O relato a
seguir, foi concedido por Augusto Lopes (Augusto Baiana) em que retrata a
passagem de Lampião na Fazenda Angico no município de Cansanção/BA na década de
20. Augusto Baiana é historiador e neto do Senhor Pedro Lopes, conceituado
Fazendeiro do Município de Cansanção, proprietário da Fazenda Angico, conforme
descrito a seguir:
“Começo da
manhã do dia 22 de dezembro de 1929, após tirar o leite das vacas voltou para
casa para tomar o café e continuar com a sua lida de vaqueiro. Quando ia
sentando a mesa para começar a tomar o café percebeu uma inquietação dos
animais lá pra banda do curral, saiu para o avarandado da casa velha da fazenda
para ver o que era e foi logo cercado pela cabroeira de Lampião, os cabras de
Lampião muito ríspido chamou seu Pedro pelo nome assim: “Pedro sabe quem esta
aqui” seu Pedro respondeu afirmativamente com a cabeça.
Pedro Lopes
Dona Nininha Moura e Aparecida Lopes Marinho do colo.
Eles falaram
assim “nos acompanhe até o curral”. O curral estava cheio de cavalos e éguas,
pois tinham sido vaquejados para ferrar e curar os potros novos. Quando seu
Pedro chegou à porteira do Curral Lampião estava escolhendo o melhor cavalo da
fazenda já laçado por ele.
Seu Pedro:
- Bom dia, quem é o capitão Lampião?
Lampião:
- Sou
eu o que queres.
Pedro Lopes:
- Tenho ordem do dono dessa fazenda de que tudo que o senhor necessitar esta as
suas ordem” nesta época Pedro Lopes era vaqueiro da fazenda Angico que no
futuro ia pertencer a eles e a seus filhos, Adonias Lopes, Ozaná Lopes e Manoel
Lopes.
Lampião:
– Não
quero nada só às montarias e quero que você venha comigo até a vila de
Cansanção para trazer os cavalos e arreios.
Após selar os
animais com ajuda de Pedro Lopes ele os convidou para acompanhar ele até a casa
o bando inteiro foi atrás dele, chegando lá só Lampião entrou, Pedro Lopes
ofereceu café, leite, coalhado ou umbuzada, mas Lampião falou que não queriam
nada. Só quero que você se arrume para ir a Cansanção. Dona Nininha Moura
esposa de Pedro Lopes tremia de medo. Lampião percebendo a aflição dela falou
“Parece que você não quer que ele vá com agente”. Mesmo com muito medo ela
respondeu “e não quero mesmo que ele vá, estou aflita”. Lampião respondeu “Não
se preocupe ele vai, mas ele vai voltar, só quero que traga os cavalos e
arreios de volta”. Neste momento Lampião percebeu a inquietação de Pedro Lopes,
ia a um canto ia a outro, pé dentro pé fora. Puro nervosismo. Indaga Lampião-
“O que procuras Pedro”. Pedro Lopes responde “minhas alparcatas e esporas”.
Lampião apontado com o cabo do rebenque para debaixo do banco na sala- “Serão
aquelas Pedro”. Pedro Lopes “e não é que é, parece que ela me cegou”. Quando
Pedro Lopes estava calçando as alpargatas com as esporas Lampião falou-
“bonitas esporas Pedro” (esporas feita de alpaca, um material semelhante à
prata da época do império). Pedro Lopes de imediato tirou as esporas e falou:
- Pode usar Capitão, pode usar.
Após calçar as esporas saiu todos eles em
direção ao curral e outra vez lampião olhou para dona Nininha Moura e disse.
- Não se preocupe ele vai voltar.
Saiu todos em
direção a Cansanção, com Lampião gabando a montaria e as esporas, tinha um do
bando que estava muito mal montado com um animal fraco e que não chegaria a
Cansanção. Passando pela Parelha encontrou o Lucio lavando um burro bem bonito
na lagoa. De imediato Lampião ordenou que selasse o burro e Lucio acompanhasse
eles junto com Pedro para trazer o burro de volta. Chegando a Cansanção Pedro
Lopes e Lucio Ficou perto do Cemitério a mando de Lampião e toda cabroeira
entro em cansanção fazendo a maior bandalheira, entrando nas lojas montados,
bebendo, puxando rolos de fumo e peças inteiras de tecidos, pela rua. Depois de
algumas horas volta Lampião com os animais todos perfumado de banhos de
perfumes roubados das lojas locais e uma peça inteira de pano e entrega a Pedro
Lopes. E fala assim- “tome isso é pra você, pode ir, mas tenha cuidado que a
volante vem ai atrás de meu bando, obrigado e vá embora”. Volta Pedro Lopes com
Lucio, segundo Pedro Lopes pelo nervosismo pouca palavra ele trocou com Lucio
na volta, queria logo era chegar em casa. Chegando em casa ele foi abraçado aos
prantos por dona Nininha e contou por alto o que tinha ocorrido e pegou o
presente que Lampião deu para ele e foi esconder em um buraco de umburana no
fundo da casa, para que no próximo dia da feira devolver para o comerciante
dono da loja de tecido.
No outro dia
quase no mesmo horário da visita de Lampião chegou a volante, acompanhado do
Lúcio, Pedro Lopes os mandou entrar e perguntou se queriam comer e eles de
pronto aceitaram, enquanto seu Pedro era interrogado pelo tenente, toda a
volante era alimentada por dona Nininha e eles na maior falta de educação
quebravam as porcelanas e roubavam todas as colheres de prata que foi dada beber
a umbuzada. No interrogatório do tenente seu Pedro falou todo realmente o que
tinha acontecido, só ficou com receio de falar do presente. Quando o tenente já
ia saindo, Lúcio segredou no ouvido dele que Lampião tinha dado um presente a
Pedro Lopes. Aí a coisa mudou de figura, o tenente partiu para cima de Pedro
Lopes falando assim:
- Coiteiro descarado, quer dizer que você é moleque, me dê
logo este presente antes que eu te arrebente.
De nada adiantou Pedro Lopes
dizer iria devolver o presente ao comerciante, ele foi empurrado até o pé da
umburana para pegar a peça do tecido e entregar nas mãos do tenente. Por muito
pouco, Pedro Lopes não apanhou muito, tudo por culpa do Lúcio, que por muitos
anos Pedro Lopes guardou esta mágoa. Em resumo, o tecido não foi devolvido para
o comerciante.
Pedro Lopes, dona Nininha, Augusto Bahiana e Cristiane Lopes no colo (1984).
Na segunda
passagem de Lampião na fazenda Angico, infelizmente no momento nas minhas
pesquisas não sei com exatidão o ano. Já foi encarado por Pedro Lopes de outra
maneira, após toda a retaliação que sofreu pela volante faltando pouco para
consequências maiores ou até mesmo a morte. Com ajuda do nosso bom Deus não
aconteceu e Pedro Lopes viveu até quase 101 anos e até a hora de sua morte
totalmente lucido e pode passar para nos muitos ensinamentos e historias boas.
Sempre era
comum na época que Lampião andava pelos lugares, saia na frente alguém para
avisar as pessoas das comunidades ou fazenda na suposta trilha por onde ele
iria passar muitas vezes por segurança ele mudava o roteiro por outro
totalmente contrario. Assim aconteceu um amigo de seu Pedro saiu montado na
frente a todos até chegar à fazenda Angico, falou que Lampião tinha chegado à
localidade de Periperi a estava com os bofes virados, batendo em muita gente e
até nos parente de Pedro Lopes. Com todo este sofrimento seu Pedro já tinha
preparado na caatinga um esconderijo, uma barraquinha de pindoba, para ficar
com a família escondido na passagem de Lampião. Assim o fez Pedro Lopes e
muito, mas agora que ficou sabendo que até seu irmão e parentes apanhou. Só que
antes de fugir ele deixou a casa aberta com mantimentos e utensílios para
Lampião e seu bando servir-se à-vontade.
Foge Pedro
Lopes para o referido esconderijo, com a família toda, um monte de filhos,
cachorros, papagaios, parentes que mora com ele, mocinhas e senhoras que ajuda
de cuidar dos, mas de 20 filhos. Imagine essa quantidade de gente toda o
rastros (pegadas) que não deixou no chão.
Chegando
Lampião à fazenda Angico, apesar de encontrar as portas abertas e a casa com
alimentos franqueados a ele e seu bando Lampião ficou muito revoltado, alegando
que não tinha feito nada com Pedro da outra vez que passou por que razão ele
fugiu. Neste momento os cabras do bando encontram os rastros de Pedro e família
e grita:
- Oia Capitão, por aonde eles vão aqui. Vamos atrás.
Desceu todo o
bando atrás da família pela variante escolhida da fuga de Pedro Lopes. Nesta
época em Cansanção estava tendo uma seca muito grande, e o rancho de pindoba de
Pedro Lopes foi construído após uma cacimba na beira do riacho, leito de rio
muito arenoso e por razão da seca, muita gente das localidades vizinhas pegava água e os rastros foram confundidos por bondade de Deus. Lampião resolve
suspender a busca, antes manda um recado por moradores que estavam pegando aáua,
assim:
-“Diga a Pedro que da próxima vez que passar aqui, quero encontrar ele em
casa, não fiz nada com ele, não devia ter fugido. Vamos embora cambada pra Cansanção.
E por milagre de Deus Pedro Lopes e família escapou e para maior tranquilidade,
Lampião poucos anos depois morreu e não retornou mas para as banda de
cansanção.
Esta foi a
passagem da família de seu Pedro Sousa Lopes e dona Nininha Moura Lopes com o
rei do cangaço Capitão Lampião.
Obs. Este
relato foi tirado das muitas vezes que ouvir meu avô de coração Pedro Lopes
contar e do livro de sua filha Davina Moura Lopes Marinho” – Augusto Bahiana.
Blog do
Florisvaldo – 10/05/2014
Florisvaldo
Ferreira dos Santos
Consultor de
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