. Isso é percebido no avanço da malha urbana
sobre os perímetros rurais e dos novos paradigmas de lazer e descanso. Várias
pessoas das cidades procuram cada vez mais áreas rurais para passarem finais de
semana ou para realizarem turismo rural, trilhas ecológicas e etc.
Várias pessoas,
em inúmeros pequenos municípios, moram em zonas rurais e trabalham na zona
urbana, o fenômeno também ocorre ao contrário, várias pessoas moram em cidades,
mas trabalham e desenvolvem várias atividades econômicas no campo. Esse fenômeno
vem cristalizando um complexo sistema que funciona de forma orgânica e
interdependente entre os dois espaços.
Se partirmos
do princípio que os dois espaços não se separam apenas se completam, essa
dicotomia nociva não faz sentido algum. As cidades necessitam do campo para se alimentar,
se vestir, entre outras inúmeras coisas, do mesmo jeito, o campo necessita da
cidade para consumir e utilizar diversos produtos produzidos lá. O campo e a
cidade se misturam realizando um sistema de trocas, dependência e equilíbrio.
Em meio desse
problema, a agricultura urbana (AU) é um exemplo clássico de apoio para a superação
dessa dicotomia e do pleno funcionamento do sistema campo/cidade. A prática vem
avançando na malha urbana, seja em terrenos ociosos, seja em coberturas de
prédios ou até mesmo em pequenas varandas de apartamentos e principalmente nas
áreas periurbanas das cidades.
A AU surge
como um enorme potencial não só para estreitar esses laços, mas também para
transformar as cidades em produtoras de alimentos, gerando mais empregos, renda
e sustentabilidade. Nada mais é que a exploração agrícola em pequenas áreas
urbanas ou periurbanas com o intuito de superar a carência alimentar e também
gerar lucros com a venda dos excedentes.
Essa atividade
também traz uma maior sustentabilidade para as cidades deixando-as mais verdes,
reaproveitando resíduos urbanos e melhorando o clima. Do ponto de vista
econômico, a atividade gera empregos e rendas,se tornando algo importante nos
dias de hoje, uma vez que o desemprego cresce cada vez mais nas cidades.
De acordo com
os dados da Organização das Nações Unidas (ONU), cerca de 54% da população
mundial vivem nas cidades. Essa porcentagem tende a aumentar para 66% até 2050,
totalizando 2,5 mil milhões de pessoas(1). Diante desse quadro, novas
alternativas precisam ser elaboradas para alcançar sustentabilidade ambiental,
empregos e renda nas cidades. Já está mais que claro que as cidades também
terão que produzir alimentos para alimentar seus moradores.
A agricultura
urbana já é uma realidade em várias cidades importantes em muitos países,
contribuindo em diversos aspectos para suas populações. Existem estudos que
estimam que a agricultura urbana vem empregando cerca de 800 milhões de pessoas
em todo o mundo. Na Ásia, cidades importantes desse continente ganham destaques,
Shangai, na China, na capital Vietnamita, Ho Chi Minh, eem Cagayan de Oro nas
Filipinas (2).Na África, destacamos países como: Lomé, Tanzânia e Senegal,
Namíbia, África do Sul entre outras. Na América Latina, temos México, Cuba. Argentina e Haiti. A AU vem
modificando a vida de milhares de pessoas nestes países, desde o combate a fome
ao desemprego, além de promover uma maior integração entre campo e cidade.
O Brasil
também tem grande destaque. Cidades como Rio de Janeiro, Belém e Minas Gerais possuem excelentes iniciativas por parte dos
governos municipais e de suas populações. No entanto, um estudo feito em 2006
por uma parceria da FAO, Rede de Intercâmbio de Tecnologias Alternativas (REDE),
o Promoção do Desenvolvimento Sostenible, (IPES) e o Ministério do
desenvolvimento social (MDS), verificou a presença da AU em 11 regiões
metropolitanas; (Belo Horizonte (MG), Curitiba (PR), Porto Alegre (RS), Rio de
Janeiro (RJ), São Paulo (SP), Brasília (DF) e Goiânia (GO),Belém (PA),
Fortaleza (CE), Recife (PE) e Salvador (BA). Concluindo assim, que a AU é
praticada em todas as regiões do Brasil (3).
A AU é um
exemplo mais que concreto da integração campo/cidade, seu avanço vem apenas
confirmando ainda mais isso. A produção de alimentos nas cidades não traz
apenas uma integração do ponto de vista econômico, também traz um forte laço
dos aspectos sociais e culturais do campo e da cidade. A falsa dicotomia entre os
dois espaços também gerou estigmas negativos entre seus moradores, muitas
pessoas das cidades consideram os camponeses como ‘’atrasados’’, já os
camponeses, muitas vezes, costumam tratar as pessoas das cidades com
desconfiança. A entrada da agricultura na cidade ajuda a acabar com essas
concepções.
Uma quebra do
reducionismo clássico da dicotomia urbano/rural é demonstrada em vários fatos
publicados em estudos atuais, seriam muitos para descrevê-los aqui. Enfatizamos
a AU por ser cada vez mais crescente e por trazer de forma direta a principal
atividade econômica do campo que é a agricultura. Com ela, também são
apresentados aspectos culturais dos camponeses e suas formas de trabalho, isso
vem contribuindo para a quebra dos preconceitos.
É necessário
entender que estamos diante de um novo
arranjo social entre campo e cidade, que embora esses espaços preservem suas
características próprias, não significa que sejam antagônicos ou um submisso ao
outro. Esses espaços se complementam em seus funcionamentos, as novas
tendências provam cada vez mais esse fato. A AU é um bom exemplo disso e suas
contribuições para a quebra desse reducionismo é enorme.
*Saul Ramos de
Oliveira é Engenheiro Agrônomo, e Mestrando em Horticultura Tropical, Ambos
pela UFCG.
REFERÊNCIAS
[1] Centro
Regional de Informações das Nações Unidas (UNRIC). Relatório da ONU mostra
população mundial cada vez mais urbanizada, mais de metade vive em zonas
urbanizadas ao que se podem juntar 2,5 mil milhões em 2050. Disponível em:http://www.unric.org/pt/actualidade/31537-relatorio-da-onu-mostra-populacao-mundial-cada-vez-mais-urbanizada-mais-de-metade-vive-em-zonas-urbanizadas-ao-que-se-podem-juntar-25-mil-milhoes-em-2050.
[2] CRIBB, A. Y., SANDRA LUCIA DE SOUZA PINTO CRIBB, UNIPLI; ANDRE YVES CRIBB, CTAA.Agricultura urbana: alternativa para aliviar a fome e para a educação ambiental.In: CONGRESSO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ECONOMIA, ADMINISTRAÇÃO E SOCIOLOGIA RURAL, 47., 2009, Porto Alegre. Desenvolvimento rural e sistemas agroalimentares: os agronegócios no contexto de integração das nações: anais. Brasília, DF: SOBER, 2009. 1 CD-ROM. Ref. trabalho 359. 2010
[3]
SANTANDREU, Alain ; LOVO, Ivana Cristina. Panorama da agricultura urbana e
periurbana no Brasil e diretrizes políticas para sua promoção. Belo Horizonte:
FAO/MDS/SESAN/DPSD, 2007.
Enviado pelo professor, escritor, pesquisador do cangaço e gonzagueano José Romero de Araújo Cardoso
http://blogodmendesemendes.blogspot.com